A vida clama pelo tempo do bom senso: vamos construir!

A vida clama pelo tempo
do bom senso: vamos construir!

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Publicado originalmente em www.pressenza.com

Vivemos no tempo do senso comum. Tempo este que os sentidos se apoderam do empírico como se tudo fosse natural. E, simplesmente, por ser natural, exista! É lamentável que a morte, que natural é para os vivos, seja imposta às pessoas. Mas não são quaisquer pessoas. As pessoas, as quais a morte é imposta, são empobrecidas pelo mesmo vetor de opressão. São as pessoas que estão nas ruas e não possuem casa e assim precisam viver, ou esperar a morte, mesmo em uma pandemia. São as pessoas da periferia, lugar que é visto pela distância de um centro, pela ausência e carência, como reflexo do predomínio ideológico que se forma como senso comum na mente da maioria das pessoas. Por isso é fácil brotar do grupo social que chamam classe média, medidas que demonstram a pena dos carentes ou a monstrualização dos indigentes, tratando como uma gangorra, as pessoas da periferia;

Precisa-se, cada vez mais, construir o bom senso hegemônico nesse mundo, e não como um suspiro individual!  Até porque, com um pouco de bom senso lambendo os corpos, fica fácil saber que o indivíduo é uma criação ideológica para empurrar as pessoas para o isolamento. É sim, pode ser lamentável para algumas pessoas, mas o indivíduo não existe! Como já diziam os filósofos gregos da vertente mais crítica, a começar por Aristóteles, somos todos zoon politikon. Somos, portanto, seres históricos. Sujeitos! E, a história, o objeto em questão.

O bom senso ganha corpo no mundo, historicamente, socialmente, culturalmente e politicamente, quando se investe no conhecimento coletivamente e se supera os raios da ignorância impostos que predominam na organização deste mundo no qual vivemos. E notem bem: agindo para abrir a caixa do cérebro para o bom senso e organizar o vetor da formação histórica, se movimentam corpos pela dignidade humana.

O pensamento dos gregos possui muito para nos ampliar, assim como o que vem acumulado de bom senso dos pensamentos e das formulações com influências africanas.  Tanto a ôntica humana sustentada em uma humanidade plena, como o trabalho criativo, opus em potencial, nos são negados nesse mundo. Tanto nos é necessário, para inspirar o bom senso a predominar nas pessoas que vivem nesse mundo, a compreensão dos conhecimentos, sem hierarquias, mas também sem deixar misturar as diversas e distintas contribuições para ler, compreender e agir sobre o tempo para transformar esse mundo. São contribuições, inspirações, ensinamentos e energias, para que sejamos sujeitos da vida plena e do trabalho criativo. Assim tanto o conhecimento ancestral passado oralmente, quanto o conhecimento, principalmente escrito, sustentado na pesquisa e formulação científica, nos são fundamentais.

Notem, construir bom senso no poço da ideologia dominante é um movimento que nos exige investir e ampliar uma inteligência coletiva. Pensar coletivamente, por sua vez, nos exige investimento em acesso aos conhecimentos, formação, compreensão dos diferentes conhecimentos que se ampliam na ação coletiva. Quanto mais coletiva a ação mais multidão seremos na mudança para uma vida digna. Afinal, não pode ser demais para qualquer ser vivo, humano ou não, ter dignidade em viver.

Não é por menos que nós, homo sapiens, precisamos cada dia aprender mais e mais para transformar a natureza sem destruir. Mas, para isso, precisamos ressignificar nossa relação com a natureza e com nós mesmos, ou seja, uma alteração profunda que coloque o comum em acesso e a favor da vida de todas as pessoas e não de poucos, como há muito vem permeando o tempo dos vivos.

Sinta-se sujeito de sua vida! E esse movimento tem, ao menos, que construir o bom senso, de que as pessoas com direitos, ampliam os direitos de todas as outras pessoas que padecem do direito roubado. Ou seja, o direito do outro não me faz calar, mas amplia a minha voz. O senso comum exposto na frase “meu direito termina quando começa o do outro” deve ser profundamente superado. Pode-se, sim, perguntar que outro, afinal vivemos em um mundo onde há os iguais, os diferentes, os contraditórios e os antagônicos.

E os antagônicos?  Estes, sim, são os que empurram a multidão de pessoas para os maiores fardos materiais e espirituais que existem nessa vida. O desafio de ser sujeito na história, nos empurra para a necessária potência criativa que temos, inspirada na ancestralidade e no acesso ao conhecimento. Mas que tenhamos bom senso e muito bom senso, para saber que nada há de natural nesse mundo dos homo sapiens e que os sentidos nos dão prazer de viver, mas não podem organizar, banhados por baldes empíricos, a nossa vida.

Vamos juntos, então criar uma consciência e inteligência coletiva, que nos amplie para um bom senso que faça a vida ser vencedora e, quem sabe, nos aproxime da crítica criativa, profunda e com a pedagogia da convivência nos organizando. Assim, nos construiremos historicamente, socialmente, culturalmente e politicamente na terra do senso crítico coletivo, criativo e que transforma o comum em comum pra a satisfação material e espiritual de todas as pessoas.

*Nasceu na periferia da cidade do Rio de Janeiro e desde os 14 anos atua em ações democráticas. Fez parte da Teologia da Libertação e atua com formação política desde os 18 anos, em partidos de esquerda, movimentos sociais e organizações da sociedade civil. Cursou Ciências Econômicas na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e Ciências Sociais na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi da direção do Observatório de Favelas, coordenador da ESPOCC – Escola Popular de Comunicação Crítica – e colaborador do IMJA-Instituto Maria e João Aleixo – desde a sua fundação. Nos dias atuais é colaborador e organizador do IPAD e identifica-se como intelectual orgânico da periferia.

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