Autor: Redação Lauro Campos

  • Não foi Sequestro hoje na Ponte Rio-Niterói, foi Suicídio

    Não foi Sequestro hoje na Ponte Rio-Niterói, foi Suicídio

    Não foi Sequestro hoje
    na Ponte Rio-Niterói,
    foi Suicídio

    Por Janira Rocha

    Um sequestrador clássico não atravessa um ônibus na pista de um dos locais mais movimentados do Estado, um sequestrador quer fugir, levar suas vítimas para longe para poder usá-las para pedir resgates em proveito próprio.

    Não, esse rapaz, agora se sabe, mentalmente perturbado, vítima de depressão resolveu se matar e decidiu fazer isto “entrando para a história” conforme relatado por vários reféns.

    No meio de sua dor e confusão mental, sabia que sua ação era um bilhete certo para a morte, afinal estamos no meio de uma Guerra Urbana, agora apimentada por um Governador que dá pulinhos de gazela toda vez que comanda explodir a cabeça de alguém.

    Condeno a polícia? Bem, em outra conjuntura, se ela também fosse sã, talvez pudesse perceber o que realmente acontecia ali e, com sua alardeada capacidade técnica apenas atirar para parar o suicida. E não fuzilá-lo com 6 tiros (e muito estranho um Sniper parar alguém com tantos tiros). Mas honestamente era sim uma situação difícil e refletir a defesa dos reféns, das vítimas era a prioridade a se resolver. Foi uma ponderação que poderia se tomar como justa, quem é o hipócrita que vai dizer que se seu filho estivesse de refém naquele ônibus não aprovaria o desfecho?

    Analisar as coisas da poltrona, da tela do celular é fácil, mas quando a vida se apresenta na sua concretude o buraco é mais embaixo.

    Foi um dia triste, nada a se comemorar e a melhor e mais tocante imagem foi a do pai de uma das vítimas consolando a mãe do suicida.

    Mas afinal de que lado estou? Aplaudo ou vaio a Polícia?

    Hoje acho que “essa” polícia não poderia nos dar nada diferente, na verdade, nem os que vaiam a polícia e nem os que a aplaudem se importam realmente com ela e tem a dimensão de quanto nossa polícia precisa que se vá em seu “socorro”. Isso é fazer política concreta contra a “Guerra aos Pobres” patrocinada pelo Estado.

    Sim, é uma polícia que é humilhada em seu treinamento, pelos seus superiores hierárquicos, que sofre com um regulamento autoritário  que a classifica de subcidadã, que lhe impõe baixos salários, que não lhe garante saúde, moradia adequada a se proteger e aos seus familiares, instrumental de trabalho adequado a sua proteção e mil outros etceteras que poderia enumerar, o mais grave, é uma polícia também acuada pelo crescente número de policiais caçados e mortos pela violência imposta pelo banditismo.

    Uma polícia formada ideologicamente para enfrentar o “inimigo” e como é polícia de governos e não de Estado, a depender do Governo o inimigo pode mudar.

    Como o menino suicida da ponte, que criou sim uma situação de perigo iminente para 37 pessoas trabalhadoras, outros suicidas criam perigos iminentes e isto tem que ser debatido pela Sociedade sem hipocrisias e sem a fórmula fácil de se “assumir um lado”, como se fosse possível absolutizar a razão em apenas um dos extremos.

    Eu choro pelos meus, pela minha classe, choro pelo suicida, depressivo que na sua loucura poderia sim ter causado a morte de 37 pessoas, choro os reféns, choro pelos policiais depressivos que se suicidam pelo país afora, choro pelos policiais que não se enxergam em seu real tamanho e se deixam ganhar pra política que matar na favela a qualquer “preto suspeito” é a solução pra toda violência que vivemos, choro contra a hipocrisia dos que condenam e criminalizam a polícia, mas que não abrem mão de um milimetro de suas pautas para tentar negociar a construção de pontes. 

    Meu lado é o de trabalhadores com farda e sem farda, com todas as suas contradições.

    Quero ganhar a todos que nossas balas “são para os nossos Generais, ou Governadores…”

    A matéria abaixo é para ilustrar a situação real da polícia e que isso também é problema de todos nós!

    #DireitosHumanosParaTodosSim
    #FimDaGuerraAosPobres 
    #NossasBalasSãoParaOsGenerais

  • Francisvaldo Mendes participa de mesa no Observatório Judaico dos Direitos Humanos no Brasil

    Francisvaldo Mendes participa de mesa no Observatório Judaico dos Direitos Humanos no Brasil

    Francisvaldo Mendes participa de mesa no Observatório Judaico dos Direitos Humanos no Brasil

    O presidente da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco, Francisvaldo Mendes, participou da mesa “Os direitos humanos no Brasil de hoje, caminhos a trilhar”, realizado pelo Observatório Judaico dos Direitos Humanos no Brasil. Durante o evento, foi lançada a Revista do Observatório Judaico, que trás uma matéria especial sobre os primeiros 100 dias do governo Bolsonaro e a relação com os direitos humanos.

    Também como representante do Observatório da Democracia, Francisvaldo Mendes explicou o processo de criação do observatório que une as diversas fundações partidárias do campo progressista do Brasil e salientou a importância de criar um ambiente de debate e de proteção da democracia no país. “A ideia do observatório é subsidiar os movimentos sociais para que possam fazer um bom debate político e consigam fazer o enfrentamento necessário para não tentar barrar esses retrocessos”.

    Clarisse Goldberg, integrante da Coordenação do Observatório Judaico dos Direitos Humanos no Brasil, comentou sobre o surgimento do observatório judaico – que surgiu nas últimas eleições com a criação do grupo ‘Judeus conta Bolsonaro’ – e salientou que “houve um sequestro do significado de ser judeu. E nós nos sentimos na obrigação de mostrar que existem judeus progressistas e de esquerda e que estamos à favor da democracia e contra o governo Bolsonaro”.

    O presidente da FLCMF ainda comentou, ainda, sobre o omento que o Brasil passa e onde precisamos focar para ter algum tipo de avanço na sociedade. “Nós estamos vivendo um momento de vários ataques. Às vezes chegamos a ficar até desnorteados. E o que que nós temos que ter em foco? O ataque que nós estamos sofrendo é para desregulamentar as instituições democráticas e que defendem os direitos humanos. Para o Bolsonaro pouco importar governar para a maioria da população. O que ele está fazendo é segmentando para formar o próprio exército ideológico para enfrentar as crises que estão por vir. E nós precisamos também ter o nosso exército para enfrentar o Bolsonaro com todas as armas possíveis, que são as ideias, a luta coletiva e solidária em defesa da população”, argumenta.

  • Future-se: o exterminador do futuro

    Future-se: o exterminador do futuro

    Future-se:
    o exterminador
    do futuro

    Por Jorge Almeida, Magda Furtado e Rafaela Cardoso*

    A essência do projeto “Future-se” do MEC é destrutiva: materialmente é a privatização de fato das Universidades e Institutos Federais e dos seus recursos físicos e intelectuais. Evidencia-se em cada ponto sua pretensão de fazer uma disputa ideológica e sua concepção visa reforçar ainda mais a hegemonia burguesa na Universidade e na sociedade.

     Efetivamente, pelo Future-se – lançado oficialmente pelo MEC em 17 de julho e atualmente em consulta pública – as IFES (Instituições Federais de Ensino Superior) continuariam a ser formalmente públicas, mas seriam geridas por Organizações Sociais (OSs) privadas, mantidas por meio de Fundos de Investimento especulativos formados a partir da alienação de patrimônio público e outros financiamentos privados guiados pelo objetivo do lucro, sem qualquer garantia de orçamento federal para seu custeio.  A proposta aponta para o progressivo esvaziamento da carreira docente, podendo chegar até à eliminação dos professores/pesquisadores concursados em regime de Dedicação Exclusiva e da carreira como hoje existe, além de abrir caminho para a implantação da cobrança de mensalidades para todo o ensino – o que não aparece formalmente no projeto e depende de emenda constitucional – e colocar em cheque a permanência estudantil. Ou seja, vai piorar as condições de trabalho, de ensino e de aprendizado, atingindo diretamente a formação dos estudantes.

    Concomitantemente, o Future-se visa travar uma luta ideológica e promover uma profunda mudança na cultura universitária numa perspectiva liberal, tipicamente de mercado. Ao submeter o financiamento e, portanto, o funcionamento da universidade à perspectiva ideológica do governo federal e das empresas, pretende favorecer aqueles que têm uma posição mais identificada com o governo e os empresários e, ao mesmo tempo, forçar os outros a se adequarem a métodos privatistas, enquadrando os conteúdos de pesquisa. Vai gerar um clima de competição individualista e até mesmo um “salve-se quem puder” em vários níveis, como exacerbar a competição entre professores, entre estudantes, grupos de pesquisa, IFES e unidades internas às IFES.

    Segundo Steve Bannon, da Cambridge Analytica, “para mudar fundamentalmente uma sociedade, primeiro é preciso destruí-la; somente depois de destruí-la você pode remodelar os pedaços segundo sua visão de uma nova sociedade”. Se trocarmos “sociedade” por “Universidade” nessa frase, teremos uma boa ideia do que pode ser o projeto “Future-se. Considerando que Steve Bannon foi consultor da família Bolsonaro durante as eleições no Brasil e que seu método de marketing eleitoral entranha a gênese desse governo, podemos estar muito próximos de entender os objetivos reais do projeto, que, se adotado tal como se apresenta, não deixaria de pé as Universidades e Institutos Federais tais como os conhecemos.

    O lançamento do projeto não foi precedido de um balanço profundo, sistemático e consistente do ensino superior brasileiro nem do conjunto de nossa educação e seu financiamento. Tampouco passou por estudo de viabilidade. Tem uma origem marcadamente autoritária, não tendo sido submetido a nenhum tipo de consulta prévia à comunidade universitária e científica do país.  Essas limitações, incríveis para um projeto que se propõe a uma mudança de tal monta, depõem fortemente contra a possibilidade de ele dar certo naquilo que propaga – que, supostamente, seria melhorar o ensino, resolver a questão do financiamento, promover a ciência e a pesquisa e aumentar a produtividade de professores, funcionários e estudantes. Mas isso é o de menos para a atual equipe do MEC e o presidente Bolsonaro. Se o projeto for aprovado e entrar em vigor, seus principais objetivos reais estarão alcançados: privatizar de fato as Universidades e Institutos Federais, favorecendo as empresas privadas e o capital especulativo, e destruir grande parte da capacidade de produção científica, tecnológica e intelectual em geral do Brasil.

    O projeto Future-se se insere e é coerente com o conjunto da política deste governo, que parece caótico, mas não é. É antipopular, antidemocrático e antinacional. É ultraliberal e privatista na política econômica, na política social e nas políticas públicas em geral. É autoritário, obscurantista e destrutivo do patrimônio cultural de nosso povo. Tem as marcas do neofascismo do bolsonarismo. É um desdobramento do golpe do impeachment de 2016. E, enfim, é a face brasileira da ofensiva do capital diante da crise estrutural do capitalismo.

    Essa proposta teve dois instrumentos principais de lançamento: o texto redigido de um projeto de lei e uma apresentação, na forma de monólogo do Secretário de Ensino Superior, Arnaldo Lima, de cerca de uma hora, para dirigentes da comunidade acadêmica. No meio de um emaranhado de afirmações bombásticas, críticas inconsistentes, promessas vazias, demagogias, destaque a “novidades” que já estão em andamentos nas IFES, e inúmeras emendas a leis já existentes e outros detalhes diversos, o projeto “Future-se”, foi apresentado pelo MEC como solução para o financiamento, gestão e produtividade das IFES. Mas, no frigir dos ovos, seus objetivos centrais, materiais e ideológicos estão nos parágrafos acima. 

    O programa é bastante amplo, mas há muitas lacunas e possibilidades de desenvolvimento a partir de emendas legislativas. Vamos aqui nos ater aos seus elementos centrais e a suas principais consequências e repercussões materiais e ideológicas. Há muitas questões que ficam para ser regulamentadas pelo MEC ou negociadas em contratos com as Organizações Sociais, o que não está explícito, mas que, dentro da lógica geral do projeto, dá margens para uma maior liberdade do MEC para agir de modo arbitrário, autoritário e privatista, já que a autonomia universitária não existirá mais na prática.

    Afronta à autonomia universitária: gestão privada e interesses de mercado

    O projeto se apresenta como supostamente “opcional”. Cada IFES seria livre para aderir ou não. Mas, na prática, pretende ser do tipo opcional-obrigatório, pois o governo continuará a promover um arrocho de tal monta sobre as IFES que elas vão ser colocadas diante do desafio de aderir ou ser estranguladas até morrer à míngua, afinal, não coloca nem como possibilidade revogar o brutal “contingenciamento” de verbas de custeio realizado no primeiro semestre deste ano. Ademais, aqueles que aderirem deverão receber incentivos materiais do Estado e do mercado como contrapartida.

    Sua efetivação, entretanto, ainda vai passar pelo crivo do debate e da resistência na comunidade acadêmica e na sociedade em geral, assim como por uma luta legislativa e jurídica, na medida em que partes essenciais do projeto, como veremos, são ilegais e inconstitucionais. Nas Universidades e Institutos Federais, qualquer assinatura de acordo deve ser precedida necessariamente por análise, debate e aprovação do Conselho Superior da Instituição. Considerando o teor polêmico do projeto, o debate já está sendo desencadeado nos departamentos e nas entidades sindicais representativas das categorias de docentes e servidores técnicos-administrativos, bem como nas entidades e na base do movimento estudantil.

    A proposta de transformar a natureza das Universidades e Institutos Federais – caracterizados como instâncias adversárias durante a campanha eleitoral, locais de “balbúrdia” segundo o Ministro da Educação e vítimas de pesados cortes no orçamento – evidencia-se em cada parágrafo do projeto Future-se, que altera 16 leis, e se sobressai na apresentação feita em Brasília pelo Secretário de Ensino Superior, Arnaldo Lima. Sob a enganosa promessa de um supostamente vultoso fundo financeiro com ações negociadas em bolsa e lastreado no patrimônio imobiliário das IFES, irrigado por doações de “generosos empresários” e “milionários abnegados”, cotas de fundos de investimento e outras receitas etéreas e incertas, as IFES deveriam se abrir a transformar sua finalidade para se entregar aos ditames do Mercado, adotando o espírito do “empreendedorismo” como sua nova razão de ser.

    Um projeto inconstitucional: autonomia de gestão financeira não é autonomia financeira

    Está explícito no projeto que, para não continuarem estranguladas financeiramente, as IFES devem, espontaneamente, abrir mão de sua autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, garantida pelo artigo 207 da Constituição, para entregar sua administração a Organizações Sociais de natureza privada, que podem contratar livremente pessoas estranhas ao meio para atuar na gestão e inclusive na atividade-fim. Além de atropelar a Constituição a serviço do mercado, de modo monocrático, sem um processo de debate amplo na sociedade e no parlamento, há também uma confusão que é obviamente proposital entre autonomia de gestão financeira, como está na CF, e autonomia financeira, que desobrigaria o governo de manter as IFES – e não é o que está no texto constitucional. O Future-se se vangloria de proporcionar essa suposta autonomia financeira, que representa na verdade uma dependência das empresas e do mercado, onde seria negociado o fundo imobiliário a ser constituído.

    Gestão privada das OSs alavancaria lucros para os empreendedores

    Pelo projeto, as Organizações Sociais, sem qualquer experiência de gestão universitária, passariam a gerir ensino, pesquisa e extensão, em parcerias público-privadas voltadas ao atendimento das necessidades de Inovação, Pesquisa e Desenvolvimento de acordo com os interesses das empresas nacionais e estrangeiras, que supostamente transfeririam seus centros de pesquisa e desenvolvimento para esses novos contratos. O capital humano das universidades seria direcionado a atender a essas necessidades, devidamente recompensado com bolsas, atividades remuneradas e distribuição de lucros e dividendos de patentes, que fluiriam tão “caudalosamente” a ponto de transformar o cargo de professor de uma IFES “no melhor emprego do país” – os professores poderiam ficar ricos, sublinhou entusiasticamente o Secretário Arnaldo Lima na apresentação.  As ideias inovadoras, doações e investimentos privados só estariam esperando a gestão das IFES ser transferida para as Organizações Sociais “sem fins lucrativos” para que começassem a fluir, proporcionado uma suposta profusão de patentes, publicações e microempresas lucrativas e capazes de alavancar o fundo que lastreia o projeto. Este se transformaria em um negócio tão atrativo para o capital que inauguraria o supostamente desejado estado de autonomia financeira do ensino superior no país, além de dar lucros e dividendos não só para o mercado como para estudantes e professores – enfim, idealiza-se um cenário em que todos estariam satisfeitos com a nova natureza das Universidades, em perfeita simbiose com os interesses de mercado em nível nacional e internacional.

     Em plena vigência da Emenda Constitucional 95, que congela os investimentos federais nas áreas sociais como Saúde e Educação no nível da execução orçamentária do ano anterior, agravada pelos cortes de cerca de 5,8 bilhões no orçamento de custeio da Educação e Ciência e Tecnologia, esse fundo de investimento pretende se afigurar como uma solução salvadora. Afinal, as Universidades e Institutos Federais estão à beira da paralisação por falta de verba de custeio. Mas não existe adesão parcial: o acesso está atrelado à subordinação, no escuro, da gestão das IFES às Organizações Sociais – como se o problema do déficit no custeio fosse culpa da gestão democrática, que é um preceito constitucional. A distribuição de fundos não será equitativa: pressupõe uma competição entre as instituições, com critérios produtivistas que acirrarão as desigualdades regionais, numa espécie de gincana pelo cumprimento de metas estabelecidas por critérios externos de mercado.

    Nas argumentações do MEC, eles procuram apresentar as Organizações Sociais como se fossem um desenvolvimento natural das atuais Fundações de Apoio hoje existentes, que são entidades de caráter privado sem fins lucrativos. Na realidade, as Fundações, bem ou mal (pois há muitas situações passíveis de crítica), desempenham uma função de apoio a iniciativas da Universidade, como cursos de extensão e a participação em parcerias público-privadas em projetos de Pesquisa & Desenvolvimento permitidas pelas alterações do Marco Legal da Ciência e Tecnologia de janeiro de 2016 (lei 13.243 de janeiro de 2016, sancionada por Dilma Rousseff). Já as OSs tomam para si a gestão dos contratos de parcerias com empresas no âmbito de P&D, tirando o controle das IFES, o que resulta, portanto, na destruição da autonomia universitária de gestão.  Além de colocar o próprio ensino superior a serviço do capital, esse processo ainda vai capitalizar outras empresas privadas, especialmente bancos e o setor imobiliário.

    A pesquisa pura, Ciências Humanas e Sociais: o que fazer com os “não-lucrativos”?

    Esse atrativo conto só não ousa perguntar o que seria da pesquisa pura e de base, das Ciências Humanas e outras áreas não afeitas a resultados lucrativos e rápidos. Salta aos olhos que é preciso muita ingenuidade para acreditar no desprendimento do capital financeiro para investir em ensino e pesquisa em um país de capitalismo dependente, para onde as empresas transnacionais nem pensam em transferir seus setores de pesquisa e inovação, como alerta o professor Roberto Leher (UFRJ) em recente artigo sobre o Future-se, mostrando como o projeto idealiza o capital e as empresas estrangeiras em sua formulação. É preciso muito desconhecimento (ou má-fé) da parte dos elaboradores do projeto para acreditar que o modelo de polo tecnológico, já existente em instituições como a COPPE/UFRJ e aplicável a poucos departamentos, deva direcionar as prioridades e esmaecer as especificidades de uma Universidade voltada realmente ao avanço do conhecimento em todas as áreas. Evidentemente algumas, pela natureza de seu objeto de estudo, são francamente contrárias aos princípios de mercado – como as pesquisas arqueológicas, linguísticas e de meio ambiente, para citar alguns exemplos. O projeto também atropela um dos princípios mais caros ao ensino superior público, que é a indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão socialmente referenciados.

     Os entusiastas do Future-se omitem ou desconhecem que a possibilidade de simbiose com as empresas na pesquisa aplicada ao desenvolvimento de produtos e inovação não pode se desprender da pesquisa pura que lhe embasa os avanços, mas que não proporciona resultados tão rapidamente mensuráveis por metas de curto prazo.  Do jeito que está o projeto, parece que as patentes e publicações só não jorram em abundância porque as pessoas não estão suficientemente estimuladas pela possibilidade de ganhos financeiros imediatos. Torna-se evidente a pequena conta em que são tidos os professores e pesquisadores brasileiros por parte dos formuladores do projeto.

    É provavelmente proposital a omissão no projeto das especificidades das pesquisas na área das Ciências Humanas, que, em diálogo com os movimentos sociais, possibilitam compreender a história da formação social brasileira, recolheram dados e sistematizaram informações acerca das desigualdades sociais, do racismo estrutural e desigualdade de gênero da sociedade, entre outros avanços. Tais pesquisas contribuíram para proposição de políticas públicas, como a lei das cotas raciais e sociais nas IFES. Mais tarde, forneceram informações para políticas de assistência estudantil que foram responsáveis por garantir a permanência dos estudantes. Na lógica mercadológica do Future-se, esse tipo de pesquisa não merece financiamento.

    Fim da gratuidade constitucional do ensino público como alternativa implícita

     O primeiro questionamento ao projeto, diante do espírito privatizante que o informa, foi sobre a possível cobrança de mensalidade aos estudantes, que é uma alternativa que está implícita ao texto e, sobretudo, à apresentação do projeto – todas as universidades estrangeiras citadas como modelo cobram mensalidades. Diante da explícita proibição no texto constitucional (CF artigo 206, inciso IV), que garante a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais, o Future-se se apega à recente e controversa decisão do STF, que permitiu cobrança de mensalidade em curso de pós-graduação lato sensu para listar essa modalidade como uma das fontes de receitas previstas do fundo “de autonomia financeira das IFES” – (artigo 23, inciso h).

    Foi exatamente o caráter empresarial de certos cursos de pós-graduação lato sensu denominados “MBA” aplicados, oferecidos muitas vezes de forma condensada e em convênio com entidades privadas, que fundamentou a justificativa da deliberação do STF de permitir a cobrança, apesar do texto constitucional, já que seriam cursos que passariam ao largo do caráter acadêmico das pós-graduações tradicionais. Essa mesma justificativa poderia ser utilizada para cobrar mensalidades de novos cursos que buscassem se harmonizar com o espírito do Future-se, tornando-se mais atrativos para os modelos que o projeto louva como rentáveis para as parcerias público-privadas, capazes de gerar receita para engrossar o fundo financeiro, especialmente na hipótese de não se confirmar o “espírito generoso” que está sendo suposto em investidores do mercado financeiro.

     Essa cobrança, limitada no projeto aos cursos lato sensu, se configuraria como uma tática paliativa de obtenção de receitas, enquanto o governo em curso não concretiza o que já adiantou na campanha eleitoral e vem ameaçando em diversos momentos: uma proposta de emenda constitucional para instituir a cobrança de mensalidades em todos os cursos de graduação e pós-graduação das IFES. Apesar do “otimismo ingênuo” que perpassa todo o projeto, nenhum antecedente na nossa história é capaz de sustentar a hipótese de que um fundo financeiro voltado a subvencionar educação e pesquisa, num país de capitalismo dependente, possa ter viabilidade suficiente para liberar o Estado dessa obrigação, mesmo que em parte. Por mais que os ditames de mercado presidam a elaboração e aprovação de projetos nesse novo ideal, os produtos financiados não têm como obter potencial para concorrer com remuneração proporcionada pelas exorbitantes taxas de juros do mercado financeiro no Brasil. Por esses motivos não é possível afastar a hipótese de que o ensino público e gratuito, a despeito de suas atuais garantias constitucionais, está sob risco direto diante do apregoado Future-se.

    Possíveis consequências para a carreira docente e dos técnicos-administrativos das IFES

    O projeto Future-se, ao permitir por meio das Organizações Sociais a aceleração do processo de contratação de funcionários via CLT que já vinha em curso no universo das IFES – tanto pela EBSERH quanto pelas Fundações de Apoio – coloca em risco evidente não só a carreira dos servidores técnico-administrativos em educação como também a dos docentes. A percepção desse risco se assenta não só nas referências explícitas feitas no projeto (por exemplo, os funcionários das OSs são denominados “colaboradores” no inciso II do artigo V, inclusive os cedidos pelas IFES), como na conclusão implícita de que poderão ser contratados professores via OS inclusive para lecionar. A facilitação do reconhecimento do notório saber, que dispensa o título acadêmico, é proporcionada por alteração do artigo 66 da Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional) – artigo 29, nas disposições transitórias – é outro indício que incrementa essa preocupação.

    É preciso ressaltar que a facilidade na contratação de pessoal via OSs tem como contraponto a anunciada suspensão da contratação de pessoal no Executivo Federal por meio de concurso público. Essa intenção vem se coadunar com as sombrias perspectivas introduzidas pela aprovação da lei 13.429/2017, que amplia as possibilidades de terceirização, inclusive no serviço público, permitindo que se terceirize até mesmo atividade-fim. Esse processo geraria na prática a extinção lenta e gradual do RJU (Regime Jurídico Único) no âmbito das IFES, com todas as consequências nefastas de sua obliteração, como o fim da estabilidade e o consequente aumento do assédio moral e das ingerências ideológicas, político-partidárias, nepotismo e lobbies empresariais na contratação de servidores.

    Em relação ao regime de Dedicação Exclusiva, o Future-se aprofunda a descaracterização já iniciada com a permissão concedida pela lei 13.243, de janeiro de 2016, para que o docente da carreira do Magistério Federal possa exercer atividade eventual remunerada em ICT ou empresas, em assunto de sua especialidade, em desenvolvimento, pesquisa e inovação por até 8 horas semanais (ou seja, o mesmo tempo mínimo dedicado às aulas nas IFES) ou 416 horas anuais (o limite anterior era de apenas 30 horas anuais). Na prática, o docente em regime de Dedicação Exclusiva nas IFES pode ter uma atividade paralela remunerada, desde que autorizada e relativa ao seu projeto de Pesquisa e Desenvolvimento. Com o Future-se, essa atividade paralela remunerada passa a estar sob a gestão das Organizações Sociais, que, ao estimular amplamente o empreendedorismo, passam a ter todo o controle das atividades de ensino e pesquisa da Instituição e fora dela. Esse controle total se comprova, sobretudo, no inciso II do artigo 40, que estabelece que as OSs poderão “apoiar a execução de planos de ensino, extensão e pesquisa das IFES” e, no artigo 11 inciso 7, exercer “avaliação da satisfação dos alunos com os professores e disciplinas”.

    Afigura-se bastante evidente que o intenso estímulo ao empreendedorismo (como foi dito na apresentação do projeto, “vai ser o melhor emprego do mundo”) pode fazer com que essa atividade paralela, exercida no âmbito na profusão de microempresas criadas em parceria com as OSs, pode se tornar a ocupação principal do docente pertencente à carreira, em regime de Dedicação Exclusiva, em detrimento das atividades de ensino, orientação e contato com seus pares voltados à pesquisa básica, para a qual não há nenhum incentivo nesse projeto.  Emerge igualmente a possível consequência de que os projetos que não se enquadrarem nesse viés do empreendedorismo não desfrutarão da mesma projeção e espaço institucional, podendo ser considerados fora do interesse ou das metas da Organização Social responsável pela gestão – portanto, não merecedores da destinação de recursos, inclusive humanos. Tudo no Future-se aponta para a prevalência visão mercadológica das atividades de ensino e pesquisa, com critérios de avaliação estranhos ao fazer acadêmico, como diz explicitamente o inciso V do artigo 11: “adesão, no que couber, a códigos de autorregulação reconhecidos pelo mercado”. E, para que isso se efetive, o professor, como bom “empreendedor”, teria que se transformar num profissional de administração e marketing.

    “Código de ética e Conduta” –  punições para quem não se adequar

    Todo o projeto é perpassado pela não dissimulada intencionalidade punitiva para os resistentes à filosofia do empreendedorismo. Além da possibilidade de rejeição dos projetos de pesquisa que não atendam aos critérios de financiamento estabelecidos pelos gestores do fundo a ser criado, o método de cobrança é a verificação do cumprimento de metas no ritmo determinado pelos interesses de mercado da OS. É fácil concluir que a pesquisa de base e pura, que tem evolução e percurso em ritmo não facilmente mensurável pelos critérios de avaliação derivados desses interesses, seria diretamente prejudicada. Mas até mesmo uma pesquisa perfeitamente enquadrada nos parâmetros desejáveis pelo mercado pode ter uma mudança de curso e deixar de cumprir metas – nem sempre os resultados esperáveis são confirmados pela evolução de um projeto. Mesmo em casos dessa natureza poderá haver aplicação de penalidades, pois os gestores não necessariamente se orientam por critérios do meio acadêmico e estarão sujeitos à constante cobrança por resultados. Não é difícil prever a pressão psicológica e o grau de estresse que esse ambicioso plano de metas e avaliação de satisfação por parte dos clientes pode trazer aos docentes pesquisadores.

     . A garantia de aumento do controle interno e a auditoria externa das contas das IFES estão sacramentadas no projeto pelo artigo 60, inciso VI, parágrafo único. Exala do conjunto do projeto uma forte desconfiança das instâncias e mecanismos de gestão democrática estabelecidos pela própria Constituição Federal e já desenvolvidos no âmbito administrativo das IFES. O Future-se, entretanto, vai mais longe, ao prescrever no artigo 6o um “Código de ética e conduta” para todos os servidores cedidos, ainda que já estejam sujeitos aos processos administrativo-disciplinares (PAD) previstos no Regime Jurídico Único, com o objetivo de “aferir responsabilidade pelos atos praticados durante o contrato de gestão”. Aceitar a priori a aplicação desse código a servidores estáveis e sujeitos às garantias do RJU, sem que ele esteja estabelecido, desconhecendo-se, portanto, suas possíveis consequências e limites, parece ser um tiro no escuro, sem que se saiba o que se pode atingir e a extensão dos danos.

    Em caso de descumprimento de cláusulas contratuais ou da manifesta intenção da Instituição Federal em romper o contrato de gestão com uma OS, ainda que deseje se manter no Future-se, serão aplicadas penalidades, como deixa expresso o projeto de lei no artigo 3o parágrafo 3o, incisos VI e VII, e é esperado em qualquer contrato. Porém, se uma IFES, por força de deliberação de seu Conselho Superior, optar pela sua exclusão do Future-se, também serão aplicadas penalidades, como adianta o artigo 2o parágrafo 1o. Portanto, uma vez que ingresse no programa, está caracterizada cessão da autonomia administrativa garantida às Universidades pela Constituição Federal no artigo 207.  Ao assinar um contrato dessa natureza, mesmo com a aprovação do Conselho Superior, o Reitor de uma Universidade ou Instituto Federal não pode garantir que algum servidor público ou estudante da Instituição, ou suas entidades representativas, não vá reclamar na justiça seu prejuízo de direito funcional ou estudantil por não concordar com essa explícita renúncia a um princípio constitucional vigente quando de seu ingresso na Instituição. A questão que se levanta, para além dos aspectos técnicos e políticos, é a admissibilidade jurídica dessa renúncia a um princípio constitucional que é democratizante. Certamente aqui há matéria para ingresso de uma ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade) por parte das entidades que possuem essa prerrogativa.

    Consequências para os estudantes

    Para os estudantes, as consequências também serão duras, colocando mais barreiras para permanência. As severas restrições de recursos para assistência e permanência, que já estão em andamento devido ao corte feito pelo MEC no orçamento de custeio, serão ainda maiores com a desobrigação do Estado de financiamento das IFES. Podemos observar que no projeto Future-se não há sequer menção a assistência estudantil, na lógica de que “cada um corra atrás do seu”. Também é bastante previsível que haverá o enfraquecimento do apoio à pesquisa (como bolsas) nas áreas consideradas de difícil ou demorado retorno financeiro, como as Ciências Humanas. Devido à imposição de metas de produtividade, está explícito no projeto o aumento do controle e um tipo de auditoria feito pelas OS. Os estudantes das áreas não contempladas pelos interesses da perspectiva do empreendedorismo vão se deparar com fortes restrições financeiras e desinteresse da gestão em autorizar o dispêndio de tempo e instalações para seus projetos.

    As atuais atividades de extensão universitária, que completam o tripé indissociável de Ensino, Pesquisa e Extensão, certamente serão revistas para que sejam forçadas a se adequar ao espírito que informa o projeto Future-se. Assim, as atividades marcadas pela interação com os movimentos sociais, por não serem rentáveis e gerarem custos (na concepção liberal), estarão na mira imediata da tesoura das OSs. Está claro que não há lugar para projetos de extensão cuja natureza se oponha ao seu sentido material e ideológico geral, do governo e do mercado. A função social das Universidades não é um princípio contemplado por esse projeto, a despeito dos resultados auspiciosos dessa linha de atuação e da grande atratividade para o conjunto dos estudantes.

    Como consequência óbvia da transferência da gestão das IFES do Conselho Superior, onde a representação estudantil tem paridade, para as OSs, haverá o reforço do autoritarismo em relação aos estudantes. A própria estrutura geral das IFES se tornará mais autoritária e decisões advindas de uma gestão tipo empresarial de OS potencializarão isso.

    Assim, parecem bastante razoáveis os temores de que haja prejuízo na formação técnica, pedagógica e humana, na medida em que todo o enfoque principal do projeto, das falas do Ministro e de outros dirigentes do MEC tem sido no sentido de simplificação do ensino, inclusive aplicando a recente ampliação do percentual de ensino a distância (EAD). O objetivo propalado é a formação de uma mão de obra técnica simplificada e que atenda aos ditames de uma exploração que produza resultados práticos para o capital, de modo disciplinado e acrítico, privilegiando os estudantes de “boa conduta”. O coroamento dessa visão está no artigo 44 do projeto: “Fica instituído o Dia Nacional do Estudante Empreendedor, a ser comemorado no primeiro sábado depois do dia do trabalhador”.

    O projeto formalmente é omisso quanto às políticas de cotas. Mas, considerando que estas requerem políticas de permanência para sua efetividade, e como tende a haver cortes ainda maiores nas verbas para a assistência estudantil, certamente o projeto acabará de fato se tornando um ataque significante às cotas.

    O inciso VII do artigo 14 preconiza como um dos objetivos das IFES contratantes a obrigação de “promover ações de empregabilidade para os alunos das instituições”. Mas não há qualquer indicação de como isso será possível no âmbito das áreas não contempladas pelo espírito empreendedor, como as Ciências Humanas. A intenção parece estar toda voltada para a criação de polos tecnológicos, incubadoras de microempresas e parcerias público-privadas voltadas ao desenvolvimento de produtos de Inovação. Há implícita desvalorização dos cursos e diplomas obtidos nas demais áreas do conhecimento que não contemplam esse tipo de pesquisa.

    Como já alertamos, apesar de não estar presente explicitamente no projeto e ser inconstitucional, o projeto abre espaço para uma futura introdução do pagamento de mensalidades também nos cursos de graduação. Nos cursos de pós-graduação lato sensu a cobrança de matrícula e mensalidades está listada como uma das receitas do fundo de financiamento.  Não por acaso, esta intenção tem sido vocalizada por diversos membros do bloco governante.

    Uma possível consequência para o Movimento Estudantil (ME) é a tentativa de sufocamento de suas potencialidades.  Afinal, os alunos que terão acesso aos recursos são os de “boa conduta”. Para esse governo qualquer ato de resistência é criminalizado, portanto, fora da boa conduta. Além disso, dentro de uma lógica mercadológica e autoritária certamente haverá restrições ao uso de espaços físicos e circulação dos estudantes. E tendo em vista que tudo que é contrário ao governo é considerado como “balbúrdia”, o ME será criminalizado e perseguido, numa tentativa de extingui-lo.

    Para coroar a perspectiva fortemente autoritária no que diz respeito à relação com os estudantes, no final da apresentação do projeto em Brasília o Secretário da SESU diz para o presidente da UNE – que havia feito uma intervenção não prevista no início da apresentação e chamado a ficar na primeira fila – que, já que teria “se comportado bem” durante a exposição,  seria depois recebido pelo MEC. Definitivamente, essa atitude não guarda qualquer semelhança com a atitude respeitosa de parceria e participação conquistada pelo movimento estudantil na gestão democrática e paritária estabelecida na maioria das IFES.

    Enfim, o Future-se representará um processo de reversão da política de expansão das Universidades e Institutos Federais e das políticas de inclusão, atingindo tanto os estudantes que já estão nas IFES como aqueles que lutam para ingressar.

    O Marketing para melhor vender o projeto

    Na promoção do seu “produto”, especialmente na apresentação de lançamento feita aos reitores, o MEC se aproveita de várias situações já existentes nas Universidades para gerar confusão, dando a ideia que seu projeto se baseia em “boas práticas” já existentes. Tanto se refere a alguns casos que deram certo (como o do uso da energia solar em algumas unidades) quanto reivindica o modelo de ações de viés privatizante que foram iniciadas em gestões petistas no governo federal, como a EBSERH, que é um mau exemplo de privatização de fato dos hospitais universitários, cuja gestão foi entregue às OSs no governo Dilma Rousseff. A adesão à EBSERH também foi apresentada como voluntária, mas a pressão sobre as Universidades foi imensa, e já estão disponíveis pesquisas que apontam para precarização das/os trabalhadoras/es. A apresentação no MEC e o vídeo de propaganda do projeto usam esses casos como gancho para generalizar o atual projeto globalmente privatizante e desestruturante da Universidade pública.

     Mesmo na comparação com o modelo antecedente da EBSERH, tanto citado como precursor, haverá uma profunda radicalização da privatização por dois elementos fundamentais: agora a gestão da Organização Social contratada envolve também ensino e pesquisa, e os hospitais universitários ficariam não somente abertos ao SUS, como também para pacientes privados e clientes de planos de saúde. Essa chamada “dupla entrada” acaba provocando diferenças de qualidade no atendimento dentro dos próprios hospitais públicos.

    Ações interessantes que já existem em algumas universidades, como projetos que geram economia de recursos e menos poluição, como reutilização de água e uso de energia solar, são alguns exemplos que aparecem na propaganda do Future-se, mas não têm nada a ver com o conjunto do novo projeto. São ações que podem e devem ser incentivadas, mas não precisam do conjunto do projeto, pois podem continuar a serem geridas como projetos das IFES, servindo ao desenvolvimento da Universidade e coroando o esforço em pesquisa de seu corpo docente, técnico e discente.

    A propaganda do Future-se incorpora também o fato de que nos campi de algumas universidades já existem marcas de empresas que formaram parcerias em alguns projetos internamente – como é o caso da Petrobras na UFBA e na UFRJ e o polo tecnológico instalado em parcerias público-privadas no campus Ilha do Fundão da UFRJ, com contrapartida financeira por parte das empresas, ou a existência de incubadoras de microempresas. Além de serem experiências que precisam passar por uma avaliação crítica, essas ações já são permitidas pelo Marco Legal vigente da Ciência e Tecnologia para Pesquisa & Inovação (de 2016), prescindindo, portanto, de um projeto como o Future-se.

    A apresentação do MEC manipula as situações, afirmando que, ao aderir ao programa e contratar uma OS para administrar a IFES, “O Reitor ficaria livre” para tratar do ensino e pesquisa, deixando a parte de gestão administrativa para profissionais especializados na lógica empresarial. Na prática, o que ocorrerá é que o Reitor e o Conselho Universitário, ao perder o controle financeiro e de gestão de boa parte do pessoal, cedido às OSs para administração e mesmo ensino e pesquisa, perderiam todo o controle sobre a instituição. O Reitor eleito se tornaria efetivamente um cargo honorífico.

    A grande e sedutora promessa é de que todos os professores “que se harmonizarem ao Future-se” vão se transformar em empreendedores e ficar ricos. É um chamariz material que tem forte repercussão e incentivo ideológico ao esforço e ao investimento e liberdade de empreendedorismo. No seu discurso para os estudantes, utiliza-se também do alto índice de desemprego entre os portadores de graduação para vender a miragem do emprego de empreendedor a partir da criatividade individual. Esse discurso mascara o cerne do projeto, que é o desmanche da universidade pública, gratuita e de qualidade.

    Uma proposta que tem condições de polarizar um setor da “comunidade” das IFES

    Apesar de ser um projeto desastroso de ruptura profunda e regressiva do acúmulo histórico da universidade pública, ele tem condições de ganhar uma parte da comunidade acadêmica. Como vimos, o projeto foi apresentado, no anúncio formal para os reitores, como um grande projeto de marketing que interessaria a todos porque “Todos vão enriquecer”.

    Dentro do atual quadro de servidores, já existem professores/pesquisadores que atuam nessa perspectiva liberal e privatista, que querem mais facilidade para parcerias com o setor privado, para a realização de cursos extras (especialmente de pós-graduação lato senso) e de outras fontes de renda além do salário e bolsas institucionais. É também, mesmo que de modo menos aberto, o caso do EBSERH e de outras parcerias já existentes com a iniciativa privada. O mesmo ocorre entre os estudantes e tem potencial de desenvolvimento em parte de servidores técnicos e administrativos.

     Além disso, contam com clima político e ideológico mais favorável a investimentos privados presente na sociedade neste momento, e mesmo com discursos e experiências já praticadas por governos petistas em nível federal e nos estaduais ainda existentes, tanto na área de educação como de saúde. Esses grupos mais afinados com a linha do projeto tendem a se organizar e tentar se fortalecer para disputar a perspectiva do MEC dentro das IFES e na sociedade, buscando a aprovação da adesão de suas Instituições e Unidades ao projeto.

    O Ministro da Educação não esconde a intenção de intervir autoritariamente nas Universidades com os instrumentos administrativos à disposição, como portarias e instruções normativas que provoquem alteração na correlação de forças, como a nomeação de reitores e pró-reitores sem apoio na maioria da comunidade acadêmica das IFES. Pode haver a tentativa de atropelar Conselhos Universitários onde existam resistências, até mesmo contra reitores que resolverem aderir, mas não tenham maioria nessas instâncias. Como exemplo, o governo já se decidiu pela escolha de pró-reitores diretamente pelo MEC, por fora das indicações dos reitores.

    O projeto do MEC, por mais precário e sem fundamentos de viabilidade que seja, não é aleatório nem “irracional”. Insere-se no conjunto da obra do governo Bolsonaro. Um governo marcado por ações que podemos chamar de idiotas ou mesmo criminosas, e que parece caótico, mas não é, pois é coerente com o conjunto de sua política. Um governo que ataca os direitos do povo em todos os âmbitos, especialmente dos trabalhadores e trabalhadoras na sua diversidade negra, feminina e jovem. Um governo antinacional, ultraliberal e privatista na política econômica, na política social e nas políticas públicas em geral. Que, explicitamente, nas palavras do Ministro da Economia, pretende privatizar todas(!) as empresas estatais e incentivar a venda de empresas privadas nacionais ao capital estrangeiro. Um governo antidemocrático, autoritário, que criminaliza os movimentos sociais, o movimento estudantil, a esquerda e tudo que pareça esquerda, mesmo quando não é. Um governo racista, homofóbico, machista, que pretende fazer vistas grossas ao trabalho análogo à escravidão e que reforça todas as opressões existentes. Obscurantista, que tem membros que acreditam que a Terra é plana, que rejeita cinicamente qualquer informação de caráter técnico e científico que conteste seus objetivos ideológicos e que nutre um profundo preconceito com intelectuais e artistas que tenham um mínimo de visão crítica. Que é destrutivo do patrimônio cultural de nosso povo, do meio ambiente, dos territórios indígenas e quilombolas. Enfim, um governo que tem dentro de si um núcleo marcado pelas concepções e práticas do neofascismo encarnadas pelo próprio presidente. Um neofascismo sui generis, adequado ao capitalismo dependente liberal periférico, onde o patriotismo é retórico e o verde e amarelo é apenas um verniz que encobre um entreguismo mais subserviente.

    Não podemos nos esquecer de que o projeto Future-se se potencializa simbioticamente com um conjunto de outras medidas que já têm sido tomadas, como corte radical de verbas para a educação em geral e o ensino superior em particular; desrespeito à indicação de reitores pela ordem definida nas consultas; censuras de diversos tipos; desqualificação pública sistemática da universidade pública, da pesquisa científica, da ciência em geral e de órgãos oficiais de pesquisa como o INPE e o IBGE; da ofensiva conservadora através da proposta da “escola sem partido”; e intromissão policial e do Ministério Público no âmbito universitário, com abertura de inquéritos arbitrários etc.

    Nesse sentido, esse projeto é mais uma manifestação dessa tragédia, que se soma coerentemente à reforma da Previdência, à reforma trabalhista, aos cortes de verbas das políticas públicas sociais, ao estado arbitrário com um aparelho jurídico coercitivo profundamente manipulado política e ideologicamente, à estripação da Petrobras e outras privatizações, à desnacionalização da Embraer, à cessão da base militar de Alcântara (Maranhão) aos EUA, ao acordo de livre comércio com a União Europeia e à destruição da Amazônia. E, é claro, está inserido dentro da ofensiva liberal e conservadora do capital, que, diante da crise mundial do capitalismo, procura realizar maiores lucros a partir do recrudescimento da superexploração do trabalho e do saque às riquezas acumuladas, especialmente na periferia.

    O viés e a essência ideológica do projeto

    Do ponto de vista ideológico, o projeto pretende uma profunda mudança na cultura acadêmica. Como sabemos, a cultura tem uma base material. Numa sociedade capitalista a cultura predominante é burguesa e a universidade pública não é uma ilha isenta e livre da ideologia burguesa, que já é predominante dentro dela. Mas não chega a ter a radicalidade existente no mercado e permite um certo grau de liberdade e pluralismo no ensino, na pesquisa e na extensão. São admitidas práticas solidárias, uma resistência ao ultraliberalismo e ao fundamentalismo conservador e, mesmo que minoritariamente, um pensamento crítico radical ou mais ou menos radical.  

    O projeto de MEC é enganoso. O regime de funcionamento das IFES é de autonomia acadêmica, administrativa e de gestão financeira, com financiamento público. A ênfase do projeto do MEC é na autonomia financeira das IFES, que devem buscar recursos em fontes privadas. Ao fazer isso, reforça a perspectiva ideológica liberal e, ao menos em parte, conservadora, de duas maneiras. Submete o financiamento e, portanto, o funcionamento da universidade aos interesses materiais e à perspectiva ideológica das empresas. Ao mesmo tempo, na medida em que vai enfraquecer os espaços da autonomia política das IFES, visa fortalecer o autoritarismo e uma cultura autoritária. E, com base no autoritarismo, haverá um reforço do conservadorismo inclusive no seu viés mais fundamentalista.

    A gestão via OS também vai reforçar a cultura liberal de mercado e o autoritarismo. Assim, em seu conjunto, favorece aqueles que têm uma perspectiva mais identificada com um governo ultraneoliberal na economia e conservador nos costumes. Procura forçar os demais a se adequarem a métodos privatistas e autoritários, assim como a conteúdos de pesquisa com melhor possibilidade de aprovação por esse sistema.

    Além disso, o sistema vai reforçar ainda mais um clima de competição individualista em cinco níveis. Pela renda pessoal dos professores/pesquisadores, que serão pressionados a buscar outras fontes de renda além do salário normal arrochado e terão que recrudescer uma competição entre eles. Dos grupos de pesquisa entre si pelos recursos. Na mesma lógica, também das IFES entre si e das unidades internas dentro de cada IFES. E também entre os estudantes, já que “os melhores, com notas melhores” nas avaliações e de “boa conduta” serão premiados. Claramente, haverá maior interferência liberal e conservadora e controle da formação ideológica dos estudantes.

    Finalmente, as contratações de professores feitas pelas OS, por métodos menos democráticos e transparentes que os concursos públicos também vão reforçar as escolhas ideológicas num viés liberal e conservador. Efetivamente, o projeto visa construir uma nova cultura política dentro das IFES, ainda mais burguesa, individualista e liberal na visão de Estado e economia, com maior presença conservadora em termos sociais.

    Sendo assim, esse projeto, mesmo parecendo meio caótico, não é um fato isolado. Ele se insere num esforço político para reforçar ainda mais a hegemonia burguesa, que já vinha se fortalecendo há mais de uma década, tanto do ponto de vista material como ideológico, na economia, no estado e na sociedade.

    A resistência está sendo construída

    Entretanto já se arma a resistência a essa hecatombe representada pelo Future-se. Algumas universidades já o analisaram e, por meio de seus Conselhos Universitários, deliberaram pela rejeição. A comunidade acadêmica e as entidades representativas das categorias de docentes, servidores técnico-administrativos e do movimento estudantil já estão em movimento em defesa das Universidades e Institutos Federais, para que se preserve sua atual natureza pública, gratuita e socialmente referenciada. Intensifica-se a luta em defesa das IFES, que são patrimônio do povo brasileiro como espaço privilegiado de construção do saber e avanço cientifico e tecnológico reconhecidos, com ênfase em seu notável capital humano altamente especializado. Já está havendo luta, dando seguimento ao que ocorreu no primeiro semestre deste ano, quando foram feitas grandes manifestações e uma vitoriosa Greve Nacional da Educação.

    É dado conhecido, embora omitido pelo atual governo entreguista, que as Universidades públicas, mesmo representando apenas 12% do total das escolas de nível superior no Brasil, realizam 95% da pesquisa básica e aplicada do país, com espetacular reconhecimento e excelência em rankings nacionais e internacionais, em diversas áreas do conhecimento. Cabe ressaltar também o avanço tanto na democratização da gestão quanto no acesso de estudantes negros e pobres, muitas vezes os primeiros de suas famílias a conseguirem o ingresso em uma Universidade.

    É fato que podem ser apontados em algumas das IFES problemas pontuais de gestão, reforçados pelos diversos cortes de verbas feitos por vários governos. Também está presente a inevitável visão tecnicista e produtivista que impregna a produção do conhecimento em nossos tempos, reforçada pela situação de capitalismo dependente liberal periférico – da qual a corrida estressante pelos pontos do currículo Lattes é um exemplo. Apesar disso, as Instituições Federais de Ensino Superior representam uma riqueza pública a ser preservada da sanha destrutiva, entreguista e cínica do governo Bolsonaro. Estando sob o duplo garrote da escorchante Emenda Constitucional 95 do governo Temer, que congelou no nível de 2016 as verbas públicas já reduzidas para as áreas sociais, e dos recentes cortes de 30% na verba de custeio, as Universidades e Institutos Federais têm diante de si uma luta de vida ou morte pela sobrevivência. Resistiremos em luta; essa é a tarefa que está colocada aos movimentos estudantil e sindical, à comunidade acadêmica e à sociedade brasileira.

    * Jorge Almeida é professor Associado do Departamento de Ciência Política e do PPG de Ciências Sociais da UFBA.

    * Magda Furtado é professora Titular do Departamento de Língua Portuguesa e Literaturas do Colégio Pedro II (IF), membro da Direção Nacional do SINASEFE e da Executiva Nacional da CSP-Conlutas.

    * Rafaela Cardoso, militante da Juventude Pajeú, licenciada e bacharelanda em História pela UFBA.

  • Observatório da Democracia: Relatório sobre Mundo do Trabalho – julho/2019

    Observatório da Democracia: Relatório sobre Mundo do Trabalho – julho/2019

    Observatório da Democracia:
    Relatório sobre Mundo do
    Trabalho – julho/2019

    Alterações nas regras de “pensão por morte”
    na proposta de Reforma da Previdência

    Fatos relevantes Se aprovada a Reforma da Previdência (o texto base foi aprovado em primeiro turno pelo plenário da Câmara dos Deputados), o valor da pensão por morte será reduzido.

    – A Reforma prevê também cortes no pagamento em caso de “acúmulo de benefícios” (pensão mais aposentadoria, por exemplo). Quem hoje é pensionista e, no futuro, venha a se aposentar ou vice-versa será atingido. O benefício de menor valor sofrerá desconto considerável.

    – Cabe destacar que o plenário da Câmara rejeitou, por 328 votos a 156, o destaque do PT (Partidodos Trabalhadores) que pretendia excluir do texto da Reforma as alterações nas regras de cálculo dapensão por morte.

    – O Brasil tem hoje 7,7 milhões de pensionistas por morte no INSS, incluindo viúvos e viúvas(homens e mulheres) e dependentes.

    – As regras para concessão do benefício são as mesmas para homens e mulheres – ou seja, os maridos também têm o direito de receber pensão por morte de esposa. Entretanto, estima-se que mais de 60% dos beneficiários da pensão por morte são pessoas do sexo feminino.

    – O Ministério da Economia divulgou os dados estatísticos dos pagamentos previdenciários do ano de 2017 (os dados de 2000 a 2016 também estão disponíveis). Os dados podem ser acessados por município (através do link http://www.previdencia.gov.br/dados-abertos/estatisticas-municipais-2000-a-2016/). No relatório divulgado, é possível consultar a população do município, a quantidade geral de beneficiários do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), a quantidade de beneficiários específicos da pensão por morte, além de outros dados acerca da aposentadoria, seja por invalidez ou por tempo de contribuição. Os dados divulgados evidenciam o fato de que a pensão por morte é um mecanismo importante de proteção social que alcança milhões de brasileiros de todas as regiões do país, inclusive das pequenas cidades. A alteração nas regras do pagamento de pensão por morte afetará a economia nacional, a economia local das cidades e pequenos municípios e a organização familiar de milhões de pessoas ao redor do país.

    Dados de 2017 – do ano mais recente disponível:

    Região Norte: Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará, Amapá e Tocantins

    Pensões por morte: 345.359.

    Total de benefícios previdenciários (incluindo aposentadorias por invalidez e tempo de contribuição + pensionistas): 1.376.323.

    25,09% dos beneficiários previdenciários da região recebem pensão por morte.

    Região Nordeste: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe,Bahia

    Pensões por morte: 2.006.618.

    Total de benefícios previdenciários (incluindo aposentadorias por invalidez e tempo de contribuição + pensionistas): 7.749.483.

    25,89% dos beneficiários previdenciários da região recebem pensão por morte.

    Região Sudeste: Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo

    Pensões por morte: 3.623.608.

    Total de benefícios previdenciários (incluindo aposentadorias por invalidez e tempo de contribuição + pensionistas): 13.546.342.

    26,74% dos beneficiários previdenciários da região recebem pensão por morte.

    Região Sul: Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul

    Pensões por morte: 1.368. 913.

    Total de benefícios previdenciários (incluindo aposentadorias por invalidez e tempo de contribuição + pensionistas): 5.561.628.

    24,61% dos beneficiários previdenciários da região recebem pensão por morte.

    Região Centro-Oeste: Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Distrito Federal

    Pensões por morte: 442.766.

    Total de benefícios previdenciários (incluindo aposentadorias por invalidez e tempo de contribuição + pensionistas): 1.571.188.

    28,18% dos beneficiários previdenciários da região recebem pensão por morte.

    Total: Pensões por morte: 7.787.264.

    Benefícios previdenciários: 29.804.964.

    26,12% dos beneficiários previdenciários do país recebem pensão por morte.

    Os dados divulgados pelo Ministério da Economia informam a quantidade total de beneficiários previdenciários por município, por estado e por região, e também descreve a qualidade do benefício: aposentadoria por idade, aposentadoria por invalidez, aposentadoria por tempo de contribuição, pensões por morte, auxílios e demais benefícios (o total de cada uma dessas qualidades). No presente relatório, apresentamos o total de beneficiários previdenciários por região(números brutos) e a quantidade de pensões por morte também por região. Por fim, apresentamos o equivalente percentual das pensões de morte com relação aos beneficiários totais da previdência social. O Ministério da Economia não informou os dados por gênero, diferenciando a quantidade de beneficiários homens e mulheres, como também não informou a renda média das pensões por morte no país. Contudo, é possível compreender o cálculo e a composição da pensão por morte e até simulá-la.

    Medidas do governo

    – A MP 871 de 2019 limita a pensão por morte do INSS. Os segurados do INSS que vivem em união estável terão mais dificuldades para conseguir a pensão por morte nas agências da Previdência. O motivo são as novas exigências impostas pela lei 13.846, derivada da medida provisória 871. A principal delas diz respeito aos documentos que comprovem a união estável, que devem ser de até 24 meses antes da morte do segurado.

    – Para além da MP 871, a proposta de Reforma da Previdência de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes também propõe modificações substanciais no quesito pensão por morte. Hoje, ela é de 100% para segurados do INSS, respeitando o teto de R$5.839,45. Para os servidores públicos, além deste percentual, o segurado recebe 70% da parcela que superar o teto. Com as mudanças, o valor parte de apenas 50%, aumentando em 10% para cada dependente, o que não faz muito sentido, dado que idosos raramente têm filhos menores de idade.

    – Para ilustrar as modificações, pensemos no seguinte caso, descrito por Antonio Tuccílio, Presidente da Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP): o segurado idoso recebe R$2 mil de aposentadoria. Ele morre, deixando viúva, também idosa, sem capacidade ou potência de trabalho. Ela não tem filhos com até 18 anos que lhe proporcione acréscimos de 10% na pensão. Ou seja, ela passará a receber apenas metade do valor (R$ 1 mil). Com esse valor, ela precisará pagar alimentação, contas básicas (água, luz, telefone, gás), além do convênio médico, que costuma ser o item mais caro nos gastos dos idosos, não obstante a existência do importantíssimo Sistema Único de Saúde (SUS). É importante ressaltar, pois, que as despesas ordinárias (da ordem do dia,cotidianas) permaneceriam praticamente as mesmas com a morte do marido: a despesa com aluguel ou moradia, por exemplo, permaneceria idêntica, afetando negativamente o orçamento da viúva. O mesmo aconteceria com despesas fundamentais como alimentação, saúde, vestimenta, que sofreriam alterações mínimas. Portanto, para além da perda afetiva, haveria neste caso uma perda econômica considerável: a renda da viúva baixaria muito mais do que as despesas, seu poder de consumo seria drasticamente reduzido, faltaria dinheiro para as contas básicas, justamente numa faixa da existência em que a pessoa necessita de maior proteção social, inclusive (e sobretudo) por parte do Estado.

    – Outro ponto crítico diz respeito ao acúmulo de pensões. Após a reforma, não será mais permitido acumular pensão por morte e aposentadoria de forma integral. Será mantido o benefício de maior valor, e o outro será limitado a determinado percentual, conforme a soma dos valores. Quanto maior a soma dos benefícios, maior será este limite: 80% até 1 salário mínimo; 60% entre 1 e 2 salários mínimos; 40% entre 2 e 3 salários mínimos; 20% entre 3 e 4 salários mínimos; e zero acima de 4 salários mínimos.

    – Um outro exemplo foi dado, desta vez pela reportagem do jornal O Globo, utilizando como referência o valor do teto de aposentadoria. Um casal na faixa etária de 60 anos, sem filhos menores, recebendo cada um R$ 5.839,45, que é o teto do INSS, veria sua renda familiar cair em caso de morte de um dos cônjuges. O viúvo ou viúva manteria sua aposentadoria, mas o segundo benefício, no caso a pensão, seria de apenas R$1.898,32. Para este viúvo ou viúva, a pensão seria reduzida para 60% do valor do benefício pela regra da reforma que acaba com a pensão integral.

    – Hoje, a legislação brasileira considera dependentes com direito à pensão integral “o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave”. Com a reforma, o texto mantém inalterado o benefício a pessoas com deficiência e recalcula para os demais.

    – Com a nova regra, o valor do benefício poderá ser inferior a um salário mínimo, hoje em R$998,00. O benefício, no entanto, não poderá ser menor do que 1 salário mínimo se for a única fonte de renda do dependente.

    – Ainda segundo Tuccílio, não é inútil lembrar que pensão e aposentadoria são direitos distintos, de acordo com os artigos 226 e 227 da Constituição Federal. “Na ânsia por economizar, a equipe do ministro Paulo Guedes se esquece de considerar a lei fundamental e suprema do Brasil”.

    Análise crítica

    Pode-se concluir, pelos dados abertos pelo Ministério da Economia, que pelo menos 25%dos beneficiários previdenciários de todas as regiões do país referem-se à pensão por morte. As mulheres são as mais afetadas por este importante direito previdenciário que sofrerá mudanças coma Reforma da Previdência, se aprovada. 26,41% dos benefícios previdenciários no Brasil são por motivo de pensão de morte.

    As mudanças no cálculo da pensão de morte afetarão toda a população, mas especialmente os idosos. De acordo com a proposta de Reforma, não será mais possível conciliar integralmente a aposentadoria com a pensão por morte. Tal medida diminuirá a renda média do brasileiro e a seguridade social da classe trabalhadora e do povo empobrecido de nosso país.

    Um detalhe importante é que a média de concessão do benefício por região é muito semelhante, gira em torno de 25% e 28%. Com esses dados, é possível contrapor os discursos xenófobos internos que associam as regiões menos desenvolvidas economicamente com as políticas de assistência social no país. O percentual de beneficiários de pensão por morte no Sudeste, por exemplo, é semelhante ao do Nordeste ou do Norte do país. A pensão por morte, portanto, é um direito previdenciário garantido pela Constituição que atende um contingente enorme de pessoas em todo o país, independentemente da região.

    A assessoria de imprensa do Senado Federal divulgou uma reportagem comentando um caso concreto de pensão de morte que seria afetado pela Reforma da Previdência (o título da reportagem é Reforma da Previdência reduz valor de pensão por morte e aposentadoria por invalidez, data de 13 de maio de 2019). A maquiadora Michelle Peres Gomes, 33 anos, moradora de Valparaíso de Goiás (GO), tem direito a pensão pela morte do marido, causada pela infecção por hantavírus em 2017. Ele trabalhava como vigilante e ela agora recebe R$ 1,9 mil para cobrir as despesas com os dois filhos do casal, de 12 e 8 anos. Como se vê, trata-se de uma renda modesta,que dialoga com a média geral da população brasileira e da classe trabalhadora. O dinheiro é usado principalmente no transporte deles para a escola e na compra de roupas, além de pagar as contas de luz, água e condomínio. – A pensão é fundamental. Eu dependo dela para quase tudo, sem ela nem tinha como sobreviver. Só que até para a alimentação, ou para a escolinha de futebol dos meninos,eu tenho que pagar por fora, com o dinheiro do meu trabalho – explica.

    Assim como Michelle, milhões de pessoas no Brasil dependem da pensão por morte para sustentar a família. Atualmente o valor do benefício equivale a 100% da aposentadoria recebida pelo segurado ou ao valor a que teria direito se fosse aposentado por invalidez. Se houver mais de um dependente, a pensão é dividida entre eles. Se a Reforma da Previdência for aprovada sem alterações nesse quesito, haverá novas regras no pagamento do benefício para dependentes de servidores públicos, do Regime Próprio de Previdência Privada (RPS), e trabalhadores da iniciativa privada, do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), administrado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

    Conforme argumenta o presidente da Confederação Nacional dos Servidores Públicos,Antonio Tuccílio, “a equipe econômica não leva em conta, como já é de costume, os aspectos sociais envolvidos”. Por fim, ele interroga: de que vale uma reforma da Previdência que supostamente visa o equilíbrio fiscal se esta influencia diretamente para que idosos e pobres passem por problemas financeiros, logo quando mais precisam estar amparados?

    Acesso o Observatório da Democracia: www.observatoriodademocracia.org.br

  • É possível uma contrarrevolução social sem a destruição das liberdades?

    É possível uma contrarrevolução social sem a destruição das liberdades?

    É possível uma
    contrarrevolução
    social sem a destruição
    das liberdades?

    Por Valerio Arcary

    Devemos nos colocar esta dúvida de mente aberta. Ela é um problema histórico. Problemas históricos são encruzihadas para as quais ainda não temos respostas. O que não diminui a importância da questão estratégica.

    No início dos anos oitenta não era claro se seria ou não possível uma estabilidade longeva para um regime democrático-liberal no Brasil. Entre 1979 e 1984, entre as greves “selvagens” de metalúrgicos, construção civil, professores, bancários e petroleiros, invariavelmente, ilegais, o Congresso de reconstrução da UNE, também, proibido, e as Diretas Já, a questão do que nos esperava, quando chegasse a hora do fim da ditadura, era central. Tivemos que lutar, duramente, por cinco anos. Cinco longos anos. 

    A tradição marxista revolucionária, herdeira da elaboração teórica da III Internacional sugeria que democracias burguesas duradouras só eram sustentáveis nos países centrais. Porque nas metrópoles imperialistas eram possíveis, mesmo se transitórios, pactos sociais com concessões reformistas para as massas trabalhadoras, em função da espoliação no mundo periférico. Nos países dependentes previa-se que  regimes democrático-eleitorais seriam improváveis. 

    Trinta e cinco anos depois sabemos a resposta. Era possível. Entre outros muitos fatores, sabemos que a construção da rede de seguridade social, através das conquistas consagradas na Constituição de 1988, favoreceu uma gradual redução da pobreza extrema, e um lento processo de distribuição de renda. Semana passada a unidade burguesa garantiu uma imensa maioria na Câmara dos Deputados, e aprovou a reforma da previdência.

    O objetivo estratégico do governo Bolsonaro é destruir todas as conquistas dos últimas três décadas. Eles dizem sem pudor que o custo da estabilidade do regime democrático ficou alto demais. Ficou caro demais. Direitos demais. Salário mínimo, carteira assinada, aposentadoria, saúde pública e universal, universalidade crescente do acesso à educação, subsídios para o transporte publico, tudo teria ficado caro demais. Enfim, impostos altos demais. Não escondem a quem servem. Os capitalistas, os fazendeiros, os patrões são apresentados como vítimas.

    A extrema-direita chegou ao governo, e está em luta pelo poder. Nesta luta pelo poder ambiciona a subversão do regime, ou do equilíbrio de poder entre as instituições. A ofensiva pela reforma da previdência foi uma primeira etapa de um programa de contrarrevolução econômico-social que pretende garantir privatizações, reforma fiscal, reforma do serviço publico, e muito mais.

    O que nos coloca diante, outra vez, da questão estratégica. Será possível levar adiante um programa de recolonização do Brasil sem destruir as liberdades democráticas? Não sabemos a resposta. Mas é bom saber que o perigo de uma contrarrevolução política existe, e é real. O perigo de uma derrota histórica. 

    Mas não há porque esmorecer. Nossa luta será uma maratona. Ela exige paciência e firmeza. E coragem e honestidade intelectual para aprender as lições. Derrotas devem ser chamadas pelo que são. O auto-engano é um mundo de ilusão e alimenta, perigosamente, o pensamento mágico e teorias da conspiração. Claro que dizer que fomos derrotados porque nossos inimigos venceram, também, não explica nada.

    Derrotas nos deixam mais frágeis. Derrotas são muito amargas. Sim, a situação é ainda muito ruim, reacionária. Mas muita calma nessa hora. Porque a aprovação da Reforma da Previdência era previsível desde o início do ano.

    O que nos deve surpreender é que não foi aprovada sem luta. Houve uma luta importante, insuficiente para derrotar o governo Bolsonaro e deter a maioria reacionária que domina a Câmara dos Deputados. Mas houve luta sindical e popular: os dias 15 e 30 de maio e o dia de greve nacional em 14 de junho. O que teria sido desmoralizador seria uma aprovação sem resistência. O campo da oposição de esquerda foi capaz de construir uma Frente Única e realizar corajosas mobilizações.

    Para derrotar esta Reforma teria sido necessário uma mobilização em uma escala muito superior. Esse patamar, simplesmente, ainda não era possível. Não existe essa disposição de luta entre as massas trabalhadoras. Sim, não reunimos ontem centenas de milhares em frente ao Congresso. A capital foi para Brasília, justamente, para ficar a mil milímetros dos grandes centros.

    Claro que foi uma capitulação absurda o apoio de governadores do PT a uma reforma da Previdência com descontos. Muito mais grave é lembrar que tanto o governo Lula quanto Dilma Rousseff martelaram a cabeça de milhões durante treze anos defendendo que uma reforma da previdência era incontornável. Tudo isso é certo.

    Mas não foi isso que explica, essencialmente, a votação da semana passada. Eles ganharam porque a força conta mais que os argumentos, e nossos inimigos estão em uma posição de força superior à nossa. Ganharam porque estamos experimentando derrotas desde 2014/15/16. E as derrotas pesam na cabeça das pessoas. Por isso inda duvidam na hora de resistir, custe o que custar.

    A votação da semana passada na Câmara dos Deputados confirma que tanto a tática quietista, ou alemã, pela referência na social democracia de Kautsky, que vê um Bolsonaro imbatível e aposta na espera das eleições, desconsiderando as possibilidades das mobilizações na escala de centenas de milhares, quanto a tática da ofensiva, ou húngara, pela referência em Bela Kun e a ultraesquerda da III Internacional, que desconsidera a força do governo Bolsonaro, e exagera as forças da resistência estão ambas equivocadas.

    A tática do desgaste, ou russa e italiana, porque defendida por Lenin, Trotsky e Gramsci, depois de 1921, compreende que em uma situação defensiva, quando as derrotas pesam na consciência de milhões, semeando a insegurança, a desilusão, ou o desespero, a resistência é vital para tentar manter posições, e favorecer a acumulação de forças. Impulsionar a Frente Única é ainda, nesta conjuntura, o melhor caminho.

    A derrota de 2018 não foi uma derrota histórica, mas não foi, somente, uma derrota eleitoral. Foi muito mais grave. Agora estamos diante das consequências. Ainda estamos na defensiva. A relação social e política de forças ainda é desfavorável. Teorias da conspiração que atribuem, com ligeireza infantil, a culpa pela derrota de hoje a forças malignas que teriam super poderes para fazer a greve geral, e derrubar o governo são puro pensamento mágico.

    Paciência e firmeza. As lutas decisivas não são aquelas que ficaram para trás. As lutas decisivas estão à nossa frente. Quanto tempo, e quantas lutas serão necessárias até a inversão da relação de forças? Não sabemos. Mas sabemos que Bolsonaro será derrotado, mais cedo do que tarde. A maré vai mudar. Não há porque esmorecer.

  • Presidente da FLCMF responde insanidade do presidente da República

    Presidente da FLCMF responde insanidade do presidente da República

    Presidente da FLCMF responde insanidade do presidente da República

    Depois das últimas declarações desastrosas do presidente da República, Jair Bolsonaro, em que “tira sarro” dos milhares de lutadores mortos, perseguidos e torturados durante a Ditadura Militar no Brasil, o presidente da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco (FLCMF), Francisvaldo Mendes, resolveu dar a sua resposta à toda essa insanidade. 

  • A luta em defesa da aposentadoria é um meio. Não o Fim.

    A luta em defesa da aposentadoria é um meio. Não o Fim.

    A luta em defesa da
    aposentadoria é
    um meio. Não o Fim.

    Por Alexandre Caso – Membro do Coletivo Bancários na Luta, Membro da Direção dos Bancários de São Paulo, Membro da Direção Nacional da Intersindical – Central da Classe Trabalhadora

    A Luta contra a aprovação da Reforma da Previdência, apresentada pelo Governo através da PEC 06/19, tem propósitos que estão além do resultado que dialogue exclusivamente com essa importante Batalha.

    A Proposta de Reforma da Previdência traz em seu bojo, Bodes e Jabutis. As batalhas enfrentadas até agora contra a aprovação dessa Pec., não começaram e nem terminam no final de sua tramitação, seja qual for o resultado.

    A Luta em defesa da Aposentadoria traz uma característica diferente de outros enfrentamentos aos ataques do Capital, que para resolver seus problemas cíclicos, tenta mais uma vez impor aos Trabalhadores e Trabalhadoras uma conta com grave Custo Social.

    Sai um governo, entra outro e os ataques se intensificam, nesse sentido a antiga PEC 287, que trata da mesma pauta da PEC 06/19, foi derrotada pelos Trabalhadores e Trabalhadoras na última Disputa. Em que pese nossa vitória na Pec. 287, e o acúmulo muito importante no debate atual, é necessário observarmos algumas distinções importantes entre esta e aquela Luta.

    A Vitória sobre a última tentativa de destruir a Previdência ocorreu em outra Conjuntura. À época, o golpista Temer chegava ao poder desgastado e sem credibilidade, além de ser alvo de escândalos. Além da Luta, a proximidade das Eleições Presidenciais contribuiu de forma determinante para a Vitória sobre a PEC 287 e o Golpista Temer.

    Na batalha atual contra a PEC 06/19, temos uma Conjuntura bastante diferente, pois um governo eleito a pouco mais de seis meses, em que pesem todas as loucuras, despreparo e aprovação em queda, foi eleito através do voto, portanto ainda conta com alguma popularidade, além de resquícios de uma recente disputa eleitoral contaminarem o debate sobre a previdência.

    A Luta contra essa Reforma da Previdência deve ser encarada também como um campo de acúmulo político para resistir aos diversos outros ataques.

    Temos diversas outras Lutas no radar, sejam no campo dos Costumes, da Segurança Pública, contra a Criminalização dos Movimentos Sociais, em defesa da Soberania Nacional, contra a Retirada de Direitos, Autonomia e Organização da Classe Trabalhadora; além de ataques velados contra a Liberdade de Imprensa.

    O Conjunto de ataques que estamos sofrendo, aponta para uma estratégia de enfrentamento a partir do acúmulo pontual de cada resultado frente à Resistência à destruição da Previdência.

    O campo principal de batalha continua sendo as Ruas. O Parlamento também mereceria uma análise a parte nessa Luta, pois o protagonismo assumido pelo Presidente da Câmara, somado ao chamado Bloco do “Centrão” que também tem o poder de determinar vida ou morte a qualquer projeto, dependendo do atendimento de seus “interesses”, consegue frequentemente superar a conhecida incompetência política do governo.

    Também deve ser considerado o importante trabalho ocupando espaços no Parlamento, compondo com Parlamentares do nosso Campo e marcando corpo a corpo não apenas os Parlamentares predadores de Direitos, mas também não permitindo aos Lobistas representantes de Bancos e Grandes Grupos Econômicos atuarem sem adversários neste Campo, em que pese clareza sobre nossas limitações frente ao poder econômico representado por eles.

    As Ruas, no último período, foram palco de importantes Atividades, com destaque para os dias 15 e 30/05, além da Greve geral em 14/06.

    O Movimento Estudantil demonstrou mais uma vez seu histórico poder de mobilização e Luta, indo às ruas em defesa da Educação, levando junto a pauta em defesa da Aposentadoria.

    O Movimento Sindical, junto com as Frentes Povo sem Medo e Brasil Popular realizaram uma Greve Geral e continuam nas Ruas conscientizando, nas bases Eleitorais dos Parlamentares denunciando suas posições, nas Associações, Igrejas, Comunidades e todo os espaços que permitam debate e conscientização sobre a gravidade dos ataques desse governo contra os menos favorecidos através da Deforma da Previdência.

    A Coleta de assinaturas nas ruas para o Abaixo-Assinado contra a aprovação da Reforma da Previdência e que será entregue ao Parlamento em Brasília no dia 13/08, tem se mostrado um importante instrumento de diálogo, esclarecimento e conscientização. Essa frente de ofensiva tem sido bastante eficaz para enfrentar as mentiras propagadas pelo Governo, via Grande Mídia, sobre a Reforma.

    No dia 13/08, mesma data da entrega do Abaixo-Assinado, todos os Movimentos farão um dia de Luta em todo o país, contra a Reforma e em Defesa da Aposentadoria.

    Estamos enfrentando a força do governo, dos Bancos, dos Grandes Grupos Econômicos e inclusive interesses internacionais. Frente a essa Conjuntura é natural, de um lado, diante de tantos ataques ao mesmo tempo, somada a uma Correlação de forças desfavorável neste momento a possibilidade de surgir algum pessimismo que nos distancie de enxergar avanços conquistados.

    Entender que o processo de ataque aos nossos direitos não teve início e nem termina na Luta e resistência à essa Reforma da Previdência é condição para construir a melhor Estratégia.

    Partindo do pressuposto que a Resistência contra a Reforma da Previdência é a principal Luta, em que pese reconhecermos que esse não deveria ser o debate central, caso tivéssemos condições de impor uma pauta positiva, é necessário compreender que essa Luta agrega de forma decisiva para todos os outros enfrentamentos.

    As etapas da tramitação da PEC da Reforma da Previdência dividem nosso enfrentamento em várias batalhas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Poderemos ter até uma etapa extra, caso haja qualquer alteração pontual ou apresentação de novo texto pelo Senado, nessas hipóteses o texto volta à Câmara do Deputados para novas disputas.

    Este enfrentamento da PEC. começou na CCJ da Câmara dos Deputados, o debate seguiu para a Comissão Especial para tratar o Mérito e foi ao Plenário da Câmara para votação em dois turnos com necessidade de 308 votos em cada um para ser aprovada.

    É importante resgatar os passos da Luta até aqui e ter claro que além estarmos bem longe do final, não esquecer de “avanços” conquistados graças à nossa Unidade e Luta.

    Não podemos desprezar que o texto original apresentado pelo governo sofreu várias derrotas, iniciando pela análise de admissibilidade na CCJ, já nessa etapa, alguns pontos foram suprimidos:

    • Fim do recolhimento mensal e da multa de 40% do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para aposentados que continuam trabalhando;
    • A possibilidade de redução por meio de lei complementar na idade de aposentadoria compulsória de servidor, hoje em 75 anos;
    • A criação de prerrogativa exclusiva do Poder Executivo para propor mudanças nas aposentadorias;
    • Fim da possibilidade de qualquer pessoa iniciar ação contra a União na Justiça Federal em Brasília

    O debate mais longo e aprofundado até agora se deu na Comissão Especial constituída para apreciar o mérito. Nessa fase tivemos “avanços” e retrocessos também. Entre alguns se destacam:

    • A retirada do BPC, mantendo as regras atuais,
    • A retirada do Sistema de Capitalização individual,
    • A exclusão do texto que propunha alteração nas regras da Aposentadoria Rural
    • Redução da idade mínima e tempo de contribuição para as Professoras, respectivamente 57 anos a idade e 25 anos o tempo mínimo de contribuição.

    Travamos várias batalhas quando o texto foi à Plenário para votação, iniciamos com uma derrota muito além de nossas expectativas na votação do texto, entretanto, no mesmo dia, quando entramos no debate e votação dos destaques, ficou ainda mais claro o quanto a Luta em defesa da Previdência está distante do tudo ou nada.

    Com correlação de forças distintas na disputa de cada destaque, fomos derrotados em alguns, porém com importante atuação dos(a) Parlamentares do nosso Campo, conseguimos algumas vitórias no sentido de minimizar danos:

    • Flexibilizando as exigências para aposentadoria das Mulheres;
    • Regras mais brandas para integrantes de carreiras policiais;
    • Redução de 20 para 15 anos do tempo mínimo de contribuição de homens que trabalham na iniciativa privada e Professores próximos da Aposentadoria;
    • Avanço no Cálculo de Pensões por Morte para Viúvos e Viúvas.

    A próxima batalha será a votação em segundo turno na Câmara dos Deputados e caso aprovado, segue para o Senado Federal, onde passará pela CCJ e pela Comissão Especial, seguindo para votação no Plenário em dois turnos. O Senado Federal pode não aprovar ou aprovar outro texto, ou ainda alterar alguns pontos. No caso de aprovação de novo texto, tudo será rediscutido na Câmara dos Deputados, caso altere apenas alguns pontos, apenas estes pontos serão objeto de análise e deliberação novamente na Câmara.

    Exceto se o Senado Federal aprovar em primeiro e segundo turno sem alterações, o texto enviado pela Câmara dos Deputados, o jogo acaba, do contrário a bola continua rolando.

    Vale destacar enfim, que a Luta contra a Reforma da Previdência nem de longe pode ser encarada de forma simplificada, determinando Vitória ou Derrota exclusivamente a partir de sua aprovação ou não nas duas Casas Legislativas. “Desidratar” a proposta original também impõe uma derrota parcial ao governo.

    Tem muito jogo pela frente e nada está definido, apenas a certeza de que fazer a melhor Luta em cada etapa, definirá além do resultado, em quais condições enfrentaremos as demais pautas ao final deste processo.

    A Reforma da Previdência passa inicialmente por entender que nessa disputa, nenhuma vitória ou derrota, de ambos os lados, é definitiva antes do apito final. O balanço final entre nossas derrotas e vitórias, inclusive minimizando danos, determinará a sentença política de ônus para os que defendem a Reforma ou Bônus através de capital político para quem defende a manutenção do Direito à Aposentadoria.

    A Luta em defesa da Aposentadoria não dialoga apenas com seu propósito principal, o saldo final entre Derrotas e Vitórias a cada Batalha, definirá de forma decisiva a capacidade de enfrentamento a todos os demais ataques pautados e que estão por vir.

    A Luta em Defesa da Aposentadoria é um meio e não o Fim.

    Em defesa da Aposentadoria, do Emprego, da Educação e da Democracia. Em Defesa da Liberdade de Imprensa.

  • O governo Bolsonaro é grotesco, mas não é fraco. Nem vai cair “ de maduro”

    O governo Bolsonaro é grotesco, mas não é fraco. Nem vai cair “ de maduro”

    O governo Bolsonaro é grotesco,
    mas não é fraco. Nem vai cair
    “de maduro”

    Por Valério Arcary

    Tem um deboche ideológico que parece inocente, mas não é. É aquela brincadeira que diz que é mais fácil alguém se convencer que o fim do mundo é iminente, do que acreditar que o fim do capitalismo é possível. Parece irreverência inocente, mas não é.

    Por isso, devemos nos preocupar com a disseminação na esquerda de outra ideia ingênua. A ideia de que Bolsonaro faz tantos disparates, que vai cair mesmo, e é só uma questão de tempo. “Se já fizeram uma vez contra a Dilma Rousseff, poderiam fazer, também, contra Bolsonaro”. Mas uma velha sabedoria ensina: “os inimigos de nossos inimigos não são nossos amigos”.

    Bolsonaro pode contar, por enquanto, com um apoio, amplamente, majoritário, quase granítico, do “dinheiro grande” para aplicar seu projeto de recolonização. Terá que ser detido pela luta popular. Esperar que seja a classe dominante brasileira a se desvencilhar do acidente histórico que ela mesma apoiou em 2018 é pensamento mágico.

    Ideologias conspiratórias são simples e, tendencialmente, populares, mas não são inofensivas. Esta expectativa alimenta uma espécie de “fatalismo” de esquerda. Ela é perigosa, por três razões. Porque, ao mesmo tempo. subestima a força de Bolsonaro, exagera os conflitos de setores da burguesia com o governo, e desconsidera o potencial da mobilização popular de resistência.

    Acontece que a ideia de que a história se repete é poderosa. O que nos remete à “mania” facilista. Uma mania pode ser definido como um humor exaltado, uma euforia. Os golpes institucionais, como no Paraguai e no Brasil, foram um instrumento, desde 2009, há dez anos em Honduras, para que as classes dominantes voltassem a governar, diretamente, sem mediações. Imaginar um giro para um novo golpe institucional, só que agora contra um governo de extrema direita, é somente, expressão de desejo. As fricções que setores da classe dominante brasileira têm com Bolsonaro não devem nos enganar.

    Basta uma ideia atrativa, mesmo que seja enganosa, para alimentar uma narrativa. Uma narrativa pode ser convincente. só precisa de coerência interna. Mas uma versão dos acontecimentos, por ser aceita por muitos milhares de pessoas, não é, por isso, menos errada.

    Não vai ser a burguesia quem vai nos livrar de Bolsonaro. Não há atalhos no horizonte. Dependemos, essencialmente, da capacidade de mobilização social e política da esquerda. Os conflitos internos à coalizão de extrema direita, ou entre o governo e o Congresso e o STF são até divertidos, mas não podem nos enganar. Há divisões reais, o que é animador, mas também, muita encenação. Não vamos “pegar carona” com o centrão para derrubar Bolsonaro, e entregar o poder ao Rodrigo Maia. Quem imagina que a burguesia vai apostar em impeachment para entregar o poder ao Mourão, o suposto “adulto” dentro da sala, está fantasiando. Auto-engano.

    Neste momento a política burguesa é pressionar para enquadrar Bolsonaro, apesar de seus excessos. Pressionar, não deslocar. Zoar com as declarações amalucadas no almoço, pode. Convocar reuniões para articular uma conspiração para derrubá-lo, não pode. Evidentemente, essa atitude do grande capital, eventualmente, pode mudar. Mas não é hoje a política que prevalece.

    Admitamos, todavia, apenas como especulação, esta hipótese. Imaginar que Bolsonaro iria assistir a uma conspiração de Palácio, sem reagir, energicamente, é insensatez. Porque Bolsonaro é candidato a Bonaparte. Podemos brincar, entre nós, para relaxar, que parece Napoleão de hospício, mas não é tão simples. Sim, é grotesco, mas não é fraco.

    O governo nos parece uma orquestra de desmiolados, um circo disfuncional, mas não vai cair de “maduro” sozinho. Bolsonaro ainda pode contar com um núcleo duro ultra-reacionário de alguns milhões de pessoas dispostas a ir para as ruas. Isso conta e muito.

    A luta para derrotar Bolsonaro passa pela resistência à aprovação da reforma da Previdência. Passa pela continuidade das grandes manifestações que começaram em 15 de maio. Até que sejamos muitos milhões nas ruas.

    As expectativas que guardamos não são gratuitas. Elas são a expressão das pressões do tempo em que vivemos. Podemos nos proteger com uma atitude crítica, muito estudo e, sobretudo, interação com os outros em uma organização militante coletiva de esquerda, mas ninguém é imune.

    O governo Bolsonaro é uma coalizão de extrema direita com um projeto político-social que provoca conflitos com as instituições do regime como o Congresso e o STF, e choques sociais que exigem a mobilização contrarrevolucionário permanente.

    Nós vamos ter que continuar com a mobilização nas ruas. E, cedo ou tarde, vamos ter que medir forces para valer.

  • BH realiza Seminário do Núcleo de Negras, Negros e Indígenas Rosa Egipcíaca no Julho das Pretas

    BH realiza Seminário do Núcleo de Negras, Negros e Indígenas Rosa Egipcíaca no Julho das Pretas

    BH realiza Seminário do Núcleo de Negras, Negros e Indígenas Rosa Egipcíaca no Julho das Pretas

    No último sábado, 27 de julho aconteceu em Belo Horizonte o Seminário do Núcleo de Negras, Negros e Indígenas Rosa Egipcíaca dentro das comemorações Julho das Pretas e da Década Internacional dos Afrodescendentes, organizado com apoio da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco.

    O seminário foi pensado para discutir a promoção da igualdade racial no cenário de retrocessos e o enfrentamento ao racismo. Contamos com uma mesa de abertura protagonizadas por Andreia de Jesus, deputada estadual pelo PSOL/MG que nos deu a dimensão da solidão da mulher negra nos espaços do poder institucionalizado, mas também do otimismo que nos move ao reconhecer que as mulheres negras vem sobrevivendo ao longo dos séculos, construindo resistências e processos revolucionários por fora do sistema. Avelin Buniacá da etinia Kambiwá nos prestigiou com um letramento racial e indígena fundamental para construção de agendas comuns de resistências entre a população negra da diáspora e os negros da terra.

    Finalizamos com a contribuição da psicóloga Thalita Rodrigues que tem por objeto de estudo os impactos psicossociais do racismo nos indivíduos que sofrem o racismo. Levantando um debate importante do ponto de vista da saúde e do bem viver que esta para além das necessidades materiais. Na mesma roda tivemos a Vanessa Beco que abordou sobre as dificuldades das mulheres negras participarem na elaboração da agenda política e na construção de políticas públicas específicas, fomentando importante debate com vistas a diminuir a baixa representação das mulheres nos espaços de direção dos movimentos sociais, partidos e parlamento, principalmente das negras e indígenas.

    Essa primeira edição do Seminário do Núcleo Rosa Egipcíaca realizado em um espaço importante para o movimento negro da cidade, o Tambor Mineiro, como espaço de referência cultural e resistência no meio da cidade, também nos mostrou que diálogos e debates estratégicos são necessários para a superação do racismo estrutural que “segregar prefere, por questão de tom, de cor, de pele” como escreve lindamente Nívea Sabino, poetiza querida de Belo Horizonte. Sairemos multiplicadores dessa luta, que antes de tudo é uma  luta antissistêmica contra toda forma de opressão e exploração de nossos corpos. Nossas Vidas Importam!