Autor: Redação Lauro Campos

  • Agora são 200 bolsas para curso de inovação política

    Agora são 200 bolsas para curso de inovação política

    Agora são 200 bolsas para curso de inovação política

    Devido ao grande número de inscrições para o o curso virtual  “Certificação em Inovação Política“, a Fundação Lauro Campos e Marielle Franco e a organização argentina Asuntos del Sur decidiram dobrar a quantidade de bolsas gratuitas oferecidas para ativistas políticos brasileiro(a)s. Agora, são  200 bolsas. As inscrições vão até a próxima segunda-feira, 05 de agosto

    Faça sua pré-inscrição. Não perca tempo. Quanto antes se inscrever, mais chances tem de receber a gratuidade.

    Para Francisvaldo Mendes, presidente da FLCMF, “é com grande alegria que percebemos a procura por formação política. Precisamos capacitar nossa juventude para a defesa da democracia. Este curso busca mostrar ferramentas para a participação de cada indivíduo na sociedade como agente político de transformação social”.

    Agora, são 200 bolsistas gratuitos!!! 

    Sobre o curso
    Conteúdo programático
    Concorra a uma bolsa gratuita!!!!!

  • Todo apoio da FLCMF ao jornalista Glenn Greenwald

    Todo apoio da FLCMF ao jornalista Glenn Greenwald

    Todo apoio da
    FLCMF ao jornalista
    Glenn Greenwald

    Nota de Solidariedade da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco ao jornalista e editor do The Intercept Brasil, Glenn Greenwald


    A Fundação Lauro Campos e Marielle Franco (FLCMF) se solidariza com o jornalista e editor do The Intercept Brasil, Glenn Greenwald, que vem sofrendo graves ataques virtuais e ameaças à sua integridade pessoal e de toda a sua família por conta da série de reportagens publicadas pelo site, no qual desvendou a inescrupulosa atuação do ministro da Justiça, Sérgio Moro, e do procurador da República Deltan Dallagnol, na Operação Lava Jato.

    Mais que trazer a público a farsa judicial que foi a Operação Lava Jato, Glenn Greenwald e toda a equipe de jornalistas do The Intercept Brasil demonstrou que, mais do que cometer excessos ou ser seletiva, a Operação Lava Jato foi um dos pilares para a execução do golpe no Brasil. Não podendo ser dissociada da postura autoritária das elites brasileiras, que desprezam profundamente o povo brasileiro.

    O grande objetivo da Lava Jato, por meio de Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, foi subordinar completamente o regime político brasileiro aos interesses econômicos dos bancos e das petroleiras estrangeiras, agredindo a soberania brasileira e nos colocando reféns das decisões das grandes empresas privadas e dos gabinetes estrangeiros. Com Bolsonaro, estão conseguindo cumprir o objetivo.

    O judiciário foi o instrumento utilizado para conferir ao golpe uma fachada de “legitimidade” e dar substância para a narrativa da grande imprensa, em especial a Rede Globo. A série de reportagens do The Intercept Brasil questiona e prova que tudo não passou de uma farsa. Uma farsa-jato.

    O jornalismo é uma forma de conhecimento que possibilita a transformação da realidade, de compreender o mundo para transformá-lo. Glenn Greenwald e toda a sua equipe nos dá a esperança que a realidade brasileira ainda tem chance de ser transformada por meio do jornalismo sério, honesto e com fidelidade aos princípios democráticos.

    Não toleraremos que ataques impeçam a imprensa de exercer seu legítimo papel de defesa dos interesses da sociedade e da perpetuação da democracia. Todo apoio e solidariedade à Glenn Greenwald, sua família e a equipe do The Intercept Brasil.

    Fundação Lauro Campos e Marielle Franco

  • FLCMF abre 100 bolsas em curso de Inovação Política

    FLCMF abre 100 bolsas em curso de Inovação Política

    FLCMF abre 100 bolsas em curso de Inovação Política

    Fundação Lauro Campos e Marielle Franco, em parceria com a a organização argentina Asuntos del Suranuncia a abertura de pré-inscrições para o curso virtual  “Certificação em Inovação Política“. A FLCMF oferece 100 bolsas gratuitas para ativistas políticos brasileiros. As inscrições vão até o dia 05 de agosto

    “É com satisfação que realizamos a parceria com Asuntos del Sul para a produção deste curso de Inovação Política, no sentido de aprimorarmos nossa perspectiva de defesa da democracia, uma vez que a participação popular está sendo tolhida por esta nova onda política conservadora no Brasil e na América Latina”, afirma Francisvaldo Mendes, presidente da FLCMF ao anunciar a parceria. 

    Aqui, você encontra todas as informações! Preencha o formulário para concorrer à bolsa!

    A Certificação em Inovação Política será realizada através da plataforma digital da Academia de Inovação Política com duração de três meses. 

    A formação se estrutura nos seguintes módulos:

    • Sociedades em transformação
    • Gestão pública aberta e participativa
    • Economias colaborativas, inclusivas e sustentáveis
    • Laboratório feeling + Projeto de incidência local

    Proposta do curso:

    Precisamos atualizar nossas democracias. Elas foram pensadas no século XVIII, e implementadas com ideias e tecnologias dos séculos XIX e XX. Este programa visa formar lideranças com os debates, os conceitos e as ferramentas disponíveis no século XXI. O perfil é a formação no sujeito político, pensando em seu entorno e na comunidade, com enfoque coletivo, crítico, criativo e inovador.

    Com base em experiências e práticas bem sucedidas de especialistas renomados da América Latina, esta Certificação busca proporcionar conhecimentos e ferramentas para entender as atuais transformações políticas e sociais, o papel das tecnologias digitais, as novas formas de participação democrática e a possibilidade de modelos produtivos sustentáveis e inclusivos.

    Direcionado para:

    • Líderes sociais 
    • Políticos transformadores
    • Empreendedores com vocação social

    O que esta formação oferece?

    • Capacidades para compreender e analisar os principais fatores que caracterizam as atuais transformações sociais e éticas cidadãs.
    • Compreensão sobre as novas formas de se propor gestão pública, governo aberto e tecnologias cívicas.
    • Conhecimentos e reflexões sobre modelos econômicos inclusivos, cooperativos e sustentáveis.
    • Uso de ferramentas de alto impacto social.
    • Fazer parte de uma comunidade latino-americana de agentes de inovação.

    Início: 26 de agosto de 2019

    Custo: 100 bolsistas gratuitos /  Demais inscrições diretamente na plataforma Academia de Inovação Política: R$1.150,00

    Duração: 3 meses

    Modalidade: virtual

    Inscrições abertas até 05 de agosto  de 2019.

    Requisitos para a inscrição: estar comprometido/a em querer transformar sua comunidade. Não requer formação universitária.

  • Presidentes das fundações definem próximos passos do Observatório da Democracia

    Presidentes das fundações definem próximos passos do Observatório da Democracia

    Presidentes das fundações
    definem próximos passos do Observatório da Democracia

    Os presidentes das fundações partidárias se reuniram para definir os próximos passos do Observatório da Democracia. O planejamento das ações para o próximo semestre e a construção de atividades foram as pautas principais debatidas entre os representantes. 

    Como resultado da reunião, foi decidido a realização de duas ações prioritárias. A construção de seminários para debater os efeitos das políticas destrutivas do governo Bolsonaro e a construção de mecanismos de envolvimento da sociedade no debate sobre a importância dos serviços públicos, que garantem o funcionamento da sociedade, como saúde, educação, segurança e tantos outros. 

    De acordo com o presidente da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco, Francisvaldo Mendes, os próximos passos do Observatório da Democracia segue os parâmetros da sua origem: construir a unidade e criar um horizonte que preserve a democracia, tão ameaçada por Bolsonaro e seus apoiadores ligados aos grandes interesses do capital financeiro. 

    “É um desafio para a esquerda construir uma unidade programática e de um projeto de nação, mas estamos avançando cada vez mais. O atual governo tem o projeto contrário: destruir a nação e o país. Nosso desafio continua o mesmo, impedir os retrocessos, mas a cada passo é possível perceber que o Observatório avança”, comenta Francisvaldo.

    O que é o Observatório? O Observatório é integrado pelas sete fundações partidárias ligadas ao PT, PCdoB, PDT, PSB, PSOL, Pros e PPL.  Os dirigentes das fundações apresentaram um relatório conjunto, com análises e dados que evidenciam as ameaças aos direitos e revelam o desmonte da estrutura do Estado brasileiro resultante dos primeiros meses do atual governo.

  • 6 meses de Bolsonaro: três debates e três perspectivas atravessam a esquerda

    6 meses de Bolsonaro: três debates e três perspectivas atravessam a esquerda

    6 meses de Bolsonaro:
    três debates e três perspectivas atravessam a esquerda

    Por Valério Arcary

    Seis meses depois da eleição de Bolsonaro são três os principais debates que atravessaram a esquerda no primeiro semestre. Eles nos remetem a três temas decisivos: (a) a natureza da derrota que a esquerda sofreu; (b) a caracterização do governo; (c) e qual deve ser a tática diante de Bolsonaro.

    Diante de cada uma destas questões foram formuladas, essencialmente, três posições coerentes:

    (a) a eleição de Bolsonaro deve ser avaliada somente como uma derrota eleitoral, portanto, circunstancial e transitória? Ou, ao contrário, podemos considerar que já ocorreu uma derrota histórica, portanto, devastadora, com consequências duradouras? Entre as duas posições, estão aqueles que aceitam que foi muito mais grave que uma derrota eleitoral, e reconhecem uma derrota político-social que abriu uma situação reacionária, mas argumentam que não deve ser comparada com uma derrota histórica, como a vitória do golpe em 1964;

    (b) o governo de Bolsonaro deve ser avaliado como um governo normal de alternância dentro do regime democrático-eleitoral? Ou os primeiros seis meses confirmam que Bolsonaro seria incompatível com o regime semipresidencialista, e já está em desenvolvimento uma mudança autoritária com um novo equilíbrio de forças entre as instituições? A terceira hipótese defende que Bolsonaro não é uma continuidade da política do governo Temer com “extravagâncias”, ou seja, é um governo de extrema-direita com ambições bonapartistas, mas ainda não subverteu o regime.

    (c) a melhor deve ser a ofensiva permanente, conhecida na tradição da III Internacional como a tática húngara, por ter sido defendida por Bela Kun no congresso de 1921, sob a bandeira Fora Bolsonaro, greve geral, porque o agravamento da crise econômica e social abre a possibilidade da derrubada iminente do governo. Ou deve ser a tática da social democracia alemã, formulada por Kautsky há mais de cem anos atrás: o quietismo, ou a construção de uma frente de oposição o mais ampla possível no Congresso Nacional, liderada pelas forças burguesas comprometidas com a defesa do regime democrático, aguardando as próximas eleições. Finalmente, a terceira posição é a defesa da tática russa, defendida por Lenin e Trotsky para a Alemanha no mesmo Congresso de 1921, ou tática do desgaste permanente, ou da frente única, ou ainda da guerra de posições, na formulação do italiano Gramsci: acumular forças nas mobilizações de resistência, até que uma mudança na relação de forças permita sair da defensiva e passar ao contra-ataque.

    Quem avalia que já aconteceu uma derrota histórica, defende que Bolsonaro já deslocou ou está em vias de subverter o regime semipresidencial, e privilegia a tática quietista de construção da mais ampla Frente de oposição, apostando em uma possível vitória eleitoral, pelo menos em algumas grandes cidades, já em 2020.

    Quem pensa que a derrota foi, essencialmente, eleitoral, caracteriza Bolsonaro como um governo de alternância limitado pelos freios e contrapesos do Congresso e do STF, e defende a tática da ofensiva permanente para derrubá-lo.

    Quem pondera que não ocorreu derrota histórica, mas tampouco se deve reduzir o impacto das derrotas acumuladas desde 2015/16 a uma derrota eleitoral, define o governo Bolsonaro como uma coalizão de quatro correntes de extrema-direita com um projeto bonapartista ultrarreacionário que é uma ameaça às liberdades democráticas, e defende a tática do desgaste permanente, ou da frente única. 

    Há muita coerência interna em cada uma dessas três posições. Mas só uma delas é correta. Os três partidos de esquerda mais influentes no Brasil são o PT, o PSOL e o PCdB estão divididos sobre estes temas. Não são os únicos, evidentemente, mas pela dimensão de sua implantação social, força eleitoral e capacidade de iniciativa política são os maiores. Outras organizações da esquerda, como o PSTU, o PCB, e a Unidade Popular têm graus variados de influência e, também, são muito mais homogêneas.

    Não deixa, portanto, de ser curioso que estas três respostas estão, igualmente, presentes nos três principais partidos, ainda que com influência e peso diferenciados em cada um deles. Tanto no PT, no PSOL quanto no PCdoB há quem defenda a tática alemã, a tática húngara e a tática russa.

    No PCdoB prevalece a primeira posição, embora as outras estejam presentes. Por isso, votaram a favor de Rodrigo Maia para a presidência da Câmara. No PT há uma cacofonia estratégica. Por isso, apesar da maioria da bancada ter chamado ao voto em Freixo, e o Diretório Nacional ter fechado questão contra a reforma da previdência, um terço da bancada seguiu o PCdoB no apoio a Maia, e os governadores entraram na negociação da reforma. E não faltaram até alguns que, há alguns meses atrás, especularam com uma possível queda antecipada de Bolsonaro.

    No PSOL prevalece a tática do desgaste permanente. Mas há, também, defensores das duas outras posições, sobretudo, da tática da ofensiva permanente.

    Sendo este o quadro do debate não surpreende que haja, também, muita confusão. O que prevalece na esquerda brasileira ainda é o empirismo, a oralidade, a improvisação. Porque não são poucos aqueles que se apropriam de um balanço da derrota, que não é compatível com a caracterização do governo, e menos ainda com a tática para enfrentá-lo.

    Não faz sentido, por exemplo, defender que ocorreu uma derrota somente, eleitoral, porque Haddad teve quase cinquenta milhões de votos, e defender, ao mesmo tempo, que o regime da Nova República desmoronou. Se o regime foi subvertido, é porque a relação de forças entre as classes, e as relações políticas de força entre partidos e instituições evoluiu tão mal, mas tão mal, que não é possível simplificar a vitória de Bolsonaro como um acidente eleitoral.

    Ou aqueles que defendem uma tática política que não é compatível com a avaliação do balanço. Não faz sentido, por exemplo, defender a tática da ofensiva permanente, mas avaliar que aconteceu uma derrota histórica.

    Por último, por que o PDT e o PSB não são considerados nesta análise? Há uma enorme e, talvez, insolúvel controvérsia de critérios para definir o que é ser de esquerda, mas há, também, uma régua marxista para a classificação dos partidos. Entre outros critérios, a natureza social e a identidade ideológica. PT, PSOL e PCdoB são os partidos que, historicamente, conquistaram maior representação entre os trabalhadores e o povo, e reivindicaram, de alguma forma, o socialismo como referência programática.

    Assim como não devemos julgar as pessoas pelo que pensam de si mesmos, não podemos avaliar os partidos somente pelo que dizem sobre si próprios. O PDT teve quatro candidatos a governador no segundo turno em 2018: Waldez Góes (Amapá), Amazonino Mendes (Amazonas), Odilon Oliveira (Mato Grosso do Sul) e Carlos Eduardo (Rio Grande do Norte). Desses, três passaram a apoiar o neofacista Bolsonaro: Amazonino Mendes, Juiz Odilon e Carlos Eduardo. PDT e PSB chegaram a ter, respectivamente, 30% e 34% de apoios à reforma da previdência apresentada pelo governo Bolsonaro, em suas bancadas de deputados federais. A candidata de Ciro Gomes a vice-presidente foi Kátia Abreu, uma liderança orgânica do agronegócio.

    PSB e PDT se apresentam como de esquerda, mas não são. São partidos eleitorais ecléticos, com trajetórias imprevisíveis, composição político-social errática e, ideologicamente, inconsistentes. Alguns os definem como de centro-esquerda, mas mesmo essa caracterização ligeira parece precária, quase leviana. PSB e PDT operaram nas últimas décadas, essencialmente, como legendas de aluguel.

  • Amazônia, desmatamento e desnacionalização

    Amazônia, desmatamento e desnacionalização

    Amazônia,
    desmatamento e
    desnacionalização

    Há um grande risco colocado diante da soberania brasileira sobre a Amazônia. O avanço da cobiça estadunidense e dos grandes projetos de mineração e do agronegócio vêm promovendo a ampliação do desmatamento e dos conflitos pela posse da terra numa região detentora de exuberante biodiversidade

    Por Marinor Brito, André Marinho, Sandra Helena Ribeiro Cruz

    A Amazônia, desde a ocupação portuguesa até à implementação dos grandes projetos de infraestrutura patrocinados pelo Estado, sofre os impactos de ações exógenas e excludentes. Estas não valorizam a diversidade sociocultural das comunidades tradicionais e dos povos da floresta – indígenas, quilombolas, ribeirinhos e trabalhadores rurais -, pois enxergam a região como fonte de capital natural baseado na incorporação contínua de terras e recursos percebidos como infinitos.

    O avanço dos grandes projetos voltados para a produção de commodities provenientes da mineração e do agronegócio, assim como a exploração do potencial de geração de energia da rede hidrográfica vêm promovendo a ampliação do desmatamento e dos conflitos pela posse da terra numa região detentora de exuberante biodiversidade. À medida que aumenta o desmatamento, reduz-se bruscamente a qualidade de vida das populações nativas, que veem a sobrevivência cada vez mais ameaçada.

    Ecossistema complexo

    A Amazônia possui um complexo ecossistema com mais de 7 milhões de km², que se estende por 8 países – Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana Francesa e Suriname – e compreende cerca de 40% do território da América do Sul, a chamada “Pan-amazônia”. A região apresenta característica fisiográfica marcante, além de imensas reservas naturais, como água doce, minérios, madeira e um potencial hidroelétrico incontestável. Essas riquezas despertam a cobiça e a ganância de interesses internos e externos, que se utilizam de diversos mecanismos para garantir a apropriação privada dos recursos hídricos, florestais e do subsolo.


    As riquezas da região despertam a cobiça e a ganância de interesses internos e externos, que se utilizam de diversos mecanismos para garantir a apropriação privada dos recursos hídricos, florestais e do subsolo


    A região é o lar de 62 das 79 espécies de primatas existentes no Brasil, de cerca de 3 mil espécies de peixes e mais de mil espécies de árvores. A abundante biodiversidade da região a mantém como uma das poucas áreas ainda preservadas no planeta. Todavia, a Amazônia sofre, cada vez mais, com o avanço do grande capital sobre a floresta e sobre a população, alterando radicalmente o modo de vida, impondo ao lugar os processos decorrentes da globalização. A Comissão Pró-índio de São Paulo em trabalho realizado nas comunidades quilombolas de Oriximiná no Pará revelaram por meio de exames que os peixes dos corpos hídricos próximos aos locais de mineração, quando encontrados, não pareciam apropriados para o consumo.

    Dois movimentos internacionais atuam na região. O primeiro é ligado ao sistema financeiro informacional das grandes potências e tende a ter uma linha “conservacionista” em função da manutenção da Amazônia como reserva de capital natural futuro. O outro tem vínculos com movimentos sociais de caráter internacionalista e busca o “desenvolvimento sustentável” da região como forma de uso racional dos potenciais de nossa biodiversidade. Esses dois movimentos se cruzam contraditoriamente na defesa de objetivos convergentes, mas que, na verdade, guardam interesses antagônicos.

    Posição estratégica

    Grande parte da exuberante floresta tropical se encontra no território brasileiro, o que coloca o Brasil em posição estratégica no cone sul e direciona as lentes estadunidenses para o nosso país. Os Estados Unidos mantêm forte vigilância sobre o Brasil – assim como outras nações de importância regional no cenário global – pois a América do Sul está na zona de ação mais próxima.

    A abertura da base de Alcântara no Maranhão aos militares norte-americanos pode agravar esse cenário, possibilitando o maior controle dos

    EUA sobre a Amazônia

    A superação dos problemas relacionados à soberania dos países da Amazônia foi sendo construída a partir do entendimento de que a região não poderia ser tratada de forma isolada e fragmentada. No entanto, as tentativas de se estabelecer uma política voltada para a integração da Amazônia sempre esbarraram nas dificuldades de mobilidade impostas pelas características fisiográficas da região, que limitam a mobilidade entre os países vizinhos.

    Diante da grande preocupação com a geopolítica da região, o general Carlos Meira Mattos (1913-2007) defendia, nos anos 1970, a posição de que “para se obter sucesso na ocupação e desenvolvimento da região, é necessário levá-la em conta em sua totalidade, pensando sempre no conjunto das diversas Amazônias nacionais”. Nesse sentido, Meira Mattos “sugere o conceito de Pan-amazônia”, no qual o desenvolvimento seria um projeto comum de todos os países.


    A Amazônia é o lar de 62 das 79 espécies de primatas existentes no Brasil, de cerca de 3 mil espécies de peixes e mais de mil espécies de árvores. A abundante biodiversidade da região a mantém como umas das poucas áreas ainda preservadas no planeta. Todavia, a Amazônia sofre, cada vez mais, com o avanço do grande capital sobre a floresta e sobre sua população


    Esse entendimento tem desdobramento por meio dos encontros diplomáticos que inauguraram uma nova fase das relações entre as nações amazônicas. Essas relações inicialmente se davam de forma bilateral, mas o caráter multilateral foi sendo fortalecido progressivamente. Dentre as iniciativas voltadas para estabelecer a interação entre os países sul-americanos estava o Tratado de Cooperação Amazônica (TCA) que, a partir de 1980, pode ser visto como um marco do sucesso da cooperação e das boas relações entre os países da região.

    “No TAC estão firmados os princípios básicos para a cooperação regional, como a concepção de que para se alcançar o integral desenvolvimento dos respectivos territórios amazônicos é necessário manter o equilíbrio entre desenvolvimento econômico e proteção ao meio ambiente” (TILIO NETO, 2010).

    Integração da infraestrutura

    Outra iniciativa importante é o projeto Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (IIRSA), que visa à interligação do cone sul das Américas. A meta é a constituição de uma estrutura física que possibilite a intensificação dos fluxos humanos, comerciais e financeiros em função de uma ação contra-hegemônica e de consolidação do Brasil frente aos interesses norte-americanos, sobre tudo na Amazônia.

    Essas iniciativas pugnavam pelo fortalecimento dos países sul-americanos num bloco que poderia fazer frente aos interesses externos, principalmente para o fortalecimento do Mercosul em detrimento da ALCA e do bloco europeu. No entanto, o atual cenário político-conjuntural, regional e mundial, impõe novos desafios, pois a investida cada vez mais contundente dos EUA sobre o território sul-americano vem causando instabilidade e desestruturação política no continente.

    Hoje, as tentativas de consolidação da soberania da região passam por um crescente processo de desconstrução das políticas de afirmação dos países latino-americanos sobre os territórios. A ação imperialista dos EUA busca impedir o avanço dos setores progressistas e da esquerda democrática no continente. Segundo o prêmio Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel:
    “O que está acontecendo no Brasil tem a ver com o projeto de recolonização do continente. Esse projeto tem alguns objetivos estratégicos: o controle dos nossos recursos naturais e, como já disse Michel Temer, a privatização das empresas estatais. Esse é o objetivo do golpe de Estado”.

    Esquivel afirmou, ainda, que os procedimentos utilizados em Honduras e no Paraguai – para a derrubada de Manuel Zelaya do poder em 2009 e de Fernando Lugo em 2012 – foram os mesmos. Eles envolvem o uso maciço dos meios de comunicação para alimentar um processo de desgaste por meio de uma série de acusações. Tudo conta com a cumplicidade de alguns juízes, como é o exemplo de Sérgio Moro.

    Subserviência externa

    No Brasil, a subserviência do governo Bolsonaro aos interesses norte-americanos se expressa por meio dos constantes ataques as populações originárias e tradicionais. Exemplo disso foi a retirada da demarcação de terras indígenas da competência da Fundação Nacional do Índio (Funai). O novo gestor é o Ministério da Agricultura, historicamente comandado pela bancada ruralista. Esse gesto demarca a posição do atual governo e as verdadeiras intenções para com os povos originários. Com a eliminação dos “entraves” para a ampliação do agronegócio e da mineração e a construção de hidroelétricas na região, potencializa-se exponencialmente um crescente processo de degradação ambiental na Amazônia.

    A materialização dessa política se dá por meio da forma descompromissada com que os órgãos licenciadores e de controle vêm agindo na Amazônia, principalmente nas Regiões Oeste, Sul e Sudeste, onde o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Agência Nacional de Mineração (ANM) estão liberando novos investimentos sem a garantia do cumprimento dos critérios básicos da legislação ambiental. Esses processos ocorrem para atender aos interesses das multinacionais e do capital, a exemplo da mudança do Código Florestal Brasileiro ocorrida em 2012.


    Uma proposta importante é o projeto Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (IIRSA), que visa à interligação do cone sul das Américas. A meta é a constituição de uma estrutura física que possibilite a intensificação dos fluxos humanos, comerciais e financeiros em função de uma ação contra-hegemônica e de consolidação do Brasil frente aos interesses norte americanos


    Segundo o World Wide Fund for Nature (WWF Brasil), entre agosto de 2017 e julho de 2018, o sistema Programa de Cálculo do Desflorestamento da Amazônia (Prodes) registrou um aumento no desmatamento na região de 13,7% em relação aos 12 meses anteriores, nos quais foram suprimidos 7.900 km² de floresta. Por outro lado, o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) conclui que o desmatamento na região aumentou 40% nos últimos 12 meses, e já chegou ao coração da floresta. Trata-se do cinturão verde que atravessa os estados do Acre, norte de Mato Grosso, sul do Amazonas, parte de Rondônia e vai até o oeste do Pará. Nas zonas de sacrifício, quanto menor são as condições socioeconômicas das regiões, maior a vulnerabilidade ao avanço do capital, consequentemente, maior a degradação ambiental.

    Empresas e poluentes

    Outros ataques provêm das grandes mineradoras, que não respeitam as populações locais e despejam sobre rios e igarapés da região o rejeito produzido durante a extração do ferro, bauxita e outros minerais. Um dos casos emblemáticos é o das empresas norueguesas Hydro e a Imerys, que há anos despejam seus rejeitos em barragens no município de Barcarena contaminando os recursos hídricos da região e, consequentemente, a população local. O mesmo ocorre em outras áreas onde estão instaladas empresas como a Vale e a Mineração Rio do Norte (MRN) que comprometem a qualidade de vida e colocam em situação de risco a população dessas áreas.

    “A Amazônia está diante de mais um perigo: áreas estão sendo vendidas para que empresas explorem petróleo e gás natural”. Quem faz essa denúncia é o Greenpeace, que alerta a espoliação comandada pela Agência Nacional do Petróleo (ANP), que está leiloando terras brasileiras para a prospecção de petróleo. Segundo o Greenpeace, existem territórios indígenas cercados e outros sobrepostos a blocos de bolsões de petróleo que estão sendo negociados com multinacionais. As populações locais estarão expostas diretamente aos impactos decorrentes da atividade petrolífera.

    Como é possível perceber, a Amazônia está sendo ofertada em um grande banquete, no qual poderá ser saboreada e degustada pelo grande capital. O controle velado até o momento, que se exerce por meio da ingerência das grandes corporações sobre o aparelho estatal, assume agora dimensões cada vez mais nefastas.


    No Brasil, a subserviência do governo Bolsonaro aos interesses norte-americanos se expressa por meio dos constantes ataques as populações originárias e tradicionais. Exemplo foi a retirada da demarcação de terras indígenas da competência da Fundação Nacional do Índio (Funai). O novo gestor é o Ministério da Agricultura, historicamente comandado pela bancada ruralista


    A disposição do governo brasileiro em consentir a presença das forças armadas dos EUA em nosso território, sob o argumento de “libertar” o povo venezuelano, demonstra a total subserviência de Bolsonaro aos interesses da potência dominante. O risco de o Brasil perder a soberania sobre o território amazônico é real e iminente, pois ela já se processa e se consolida pelos subterrâneos políticos comandados pela agenda do grande capital e agora quer emergir de forma efetiva e letal contra o povo brasileiro.

    O povo brasileiro deverá cerrar fileiras junto às lutas de resistência dos movimentos sociais. É preciso organizar e reforçar a solidariedade entre os lutadores sociais em defesa da floresta amazônica e da soberania nacional.

    *Marinor Brito é professora de Educação Física e Deputada Estadual no Pará pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).

    *André Marinho é geógrafo e Mestrando pelo Programa de Pós-graduação em Geografia da UFPa/PPGEO. Assessor Parlamentar na Assembleia Legislativa do Pará e militante dos movimentos sociais urbanos.


    *Sandra Helena Ribeiro Cruz é Assistente Social, Doutora em Ciência Socioambiental e docente do Programa de Pós-graduação em Serviço Social da UFPA.

    1. TILIO NETO, P. Soberania e ingerência na Amazônia brasileira. [online]. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisa Social, 2010.
    2. RODRIGUES, Edmilson Brito. Território e Soberania na Globalização – Amazônia, Jardim de Águas Sedento. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2013.
    3. TILIO NETO, P., 2010.
    4. ANDRADE, L. M.M. Antes a água era cristalina, pura e sadia: percepções quilombolas e ribeirinhas dos impactos e riscos da mineração em Oriximiná – Pará. Com. Pró-índio. São Paulo, 2018.
    5. BECKER, Bertha. Amazônia: Geopolítica na virada do III milênio. 2. ed. Rio de Janeiro: Garomond, 2006.
    6. SILVA, Ronaldo; VLACH, Vânia Rubens Farias. A integração continental Sul-Americana vista de uma Perspectiva da Geopolítica Brasileira. Uberlândia, MG, 2007.
    7. TILIO NETO, 2010.
    8. MATTOS, 1979, e MATTOS, 1980 apud TILIO NETO, 2010.
    9. TILIO NETO, 2010.
    10. UNASUR/COSIPLAN. Agenda de Projetos Prioritários de Integração. Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Suramericana – IIRSA. Novembro/2011.
    11. Sul21. Golpe no Brasil é parte de um projeto de recolonização da América Latina’, 2016. Disponível em: https://www.sul21.com.br/
      entrevistas-2/2016/05/golpe-no-brasil-e-parte-de-um-projeto-de-recolonizacao-da-america-latina/
    12. Designa a localidades em que se observa uma superposição de empreendimentos e instalações responsáveis por danos e riscos ambientais.
    13. Greenpeace. Petróleo na Amazônia, NÃO! Disponível em: https://www.greenpeace.org /brasil/participe /petroleo-na-amazonia-nao/. Acessado em: 29 de abril de 2019.
  • FUTURE-SE: O NOVO REQUENTADO

    FUTURE-SE: O NOVO REQUENTADO

    FUTURE-SE: O NOVO REQUENTADO

    Por Andrea Caldas

    Para responder às variadas críticas de falta de projeto e planejamento, o MEC divulgou, nesta semana, o denominado projeto FUTURE-SE.

    Apesar do nome marqueteiro, o rascunho do programa é, na verdade, uma mescla de pretéritos, com aparência de “ovo de Colombo”.

    Ainda que a alegada razão seja buscar fortalecer “a autonomia financeira das universidades e dos institutos federais”, o projeto já demonstra, parágrafos abaixo, sua real intencionalidade: “O Programa Institutos e Universidades Empreendedoras e Inovadoras (FUTURE-SE) tem por finalidade o fortalecimento da autonomia administrativa, financeira e de gestão das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes), por meio de parceria com organizações sociais e do fomento à captação de recursos próprios. ” (FUTURE-SE, MEC, 2019)

    Ou seja, clara e cristalinamente, o que se pretende não é fortalecer a autonomia das universidades e institutos federais mas, transferir sua gestão para a iniciativa privada.

    É preciso ressaltar que as Organizações Sociais são um tipo especial de “iniciativa privada”.

    Trata-se de uma qualificação – um título – que a Administração Pública outorga a uma entidade privada, sem fins lucrativos, para que ela possa receber determinados benefícios do poder público (dotações orçamentárias, isenções fiscais etc.), para a realização de seus fins.

    Tal instituto jurídico é parte constitutiva da Reforma do Estado, implantada no governo FHC, nos anos 90, com o objetivo de redução do papel do Estado e da celebração da decantada eficiência do modelo privado de gestão.

    A fórmula aqui, ainda que outros nomes, é, todavia, bem mais antiga e conhecida. Sua utilização no campo educacional, por exemplo, remonta a gênese da educação colonial quando a Companhia de Jesus recebia subsídios da Coroa Portuguesa para ofertar ensino para a elite local.

    O “passado que teima em não passar”, como dizia Octavio Ianni, circula os mesmos ritos, afinal: desobrigação do Estado e capitalismo sem riscos.

    No presente passadista, o governo Bolsonaro, desde a campanha eleitoral, elegeu o campo educacional como alvo preferencial dos seus ataques, combinando o discurso conservador- fecundado pelas supostas denúncias de que as escolas e universidades haviam se tornado antros de pregação comunista e libertina – com o interesse do ultraliberalismo de: a) reduzir o financiamento público e b) ampliar o mercado de venda de serviços educacionais.

    Os dois braços de sustentação deste governo neoconservador, que mescla fundamentalismo religioso e divinização do Mercado, encontram neste projeto do MEC/Área Econômica- já rebatizado de “Fature-se” – sua conjugação ótima.

    Destarte, através das Organizações Sociais, “qualificadas” pelo governo, conforme indicado no documento , será possível, simultaneamente ter acesso ao recurso público (inclusive ao patrimônio das Instituições de ensino superior), explorar a venda de serviços privados (venda de patentes, serviços, pesquisas e até cobrança de mensalidades) e exercer o controle ideológico das atividades realizadas nas IFES.

    “Ao aderir ao FUTURE-SE, a Ifes se compromete a: i. Utilizar a organização social contratada para o suporte à execução de atividades relacionadas aos eixos de gestão, governança e empreendedorismo; pesquisa e inovação; e internacionalização; ii. Adotar as diretrizes de governança que serão futuramente definidas pelo Ministério da Educação; iii. Adotar programa de integridade, mapeamento e gestão de riscos corporativos, controle interno e auditoria externa. ” (Future-se, MEC, 2019)

    A par disto, o governo aponta para um ainda incerto e indefinido “fundo de autonomia financeira das IFES” – eufemismo para a desobrigação do financiamento público da educação- e que será constituído por venda de serviços, capitalização financeira e eventuais doações de pessoas físicas e jurídicas, inclusive de “outros países, organismos internacionais e organismos multilaterais”. Ou seja, é o “vire-se” e “venda-se”.

    Neste ponto – aonde fica mais claro o caminho da privatização da educação superior- o discurso quer fazer parecer que teremos uma grande união cívica da sociedade brasileira, do empresariado nacional e internacional e das pessoas beneméritas em favor da educação, ciência e tecnologia do país.

    E isto ocorre, precisamente após o governo celebrar um acordo com a União Europeia para venda de grãos e compra de produtos industrializados e tecnologia.

    Ora, não é preciso ser pitonisa para saber que, se houver investimentos privados nas universidades e institutos federais, eles estarão imediatamente relacionados aos interesses de lucratividade imediata do mercado. Nisto, ficam de fora todas as pesquisas de base que não possam produzir resultados de curto prazo e todas as atividades de ensino e extensão que não tragam dividendos.

    Trata-se, portanto, de abortar qualquer possibilidade de ciência básica e de produção tecnológica soberana e transformar a educação superior em um grande shopping center de venda de serviços e fornecimento de estagiários de baixo custo.

    O projeto menciona, inclusive, que os professores universitários- mesmo com regime de dedicação exclusiva -poderão criar startups, fornecer consultorias, vender patentes e o que mais o espírito empreendedor sugerir… De pesquisadores a mascates, no reino do feliz mercado…

    Estimula-se a competitividade interna entre setores, universidades e institutos. E mais uma vez, obviamente, as regiões e áreas mais dinâmicas e próximas do mercado lograrão mais êxito, em uma espécie de “darwinismo educacional”, antítese de qualquer projeto nacional e mais igualitário.

    Nesta lógica do divisionismo, o governo lança mão de outro requentado ardil para a busca de aceitação do projeto: a chamada adesão voluntária, antecedida por uma “consulta pública”.

    Tal como ocorreu, recentemente no governo Dilma para a implantação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), a administração pública transfere a decisão para as instituições. E caso recusem a proposta, ficam sem acesso ao financiamento prometido. Tudo muito lindo e democrático…

    É em meio a este caleidoscópio de pretéritos e retrocessos que tomos nós, que defendemos a educação pública e o desenvolvimento nacional soberano, temos de encontrar forças para articular ações decisivas para impedir que se destrua o sistema federal de educação e qualquer promessa de educação nacional e democrática.

    É preciso que as entidades nacionais firmem uma posição firme e unitária, sem abrir espaço para balcões de negócio e cantos de sereia, sob o eufemismo de meritocracia ou eficiência.

    Não se trata, pois, de uma mera questão técnica e sim, de uma posição política e histórica.

    *Andrea Caldas – Professora e Pesquisadora de Políticas Educacionais da UFPR. Integrante do Grupo de Pesquisa sobre Relações Público e Privada na Educação- FACED/UFRGS. Ex-presidente do Fórum de Diretores (as) das Faculdades e Centros de Educação das Universidades Públicas.

  • Marielle, Bolsonaro  e as milícias

    Marielle, Bolsonaro e as milícias

    Marielle, Bolsonaro
    e as milícias

    É preciso esclarecer um ponto fundamental no assassinato da vereadora do PSOL: quem foram os mandantes e quais os motivos? É uma questão decisiva para impedir que o crime organizado se instale definitivamente na vida política brasileira

    Por Cid Benjamin*

    Até agora, na data do fechamento desta edição de Socialismo e Liberdade, estão presos apenas os dois milicianos executores do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes. Falta o mais importante: a identificação e a prisão dos mandantes. Além disso, claro, saber as razões do crime e desvendar as vinculações dos assassinos com o mundo da política.


    No fundo, essa história de crime de ódio é uma hipótese que serve mesmo a quem encomendou a execução. Crime de ódio é crime isolado, sem mandante. A morte de Marielle pode não ter sido pensada inicialmente como um atentado isolado. A execução aparentemente faria parte de uma série. Talvez a enorme repercussão do crime tenha sustados outros atentados que viriam


    Muito atuante na denúncia da violência policial contra os pobres, Marielle não tinha atuação localizada em áreas dominadas por milícias. Tampouco a ação dela no Legislativo teve como alvo prioritário os paramilitares, como foi o caso do hoje deputado federal Marcelo Freixo (PSOL) – a principal figura da CPI das Milícias na Assembleia Legislativa do Rio em 2008. Por conta disso, aliás, Freixo é obrigado, até hoje, a viver protegido por segurança armada.

    Assim, tudo indica que não foi um problema local que levou ao assassinato de Marielle.

    A hipótese do ódio

    Pode, também, ser descartada uma hipótese levantada inicialmente pela polícia: a de que ela tenha sido morta por ódio individual a esquerdistas, mulheres, negros ou homossexuais. Ora, alguém acredita que um matador profissional vá passar três meses estudando os passos de uma pessoa, antes de matá-la, apenas por não gostar de “gente de esquerda”? Pois foi o que fez o matador de Marielle.

    No fundo, essa história de crime de ódio é uma hipótese que serve mesmo a quem encomendou a execução. Crime de ódio é crime isolado, sem mandante.

    Investigações mostraram que o ex-PM Ronnie Lessa, o principal dos matadores, fez também levantamento da vida de outros possíveis alvos. De uma forma ou de outra, todos eles com atuação na defesa dos direitos humanos.

    Mas há algo intrigante. Teve, também, a vida investigada pelo matador o professor Pedro Mara, diretor do Ciep 210, em Belford Roxo, na Baixada Fluminense. Nesse caso, há uma diferença entre Mara e os demais. Ele não tem atuação política aberta. Mas tinha tido recentemente uma dura discussão com Flávio, um dos filhos de Bolsonaro e amigo íntimo de milicianos, tornando-se seu desafeto. Será que, por isso, passou a ser um alvo possível?

    Duas conclusões surgem do que foi dito acima.

    A primeira é que a morte de Marielle pode não ter sido pensada inicialmente como um atentado isolado. A execução aparentemente faria parte de uma série. Talvez a enorme repercussão do crime tenha sustados outros atentados que viriam em seguida.

    A segunda conclusão: o fato de o professor ser também um alvo do matador é mais um elemento a indicar a proximidade dos Bolsonaros com paramilitares. A hipótese fortalece a impressão de que o presidente e a família têm relações mais próximas com a milícia do que muitos pensam. Próximas a ponto de uma altercação individual do 1º (ou ele será o 2º? Ou o 3º?) levar o nome do desafeto à lista de alvos potenciais de um matador profissional.

    Perigo para a democracia

    Todo esse quadro traz à tona uma possibilidade macabra e perigosíssima para a democracia. Será que as milícias podem se transformar no embrião de algo semelhante à Aliança Anticomunista Argentina (Triple A), grupo paramilitar que eliminou ativistas de esquerda? Seria algo muito sério. Para que se tenha uma ideia da gravidade da hipótese, basta dizer que, segundo relatórios de entidades de defesa dos direitos humanos, a Triple A assassinou 1.122 pessoas, entre militantes, artistas, parlamentares, estudantes, historiadores, juízes e outros funcionários públicos na Argentina.


    Na campanha eleitoral, Wilson Witzel festejou o assassinato de Marielle em cima de um carro de som, ao lado de dois parceiros trogloditas que exibiam, em festa, a placa com o nome da vereadora partida em dois pedaços


    Começando a operar em 1973, quando do retorno do presidente Juan Domingo Perón ao país, aquela organização criminosa esteve em atividade até à derrubada de Isabelita Perón, em 1976, quando um golpe de Estado instaurou uma sangrenta ditadura militar. A partir daí, as próprias Forças Armadas se encarregaram do extermínio de militantes e simpatizantes da esquerda.

    Seja como for, parece evidente que uma tarefa se impõe: acabar com as milícias. E, claro, desvendar as ligações com o mundo da política.
    No Rio, elas já passaram de um domínio territorial localizado em áreas de periferia para voos mais altos, fora das regiões de influência originais. Tornaram-se quadrilhas de pistoleiros de aluguel, sem prejuízo de outras atividades criminosas que já exerciam.

    Os milicianos têm experiência militar e acesso a armamento de qualidade. Sabe-se, por exemplo, que foram contratados como matadores de aluguel nas disputas do jogo do bicho. Outras mortes fora das áreas de origem foram também de responsabilidade deles, admite a polícia.

    Crime e política

    Há outra pergunta relacionada ao caso Marielle e à promiscuidade das milícias com a polícia e o mundo da política: como vazou a operação que prendeu os dois ex-PMs matadores?

    A prisão deles traz mais indagações. Por razões legais, a polícia não pode entrar em residências antes das 6h da manhã. Talvez por isso, os assassinos tenham deixado as residências, preparados para desaparecer, em torno das 4h da madrugada. Não há dúvida de que tinham sido avisados da operação que os prenderia. Ao sair, porém, caíram nas mãos da polícia, que estava a postos desde as 3h da manhã, esperando amanhecer. Desconfiados de que, mais uma vez, uma operação vazaria, os policiais chegaram mais cedo.

    Quem alertou os dois matadores?

    É difícil pensar que em prisões dessa importância não tenha havido compartimentação de informações. É praxe que, em casos assim, os participantes da operação só sejam informados do objetivo no último momento. Até os celulares são recolhidos, por precaução.

    Se esses cuidados foram tomados, uma possível explicação para o vazamento é que ele tenha ocorrido “para cima”, a partir de quem, na cadeia hierárquica, era superior aos chefes da investigação. Eles seriam o secretário da Polícia Civil e o governador Wilson Witzel, que, pela relevância da operação, devem ter sido avisados.

    Claro que não se pode acusar quem quer que seja de ter vazado a operação. Seria uma leviandade. Mas, fica a pulga atrás da orelha.


    Os milicianos têm experiência militar e acesso a armamento de qualidade. Sabe-se, por exemplo, que foram contratados como matadores de aluguel nas disputas do jogo do bicho. Outras mortes fora das áreas de origem foram também de responsabilidade deles, admite a polícia


    Afinal, na campanha eleitoral, Witzel festejou o assassinato de Marielle em cima de um carro de som, ao lado de dois parceiros trogloditas que exibiam, em festa, a placa com o nome da vereadora partida em dois pedaços.

    Retrocesso civilizatório

    A execução de Marielle não foi mais uma morte, dentre tantas que ocorrem no Brasil. Embora toda vida humana tenha um valor igual – e incomensurável – a gravidade de assassinatos políticos vai além da perda de vidas. Os tiros atingem a democracia. Mostram que a luta política está sendo travada de forma inaceitável. São um retrocesso no processo civilizatório.

    O envolvimento de milícias com assassinatos políticos deixa claro, mais uma vez, que, no universo do chamado “crime organizado” (que deixa de lado os crimes cometidos por gente de paletó e gravata, limitando-se àqueles em que são usadas armas), os paramilitares são a principal ameaça.

    Daí ser preocupante que no pacote de combate à violência apresentado pelo ministro Sérgio Moro, em fevereiro, o combate às milícias não tenha lugar de destaque. Aliás, está quase ausente do documento, sendo citado apenas de passagem.

    A omissão só pode ser compreendida devido às ligações de milicianos com gente do poder. Mas, não seja por isso. O presidente tem uma boa oportunidade para demonstrar que não compactua com os crimes paramilitares. Foi proposta a abertura de uma CPI sobre milícias na Câmara dos Deputados. A bancada vai apoiá-la?

    Discurso comprometedor

    A propósito, vale lembrar o discurso de certo deputado no plenário da Câmara, em 12 de agosto de 2003, quando se tentou abrir uma investigação sobre um grupo de extermínio que agia na Bahia.

    “Quero dizer aos companheiros da Bahia — há pouco ouvi um parlamentar criticar os grupos de extermínio — que enquanto o Estado não tiver coragem de adotar a pena de morte, o crime de extermínio, no meu entender, será muito bem-vindo. Se não houver espaço para eles na Bahia, podem ir para o Rio de Janeiro. Se depender de mim, terão todo o meu apoio, porque no meu Estado só as pessoas inocentes são dizimadas”.

    O autor desse discurso foi o então deputado Jair Bolsonaro.

    De lá até hoje não houve qualquer indicação de que o presidente tenha mudado de opinião sobre esses grupos paramilitares.

    Talvez aí esteja a resposta à pergunta sobre as razões pelas quais Sérgio Moro não deu prioridade às milícias no plano de combate à criminalidade.

    *Cid Benjamin é militante do PSOL, jornalista e professor

  • Tenho que fazer o dobro para ser reconhecida pela metade

    Tenho que fazer o dobro para ser reconhecida pela metade

    Tenho que fazer o
    dobro para ser
    reconhecida
    pela metade

    Toco mais do que muito homem? Possivelmente, isso é verdade. Possivelmente, isso é mentira, mas o mais provável é que o único sentido nessa comparação é reforçar o lugar onipotente do homem, não o meu

    Por Manuela Trindade Oiticica*

    Uma cerveja bem gelada? Aceito. Dois goles de tutela? Não, obrigada. Sim, eu sei como segura um tamborim. É, é verdade. Um surdo mal tocado pode derrubar uma roda de samba. Tô sabendo, meu amigo, eu conheço essa música, mas olha, não necessariamente eu toco pra caramba. Toco o normal de quem sabe tocar e – eu sei que isso te dói em algum lugar que você nem sabe – o que tem é que eu conheço os códigos, compartilho saberes mundanos que envolvem uma manifestação popular. Igual a você. Rua, sabe? Eu também. Parece que meu lugar prosaico te deixa mais inseguro. Toco mais do que muito homem? Possivelmente, isso é verdade.

    Possivelmente, isso é mentira, mas o mais provável é que o único sentido nessa comparação é reforçar o lugar onipotente do homem, não o meu. Desagradeço, que isso nunca foi um elogio. Obrigada.

    Fica tranquilo que eu aguento tocar as três horas previstas de apresentação, não se aquiete que eu seguro o andamento mais rápido e não, não vou correr na música mais lenta. Pódeixar. Agora vem uma paradinha na música, eu sei que é minha vez de fazer a virada e, veja, vou dizer algo que você não deve perceber.

    Tenho que fazer o dobro pra ser reconhecida pela metade.

    A virada do meu instrumento na hora do silêncio vai ser boa. Aliás, muito boa. Muito melhor do que precisa pra essa roda de samba improvisada em que, sejamos francos, quase ninguém sabe tocar direito – mas em que quase todo mundo tem esse direito. Quase todo mundo. Se eu fizer tá tá tá, pode soar simples demais, tadinha, tá começando. Se eu fizer prapum tatá pracará tatatá, exibida demais, pra que isso, gente?, alguém diz pra moça que o samba é arte do singelo. Tudo bem, eu já sei a medida. Mais uma vez obrigada, com licença. E não se aquiete. Tente até não me enxergar muito.

    Tem mais gente tocando. Tocando melhor, tocando pior, normal. Olha pra mim. Normal, tá vendo? Pronto. Pode parar de olhar. Uma cerveja? Aceito. Uma hora alguma coisa vai dar errado, é do jogo. A gente bebe, se empolga, e o samba é desses que desnorteia. Você vai olhar de novo. Vai olhar, porque quando der errado, sem querer querendo, você vai olhar pra mim. Será que não foi ela? Pode ter sido, pode não ter sido, mas eu sempre vou ter que responder por isso.

    É, eu entendo. É mais fácil pra você quando eu sou diva e canto, quando eu sou tia e cozinho, quando eu sou linda e musa. Somos tudo isso também e não há problema, dá gosto sublinhar a tradição. Mas aí que também damos na cara do tambor, mão-pesada-de? Deixa eu mesma completar a frase: mão pesada de quem sabe a contundência do couro. Violão sete cordas, daqueles bem maestro? Cabe nela. Escuta, desiste enquanto é tempo da teoria da unha mais mole, o dedo que não alcança, a mão menor que não crava. O Romário tinha 1,68m e fez gol de cabeça nos suecos. Com licença, obrigada. Eu não quero brigar, por favor, obrigada. Saí de casa pra tocar e só. Você nem sabe quantas coisas têm que se mexer pra eu ter o direito de ficar parada.


    É mais fácil pra você quando eu sou diva e canto, quando eu sou tia e cozinho, quando eu sou linda e musa. Somos tudo isso também e não há problema, dá gosto sublinhar a tradição. Mas aí que também damos na cara do tambor, mão-pesada-de? Deixa eu mesma completar a frase: mão pesada de quem sabe a contundência do couro


    Um instrumento é porque é muito grande, o outro deve ser muito pesado, aquele ali exige força. Tem uns cientificismos que só servem pra ser os primeiros aliados pras desculpas. Pros vetos. Pras opressões. Mas deixa eu te dizer, se tiver chance a gente faz tudo. Senão, vejamos. A gente já faz mesmo sem muita chance. Deixa eu te dizer. Mas tem que ser no duro, chance desde pequenas.

    A guitarrinha de plástico, o rabisco fora da folha. Poder expulsar sem dó o berro da garganta que não vem ninguém dizer que fica tão feio pra menina berrar assim. Bater de espancar a lata de leite em pó sem se ouvir por aí que a mão da gente tem que ser – precisa ser! – delicada e não pode bater forte assim, que menina agressiva, meu deus. Depois tem que poder ficar até mais tarde na rua, porque muito desse baticum vem na fresca da madrugada, você sabe. Tem perigo pra todo mundo, né?, mas uma rua escura dessas, a gente sozinha, já pensou? E tem um ócio aí pra poder namorar a música, o instrumento. Lembre só que nossa jornada é maior.

    Nossa obrigação com o trabalho, a limpeza da casa, do corpo, da mochila, da calcinha, da dobrinha do pescoço, o caderno organizado, a letra bonita, as contas em ordem, nossa roupa não pode ser todo dia a mesma. Ficar amarrotada, ter mancha de sangue, não tem charme. A raiz branca do cabelo, sobrancelha, unha, aquela mulher tem um jeito de mal cuidada, né?

    Ainda por cima ganhamos pior e nosso espaço de lazer é menos o da brejeirice e mais o do controle, tipo uma casa com quatro paredes. Reparou: nem falei dos filhos.

    Mas olha, eu aceito uma cerveja, e teria muito mais pra te falar. Até porque eu não falei nada. Só ri quando você disse que eu deixava a roda de samba mais bonita e perfumada, e cada dente que eu não mostrei no meu sorriso amarelo de quem não quer se aporrinhar era uma dessas palavras escritas acima e que, tenho a mais plena convicção, você nem desconfia que existam.

    *Manuela Oiticica ou Manu da Cuíca é escritora, compositora e percussionista. É uma das autoras do samba da Mangueira de 2019.