Autor: Redação Lauro Campos

  • Fora Bolsonaro e Mourão! Eleições livre e antecipada!

    Fora Bolsonaro e Mourão! Eleições livre e antecipada!

    Fora Bolsonaro e Mourão!
    Eleições livre e antecipada!

    Quatro notas sobre a mudança da conjuntura e da tática

    A mudança na conjuntura impacta as distintas classes sociais de forma diferente. Os dias passaram a contar por semanas, e as semanas por meses. Tudo se acelerou. Uma parcela da classe média, sob a ameaça da iminência de um cataclismo sanitário sem precedentes, perdeu confiança na capacidade de Bolsonaro responder à emergência sanitária e começou a se manifestar nas janelas. Uma maioria dos setores organizados da classe trabalhadora se consolidou na oposição. Uma maioria burguesa pressiona para que todas as instituições, Congresso e STF e, se necessário até o generalato, enquadrem Bolsonaro, e imponham uma tutela

    Por Valério Arcary

    1. A conjuntura mudou, e exige da esquerda uma mudança na tática. Quando nossos inimigos enfraquecem, a mão não pode tremer, é preciso bater mais forte. Uma maioria dos setores organizados da classe trabalhadora e da juventude já está na oposição. Chegou a hora de agitar Fora Bolsonaro!

    O gatilho foi o alinhamento insólito de Bolsonaro com as teses negacionistas da pandemia devastadora que assola o mundo. Estamos na inusitada situação de um presidente em luta pública contra o próprio ministro diante de uma guerra pela saúde pública. A emergência sanitária e as divisões na classe dominante provocaram um isolamento de Bolsonaro. O desgaste é um processo em curso, tem dinâmica lenta, mas é clara.

    Nas últimas semanas, a maioria dos governos estaduais passou a questionar a orientação da Presidência da República e o apoio de alguns dos principais grupos de mídia do país a Mandetta. Uma crise política está escancarada, e vivemos uma situação anômala, excepcional e anormal de “dualidade de poder” institucional, porém, o paradoxo é que prevalece a linha do ministro, não de Bolsonaro. Não parece sustentável, indefinidamente.

    Mas, ao mesmo tempo, que a obtusa e teimosa atitude provocatória de Bolsonaro potencializa a crise do governo, o regime democrático-liberal se fortalece, revelando plasticidade, ou capacidade de absorção de choques, de adaptação ao conflito de poderes, e de iniciativa diante da crise. Abriu-se uma conjuntura de instabilidade, mas deve se fechar. O poder não é compatível com um impasse prolongado, quando há um perigo imenso no horizonte.

    A mudança na conjuntura impacta as distintas classes sociais de forma diferente. Os dias passaram a contar por semanas, e as semanas por meses. Tudo se acelerou. Uma parcela da classe média, sob a ameaça da iminência de um cataclismo sanitário sem precedentes, perdeu confiança na capacidade de Bolsonaro responder à emergência sanitária, e começou a se manifestar nas janelas. Uma maioria dos setores organizados da classe trabalhadora se consolidou na oposição. Uma maioria burguesa pressiona para que todas as instituições, Congresso e STF e, se necessário até o generalato, enquadrem Bolsonaro, e imponham uma tutela.

    Mas isso só é possível, parcial e efemeramente, e parece improvável que se mantenha, pois entre outros fatores, Bolsonaro tem uma personalidade messiânica, uma corrente de massas neofascista, importante resiliência política no aparelho repressivo do Estado e apoio do governo norte-americano.

    Uma nova conjuntura impõe uma mudança na tática. Quando há giros na situação política é comum que as organizações de esquerda sofram com um nível mais áspero de polêmica interna. Entram em crise e não é raro que se dividam. Portanto, o PSOL acaba de passar por uma prova importante.

    A executiva nacional do PSOL já aprovou uma resolução que levanta o Fora Bolsonaro e Mourão. Apresentou a defesa de que a melhor saída deve ser a luta por eleições diretas livres e antecipadas, pois Mourão não tem legitimidade para assumir a presidência. Livres porque é necessário anular as decisões da LavaJato, e garantir a restituição dos direitos políticos de Lula.

    Essa decisão facilita uma maior unidade entre as diferentes correntes do partido. Poderemos discutir se o fez de forma atrasada ou adiantada, o que é um debate que pode ser educativo, mas é um balanço. Balanços têm o seu lugar e são indispensáveis para uma militância séria, mas com maturidade. Nem mais, nem menos. O que é, realmente, importante é que a confluência na necessidade de exigir o Abaixo o governo abre o caminho para que o PSOL se fortaleça.

    2. Fora Bolsonaro é uma consigna de agitação. Não é para a ação. As palavras de ordem para a ação são aquelas articuladas com a necessidade de salvar vidas: defender os profissionais de saúde que estão abandonados na primeira linha de defesa, proibir demissões, defender os salários de quem tem emprego, e construir a solidariedade.

    A conjuntura mudou com o enfraquecimento de Bolsonaro, mas a situação reacionária ainda está longe de mudar. São dois níveis de abstração distintos na análise da realidade: estrutura social e superestrutura política. As relações sociais de força se alteram quando se precipitam embates em que, claramente, ocorre uma vitória ou derrota de uma das classes em luta.

    Dentro de uma mesma situação existem diversas conjunturas. Uma análise só é marxista se a sua referência é a luta de classes. O que define uma situação é a relação social de forças, ou o estudo das posições relativas na estrutura da sociedade da burguesia, dos trabalhadores e setores oprimidos e da classe média. As relações sociais de forças são mais estáveis que as relações políticas de força. Porque as relações políticas de força, ou a posição relativa do governo, das diferentes instituições de poder, como o Congresso, o Judiciário, as Forças Armadas, os governos estaduais, os partidos políticos, na superestrutura da vida social se alteram, oscilam, deslocam-se mais rapidamente. Mas este descompasso é transitório.

    A conjuntura mudou, embora a situação ainda seja reacionária, ou seja, a classe trabalhadora permanece, infelizmente, na defensiva. Até agora, foram os governadores que se fortaleceram, não a esquerda. Ignorar que a situação permanece reacionária seria uma ilusão, mas desconsiderar a mudança da conjuntura seria um erro gravíssimo. Podemos e devemos nos inspirar no bom e velho empirismo leninista para a análise.

    Recordemos que o contexto histórico recente deve ser levado em conta. O golpe de 2016 triunfou com pouca resistência, o que só é explicável pelo que foi a orientação dos governos do PT e as divisões que geraram dentro da classe trabalhadora e na juventude. Viemos de derrotas acumuladas, e abriu-se uma situação reacionária. Lembremos, também, que nenhum governo cai, se não for derrubado, seja a “frio” ou a “quente”. Acontece que a “ frio” é muito incomum. E a “quente” depende da entrada em cena das massas populares à chilena. Nenhuma luta está perdida antes que acabe. E a luta contra Bolsonaro está apenas começando.

    Nunca será bastante sublinhar que a potência da resistência a Bolsonaro esteve no movimento de mulheres que construiu o #EleNão na hora mais triste de 2018, e entre a juventude que protagonizou o tsunami da educação em 2019. Serão, provavelmente, a primeira linha quando pudermos voltar às ruas.

    A conjuntura mudou com o enfraquecimento de Bolsonaro, mas a situação reacionária ainda está longe de mudar. São dois níveis de abstração distintos na análise da realidade: estrutura social e superestrutura política. As relações sociais de força se alteram quando se precipitam embates em que, claramente, ocorre a vitória ou a derrota de uma das classes em luta

    Fora Bolsonaro é o centro da luta para salvar vidas. Por quatro razões: (a) porque a pandemia é de máxima gravidade; (b) porque Bolsonaro errou rude, deixou um flanco aberto, subestimou o medo da população diante de drama de saúde pública, abriu uma crise na relação com as instituições; (c) porque uma onda de protestos se iniciou mesmo nas condições de quarentena, com a ocupação das janelas e deve ser impulsionada; (d) porque o embrião de uma Frente Única de Esquerda ganhou força com a plataforma das Frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular.

    3. Mudou a conjuntura, e ela exige lucidez e coragem. Audácia, audácia e audácia. Abriu-se uma brecha para a oposição, portanto, para a esquerda.

    Só que a luta para que a esquerda ocupe um lugar central na oposição a Bolsonaro não é simples. O Brasil contemporâneo nunca viveu as sequelas de uma guerra. O impacto de um cataclismo em poucas semanas, infelizmente, com a possibilidade de dezenas de milhares de mortes, é imprevisível. Será, provavelmente, um terremoto na consciência de dezenas de milhões.

    Não há razão, contudo, para alimentar ilusões “facilistas” de que o processo de desgaste de Bolsonaro será gradual e constante, menos ainda que resulte, necessariamente no aumento da confiança na esquerda. Tudo estará em disputa. Bolsonaro reagirá e tem ambições bonapartistas. Dória e Witzel, que foram garantia da governabilidade de Bolsonaro, já se reposicionaram pela necessidade de uma unidade nacional de emergência contra Bolsonaro. Haverá ação e reação, e uma luta implacável.

    Bolsonaro enfraqueceu, mas mantém apoio. Há uma oportunidade. A burguesia está dividida em torno de um tema central, o que é uma novidade. Não acontece desde 2017, quando do escândalo da gravação de Michel Temer com Joesley Batista na garagem do Palácio do Jaburu. Uma maioria da classe dominante apoia a tática de mitigação defendida pelos governadores e até por uma ala do próprio governo Bolsonaro, liderada por Mandetta.

    O golpe de 2016 triunfou com pouca resistência, o que só é explicável pelo que foi a orientação dos governos do PT, e as divisões que geraram dentro da classe trabalhadora e na juventude

    Salvar vidas é um programa humanitário. Unidade na ação é legítima contra Bolsonaro. Mas não há um programa comum possível. A tática da Frente Ampla com Maia ou Dória prepara uma derrota que será fatal. A esquerda deve se diferenciar com programa próprio que precisa ser ordenado pela defesa da quarentena total e nenhuma demissão, porque todas as vidas importam. Deve exigir que, diante da crise, os mais ricos devem pagar pelo preço dela e, portanto, diante da tragédia, as grandes fortunas e as grandes corporações têm que ser taxadas. Por último, deve-se dizer que Bolsonaro tem que ser deslocado.

    No início de março, a posição negacionista de Bolsonaro diante do perigo de uma pandemia catastrófica não era excepcional. Não era somente Bolsonaro que defendia a continuidade da atividade econômica, a facilitação do contágio em massa para uma rápida imunidade de grupo e o isolamento social dos idosos. Era compartilhada pelos governos dos EUA, do Reino Unido, e até da Itália e da França, e só o colapso do sistema hospitalar na Lombardia levou a um reposicionamento.

    A posição de Bolsonaro contra o distanciamento social parece uma loucura, mas obedece a um método. É a expressão de uma visão de mundo. Responde à assustadora mistura de estratégia neofascista e ideologia ultraliberal. Naturalizava uma visão assombrosa de eugenia social. Há um debate na esquerda sobre a sanidade mental de Bolsonaro. É plausível discutir, seriamente, o problema, pois é indispensável saber contra quem lutamos. É claro que há que considerar, em alguma medida, o papel do indivíduo na história. O comportamento de Bolsonaro sugere uma mente paranoica, mas subestimá-lo constantemente tem sido um grave erro.

    Salvar vidas é um programa humanitário. Unidade na ação é legítima contra Bolsonaro. Mas não há um programa comum possível. A tática da Frente Ampla com Maia ou Dória prepara uma derrota que será fatal. A esquerda deve se diferenciar com programa próprio que precisa ser ordenado pela defesa da quarentena total e nenhuma demissão, porque todas as vidas importam

    Ele é um monstro, não importa se é doido. Não será com um atestado médico de insanidade que será derrotado. Não é um bom critério de luta política priorizar a acusação dos inimigos de classe como dementes, maníacos, psicopatas. Socialistas não consideram que a sociedade se divide entre os saudáveis e os malucos. Não reduzimos nossa luta a uma avaliação clínica, psicológica. O bolsonarismo é uma corrente política neofascista que tem apoio de um terço da população. Mas, também, porque respeitamos aqueles que, entre nós, têm sofrimento psíquico.

    4. Aonde vamos? A situação vai ficar muito mais grave, antes de melhorar. Ela vai nos colocar diante de desafios perigosos. A possibilidade de interrupção do mandato se abriu, embora não seja a mais provável, porque não tem apoio de nenhuma fração burguesa importante. Mas a crise sanitária pode ser explosiva, Bolsonaro pode cometer erros muito mais graves, e as massas populares podem entrar em cena.

    Viemos há cinco anos de acumulação ininterrupta de vitórias das forças reacionárias, mas não houve derrota histórica. Há que evitar tanto os otimismos “selvagens”, quanto os pessimismos “hipocondríacos”. Sejamos realistas, portanto, paciência revolucionária. Nossa aposta repousa na confiança de que em situações extremas as massas populares e a juventude liberam forças extraordinárias, e tiram lições políticas mais rapidamente.

    Os cenários políticos serão condicionados pela evolução da crise sanitária e da crise econômico-social. Eles serão decisivos para prever os desdobramentos políticos. Os parâmetros objetivos que permitem projetar a dinâmica da evolução da pandemia no Brasil serão, essencialmente, a extensão e intensidade do contágio, e a taxa de letalidade.

    Bolsonaro é um monstro, não importa se ele é doido. Não será com um atestado médico de insanidade que será derrotado

    Não há dados incontroversos, uma vez que não foram feitos testes em massa e é improvável que se consiga fazê-los antes de maio. Não está claro quais serão as terríveis dimensões da catástrofe, mas serão dramáticos, porque as projeções mais moderadas consideram dezenas de milhares de óbitos já na primeira onda, e as mais apocalípticas não menos de centenas de milhares.

    O impacto poderá favorecer as inevitáveis conclamações à “unidade nacional” contra o vírus. Governos e mídia apresentarão o flagelo como inevitável, anistiando os governos em todas as esferas. Mesmo assim, é possível que esse discurso não seja suficiente para acalmar o mal-estar popular, pois associada ao crescimento da demanda por atendimento hospitalar, veremos as condições materiais de sobrevivência das grandes massas se deteriorar. A aprovação do programa de renda mínima de emergência para cinquenta milhões de pessoas será um fator de relativa atenuação da catástrofe, mas tem prazo curto de validade, porque uma segunda onda de contágio é previsível.

    Nesse contexto, temos três grandes cenários políticos. O primeiro e mais provável, no momento, é que a pressão pelo enquadramento de Bolsonaro seja, em alguma medida, bem sucedida durante a crise. Enquanto ganha tempo, e procura sair do isolamento, Bolsonaro pode tolerar um “freio de arrumação” das alas em disputa, ou uma gestão do ministério articulada pelos generais do Planalto e mediada por Braga Neto. Seria um passo atrás, transitório, enquanto se verifica o ritmo da pandemia e suas sequelas econômicas.

    Ninguém sabe, realmente, as negociações que aconteceram nessas últimas semanas na cozinha do Palácio, mas parece prevalecer um acordo de divisão de tarefas, em que Bolsonaro e sua ala neofascista, contrariados, aceitaram que a linha de Mandetta continue sendo aplicada, diante do jogo de pressões. Embora Bolsonaro tenha provado que é incontrolável. Essa hipótese é a que tem hoje o apoio explícito da maioria da classe dominante.

    A segunda hipótese é que diante de um agravamento desastroso da pandemia, da insatisfação social crescente, do comportamento irresponsável de Bolsonaro, e o perigo de uma subversão revolucionária a chilena, uma maioria burguesa se constitua defendendo um deslocamento de Bolsonaro a “frio”, pelas regras constitucionais. Acontece que o Brasil não é a Argentina. Seria uma solução extrema para a burguesia brasileira, portanto, menos provável. A tradição da cultura política em Brasília é a negociação permanente.

    O maior problema é que Bolsonaro nunca aceitará a renúncia. Não é o seu perfil político, social ou psicológico. Não é Jânio Quadros, embora venha ensaiando blefes bonapartistas, como o de 15 de março. Por outro lado, a urgência de manutenção da linha de distanciamento social não é a mesma do início dos anos 1960. Líderes como Bolsonaro lutam até o fim. Preferem a morte à rendição sem luta. Apelaria à mobilização de massas de suas hordas envenenadas pela ideologia neofascista.

    O maior problema é que Bolsonaro nunca aceitará a renúncia. Não é o seu perfil político, social ou psicológico. Não é Jânio Quadros, embora venha ensaiando blefes bonapartistas, como o de 15 de março

    Nessas circunstâncias, porque um animal político encurralado é muito perigoso, Bolsonaro poderia apelar para a decretação de Estado de sítio, a tentação golpista. Um deslocamento a “frio” teria que ser, portanto, uma intervenção implacável, cirúrgica, instantânea: um impeachment de emergência, feito às pressas, e negociado com o Supremo, “com tudo”. Ou uma combinação de impeachment parlamentar com julgamento do STF. Sempre existem advogados habilidosos para a arquitetura de um processo.

    A terceira hipótese seria a abertura de um deslocamento a “quente”, uma derrubada revolucionária de Bolsonaro. Essa hipótese, que deve ser a estratégia do PSOL, e por ela deve lutar para construir a Frente Única de Esquerda é, por enquanto, infelizmente, muito improvável, por várias razões. O maior obstáculo é que ela não depende somente das sequelas do cataclismo sanitário e social, ou das barbaridades que Bolsonaro venha a cometer.

    Para que a situação venha evoluir nessa direção são necessárias, também, outras três condições. A primeira é que a burguesia e seus representantes, tanto no Congresso Nacional e STF, como nos governos estaduais, venham a cometer erros de gestão da crise que levem a uma ruína nacional sem precedentes, um fracasso retumbante. A segunda é que as massas entrem em cena com disposição revolucionária de luta. A terceira é que os partidos de esquerda com maior influência não aceitem os cantos de sereia da classe dominante, e não abracem a estratégia quietista de deixar sangrar Bolsonaro até 2022, aceitando dar tempo para ele se recuperar, com medo de medir forças nas ruas. Ou, tão grave quanto, uma rendição diante de Mourão como um mal menor.

    O papel da esquerda deve ser a defesa de uma saída anticapitalista. O Brasil precisa de uma esquerda com instinto de poder e um programa socialista.

    Valerio Arcary é professor titular aposentado do IFSP. Doutor em história pela USP. Foi presidente nacional do PSTU entre 1993/98 e, desde 2016, é membro da Coordenação Nacional do MAIS/PSOL. É autor de O martelo da história, entre outros livros.

     

  • A crise deságua na multidão de trabalhadores e trabalhadoras

    A crise deságua na multidão de trabalhadores e trabalhadoras

    A crise deságua na multidão
    de trabalhadores e trabalhadoras

    Por Francisvaldo Mendes, presidente da FLCMF

    É comum ler e ouvir pessoas chamadas de analistas da política afirmarem que o coronavírus jogou o Brasil em uma crise. A crise já era pré-existente, e envolve várias pontas do Estado e da sociedade e pesa sua maior consequência nas pessoas que vivem da venda da força de trabalho. E, principalmente, as que moram nas periferias, que são as que já sofrem o maior impacto da exploração que essa sociedade impõe a todos e todas. Essas pessoas com dificuldade de morar, se transportar, de cuidar das doenças da família, colocar comidas na mesa, sempre receberam o maior impacto da crise e atualmente serão, como sempre, os mais atingidos.

    O vírus não escolhe classes, grupos sociais e territórios. Porém quem joga o vírus cada vez mais perto dos moradores da periferia são os que controlam o sistema de poder. Não são quaisquer pessoas, são as comprometidas com o capitalismo como projeto político, como a maioria da Câmara e o presidente atual.

    Uma demonstração desse descompasso é a aprovação da MP 905 de 2019, que cria o contrato de trabalho verde e amarelo. No meio de uma pandemia a aprovação desta Medida Provisória vai na contra mão de tudo que seria necessário. Quando se deveria, nesse momento, taxar os grandes lucros e os grandes milionários do Brasil, se faz o contrário. Diminui-se os contratos formais de trabalho, e para além disso, a MP congela 13ª salario, retira direito as férias, desonera os patrões, retira conquistas dos trabalhadores, e despreza, por completo, os conceitos de aposentadoria e seguridade.

    Seja qual for a medida de urgência, nenhuma será realmente urgente, sem um investimento econômico real para salvar a vida das pessoas que mais precisam. Essas pessoas são as que não tem casas, são as que possuem dificuldades de conseguir medicamentos essenciais para sobreviver. São as que não tem acesso à água, assim como às mercadorias básicas para higiene, que aparentam inalcançáveis em suas vidas. O impacto do descaso dos governantes recairá sempre nas pessoas mais empobrecidas pelo sistema, e segue assim essa pratica vivida pelo país, imposta pelo parlamento, executivo e judiciário.

    Essa é a hora de concentrar em salvar vidas, frases repetidas por todos os políticos formais do Estado, a grande maioria eleitos pelas pessoas. Mas para que salvar vidas tenha a dimensão necessária do fardo que pesa no tempo atual é necessário mais do que focar as ações contra um ou outro poder do Estado ou de parcelas ou dimensões do Estado. Somente bravatas de Governadores e Deputados não preservam vidas, muito menos cria as condições para superar a crise de consequências sanitárias, políticas e econômicas pelo qual passa hoje o país.

    E se o COVID-19 trouxe para o Brasil e para o mundo esse cenário, não é dele a responsabilidade pelas escolhas e opções de enfrentamento. Os organizadores do Estado são os responsáveis, ou, melhor os irresponsáveis pelo tipo de enfrentamento que está se realizando. Mesmo com suspiros de defesa mínimas de alguns governos, as instituições precisam, no século XXI, em um “Estado de Direito” como gostam de afirmar, apresentar soluções nas quais saúde e vida sejam defendidas de forma assertiva e inquestionáveis.

    Pequenos passos, como designar prazos indeterminados para as receitas de medicamentos, ainda que importantes, se desmantelam na impossibilidade das pessoas adquirirem os medicamentos por falta de recursos. Aprovações de rendas básicas de 600 reais por pessoa, ainda que seja um suspiro de alento frente a essa situação, não chega próximo da seguridade necessária que as pessoas precisam nesse momento de exceção. Um momento verdadeiro de exceção no qual vivemos, precisa de ações também verdadeiras que o momento demanda e tais ações não podem diminuir direitos, diminuir salários, acabar com contratos, ao contrário, precisa taxar os grandes lucros. Isso sim é uma medida real de exceção no capitalismo, que pode demonstrar a importância da vida.

    O enfrentamento sério que poderia se construir, apontando para a destruição do capitalismo, está na organização de um Estado que garanta uma renda mínima para todos os cidadãos quebrando a estrutura que sempre garante ganhos aos donos dos meios de produção e socializando a riqueza produzida por todos e todas na sociedade.

    É uma ilusão considerar que exista algum membro da classe dominante com maior ou menor equilíbrio em momentos como esse. Essa visão mantem a estrutura que sempre garante ganhos aos donos e leva o enfraquecimento dos setores populares para o enfrentamento necessário hoje e para o amanhã.

    Os setores democráticos e populares precisam se aproximar da maioria, de todas as pessoas que vivem da venda da força de trabalho para que sejam também, maioria política. E tal movimento exige formação, incentivo ao estudo e mobilizações de solidariedade que defendam a vida. Acumular forças, em tempos atuais, é muito difícil, não há dúvidas, mas somente em ações que ampliem a consciência e a solidariedade podemos avançar na defesa do hoje e de um amanhã com traços que possam defender a vida.

  • NEOLIBERAIS EM PÂNICO?

    NEOLIBERAIS EM PÂNICO?

    NEOLIBERAIS EM PÂNICO?

    Por Milton Temer

    Tudo indica, a valer o que nos diz na coluna de hoje uma das principais porta-vozes do conjunto de contra-reformas anti-sociais aprovadas na sequência da PEC da morte: “Ao fim desta pandemia, pouca coisa vai sobrar da agenda com a qual o ministro Paulo Guedes chegou ao governo. As reformas foram engavetadas, o plano Mansueto foi deixado de lado por outro que socorre os estados na emergência, a empresa que está para ser privatizada ajudou a fazer o caminho para o pagamento do auxílio emergencial, a proposta de zerar o déficit público se transformará no maior déficit da nossa história”.

    O QUE SERIA DITO por alguém de esquerda – embora alguns nem cheguem a tanto – é da lavra de Miriam Leitão. Nada mais nada menos, E que me poupa do esfoço sempre imenso que me obrigo a fazer para contestar as bazófias de Paulo Guedes, em seus convescotes com oo embevecidos maganos do grande capital, quando vamos a outro parágrafo: “(…) A VERSÃO DO GOVERNO, dita em várias entrevistas, que o país estava decolando quando foi abatido pela crise. Não é verdade. O primeiro trimestre já não vinha dando bons sinais de recuperação da economia. O comércio caiu 1,4% em janeiro e subiu menos em fevereiro, 1,2%. O setor de serviços vinha de duas quedas no final do ano passado, subiu apenas 0,4% em janeiro e voltou a cair 1% em fevereiro. Na indústria, as duas altas dos meses de janeiro e fevereiro não recuperaram as perdas de novembro e dezembro”.

    CONHECEU, PAPUDO? para usar expressão brasileira da primeira metade do século passado, é o mínimo que posso dizer aos que, no campo da esquerda, se oferecem como assessores da gestão empanicada do governo no combate “a crise pandêmcca atual. Não é esse o paoel dessas liderançcas.

    MELHOR FARIAM se atentassem para algo publicado no Al Jazeera, e que se encaixa como desdobramento palpável ao ato de confissão de \Miriam Leitão.

    “A CORONAVIRUS SINALIZA O FIM DO CAPITALISMO? é o título do ensaio que recupera fato histórico do século XIV, a peste bubônica iniciada na Ásia, estendida depois ‘a Europa, que teria marcado o início do fim do feudalismo, em função dos abalos que veio a causar nas instituições feudais, então absolutamente hegemônicas. O título e um parágrafo bem expressivo seguem como ilustração desta postagem.

  • É HOJE, MAIS QUE SEMPRE OU NUNCA, O TEMPO DA UNIDADE E DA TRANSFORMAÇÃO

    É HOJE, MAIS QUE SEMPRE OU NUNCA, O TEMPO DA UNIDADE E DA TRANSFORMAÇÃO

    É HOJE, MAIS QUE
    SEMPRE OU NUNCA,
    O TEMPO DA
    UNIDADE E DA
    TRANSFORMAÇÃO

    Por Francisvaldo Mendes, presidente da FLCMF

    É tempo de unidade de todas as pessoas que vivem da venda da força de trabalho. É justamente esse movimento, o da unidade, que pode mudar o amanhã. As pessoas que já acumularam níveis de consciência para fazer da cidade, do país e do mundo ambientes para viver melhor, já identificaram a importância da unidade do maior grupo social que existe no planeta. A multidão que vende sua força de trabalho para viver para um grupo de poucas pessoas que compra e lucra com a exploração da venda dessa força de trabalho; e para além disso submete todos e todas à ideologia recheada com as piores mentiras para manter a dominação das pessoas e o culto a ignorância, faz desse grupo minoritário uma maioria na política. Assim move-se o capitalismo.

    O que vivemos no Brasil de hoje, experiência que quase a totalidade das pessoas do mundo estão se lamentando e atormentando, contra o inimigo comum, um vírus, o COVID-19, que coloca a saúde e a própria vida de todas as pessoas em risco. Mas não coloca da mesma forma, nem com o mesmo peso, muito menos com os mesmos riscos. O mundo sofre pela grande mancha branca das desigualdades. Os maiores pesos, os grandes riscos da perda da saúde e da perda da vida, pressionam, como poucas vezes na história, a cabeça e os sentimentos das pessoas que vivem da venda da força de trabalho, ou seja, trabalhadoras e trabalhadores. E nesse processo há escala diferentes, certamente, mas todas essas pessoas podem perder suas vidas nessa evidente situação de exceção.

    Quaisquer análises do momento atual, desse tempo do medo para quem vive ainda, exige identificar as desigualdades em todos os seus aspectos. Não é verdade que quem possua maiores recursos, passe pela pandemia que nos toma o dia a dia, do mesmo jeito que as pessoas que buscam todos os dias recursos para se alimentar, para viver, para se sustentar. O risco universal de perdas de vida e saúde não é igual, ao contrário, é desigual também na pandemia e impõem, para todos nós trabalhadoras e trabalhadores, desafios e fardos do tempo histórico poucas vezes vivido.

    Nas diferentes escalas dos acessos aos recursos há as pessoas iguais, as diferentes, as desiguais e as antagônicas. Grupos distintos que exigem tratamentos distintos do Estado para que a vida, de fato, seja garantida. Mas essa compreensão demanda, principalmente, a maior unidade de todos os tempos dos iguais e diferentes, de todas as escalas de quem vende a força de trabalho para manter a vida, esteja onde estiver na cidade.

    A disputa política do momento nos exige o desafio de mostrar e conquistar que as grandes riquezas e o avultantes lucros sejam taxados para investir no combate do vírus. Por outro lado, também nos é exigido, neste tempo, a superação das ideologias do individualismo e do consumo que sempre nos foram impostas.

    Estamos no Brasil, país no qual o Estado organiza a vida a favor dos que vivem do lucro de forma ampliada, com um capitalismo tardio esmagador e com nutrições constantes da ignorância, haja vista o comportamento do atual Presidente da República, que privilegia a desinformação e menospreza a ciência. Nosso desafio aumenta e nossa unidade é mais que urgente e necessária para demonstrarmos as contradições e antagonismos do sistema para, coletivamente, superá-lo.

    A disputa em pauta nos exige romper com todas as propagandas mentirosas que o sistema capitalista produz, tais como a taxação de salários, sejam de trabalhadores pagos pelo Estado ou pela iniciativa privada, a tributação regressiva que existe, e a garantia de livre aplicação na Bolsa de valores. Na contra mão do que afirmam o presidente e chefes do executivo federal, essa logica que o Brasil sempre viveu fragiliza a vida de milhões de pessoas, como os já ainda mais fragilizados que vivem nas periferias, favelas e nas ruas dessa imensa geográfica física que desenha o Brasil.

    Superar todas as ideologias de consumo, de correr aos montes em farmácias, mercados e shoppings, do desejo obtuso de ter a melhor TV, carros novos e a melhor roupa, as várias mercadorias que não trazem a felicidade, só nos coloca como alimentadores do lucro. Faz-se necessário superar o individualismo mentiroso que, em tempos de confinamento necessário, amplia o isolamento humano e esmaga a vida. É tempo que a solidariedade clama com força aos nossos corpos e sentidos. Para isso a unidade de todas as pessoas que vivem da venda da força de trabalho é um movimento fundamental e estratégico para a ação política democrática e revolucionária, principalmente no tempo atual.

    Que seja visto como exceção, que seja tralhado como momentâneo, que seja para o tempo em que a vida precisa, de fato ser garantida para todas as pessoas: é hora de taxar as grandes fortunas e os aviltantes lucros para que saiamos vivos desse processo. O Estado, organizado pelos sujeitos que se ajoelham ao lucro e ao capital, não fará isso espontaneamente, muito pelo contrário. E essa é a hora de assumir a organização, a unidade, o companheirismo e a solidariedade, como um grande ato de mãos dadas para que nosso direito, de fato, se amplie naquilo que foi sempre roubado do suo do trabalhador para o bolso dos exploradores.

    Somos unidade. E o conhecimento será mais forte se coletivo e as ações mais assertivas nos encontros de identidades que garantirão a vida e a dignidade. Vamos apostar na unidade e superar, juntas e juntos, esse momento com a vida acima do lucro e de todas as ideologias que nos isolam e nos afastam. Nós somos os sujeitos principais para garantir e conquistar a vida em todos os aspectos e dimensões. Sabemos o caminho da solução, sempre investindo no conhecimento e no sistema educacional e do fazer assertivo, o Estado precisa assumir com sabedoria, conhecimento e ações que preservem a vida e a dignidade humana, com direitos para todas as pessoas, o combate dessa epidemia desastrosa. Esse é o desafio político do nosso tempo e, da nossa parte, vamos construir uma grande unidade que garanta essa direção de transformação deste sistema que não atende a humanidade e deste vírus que chegou e deixou o conteúdo mesquinho e opressor do sistema mais evidente.

  • Distribuir máscaras à população: ÓBVIO!

    Distribuir máscaras à população: ÓBVIO!

    Distribuir máscaras à população: ÓBVIO!

    Franklin Douglas (*)

    Com a confirmação dos cenários antevistos por infectologistas, biólogos e demais cientistas, de que a Covid-19 colocaria em colapso o sistema de saúde dos países, chega-se à alternativa que há muito se alertava: a necessária prevenção. E um instrumento que se comprovou eficaz para esse fim foi a máscara – sobretudo a de utilização caseira, recomendada pelas autoridades de saúde.

    Não à toa, após dar um giro de 180 graus, o presidente dos Estados Unidos partiu até mesmo para uma novíssima pirataria em seu combate ao coronavírus: interceptar máscaras que a China tem doado ou vendido a diversas nações.

    Foi o caso de carregamento de máscaras da China à Europa, comprado pelos Estados Unidos por valor até quatro vezes maior do que o negociado por chineses aos europeus. Assim como o envio de 23 aviões cargueiros americanos para transportar 200 milhões de máscaras e demais equipamentos que o Brasil tinha adquirido da China.

    Mas, na guerra das máscaras, não são apenas os norte-americanos no vale-tudo. A França também confiscou 4 milhões de máscaras destinadas à Espanha e à Itália. A República Checa interceptou 680 mil máscaras enviadas da China para a Itália. Berlim (Alemanha) deixou de receber 200 mil máscaras, confiscadas por Bangkok (Tailândia).

    O que isso tudo nos ensina? O óbvio: quem teme o coronavírus tem pressa!

    A estupidez ideológica do governo brasileiro nos fez perder a interlocução privilegiada com a China. No caso dessa guerra das máscaras, é preciso menos política ideológica e mais agilidade e coordenação entre os entes governamentais.

    Incentivar a produção em massa de máscaras caseiras é a solução mais viável!

    Governo do Estado e Prefeitura de São Luís devem fornecer o material inicial necessário e adquirir a produção de diversos grupos de costureiras, artesãos dos barracões das escolas de samba e sedes dos grupos de bumba-meu-boi. Estamos falando de algo em torno de 300 grupos de bumba-meu-boi, 10 escolhas de samba e 32 blocos tradicionais. Todos eles com seus ateliês que, sobrecarregados nos períodos momesco e junino, estão subutilizados neste momento. Afora os diversos grupos ligados à economia solidária.

    Quando fui secretário adjunto do Trabalho e Economia Solidária, no governo Jackson Lago (2007-2009), pude verificar e contribuir com o apoio a esses grupos de produção artesanal. Nosso pioneirismo na criação da SETRES, agregando a economia solidária (Ecosol) à estratégia de emprego, geração de trabalho e renda, deu visibilidade a esse setor. A Ecosol gera renda e potencializa o comércio solidário de produtos de excelente qualidade. Falta apoio.

    Incentivar esses grupos de produtores e artesãos, apoiando a produção dessas máscaras caseiras por parte deles, e, ao mesmo tempo, combatermos a proliferação da Covid-19. Toda a produção seria adquirida pelo Poder Público e distribuída gratuitamente à população. Eis a oportunidade de criarmos um círculo virtuoso: injetar recursos na economia local, dar trabalho a setores vulnerabilizados e potencializar o combate à Covid-19, incentivando uma prática profilática. No combate à Covid-19, basta que copiemos as boas iniciativas.

    “Não há mudança nem solidariedade espontâneas, algo tem que acontecer primeiro”, diria uma personagem do filme “O Poço” – em exibição na plataforma Netflix. Distribuir máscaras à população para prevenir o coronavírus é o “óbvio”, diria “o velho”, outra personagem desse mesmo filme.

    Só não defende isso quem, estando no andar de cima, acredita que nunca chegará ao fundo do poço: o leito de uma UTI. Porque se convenceu que o vírus não seria mais do que uma simples “gripezinha”… Não é, óbvio!

    Franklin Douglas – professor e doutor em Políticas Públicas.
    Artigo publicado no jornal O Imparcial (05.04.2020, p. 04),

    Disponível também aqui:
    https://ecosdaslutas.blogspot.com/2020/04/distribuir-mascaras-populacao-obvio.html

  • A VIDA PRECISA SER GARANTIDA

    A VIDA PRECISA SER GARANTIDA

    A VIDA PRECISA SER GARANTIDA

    Por Francisvaldo Mendes
    Presidente da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco

    O inimigo ainda desconhecido chamado de coronavirus-covide19, continua se destacando no cenário mundial. A desigualdade existente, principalmente em países com o lastro do populismo, como o Brasil, faz com que a epidemia atinja as pessoas de forma brutalmente distintas, pois as condições matérias são objetivamente diferentes para cada pessoa. O Estado precisa enfrentar essa situação e combater o vírus respondendo as desigualdades para que a vida seja universalmente assegurada.

    O lugar estratégico que o Brasil ocupa na América Latina gritou mais alto e economia fez valer sua estratégia. No pronunciamento do dia 31 de março o presidente fez um movimento totalmente distinto do que os anteriores, que o colocou em confronto com todo o Estado e com o próprio Ministro da Economia. Mesmo com pouca fidelidade as posições do diretor-geral da OMS, sustentou-se em suas posições para afirmar que salvar vidas é a grande prioridade. E, é necessário que se lembre, todas as vidas. Que assim seja, portanto, esse deve ser o papel e o compromisso do Estado, mas com ações verdadeiras e não apenas com bravatas, o que é peculiar deste governo Federal.

    Recuperar o Bolsa Família e falar de um auxílio de 600 reais, para as pessoas que chamou de vulneráveis, não é suficiente, precisa-se ir além. Certamente que ninguém pode ser demitido na pandemia, já que o emprego é tão importante quanto o enfrentamento do vírus. Todas as medidas em defesa da vida precisam ser tomadas pelo Estado, em todo o seu conjunto, tanto nos níveis federativos quanto nas diversas instancias de governo: judiciário, parlamento e executivo. O Estado precisa garantir a universalidade do direito à vida e para isso deve tratar com as diferenças necessárias as desigualdades existentes no país e no sistema capitalista. Assim não poderá haver diminuição de nenhum salário, sejam os pagos pelo Estado, sejam os pagos pela iniciativa privada.

    As medidas emergenciais são bem maiores do que o congelamento por dois meses dos preços de medicamentos e de recursos parcos para a manutenção da vida, ainda mais na situação atual. Os medicamentos não podem aumentar preços de venda enquanto houver pandemia, assim como os alimentos e todos os produtos necessários para limpeza e higiene das pessoas. Para que a vida se aproxime da dignidade, para além de continuar com o confinamento e isolamento e apostar no fortalecimento do SUS, como disse o presidente em seu pronunciamento, deve-se ter ações que qualifiquem realmente que toda a vida é importante.

    Assim, não há dúvidas, que junto a tais medidas acima o fortalecimento da saúde, para além do combate das doenças, de transportes no qual as pessoas não se amontoem, da educação e de moradias, são medidas fundamentais. E nesse sentido é mais do que urgente que todos os espaços físicos tenham água, principalmente nas periferias, com destaque nas favelas, onde falta esse item básico de enfrentamento da doença. A garantia de água para todas as pessoas, em todos os seus locais, é uma medida estratégica e urgente. Assim como o Estado deve, imediatamente, ter um procedimento de acolhimento para todas as pessoas que não contam com residências e vivem nas ruas. Nenhuma pessoa na rua, com a coerência que o confinamento exige, demanda do Estado, imediatamente, uma postura assertiva e combativa, a favor de quem se encontra abandonado a má sorte.

    O vírus adoece e mata, mas não é natural e não pode ser tratado com naturalidade, demanda-se então, ao menos nesse momento de exceção, medidas que o combata com firmeza para que as pessoas tenham vida e saúde. E, como disse o próprio presidente em seu pronunciamento, todas as pessoas, ou seja, todas as pessoas mesmo!

    Para que, de fato, sejam todas as pessoas abraçadas pelo cuidado e por um pouco de cultura de seguridade, que pouco existiu no Brasil, precisa-se medidas diferenciadas. Enquanto os salários e empregos precisam ser garantidos e assegurados, a taxação dos super ricos é uma medida necessária para que mais recursos se tenha no combate do vírus. As chamadas pessoas mais vulneráveis não podem, nessas condições, pagar luz, agua, gás, além de ficarem solitários as faltas de elementos e produtos básicos para higiene e cuidados pessoais. Assim reafirmamos: imediata anistia das contas dos tributos cobrados pelo próprio Estado nesse momento se faz fundamental.

    Vários locais da periferia, principalmente nas favelas, já demonstram suas potências e apostam e organização e solidariedade. Haja vista, que a solidariedade popular é a maior arma contra os desmandos que o Estado faz com os pobres desse País. É hora de apostar e apoiar todas essas iniciativas e fazer da solidariedade entre as pessoas, principalmente de todas que vivem da venda de sua força de trabalho, um alimento fundamental para manter e qualificar a vida. Nossa unidade é mais que necessária, para fazer das ações nos dias de hoje alimentos para transformar a vida, para mais dignidade e qualidade, em todos os tempos. Colocar a vida acima dos lucros é uma ação fundamental e, ao menos neste momento, o Estado precisa tratar os diferentes como diferentes e os desiguais como desiguais, para que, de fato, toda a vida seja garantida. Nossa organização, formação e ação conjunta é potência para manutenção da vida em escala universal, para além dos discursos de momentos e contra os oportunistas de plantão. Precisa-se construir garantias de continuidade de uma nação soberana e viva.

  • DEFENDER UNIVERSALMENTE A VIDA

    DEFENDER UNIVERSALMENTE A VIDA

    DEFENDER UNIVERSALMENTE A VIDA

    por Francisvaldo Mendes, presidente da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco

    O mundo, agora, se volta para a pandemia causada por um inimigo desconhecido: o coronavirus, covid-19. O cenário mundial é o de disputa imperialista, no qual o bloco ocidental entra em declínio com suas potências dominantes em decadência diante das novas potências no oriente. No desenvolvimento desigual do capitalismo no mundo, a correlação de forças muda no decorrer do desenvolvimento de novas potências e, com isso, a disputa pela partilha territorial no mundo ganha novos contornos.

    O Brasil ocupa, neste cenário, um lugar estratégico na américa Latina e, consequentemente, nesta disputa, tanto como fonte de produção de riqueza quanto de energia, esta última essencial para o desenvolvimento das forças produtivas capitalistas, sem a qual um país não desenvolve os meios de produção à altura da concorrência mundial e, também, regionais. A recente estratégia estadunidense salta aos olhos desde o impeachment de Dilma: retirar a resistência do Brasil e da América Latina ao império em decadência. Com isso, uma guerra híbrida se iniciava, com o apoio de estratégias midiáticas, terroristas, com uma ideologia conservadora que deu a unidade de uma base para o projeto de desestruturar os esforços do Brasil em manter um bloco fortalecido na América Latina de modo a garantir-lhe uma posição singular e mais forte no cenário mundial.

    Neste sentido, a pandemia nos revela as duas faces da conjuntura no Brasil: em primeiro lugar, a impossibilidade do neoliberalismo garantir os direitos socias básicos da população brasileira, demonstrando que são os mais vulneráveis a sofrer o impacto da pandemia. Trabalhadoras e trabalhadoras mais precarizados e pauperizados na divisão social do trabalho, negras e negros da periferia, são os que mais sofrerão e morrerão. Em segundo lugar, a estratégia estadunidense de garantir-lhe a manutenção de seu projeto, o que incide sobre o Brasil no pronunciamento do presidente da república em reforçar que a economia não pode parar e que devemos voltar à normalidade. Esta medida demonstra, também, o verdadeiro propósito da política adotada e a concepção que a subjaz: a vida da periferia não importa e que morram mais pobres e pretos, para salvar a tática econômica em curso.
    Esta pandemia nos revela o fracasso do neoliberalismo como projeto societário, de estado mínimo e de mercantilização de todas as relações, incluindo os direitos sociais. A pandemia também nos revela o mais importante: que as milhares de pessoas que morreram e que ainda morrerão, no mundo e no Brasil, não morreram por causa do covid-19, mas pela ausência e falência de garantia de seus direitos sociais básicos, sobretudo o direito à saúde. Não é o vírus que mata. É a falta de atendimento, recursos, planejamento, hospitais, sistema de saúde, realidade esta que não nos é nova tampouco surpreendente, pelo modelo de desenvolvimento do capitalismo adotado.

    O vírus chegou para nos dizer o que precisa ser mudado, que esta lógica precisa ser transformada para que os direitos sociais das trabalhadoras e trabalhadores do país sejam garantidos. Para isso, é fundamental transformar esta lógica e somar forças para um projeto de sociedade em que os lucros não estejam acima da vida e que todas as vidas importam.

    O isolamento e o distanciamento permanecem sendo as principais medidas adotadas, como recursos para baixar a curva epidêmica, para evitar o pior colapso do sistema de saúde, para que a tragédia seja mais branda e para que menos pessoas sejam contaminadas. Pela vida dos mais vulneráveis. Pela vida dos trabalhadores. Por todas e todos nós.

    Há medidas emergenciais a serem assumidas pelo Estado. Entre as medidas estão em destaque as principais são: SUS fortalecido, bem como investimento em todas as áreas de políticas públicas, educação, saúde, transporte, lazer, moradia; Taxação dos super ricos; Anistia de contas de água, luz e gás, com garantia de água, luz e produtos de higiene para todas as pessoas; Benefício emergencial para o setor informal; Licença remunerada para a medida de isolamento e plano para garantir o emprego formal; Revogar o teto dos gastos, suspender os despejos, plano de emergência para os moradores de rua, com acolhimento e condições de manutenção da vida. Há também medidas emergenciais para garantir o mínimo necessário de humanidade, dignidade e sanidade, que é imediatamente tirar o atual presidente e assumir um sopro de solidariedade para garantir que a doença e a morte, que espreitam as pessoas na esquina, não tenham êxito. A vida assim pode seguir colocando a política no seu lugar da disputa de projetos.

  • O governo Bolsonaro: um balanço da destruição do Estado Brasileiro

    O governo Bolsonaro: um balanço da destruição do Estado Brasileiro

    O governo Bolsonaro: um balanço da destruição do Estado Brasileiro

    por Fundação Claudio Campos, Fundação Dinarco Reis, Fundação João Mangabeira, Fundação Lauro Campos e Marielle Franco, Fundação Leonel Brizola-Alberto Pasqualini, Fundação Maurício Grabois, Fundação da Ordem Social e Fundação Perseu Abramo

    Da posse em janeiro de 2019 até este mês, o ex-capitão Jair Bolsonaro atuou cotidianamente em várias frentes para desmontar as instituições e retirar os direitos da maioria da população brasileira. No acompanhamento mensal das ações governamentais, pelo Observatório da Democracia, as fundações pontuaram e analisaram as engrenagens políticas deste projeto de destruição do país, com apoio de setores ultraconservadores como os ligados às igrejas neopentecostais e aos interesses internacionais da extrema-direita.

    Passados um ano e três meses, os resultados deletérios na vida cotidiana e na vida institucional do país estão sendo sentidos, ainda que o governo Bolsonaro conte com uma relativa boa vontade de grupos econômicos e políticos que, em troca de limitar cada vez mais a democracia, garantem lucros e poderes. Bolsonaro conduz o país promovendo a perseguição contra seus opositores, tentado impedir que opiniões e ideias divergentes sejam expressas na esfera pública. Seu governo tem um traço autoritário grave, que violenta profundamente o Estado Democrático de Direito.

    Congresso e Bolsonaro: relações truncadas

    Transcorridos este um ano e três meses, a atuação do governo em seu relacionamento com o Poder Legislativo, assim como em outras áreas, é desastrosa. As incontáveis falhas de diálogo, a forma intransigente com a qual tratou de agendas importantes ao país, e o desrespeito público às instituições brasileiras foram, para citar alguns, elementos cruciais que justificam essa qualificação.

    Cabe destacar a saída de Bolsonaro e de seus filhos do PSL, partido que o elegeu presidente e ampliou a presença da legenda no Congresso, como a maior bancada na Câmara. Esse movimento, marcado por trocas de acusações internas entre parlamentares da tropa de choque bolsonarista e disputa pelos fundos públicos partidário e eleitoral, resultou na tentativa de criar uma nova legenda: a Aliança pelo Brasil, que ainda não está consolidada para as eleições municipais deste ano.

    A CPMI das Fake News expôs o notório racha na base do presidente Jair Bolsonaro, colocando, inclusive, correligionários em lados completamente opostos no espectro político do Congresso Nacional. Os duros embates protagonizados entre Alexandre Frota x Eduardo Bolsonaro, Joice Hasselmann x Filipe Barros/Carla Zambelli durante reuniões da CPMI, expuseram a fragilidade estrutural à qual é sustentada a base política do presidente Bolsonaro no Congresso Nacional.

    O principal entrave do Planalto neste primeiro ano de governo foram justamente as crises auto produzidas, muito embora um ano possa ser considerado pouco quando se pensa em projeto de governo ou de poder, é tempo satisfatoriamente suficiente para se aprender com os erros e iniciar um projeto de governança, deixando para trás as trapalhadas ações com o Legislativo, os embates internos que fragilizaram e minaram sua força política, e o desrespeito às instituições democráticas e às forças opositoras que compõem nossas liberdades democráticas.

    Privatizações, precarização do trabalho e exclusão social

    No primeiro ano de Bolsonaro, a gestão da política econômica foi desenhada para instalar os princípios do neoliberalismo mais radical. O Ministério da Economia, capitaneado por Paulo Guedes, foi estruturado para priorizar as privatizações de estatais e das instituições do Estado brasileiro. O Programa de Parcerias e Investimentos – nome dado ao plano de privatizações do governo — inclui mais de 50 empresas, subsidiárias e ativos públicos para serem vendidos ao setor privado. São um elenco de empresas de atividades econômicas distintas, algumas de caráter estratégico, de ponta na área de tecnologia e outras que atuam em áreas sensíveis para a democracia e inclusão social, que Jair Bolsonaro quer privatizar e que pode trazer graves prejuízos econômicos e para a soberania do país.

    Levantamento realizado pelo jornal Folha de S. Paulo revelou que nos dez primeiros meses de governo a equipe de Paulo Guedes já vendeu R$ 91,3 bilhões em ativos das empresas estatais sob o comando da União. A maior parte desse valor (R$ 70,9 bilhões) corresponde a vendas realizadas pela Petrobras, que desfez de operações importantes para o funcionamento integrado da empresa, mas que, no seu afã privatista, o governo decidiu entregar a empresas privadas.

    Um amplo projeto de privatização foi iniciado com a venda de ativos da Petrobras (TAG e BR distribuidora), leilões de campos do pré-sal e concessões de aeroportos. Foi anunciada a intenção de venda da Eletrobras, Correios, Casa da Moeda, Dataprev, Serpro. Os bancos públicos estão na mira da agenda de Guedes e sua equipe. Entre as medidas anunciadas e algumas já efetivadas estão a venda de ativos da Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e outras instituições financeiras públicas. Apesar de estar em consonância com a agenda de redução do Estado, a privatização e “enxugamento” dos bancos públicos não se encaixa no discurso de redução de gastos e nem mesmo de ineficiência, uma vez que estas instituições financeiras são lucrativas, eficientes e cumprem função central para a execução de políticas públicas.

    A privatização do sistema de água e esgoto, aprovado pelo Congresso no final de 2019, é um retrocesso sem precedentes na área de controle dos recursos hídricos, passando a água a ser tratada como uma mercadoria qualquer e não como um direito básico de todo o povo. A Eletrobras é a maior empresa do setor elétrico da América Latina e é líder em geração e transmissão de energia elétrica no Brasil. A capacidade geradora da Eletrobras equivale a cerca de um terço do total da capacidade instalada do país. Tem 14.532 funcionários. Em 2018, lucrou R$ 13,3 bilhões. O acesso à energia elétrica é um direito fundamental da população brasileira, serviço essencial de interesse coletivo e que não pode ter sua geração e transmissão nas mãos do setor privado. As resistências políticas e os entraves legais para o governo vender a Eletrobras impediram o governo de executar seu plano neste ano. Enquanto em todo mundo acontecem processos de reestatizações de serviços públicos na área de saneamento e energia, demonstrando que as experiências internacionais com privatizações dos serviços de água e esgoto são bastante negativas, o Brasil caminha na direção contrária.

    Outras empresas que estão na mira do projeto privatizante de Guedes são: Telebras, Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre (Trensurb), Centrais de Abastecimento de Minas Gerais (Ceasaminas), Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), Porto de São Sebastião, Porto de Santos, Companhia Docas de São Paulo (Codesp), Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores (ABGF) e Empresa Gestora de Ativos (Emgea) e Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada.

    O Ministério do Trabalho e o da Previdência foram extintos, suas atribuições foram colocadas sob o guarda-chuva do superministério. A tentativa de desmonte da liberdade de organização dos trabalhadores se intensificou com a promulgação da MP 873, tema do relatório de março. A medida proibiu arbitrariamente o pagamento de mensalidade associativa por folha salarial, alterando dispositivos da CLT e da Lei No. 8.112/90.

    A reforma da Previdência, levada em abril pelo governo para o Congresso e aprovada, reduziu valores de pensões e aposentadorias de trabalhadores/as na iniciativa privada e dos servidores/as da União. As regras de transição foram mais duras, houve aumento das faixas de contribuição dos/as trabalhadores/as e a idade mínima para aposentadoria foi elevada tanto para mulheres (62 anos) como para os homens (65 anos). No entanto, o regime de capitalização que substituiria o regime de repartição e que se tratava da grande aposta do ministro da Economia Paulo Guedes para “recuperar os investimentos” foi barrada na CCJ da Câmara.

    A meta de fazer caixa para a União com as vendas e a reforma da previdência e assim estimular o investimento privado no Brasil, no entanto, não alavancou a economia neste primeiro ano de governo. As taxas de desemprego continuam elevadas (superiores a 11%), ainda que haja algum aumento do emprego informal ou de assalariados no regime intermitente (sem garantia de jornada nem de renda). Ao longo de 2019, as sucessivas revisões para baixo da taxa de crescimento do PIB indicam que pelo terceiro ano consecutivo a economia permanece em ritmo de semi estagnação, com a taxa anual rastejando em torno de 1%.

    Seguindo a receita neoliberal, a equipe de Guedes propôs via Medidas Provisórias, como a da Liberdade Econômica, um pacote de desregulação das normas para estimular a abertura de empresas, a desoneração de folha de pagamento e outros tributos. Trata-se de uma MP com forte carga ideológica – “proteção à livre iniciativa e ao livre exercício da atividade econômica”. Paralelamente, através de contingenciamento em várias áreas (educação, saúde, ciência e tecnologia, infraestrutura) desestruturou os investimentos em políticas públicas, desmontando programas como Mais Médicos, Minha Casa, Minha Vida, o que agravou a desigualdade entre ricos e pobres no país. Em maio, estudantes, trabalhadores e entidades ligadas à educação realizaram enormes manifestações em todo o Brasil em protesto contra o corte de verbas destinadas ao ensino público. O corte afetou milhares de trabalhadores que atuam na área da educação – infraestrutura, limpeza, segurança, administração, além dos professores.

    Como medida de estímulo da economia interna, Guedes retomou a liberação do FGTS para as/os trabalhadoras/es, iniciativa adotada anteriormente no governo Temer. Em novembro, Bolsonaro encaminhou a MP 905, chamada de Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, para o Congresso para estimular a contratação de jovens de 18 a 29 anos pelas empresas, tendo como contrapartida uma série de desonerações e redução de direitos como recolhimento de FGTS, INSS, dentre outros. A MP foi questionada pelos partidos progressistas no STF por alterar e retirar direitos trabalhistas consolidados na Constituição. Uma análise dos efeitos da MP 905 permite vislumbrar um cenário em que uma parcela da população brasileira terá um conjunto de direitos assegurados pela CLT e outro conjunto que irá aderir à Carteira de Trabalho Verde e Amarelo, constituído por jovens, com os direitos reduzidos pela recente MP.

    Desmatamento, queimadas e ameaças à soberania

    Dois aspectos chamam de imediato a atenção sobre as mudanças efetuadas na política externa do Brasil por Bolsonaro neste primeiro ano de mandato. A primeira e mais relevante foi o rompimento com toda a tradição efetivada ao longo dos governos pós-ditadura militar como o respeito à soberania dos povos, a não ingerência, defesa da paz, a universalidade nas relações exteriores, a integração continental, o não alinhamento, entre outros princípios. Todos eles inscritos direta ou indiretamente na Constituição de 1988. O segundo aspecto foi escolher como ministro das Relações Exteriores um inexperiente profissional de carreira, Ernesto Araújo, que não era sequer embaixador de primeira classe e tampouco chegou a chefiar qualquer embaixada. Ele se insere no grupo de ministros que conduzem a luta ideológica mais obscurantista e conservadora nos costumes.

    O fato é que esse novo ministro teceu uma série de teorias sobre o combate ao “marxismo cultural”, decadência da civilização ocidental e ausência de Deus na formulação da política externa. Os desdobramentos destas posições foram o alinhamento incondicional e automático com o governo Trump dos Estados Unidos, Netanyahu de Israel e em menor grau com os governantes da Polônia e Hungria. Na prática estes alinhamentos têm causado desgastes para o Brasil, não apenas do ponto de vista político, mas também econômico, pois a adesão às políticas destes governos tem sido sem reciprocidade e contrapartidas. Por exemplo, o apoio tímido dos EUA à filiação do Brasil à OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que não é vantajosa para nós, em troca de abandonarmos o status de país em desenvolvimento na OMC, que era um benefício comercial importante que tínhamos.

    Da mesma forma a intenção de mudar a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém em apoio à política israelense de colonização da Palestina e o posicionamento contrário às decisões da ONU sobre a ocupação ilegal dos territórios árabes e da Palestina, criaram atritos com vários países árabes que são os principais importadores de carne do Brasil, assim como o apoio às sanções estadunidenses contra o Irã que também poderá prejudicar um importante comércio bilateral. Bolsonaro ainda tentou fazer um agrado aos governos árabes do Oriente Médio visitando a Arábia Saudita, cujo governante é acusado de mandar matar e esquartejar um jornalista, os Emirados Árabes e o Catar. Os três governos mais conservadores da região.

    Na América do Sul, o governo brasileiro hostiliza a Venezuela, sai da Unasul e une-se aos governos mais à direita no continente como os da Colômbia, o atual da Bolívia, do Chile e do Paraguai. Opinou sobre candidatos preferenciais na Argentina e Uruguai, o que não convém, pois no primeiro caso “perdeu o voto” e consequentemente arranjou atrito com o vencedor, Alberto Fernández, parceiro fundamental no Mercosul. O vencedor do pleito uruguaio, Lacalle Pou, de direita, dispensou esse apoio, pois somente prejudicaria sua campanha.

    Por fim, nas reuniões internacionais que discutem temas como trabalho (OIT), direitos humanos (Conselho da ONU) e meio ambiente (COP) as posições brasileiras têm se somado aos dos países com déficit de democracia e reacionários quanto a possíveis avanços nestes temas.

    Em setembro, as queimadas na Amazônia alarmaram o mundo. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), as queimadas no Brasil aumentaram 82% em relação ao ano de 2018. Se compararmos esse mesmo período (de janeiro a agosto), foram registrados 71.497 focos de queimadas neste ano, contra 39.194 no ano passado. Bolsonaro desqualificou os dados apresentados pela equipe do Inpe, demitiu seu diretor e reestruturou o Instituto em retaliação. Com a desestruturação promovida no início de seu governo nos órgãos de fiscalização e acompanhamento do desmatamento, os números da devastação ambiental explodiram neste primeiro ano de governo.

    Outra frente atacada foi a defesa das reservas indígenas e quilombolas. O governo desmontou a estrutura de proteção aos povos indígenas existentes nos ministérios da Saúde e Educação, colocou à frente da Funai dirigentes identificados com a visão de destruição e exploração das terras e do modo de vida destes povos, e o presidente fez inúmeras críticas públicas no Brasil e no exterior, preconceituosas contra a preservação das reservas.

    O tema da Operação Lava Jato reapareceu com força nos noticiários por conta dos áudios divulgados pelo jornal The Intercept Brasil. Quando se observa as consequências da Operação Lava Jato para o mundo do trabalho, o que se nota é que ela tem promovido o desmonte de importantes setores da economia nacional, principalmente da indústria petrolífera e da sua cadeia de fornecedores, como a construção civil, a indústria naval, além do programa nuclear brasileiro.

    Ciência, Tecnologia e Inovação: 60 anos destruídos em um

    Passaram-se 37 anos entre a descoberta da Relatividade e sua utilização para produção de energia nuclear (1905-1942). Para encaminhar a destruição do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI), construído ao longo dos últimos 60 anos, o atual governo brasileiro levou apenas um ano.

    Na década de 1950, o Brasil entrou na era do conhecimento, com a criação, em 1951, do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq), voltado à concessão de bolsas para formação de pesquisadores no país e no exterior e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), para formação de pessoal especializado através da oferta de cursos de pós-graduação. Aliados à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), também provedora de bolsas de pesquisa, a partir de 1961, e apoio financeiro inicial do Fundo Nacional de Desenvolvimento Técnico-Científico (Funtec), através do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE), substituído pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) em 1967, agência operadora do novo Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) instituído em 1969, o Brasil passa a ter um SNCTI e a ver a formação de seus primeiros mestres e doutores.

    Com o advento dos Fundos Setoriais a partir de 1998, sendo o primeiro o Fundo do Petróleo (CT-Petro), a Finep passou a fazer a articulação institucional entre CT&I, transversalmente, com outras áreas de governo, atuando como secretaria- executiva dos 16 fundos instituídos. Em 2010, os fundos foram executados em sua totalidade, fato que permitiu ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) passar de um orçamento de R$ 3 bilhões em 2002, para mais de R$ 8,5 bilhões em 2010. O FNDCT expandiu de R$ 500 milhões em 2002 para R$ 3 bilhões em 2010. O orçamento da Capes cresceu oito vezes, de R$ 500 milhões em 2002 para R$ 4 bilhões em 2010.

    Afora a estapafúrdia ideia de extinguir o FNDCT em 1989, o que geraria uma mísera economia de Cz$ 30 milhões, e de transferir a Finep para o Ministério da Indústria e Comércio e o CNPq e seus centros de pesquisa para outro órgão, o SNCTI desenvolveu-se consideravelmente e de forma estável nestes últimos 60 anos.

    Nesta conta entram o ganho de produtividade da agricultura brasileira, diretamente relacionado ao investimento em pesquisa realizado pela Embrapa e universidades, a exemplo do desenvolvimento da fixação do nitrogênio por meio de bactérias, estudo que permitiu eliminar adubos nitrogenados e aumentar fortemente a produtividade da cultura da soja, gerando recursos anuais da ordem de R$ 15 bilhões. Parcerias entre Petrobras e universidades com recursos do FNDCT (CT-Petro), Fundo Verde-Amarelo (transversal) e outros recursos públicos, possibilitaram a exploração do petróleo em águas profundas (7 Km), o que desencadeou a exploração do pré-sal, fonte responsável por 54% da produção de óleo brasileiro, gerando R$ 60 bilhões a cada ano para o país.

    Igualmente, nestes 60 anos de investimentos em CT&I e Educação, chegou o país à produção de energia por fontes renováveis, à medicina de alta tecnologia, ao lançamento de startups, ao desenvolvimento de uma base industrial diversa e ao aparecimento de empresas unicórnio. Empresas brasileiras transnacionais, como E mbraer (carteira de R$ 60 bilhões), inobstante desnacionalizada, Embraco e WEG foram alavancadas através de parcerias e investimentos cruzados com universidades para formação de pessoal e geração de pesquisa inovadora. Na epidemia causada pelo zika vírus, pesquisadores brasileiros descobriram em apenas quatro meses a vinculação entre o mosquito e a infecção provocadora da microcefalia, conforme estudos publicados pelos periódicos Science e Nature. Entre 2011 e 2016, o Brasil publicou mais de 250 mil artigos na base de dados Web of Science, o que colocou o país na 13A. posição na produção científica global. As áreas de maior impacto foram agricultura, matemática, medicina e saúde, física, ciência espacial, psiquiatria e odontologia.

    Entretanto, no caso do Brasil, nada é tão escancaradamente antinacional que não possa ser repetido. Vale, neste país, a profecia do filósofo irlandês Edmund Burke: “um povo que não conhece sua história está condenado a repeti-la”. Vamos repeti-la, pois. Em apenas um ano do atual governo, excluíram 15 mil bolsas do sistema CNPq e Capes, e 84 mil bolsistas do CNPq penaram para receber o financiamento para suas pesquisas. Volta e meia, retoma-se a proposta de transferência da Finep para o BNDES, assim como a fusão do CNPq com a Capes. O FNDCT viu 80% seus recursos esterilizados, inseridos na reserva de contingência.

    Netas condições, segundo o Índice Global de Inovação, publicado anualmente desde 2007 pelo Instituto Europeu de Administração de Empresas (INSEAD) e pela Organização Mundial de Propriedade Industrial (WIPO) o Brasil, que ocupava em 2011 a 47a posição mundial, em uma lista de 127 países, caiu em 2019 para 66a. posição, entre 126 economias.

    A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 187, de 2019, propõe (como em 1989), a extinção do FNDCT, tirando-lhe R$ 4,2 bilhões. Somado a outros 240 fundos não constitucionais, objeto da emenda, “custam”, anualmente, R$ 60 bilhões.

    Desses, 50% vem do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), R$ 31,9 bilhões. Somado à extinção do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES), R$ 13,6 bilhões, destinado a financiar estudantes pobres em cursos de graduação presencial oferecidos por instituições de ensino superior não gratuitas, a PEC causa um estrago irreversível ao SNCTI do país e produz um futuro fracassado, tudo isso em apenas um ano.

    Violações aos direitos humanos fundamentais

    Neste primeiro ano de gestão, Bolsonaro demonstrou o desprezo do seu governo pelos direitos fundamentais previstos na Constituição de 1988, seu desapego à democracia e a falta de respeito com a qual se dirige a amplos setores sociais.

    O país, a partir de janeiro de 2019, presencia a institucionalização das violações à liberdades civis e direitos fundamentais. As iniciativas do governo (projetos de lei, medidas provisórias, decretos) somadas às declarações e atitudes que partem da presidência e de seus ministros, criam um grave ambiente de estímulo à violência e ao autoritarismo.

    Os ataques aos professores, às universidades, à ciência e tecnologia, aos meios de comunicação e a jornalistas, ao direito de manifestação e organização da sociedade e a participação social nas discussões, decisões e acompanhamento de políticas públicas, bem como os pontos do Pacote Anticrime têm todos o mesmo sentido: restringir a democracia e concretizar um golpe para consolidar um estado ditatorial.

    A violação à liberdade de imprensa já foi percebida durante a sua posse, quando os jornalistas não puderam circular livremente pelos espaços do Palácio do Planalto, foram privados de água e ameaçados caso desrespeitassem as rígidas regras de comportamento determinadas pelo governo recém-empossado. Em seus pronunciamentos e entrevistas coletivas, Bolsonaro trata os jornalistas com desrespeito, dando respostas ofensivas ou ignorando as perguntas, quando o tema abordado o incomoda. Além disso, usa suas contas e as contas oficiais do governo nas redes sociais para promover ataques diretos a profissionais da imprensa. Destaque para as ações contra o jornalista Glenn Greenwald do The Intercept Brasil, as ações e ataques contra a jornalista Patrícia Campos Mello da Folha de S. Paulo, a perseguição contra o jornalista Adécio Piran, que denunciou o dia do fogo na Amazônia e neste ano, a agressão contra a jornalista Vera Magalhães, de O Estado de S. Paulo, por ela ter divulgado a convocatória para o ato contra o Congresso e o STF. Mesmo a comunicação pública está ameaçada, com a portaria 216/2019 que unificou as emissoras NBr e TV Brasil.

    O Pacote Anticrime promovido pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, representa mais um ataque os direitos humanos fundamentais. Apesar de o Congresso ter derrubado alguns pontos do projeto, que legalizavam a licença para matar das forças de segurança e atentavam contra direitos civis — como o plea bargain, o excludente de ilicitude e a prisão em segunda instância — a lei mantém o viés da escalada punitivista do governo no país, aumentando ainda mais os mecanismos para o encarceramento em massa da população.

    Para inibir possíveis protestos populares contra as medidas tomadas pelo governo, Moro determinou em abril, por meio da portaria nº 441, o uso da Força Nacional de Segurança na Esplanada dos Ministérios. E, por meio de um Projeto de Lei, Bolsonaro pretende retomar o excludente de ilicitude em operações de garantia da Lei e da Ordem. Segundo o presidente, a medida “impedirá certo tipos de protestos” e também a possibilidade de seu uso em casos de reintegração de posse, chamada por si mesmo de “GLO do campo”.

    A extinção de Conselhos Participativos que formulavam políticas públicas em vários ministérios e órgãos administrativos federais evidencia o menosprezo pela participação da sociedade neste governo. Com o decreto nº 9.759, de 11 de abril de 2019 que extinguiu e estabeleceu diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal. A censura aos dados públicos e assuntos considerados “ideológicos” tem sido adotada com política de Estado. O Ministério das Relações Exteriores barrou o acesso a documentos sobre a posição do Brasil em debates na Organização das Nações Unidas (ONU). Alegando risco à segurança nacional e à “posição negociadora” do país, o Itamaraty impôs censura de cinco anos, até 2024, aos textos nos quais teria baseado sua posição retrógrada de negar proteção aos grupos LGBT e mulheres.

    Ataques às instituições jurídicas e ameaças de reeditar atos autoritários da ditadura militar também foram recorrentes neste primeiro ano de governo. Destacam-se o ataque ao presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, as mudanças na composição e atuação da Comissão da Verdade e o retorno do Ato Institucional nº 5, defendido publicamente pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro para reprimir manifestações.

    A educação e a cultura: censura e perseguição

    Desde os primeiros dias de seu governo, Bolsonaro e seus ministros elegeram a educação e a cultura como terrenos para uma “guerra santa ultraconservadora” contra os ideais progressistas e democráticos. Sob o discurso de defesa da “família, da Pátria , contra o “marxismo cultural”, atacaram em várias frentes a estrutura educacional e cultural, com cortes e contingenciamento em orçamentos, propostas de mudanças no funcionamento e nas direções dos ministérios da Educação, (destacando aqui a extinção do Ministério da Cultura). Foram extintos também os conselhos de participação social destes setores, interditando a participação da sociedade e dos movimentos setoriais na elaboração e no acompanhamento das políticas públicas.

    As universidades e os institutos federais foram alvos de medidas coercitivas como: nomeação de reitores não respeitando a ordem da lista tríplice, para garantir dirigentes alinhados ideológica e politicamente com o governo, o uso de critérios ideológicos para seleção de bolsistas e direcionar recursos para instituições federais de ensino, perseguição a professores com abertura de sindicância e estímulo à denúncia através de linhas criadas pelo governo com esse objetivo.

    As propostas educacionais do atual governo giram em torno das escolas cívico-militares que começaram a ser implantadas em alguns Estados, fundamentadas na presença de militares e policiais no cotidiano escolar e da escola em domicílio. Por outro lado, Bolsonaro e Guedes querem retirar a obrigatoriedade do investimento da União, Estados e municípios na estrutura educacional, com a desvinculação das receitas no orçamento.

    As manifestações autoritárias dos membros do governo Bolsonaro contra a cultura foram ganhando contornos nazistas ao longo do ano passado, quando o agora ex-secretário de Cultura Roberto Alvim, com visual e performance aos quais só faltavam a suástica, afrontou a consciência cívica nacional com um vídeo, propondo (pela primeira vez no atual governo, diga-se) um projeto cultural que faria Joseph Goebbels babar de inveja. Esqueceu apenas de combinar com a sociedade brasileira, que reagiu à altura: em menos de seis horas o projeto foi suspenso e o secretário demitido.

    Fora as manifestações fascistas, a área da Cultura foi vítima também de uma gestão inoperante, incompetente, anti- intelectual e, principalmente, que prega o ódio à democracia. Além da extinção do Ministério da Cultura que, transformado em Secretaria de Cultura, ficou à deriva, sendo jogado de um ministério a outro, tendo neste período vários titulares, sendo que o primeiro demitiu-se por discordar da censura pretendida pelo ministro da pasta; outros, não tiveram sequer como esquentar a cadeira para a qual foram nomeados. Enquanto isso, nada acontecia na pasta. Até que veio Alvim, que levou para o órgão uma plêiade de agentes culturais, muitos pouco conhecidos ou familiarizados com as áreas que administrariam, para dirigir a Funarte, a Biblioteca Nacional, a Fundação Palmares, dentre outros. Os critérios para a escolha destas pessoas foram, marcadamente, a identificação com o discurso de extrema-direita de Alvim.

    Já neste ano, um grupo de artistas visitou o Planalto para apoiar Bolsonaro e pedir-lhe alguns favores, como o fim da meia- entrada para estudantes e idosos e o corte do pagamento de direitos autorais em eventos dados como “culturais”. Soube-se depois que tais artistas estavam a serviço de empresários do ramo de vaquejadas e rodeios, quando não eram, eles próprios, também empresários. Enquanto rejeita dialogar com outros segmentos culturais, Bolsonaro acolheu estes agentes, que tiveram a desfaçatez de pedir ao governo que seus lucros sejam aumentados pelo fim de subsídios sociais e obrigações legais, para que possam, em nome da “cultura”, inclusive maltratar animais.

  • Coronavírus: A falência do sistema capitalista e a defesa radical do SUS

    Coronavírus: A falência do sistema capitalista e a defesa radical do SUS

    Coronavírus: A falência do sistema capitalista e a defesa radical do SUS

    Algumas reflexões sobre a pandemia do COVID-19 e as respostas políticas.

    Vivemos uma crise sanitária que tem se consolidado como uma crise política internacional. Uma análise da questão coerente com os princípios socialistas visa identificar as raízes que determinam os processos de adoecimento na sociedade capitalista e a busca por enfrentamentos que pautem a saúde enquanto emancipação humana a partir da solidariedade internacional e da ruptura desse sistema político. Em tempos de especulação midiática e pânico social, é necessário ter uma posição consistente e não-alarmista, afirmando a necessidade de respostas políticas radicais, na defesa do sistema público e universal de saúde e em prol das necessidades de saúde das pessoas. Este texto pretende, brevemente, reunir algumas reflexões a respeito da atual pandemia do novo Coronavírus e apontar algumas respostas necessárias para tal.

    A pandemia COVID-19

    O primeiro alerta do governo chinês à Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a possibilidade de um novo vírus em circulação foi dado em 31 de dezembro de 2019. Eram casos de pneumonia de causa desconhecida na cidade de 11 milhões de habitantes, Wuhan capital da província de Hubei, cuja origem provável detectada posteriormente seria um mercado de carnes de animais silvestres. Logo o vírus recebeu o nome de COVID-19 e fez milhares de vítimas no país, se alastrando por diversos continentes e chegando ao Brasil em fevereiro de 2020.

    A OMS declarou a situação gerada pela COVID-19 como emergência de saúde de importância internacional, devido ao seu grande potencial de propagação internacional e da necessidade de ações de resposta coordenadas. A essência da ameaça das pandemias de vírus respiratórios, como as causadas por Influenza ou Coronavírus, que assustaram e assustam o mundo ao longo da história, é justamente sua alta virulência e a rápida mutação das cepas que podem passar longos períodos incubadas e viajar pelo mundo à velocidade pandêmica, infectando uma humanidade que hoje é densamente urbanizada e majoritariamente pobre.

    Os Coronavírus são uma grande família de vírus que infectam principalmente animais, mas podem causar infecções em seres humanos, com sintomas que se assemelham aos resfriados ou gripes, podendo levar a complicações respiratórias em pessoas imunodeprimidas ou com doenças crônicas como hipertensão e diabetes. Apesar de fora dos grupos de risco, o curso da doença ser relativamente rápido e de baixa gravidade, os indivíduos infectados podem contribuir na disseminação do vírus, o que tem grande importância epidemiológica, já que o mecanismo de transmissão entre humanos pode ser via aérea ou por contato com secreções ou objetos contaminados.

    As experiências internacionais sobre o impacto do coronavírus são devastadoras. Em menos de três semanas no norte da Itália a COVID-19 sobrecarregou e colapsou completamente o sistema de saúde. Assim, medidas que visem a diminuição do ritmo de propagação do vírus e a curva de novos casos de pessoas infectadas, com o objetivo de dar condições aos serviços de saúde para atenderem a demanda progressiva que devem receber, são fundamentais, sobretudo considerando que em breve o Brasil estará em período de outono e inverno, período no qual aumenta a circulação dos vírus respiratórios.

    O isolamento e o distanciamento social têm se mostrado como importantes estratégias de contingenciamento da pandemia, somados a higienização das mãos, restrições a aglomerações, eventos de grande porte, viagens e modificações nos turnos de trabalho. Entretanto, há diversas contradições nas respostas dos países ao avanço da doença, considerando que por muitas vezes as decisões governamentais são tomadas com base em critérios políticos e não científicos e epidemiológicos.

    O esgotamento do sistema capitalista e a Determinação Social da Saúde

    O modelo de organização social reflexo do modo de produção capitalista determina o perfil de adoecimento da sociedade. Isso significa dizer que as doenças que enfrentamos e a forma com que os diferentes grupos sociais se impactam por elas têm ligação direta com o arranjo estrutural de organização do trabalho e das condições de vida das pessoas. É nesses marcos que compreendemos a atual crise sanitária do novo Coronavírus.

    No capitalismo neoliberal globalizado, é quase impossível que doenças infecciosas não assumam proporções pandêmicas. Pandemias dessa dimensão são na verdade resultado do esgotamento do modo de produção capitalista que enfrenta uma dura crise desde 2008, com intensificação da exploração da força de trabalho, precarização completa das condições de vida das populações, especialmente nos países de capitalismo periférico e ampliação da desigualdade social.

    A infraestrutura dos centros urbanos é dependente de aglomerações e grandes fluxos de abastecimento e suas periferias concentram pobreza e condições de vida precárias, com deslocamentos diários em meios de transporte lotados. Os limites das grandes cidades estão escancarados e as saídas de controle da pandemia atual colocam em questão a necessidade de se repensar a lógica das metrópoles e o tema do direito à cidade.

    Soma-se a isso o colapso das estruturas e a retirada de direitos sociais cada vez mais intensivas, especialmente os ataques aos serviços públicos. Vivemos um neoliberalismo marcado pela crescente privatização dos sistemas de saúde, que não são capazes de dar respostas, nem na lógica do capital, às crises sanitárias e políticas que estamos enfrentando, tal como o protagonismo da indústria farmacêutica que visa o lucro em detrimento da identificação de tratamentos a doenças infecciosas que ressurgem no perfil epidemiológico global.

    Vivemos uma crise política, econômica e ambiental do capitalismo

    A pandemia COVID-19 escancara uma crise política internacional de grandes proporções, principalmente porque o caráter intimidador da pandemia não se deve necessariamente ao potencial patogênico do vírus, mas ao estado precarizado dos sistemas públicos de saúde no Brasil e no mundo. O desfinanciamento dos sistemas a partir de medidas de austeridade e cortes de direitos sociais, e os incentivos ao desenvolvimento do setor privado em saúde promovidos pelas últimas décadas de governos neoliberais, revelam uma dificuldade concreta de contingenciamento de epidemias.

    No Brasil, o mecanismo de teto de gasto público em saúde a partir da Emenda Constitucional 95 e outras medidas implementadas pelo governo no último período como a mudança de financiamento do orçamento da Atenção Básica (Portaria 2.979/2019) que retiram recursos da saúde e dificultam a atuação em casos como a COVID-19. Da mesma forma o déficit de profissionais acompanha um projeto de desmonte do sistema público de saúde no Brasil que sobrecarrega os trabalhadores e infringe o direito à saúde das pessoas que acabam se aglomerando nas filas dos hospitais e postos de saúde para receberem cuidados.

    Contraditoriamente, justamente em um período de redução da máquina pública, há a necessidade de investimento dos Estados na proposição de medidas de saúde pública de contingenciamento da crise sanitária e de resgate da economia.

    A interrupção da produção e do comércio, que começou com a paralisação da economia chinesa, que representa um quarto da produção industrial do planeta, 19% do PIB global e 13% de todo o fluxo de comércio, atingiu diversos países. A crise econômica avança derrubando bolsas de valores, expressa em successivos acionamentos de “circuit breaker” e impactando diversos setores da economia como transportes, tecnologia, eletrônicos, automóveis e alimentos, com bloqueio das cadeias de produção e circulação de mercadorias.

    Além disso, é impossível entender essas pandemias virais sem atentar para o quanto as ações humanas têm contribuído para que os surtos cíclicos de infecções causadas por novas mutações genéticas possam se alastrar com cada vez mais rapidez. Os choques ambientais induzidos pelo ser humano, que incluem poluição das águas, uma “revolução na criação de animais”, o intenso adensamento urbano dos países de capitalismo periférico, o enorme trânsito internacional de pessoas e produtos são parte do conjunto de fatores que podem transformar surtos em epidemias e pandemias.

    Compreender a emergência da crise climática atual é fundamental para alcançar as raízes dessa pandemia. A destruição ambiental só agrava a possibilidade de novos microorganismos infecciosos emergirem e terem mais condições de atingirem com gravidade o ser humano. Ruptura das cadeias naturais de circulação de doenças, aumento de vetores e as grandes destruições de meio ambientes, como reflexo das queimadas, desmatamentos e rupturas de barragens, por exemplo, tem resultado em maior vulnerabilidade à doenças infecciosas, como arboviroses (dengue, febre amarela, zika e chikungunya) ou infecções respiratórias, como as gripes ou as síndromes agudas graves.

    A pauta climática tem mobilizado o mundo com iniciativas que compreendem que a ruptura do sistema capitalista e a mudança das formas de produção é imperativa para que se tenha melhores condições ambientais e climáticas. A Greve Mundial do Clima marcou o final de 2019, antecedendo o caos sanitário que seria causado meses depois pela emergência da COVID-19.

    A necropolítica e o racismo e desigualdades desvelados

    São tempos de governos neoliberais que carregam um forte sentimento nacionalista e xenofóbicas, agravados pela crise imigratória. Muitos são os países, inclusive o Brasil, que ainda contam com líderes autoritários e protofascistas, e que se aproveitam do momento de crise sanitária do novo coronavírus para reforçar fechamento de fronteiras e medidas restritivas, com posições anticientíficas. Parece ser o pretexto ideal a pandemia, a motivação para a instauração de medidas de exceção pelos Estados.

    Apesar da fala recorrente na mídia de que o vírus é “democrático” e atinge igualmente a pobres e ricos, não há como negar que qualquer doença reforça e escancara a desigualdade social e racial. Primeiramente, se considerarmos as condições de vida da parcela mais pobre da população, a ausência de condições de saneamento básico e rede de abastecimento de água impossibilitam a base da prevenção que é a higienização das mãos. Para além disso, a parcela mais pobre da população, que no Brasil, é majoritariamente negra, também enfrenta as dificuldades para cumprir as medidas de distanciamento social, considerando a necessidade de se manter trabalhando e utilizando os serviços públicos sucateados, como transporte lotado e serviços de saúde deficitários. Pelos dados de 2018, 33,% da população branca do país trabalhava na informalidade. Entre a população negra, o índice chega a 47%, revelando as condições completamente desiguais para garantir saúde. Os idosos negros também são os que menos têm acesso a direitos previdenciários e estão em condições piores de vida e trabalho, criando um horizonte aterrador quando pensamos previsões a curto e médio prazo.

    A precarização dos direitos trabalhistas afeta diretamente as medidas de contingenciamento da COVID-19 na medida em que muitos trabalhadores sob suspeita da infecção mantêm suas rotinas de trabalho para garantir a subsistência de suas famílias. Sem proteção social para boa parte da classe trabalhadora que ocupa o mercado informal, a recomendação de isolamento social se torna uma falácia.

    A população vulnerável à pandemia, portanto, vai além daqueles indivíduos com menor imunidade, como idosos e pessoas com doenças crônicas e imunossupressoras, mas também engloba aqueles que vivem em extrema pobreza. Além disso, com poucas condições de promoção à saúde e prevenção, população mais pobre envelhece pior, aumentando as chances de risco e complicações para essa população. Para o capitalismo, as vidas improdutivas: idosas, doentes, pobres, valem menos do que as outras. Esse é o projeto da necropolítica em curso reforça a cada dia que algumas vidas valem menos do que outras, fazendo com que se viva no limite enquanto dá lucro pra quem o explora e deixando morrer quem não é mais produtivo.

    O enfrentamento é pela defesa do SUS, da Vigilância em Saúde e dos trabalhadores

    A pandemia evidencia o esgotamento do capitalismo neoliberal porque expõe o sistema a uma contradição. O controle da COVID-19 exige respostas que só podem ser dadas por sistemas públicos, gratuitos e universais de saúde.

    Segundo dados do Ministério da Saúde, até domingo, dia 15, tínhamos 200 casos confirmados, mais de 1913 suspeitos no Brasil. Em São Paulo e Rio de Janeiro já há transmissão comunitária da doença e as autoridades de saúde projetam que para os próximos meses um grande aumento de infectados, contando os casos que são assintomáticos no país.

    Boa parte dessas pessoas serão atendidas pelo SUS – Sistema Único de Saúde, que tem sofrido grandes ataques no último período, com o congelamento do orçamento e o desfinanciamento crônico. Ainda assim, somos o país mais bem preparado para atuar diante de uma emergência de saúde. O SUS é referência internacional e patrimônio do povo brasileiro, com acesso universal e larga cobertura geográfica, contando com prevenção de doenças e promoção de saúde.

    Uma questão fundamental é que toda a investigação e controle epidemiológico, sanitário e ambiental relacionado ao coronavírus ou outras doenças é realizado pela Vigilância em Saúde, que no Brasil é centralizada e coordenada pelo SUS. É a partir da centralização de dados sobre eventos relacionados à saúde que se tem o planejamento e a implementação de medidas de saúde pública para proteção, prevenção e promoção da saúde da população. Sem a coordenação da vigilância epidemiológica e sanitária em saúde, seria muito mais lento e ineficiente o processo de controle dos casos suspeitos e confirmados da COVID-19 no Brasil, impedindo as bases para tomada de decisões fundamentais de contingenciamento da epidemia. É fundamental o reconhecimento e o respeito ao trabalho da Vigilância em Saúde, que realiza ações com base científica e epidemiológica.

    Países sem sistemas centralizados e universais de saúde, como os EUA, sofrem grandes dificuldades de realizar o controle de epidemias. Além disso, a não gratuidade dos serviços de saúde onera grande parcela da população, que por muitas vezes opta por não se submeter a atendimentos em serviços de saúde, mesmo sob sintomas graves.

    Os trabalhadores da saúde têm cumprido no Brasil e no mundo papel protagonista no enfrentamento a epidemia. O trabalho em saúde, já muito precarizado e explorado, é grande sustentador do sistema capitalista, garantido a reprodução social do trabalho. Os trabalhadores da saúde que sofrem mais riscos são justamente os mais precarizados, como os profissionais de Enfermagem e os Residentes Multiprofissionais e Médicos em saúde, principal mão de obra do SUS. A foto da enfermeira, Elena Pagliarini, descansando sobre um computador no hospital de Cremona depois de 10 horas de trabalho se tornou símbolo do desgaste e esforço dos profissionais de saúde, esgotados com o excesso de trabalho na luta para salvar vidas contra o coronavírus.

    A enfermeira Elena Pagliarini descansando sobre um computador no hospital de Cremona depois de 10 horas de trabalho.

    A valorização da Ciência em tempos de Fake News

    Nossos tempos enfrentam a contradição de um desenvolvimento científico capaz de conter pandemias, convivendo com uma sociedade pautada no individualismo e um sistema político falido reflexo desse modo de produção exploratório e destruidor. Medidas de contingenciamento são fundamentais, mas elas sempre devem ser balizadas por critérios científicos e epidemiológicos. Mas nos governos fascistas e neoliberais, a Ciência tem perdido investimento e credibilidade. Bolsonaro aposta na farsa, no clima de obscurantismo e muitas vezes tem a desinformação enquanto discurso oficial.

    As pesquisas e a ciência nos dão condições de prever eventos com antecedência, para alertar a sociedade do perigo iminente e provocar mudanças nas políticas públicas e comportamentos sociais de maneira a proteger a vida, o meio ambiente e economia. Precisamos confiar nas medidas indicadas pelas autoridades sanitárias, desde que sejam feitas com base em evidências científicas. E pesquisas produzidas e compartilhadas socialmente, sem restrições das patentes impostas pela indústria farmacêutica e pelos mercados, que só podem ocorrer em universidades e institutos de pesquisa públicos, são muito mais eficientes e adequadas para responder aos desafios de crises sanitárias como a atual. A valorização das universidades públicas e dos cientistas é portanto, essencial para se garantir a produção compartilhada de conhecimento e o avanço na identificação, estudo e contenção do novo coronavírus, com qualidade, como ocorreu no sequenciamento genético em tempo recorde do novo vírus por pesquisadoras brasileiras.

    A anticiência caminha junto com a disseminação de falsas informações por meio das redes sociais, as chamadas “fake news”, que bombardearam os whatsapps da população de xenofobia, orientações errôneas e sem base em evidências, e propagação do pânico. As falsas notícias, método muito utilizado pelos que ocupam o governo brasileiro, são um desserviço absoluto à sociedade, não contribuindo para a confiabilidade nos órgãos competentes às recomendações sanitárias, que o fazem baseados em ciência e responsabilidade.

    Mesmo a grande mídia tem atuado de forma especulativa e alarmista, na maior parte das vezes, sendo raros os momentos que utilizam seu espaço privilegiado de comunicação para divulgar informações e orientações de qualidade. Isso gera uma avalanche social de pânico e histeria coletiva ao redor de um tema que é sim, preocupante, mas para os governantes e profissionais da saúde responsáveis pela Vigilância em Saúde, não para população geral, individualmente.

    A corresponsabilização dos governantes para com a sociedade nas medidas de contingenciamento da pandemia deve se dar de forma cautelosa e responsável, de forma a incentivar as ações preventivas e o cuidado solidário àqueles com vulnerabilidade. E é interessante analisar como as ações governamentais, por vezes até antecipadas em relação às indicações epidemiológicas, tem muito mais motivações políticas de contingenciamento da crise político-econômica internacional do que de fato preocupações sanitárias.

    Esta é a melhor hipótese para compreender porque o coronavírus se tornou objeto de intervenção das políticas de saúde tão mais rápido e intensamente que de outras doenças epidêmicas e endêmicas no Brasil. A recente epidemia de sarampo, as altas taxas de feminicídio e violência, a mortalidade por H1N1 e mesmo por SARS, o aumento dos casos de sífilis congênita e tuberculose, nada disso mobilizou tanto a mídia ou o governo quanto a COVID-19, talvez justamente por não serem questões em que se seja necessário conter a pressão social de pânico e a queda na economia, apesar de impactarem diretamente na vida das pessoas. A SARS em 2019 teve 40 mil casos e matou 5 mil pessoas no Brasil.

    A resposta passa pelo enfrentamento a esse sistema

    A pandemia de coronavírus em 2020 evidencia diversas contradições do sistema capitalista e evidencia a necessidade de superação e este modelo econômico e político. A crise sanitária revela a necessidade de sistemas de saúde universais e sistemas de proteção ao trabalhador, assim como independência da indústria farmacêutica e defesa da ciência nas universidades públicas. A crise política revela a necessidade de se repensar representantes, fronteiras e ideologias, de retomar a solidariedade internacional em detrimento do racismo e da xenofobia, de refazer laços comunitários de cuidado ao invés da valorização do individualismo e da meritocracia.

    A resposta está na cooperação entre os povos, em escala internacional, na radicalização política do enfrentamento a esta ordem mundial, na ruptura com a exploração humana e ambiental no planeta. No Brasil, a defesa do SUS é bastante estratégica nesse momento para os socialistas. A crise do capital tem gerado cada vez mais a necessidade de acirrar o nível de exploração sobre o povo e avançar sobre sistemas de direitos públicos como saúde, educação e assistência/previdência, de forma a abrir novos mercados. A tensão sobre o estado burguês feita pela classe trabalhadora, no sentido de preservar esses sistemas, é um fator importante de desestabilização de regimes protofascistas como o de Bolsonaro e dificulta aos donos do poder a encontrar saídas políticas estáveis para a crise.

    A defesa radical do SUS e a revogação imediata da EC 95 e dos demais ataques ao sistema universal de saúde são imperativos para garantia de uma saúde de qualidade à população. É necessário pensar a saúde enquanto reflexo das condições de vida e de trabalho das pessoas, mas também como necessária à emancipação humana.


    Referências