Autor: Redação Lauro Campos

  • Estreia série de entrevistas “PSOL pelo Brasil”

    Estreia série de entrevistas “PSOL pelo Brasil”

    Estreia série de entrevistas “PSOL pelo Brasil”

    Na estreia da série “PSOL pelo Brasil”, Francisvaldo Mendes de Souza entrevista o presidente do PSOL ParaíbaTárcio Teixeira, que comenta a realidade econômica do estado, os desafios do PSOL 50 na atual conjuntura e os seus planos como pré-candidato ao governo da Paraíba.

    Veja o primeiro episódio

    Na estreia, Francis entrevista o presidente do PSOL ParaíbaTárcio Teixeira, que comenta a realidade econômica do estado, os desafios do PSOL na atual conjuntura e os seus planos como pré-candidato ao governo da Paraíba.

    Nessa primeira temporada, todas as terças e quintas-feiras, novos vídeos com novos presidentes e novos estados serão publicados nas plataformas digitais da FLC. Acompanhe nas redes, curta, comente e compartilhe!

  • FLC apoia seminário de policiais antifascistas

    FLC apoia seminário de policiais antifascistas

    FLC apoia seminário de policiais antifascistas

    Antifascistas, pela desmilitarização da segurança pública, pelo fim da política de proibição das drogas e da hierarquia das forças policiais. Essas são as pautas e o horizonte de reivindicação do Policiais Antifascistas, um movimento de trabalhadores do sistema de segurança pública de todo o Brasil, formado por policiais civis, militares estaduais e federais, bombeiros, guardas municipais, agentes penitenciários e do sistema socioeducativo e que se reuniram no Fórum Social Mundial, realizado em Salvador (BA), para o II Seminário Nacional dos Policiais Antifascismo com o apoio e a promoção da Fundação Lauro Campos.

    Na abertura do evento, o soldado da PMBA, Ewerton Monteiro, repudiou a afirmação de que “todo policial tem que apoio Bolsonaro”. “As pessoas acham que porque você é policial e Bolsonaro fala sobre polícia, você tem que apoiar ele. Não! Nós não apoiamos ele. Somos policiais e não concordamos com a política de segurança pública que ele quer para o Brasil. Estamos aqui para lutar por espaço e para o enfretamento das ideias fascistas”, comenta.

    Antônio Bonfim Moreira, servidor pública, convidado para a abertura do seminário, salientou a importância da criação do movimento e da luta antifascista. “Primeiro, falo como morador da periferia, falo como servidor público e falo na condição de “suspeito padrão”. Estar numa mesa sentado ao lado de policiais, que estão aqui para afirmar o contraponto ideológico e negar a hegemonia violenta que se impõem à sociedade. Esse esforço das forças de segurança é um esforço de todos que acreditam numa outra possibilidade de relação”.

    Durante o seminário, que ocorreu entre os dias 14 e 15 de março, outros temas como a “Intervenção Militar no Controle das Policias”, “O Tribunal de Rua e a Vingança como Justiça” e a “Proibição das Drogas e o Racismo Institucional”, também foram tema de debates com convidados como Marcelo Yuka, música e ex-integrante do grupo O Rappa.

    Confira, na íntegra, o Manifesto dos Policiais Antifascismo

    MANIFESTO DOS POLICIAIS ANTIFASCISMO

    O Movimento dos Policiais Antifascismo é um campo de atuação política, não institucionalizada e suprapartidária, formado por trabalhadoras e trabalhadores do sistema de segurança pública, representados por policiais civis e militares estaduais e federais, bombeiros, guardas municipais, agentes penitenciários e do sistema socioeducativo.

    Reunidos nos dias 28 e 29 de setembro, na cidade do Rio de Janeiro, em plenária final do I Seminário Nacional dos Policiais Antifascismo, na sede da OAB-RJ, deliberamos o presente Manifesto, visando divulgar as nossas pautas e reivindicações para conhecimento de todas as categorias policiais, movimentos sociais e instituições interessadas na luta antifascismo e na construção de uma sociedade mais justa.

    1) O fascismo é um modo de vida, que se manifesta como reação violenta de ódio às diferenças. Ele aponta a guerra, as armas e o sistema penal como solução para problemas sociais, esvaziando as ações politicas que efetivamente podem realizar transformações sociais. O Movimento Policiais Antifascismo se coloca, neste momento histórico de crescimento do autoritarismo no Brasil, como uma força viva contra estas manifestações, na perspectiva da construção de uma política de segurança pública democrática e pautada na garantia dos direitos humanos para todos.

    2) Policiais devem ser construídos como trabalhadores! O reconhecimento do direito de greve, de livre associação, de livre filiação partidária, bem como o fim das prisões administrativas, são marcos nesta luta contra a condição de subcidadania à qual muitos policiais estão submetidos. Acreditamos que este é o único caminho pelo qual policiais possam vir a se reconhecer na luta dos demais trabalhadores, sendo então reconhecidos por toda classe trabalhadora como irmãos na luta antifascismo.

    3) Não estamos em guerra! Qualquer tentativa midiático-policial de construir tal discurso como política pública tem por objetivo legitimar as políticas racistas de massacre, promovidas pelo Estado contra a população negra, pobre e periférica de nosso país. Tal política belicista acaba também por vitimar policiais, que operam na base das corporações do sistema de segurança, recrutados nos mesmos estratos sociais daqueles que são construídos como os seus “inimigos”.

    4) A desmilitarização da segurança pública se coloca como uma pauta urgente. Somos contra a participação das Forças Armadas em ações de segurança e defendemos a desvinculação das policias militares estaduais como forças auxiliares do Exército. Não podemos mais aceitar que policiais sejam reduzidos à condição de soldados, despido de muitos dos seus direitos como cidadãos e trabalhadores, ao mesmo tempo em que se estabelece um modelo de segurança pautado em ações militares violentas e letais contra a nossa população.

    5) É preciso por fim às politicas de proibição das drogas, que tem servido como dispositivo da militarização da segurança, sob o falso argumento de proteção à saúde pública. As ações militares contra o comércio das drogas feitas ilícitas acabam por gerar um quadro de destruição e de dor, principalmente nas populações pobres. A proibição das drogas mata mais do que o consumo das drogas, revelando assim a irracionalidade deste modelo proibicionista.

    6) O Movimento Policiais Antifascismo coloca ainda como urgência o debate sobre a reestruturação das forças policiais em nosso país, através da abertura do diálogo horizontal entre todas as categorias de trabalhadoras e trabalhadores da segurança pública com a sociedade.

    É preciso discutir a hierarquização das forças policiais, que cria um sistema de castas que permite privilégios àqueles que estão nas cúpulas, em detrimento do trabalho árduo e sem proteção daqueles que estão em contato com o dia a dia da população. Pautas como o ciclo completo, carreira única, unificação das policias, entre outras, que hoje tramitam em projetos de emendas constitucionais do Congresso, devem ser amplamente discutidas por todas as categorias policiais e não apenas no interesse daquelas que se encontram na direção e comando destas corporações.

    7) Entendemos, por fim, que estas pautas e reivindicações atendem aos interesses das classes policiais trabalhadoras, bem como aos anseios de todos os setores progressistas da sociedade, que desejam e lutam por uma vida não fascista em uma sociedade justa e igualitária.

  • Encontro em SP discute a conjuntura e o Manifesto Unidade

    Encontro em SP discute a conjuntura e o Manifesto Unidade

    Encontro em SP discute a conjuntura e o Manifesto Unidade

    Na noite desta terça-feira (20/3), as Fundações Lauro Campos, Perseu Abramo, Leonel Brizola e Maurício Grabois realizaram o terceiro encontro para debater a conjuntura e os próximos passos do Manifesto Unidade para Reconstruir o Brasil. O debate, que contou com a presença dos presidentes e representantes das fundações, além das convidadas Carina Vitral e Maria Inês Nassif, ocorreu no Centro de Estudos Barão de Itararé, em São Paulo.

    Francisvaldo Mendes, presidente da FLC, abriu o debate com considerações sobre a atual situação do país e como o manifesto pode ter um importante papel para os próximos enfrentamentos. “A construção do manifesto tem o objetivo de discutir como enfrentar as novas investidas dos setores conservadores e como construir um projeto alternativo para o país. A elite brasileira nunca deu trégua a classe trabalhadora e ao povo brasileiro. O desafio das fundações é que todos, entre nós, dialoguem e conversem. Nós temos de ter capacidade de discutir qual o projeto quer vamos defender para a população. Precisamos pensar e debater esses pontos principais: qual tipo de desenvolvimento queremos? Qual matriz energética? Qual meio de comunicação? Qual participação popular? Esse é o desafio que colocado para todos nós, no sentido de construir um projeto mínimo de defesa do nosso povo”, indaga.

    Francis, comentou ainda o significado do assassinato da vereadora Marielle Franco para a conjuntura e os desafios que seguirão em 2018. “Nós temos que dar condições de combater o machismo, o racismo e todas as formas de opressão. Não adianta só apoiar, temos que dar condições para esses enfrentamentos, de fato, acontecerem. Nós temos de ter a capacidade de entender que essas pautas são pautas centrais da política. Um nova sociedade pode surgir e a plataforma das fundações tem que estar aberta para discutir, ouvir e criar a unidade na prática. A barbárie não pode imperar na democracia.”, conclui.

    Outros encontros das fundações serão marcados em diferentes cidades do Brasil, com o objetivo de ampliar o debate e expandir os principais pontos do manifesto.

  • Resistir e transformar: FLC participa do Fórum Social Mundial em Salvador (BA)

    Resistir e transformar: FLC participa do Fórum Social Mundial em Salvador (BA)

    Resistir e transformar: FLC participa do Fórum Social Mundial em Salvador (BA)

    Com o tema central nos “Povos, territórios e movimentos em resistência” e com o slogan “Resistir é criar, resistir é transformar”, o Fórum Social Mundial voltou a ser realizado no Brasil depois de sete anos. O evento ocorreu entre os dias 13 e 17 de março, no campus da Universidade Federal da Bahia (UFBA), em Salvador. A Fundação Lauro Campos participou das atividades do fórum com a construção de espaços como o “II Seminário Nacional dos Policiais Antifascismo” e de debates sobre os desafios da esquerda para 2018.

    De acordo com o presidente da Fundação Lauro Campos, o Fórum Social Mundial é um importante espaço para envolver a população nos principais debates das organizações e movimentos sociais para a transformação social. “O envolvimento da população nos debates teóricos é importante, mas não podemos esquecer que o nosso foco tem que ser, também, o envolvimento na prática. O Fórum Social Mundial é fundamental para alinharmos as ideias de uma sociedade melhor, mas o mais importante é que o resultado desses debates, dessas ideias, seja a ação prática para as conquistas concretas para o povo”.

    Na Tenda Povo Sem Medo, no FSM: Marielle, Sempre!

    Na quinta-feira, 15, as atividades do Fórum foram interrompidas para a manifestação e homenagens para a vereadora do PSOL-RJ, Marielle Franco, brutalmente assassinada na noite anterior, na capital carioca. O evento “Desafios da Esquerda 2018”, programada pela Fundação Lauro Campos, que seria realizada na Tenda Povo Sem Medo durante o Fórum, com a presente o pré-candidato a presidente pelo PSOL, Guilherme Boulos, e a pré-candidata a vice-presidente pelo PSOL, Sônia Guajajara, foi transformada num espaço de homenagens de todos os partidos políticos e movimentos sociais presentes na UFBA.

    Com cerca de mil pessoas, a Tenda Povo Sem Medo se transformou no ponto de encontro para de grande parte dos participantes do FSM para um ato de homenagem e de resistência do genocídio do juventude negra e das mulheres negras no país. Confira algumas falas das principais lideranças dos partidos políticos e movimentos sociais durante o ato:

    Guilherme Boulos, pré-candidato à presidência pelo PSOL

    “Quem cometeu esse crime, cometeu certo do sentimento de impunidade. Quem fez isso deu uma mensagem que não está nem aí para as consequências. Da mesma forma que todos estivemos juntos para enfrentar os demais ataques democráticos, nos esperamos todos juntos para enfrentar esse novo ataque democrático. Que as investigações sejam feita e que se encontre quem praticou esse crime e, sobretudo, os mandantes. Nós vamos honrar a caminhada de Marielle e, enquanto não tivemos respostas pra questão de quem matou Marielle, nós não vamos descansar um só segundo”.

    Sônia Guajajara, pré-candidata à presidência pelo PSOL

    “Nós sabemos quem matou Marielle. Foi o sistema econômico, foi o sistema político. Nós não podemos só denunciar não, vamos reconstruir essa história. Vamos reconstruir esse Brasil. Nós precisamos reagir, é agora!”.

    Francisvaldo Mendes, presidente da Fundação Lauro Campos

    “Hoje é um dia em que a gente tem que ter como marco da renovação da nossa luta. Só esse ano foram mortos mais de seis líderes comunitários. Além do trabalhador que é assassinado todo dia, estão querendo amedrontar quem é organizado. Estão querendo dizer que nós não temos direito à nossa casa, à educação, à saúde, estão querendo dizer que o Estado é deles e que o estados tem que ser usado só por eles. E que nós temos que servi-los. A morte de Marielle tem que ser um recado que nós vamos reagir. Nós não vamos ficar lamentando, nós vamos à luta, porque a Marielle era de luta. Essa é a nossa tarefa”.

    Cleide Coutinho, militante PSOL – BA

    “A gente precisa cobrar justiça. Porque, ontem, foi a Marielle. Amanhã, pode ser outras Marielles por aí. São Marielles que estão sendo mortas todos os dias. Ou nós, mulheres pretas, nos juntamos na luta. Ou nós mulheres pretas, vamos nos juntar nas estatísticas. A gente não pode deixar isso passar impune. A justiça tem que dar conta!”.

    Ana Rocha, militante do PCdoB

    “A morte da Marielle é um sinal para o Brasil. É um sinal que algo de podre está acontecendo nesse país. Cada crime político e de assassinato, como esse, nós temos que reagir. Porque, senão, isso não vai ter fim. Nós estamos vivendo um estado de exceção criminoso, que precisamos conter nas ruas”.

    Inês Pandeló, ex-Deputada Estadual do RJ pelo PT

    “Estamos vivendo uma ditadura disfarçada, mas é uma ditadura. Agora, com a intervenção militar, fica mais nítido. Esse assassinato mostra que existe, sim, um estado de exceção. O Rio de Janeiro tem sido um laboratório no Brasil de políticas de repressão, de retirada de direitos, de violência institucionalizada. Marielle era um símbolo da luta das mulheres e, mais que isso, era um símbolo da luta dos direitos humanos, da justiça e da democracia”.

    Fábio Nogueira, presidente do PSOL – BA

    “Nós vamos continuar lutando, para dar continuidade à luta de Marielle, para realizar o seu sonho de uma sociedade justa e igualitária, para um sociedade sem racismo e opressão. Não dá mais para assistir o que está acontecendo, precisamos ir para as ruas, precisamos radicalizar o processo político, radicalizar a democracia e, com certeza, muitas Marielles surgirão nesse país para fazer a luta e a transformação”.

    Logo em seguida as falas, todos os participantes realizaram um ato contra o genocídio da população negra e em homenagem à Marielle na UFBA e nas ruas e avenidas ao redor do campus universitário.

  • O assassinato de Marielle Franco e a crise do fascismo

    O assassinato de Marielle Franco e a crise do fascismo

    O assassinato de Marielle Franco e a crise do fascismo

    Renan Zapata*

    Em 30 de maio de 1924, o deputado italiano Giacomo Matteotti fez um discurso na Câmara dos Deputados denunciando a fraude da eleição anterior, ocorrida a 6 de abril do mesmo ano, assim como a violência que havia acompanhado o pleito. Nessas eleições, a oposição ao regime de Benito Mussolini havia conquistado uma grande importância e desde então a maioria parlamentar fascista se deteriorava. Um ano e meio se passava da Marcha sobre Roma, manifestação que instaurou a ditadura fascista. Junto do discurso, Matteotti, do Partito Socialista Unitario, propunha invalidar a eleição de pelo menos um grupo de deputados. Apesar da proposta ter sido derrotada de forma esmagadora, os fascistas se atemorizaram.

    “Vocês são uma milícia armada, composta de cidadãos de um só partido, a qual tem a tarefa declarada de sustentar um determinado governo com a força, ainda que para isso, falte o consenso”[1]

    A motivação de Matteotti era de formar uma oposição combativa e intransigente, baseada no direito de legítima defesa. Não se importava de a proposta ser derrotada. Nem se importava com as consequências certamente fatais de tal atitude afrontosa. Depois do discurso, Matteotti disse profeticamente a alguns companheiros de partido: “Eu, o meu discurso fiz. Agora, preparem o discurso fúnebre para mim”. Bastaram dez dias para que ele fosse sequestrado. Acharam o corpo 2 meses depois num bosque a 25 quilômetros de Roma. Seu assassinato levou o fascismo a uma crise inesperada. A hegemonia fascista fragilmente preservada nas eleições de abril era suspensa. Uma comoção de grandes proporções toma conta da Itália, o fascismo é cada vez mais explicitado em seu aspecto autoritário. Cria-se uma abertura histórica para isolar o fascismo e desenvolver uma hegemonia da oposição, democrática. Porém, os inúmeros partidos da esquerda italiana não conseguem entrar em acordo para uma ação conjunta e decisiva. Fragmentada e desorientada, essas várias agremiações parecem não ter a força necessária para se sobrepor ao fascismo. Três meses depois da morte de Matteotti, um militante comunista mata um deputado fascista, vingando Matteotti. O terrorismo fascista recomeça e a abertura histórica de crise começa a se fechar.

    Essa mesma crise do fascismo que se abriu na Itália da década de 20, agora ressurge diante de nós mesmo que o nosso atual regime não seja propriamente fascista. O assassinato da vereadora Marielle Franco do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), ao que tudo indica, por paramilitares, desnudou para todo o mundo, o caráter autoritário, não só da intervenção militar do Rio de Janeiro, mas de toda a política envolvida nessa “solução”. A morte de Marielle acontece cerca de 15 dias depois dela assumir a relatoria na comissão da Câmara de Vereadores que avaliava a intervenção militar e a menos de um mês desta iniciar-se. O absurdo desse “excesso” colocou de uma vez por todas em suspensão o Estado democrático de direito. Isso é extremamente relevante, de um modo grave, porque o governo e o judiciário estavam mantendo a política da legitimidade da lei e do funcionamento normal das instituições, apesar de tudo. De certo modo, ela corria bem e camuflava todas as medidas impopulares, como se a popularidade do judiciário equilibrasse a impopularidade do governo Temer. Essa linha condicionava a esquerda a uma só estratégia, a de esperar pelas eleições. Toda angústia e impotência causada pelo assombro das reformas impostas desde o impeachment estavam sendo canalizadas para as eleições, mesmo com a incógnita da participação de Lula. Agora parece que a situação mudou. Antes, o governo e o judiciário conjugavam o funcionamento normal da democracia com o abuso de poder, um poder autoritário e seletivo contra os principais representantes do pacto do governo lulista, e na esteira contra todos os marginalizados. Agora, a aparência de democracia sofre um abalo significativo. Passou-se, então, de uma ordem fracamente legítima com popularidade média para uma ordem ilegítima. Po isso, renasce em todos os lados o debate sobre o terrorismo de Estado.

    Há com essa mudança, consequências explosivas e paradoxais. As manifestações do dia 15 de março por conta do assassinato de uma parlamentar de esquerda no dia anterior, que denunciava o Estado de exceção vivido nas favelas do Rio de Janeiro com a intervenção militar, recolocam as massas nas ruas. O que, por mais que se tentasse na defesa contra a perseguição de Lula, não tinha êxito. Esse assassinato não aparece ao mundo como mais uma morte de negros da periferia, contudo, mais do que isso, como um crime político, oficial e excepcionalmente político, de uma representante do povo com imunidade parlamentar. O peso simbólico que se ergue é que o Estado não se sustenta mais. Isso significa rigorosamente uma ruptura na ordem simbólica que balizava o governo. Ruptura que arranca a esquerda da inércia e a coloca de novo no protagonismo de suas próprias ações. A retórica pública, isto é, aquele pequeno “consenso” do que é permitido falar em público sem se isolar, do que é conveniente falar em público, volta a uma suspensão da hegemonia de direita, conquistada em 2013. Uma retórica pública democrática ressurge e sua força é ampliada pelo represamento angustiante a que o impeachment havia reduzido a esquerda e as forças populares, que padeciam de uma impotência somente consolada pela esperança das eleições.

    A esquerda pode intervir nessa crise de modo a fazer recuar o governo Temer tanto quando o judiciário na sua normalidade despótica. Para isso, são necessárias uma estratégia comum e uma ação sólida e coordenada. A oportunidade pode não representar de imediato muita coisa, mas batalhas gigantescas vão ser travadas nas próximas semanas, principalmente nos próximos dias. O “clima” político parece ter a primeira ocasião de ser remodelado e tende de novo a um equilíbrio das forças políticas. Isso pode fazer diferença na prisão de Lula, na perseguição ao PT, PSOL e movimentos sociais e também na garantia das eleições esse ano. Até a eleição com Lula hoje parece voltar a ser possível. As ocasiões, é claro, podem ser perdidas, mas mesmo assim o sacrifício de uma mulher tão corajosa, nos inspira a levantar a cabeça e lutar com mais garra. O deputado Giacomo também falou aos seus companheiros que embora pudessem matá-lo, a ideia que ele carregava, jamais.

    A voz da história ressoa alto: as ideias de Marielle não serão assassinadas!

    *Professor de história e filosofia e estudante de mestrado em Filosofia na FFLCH-USP

    [1] O texto integral desse discurso em italiano se encontra no site: https://it.wikisource.org/wiki/Italia_-_30_maggio_1924,_Discorso_alla_Camera_dei_Deputati_di_denuncia_di_brogli_elettorali

  • Mais mulheres no poder, mais poder para as mulheres

    Mais mulheres no poder, mais poder para as mulheres

    Mais mulheres no poder, mais poder para as mulheres

    Juliana de Souza Oliveira¹ & Rafael Moreira²

    No dia 8 de março comemoramos o Dia Internacional da Mulher. Porém, a escolha desta data não se deu por acaso. A data é comumente conhecida por homenagear as operárias atingidas por um incêndio em uma fábrica têxtil enquanto reivindicavam melhores condições de trabalho. Há diversas versões deste episódio, mas o fato é que a decisão da ONU em oficializar a data em 1921 vem do acúmulo de lutas e reivindicações que as mulheres travaram a longo de todo século XX. Para além de um dia de homenagens, como é visto por muitos nos dias de hoje, a data tem também um significado simbólico bastante forte, de lembrar a todas e todos as lutas históricas que as mulheres têm travado para reivindicar igualdade de gênero, cabendo a nós então aproveitarmos a data para recapitularmos esse histórico de lutas pela igualdade de direitos em nosso próprio país.

    No Brasil, o ano de 1932 é considerado a data que marca o direito feminino ao voto. A data é considerada um marco histórico fundamental nas conquistas femininas, e que em nosso país se deu muito antes de países ditos “desenvolvidos” e que muitas vezes são tomados como exemplos de democracias consolidadas, tal como França (1944) e Suíça (1971). Contudo, a letra da lei não acompanhou a realidade dos fatos.

    Entre 1932 e 1955 as mulheres foram apenas 30% dos eleitores registrados, o que se dava pelo fato do voto ser facultativo às mulheres casadas. Elas não eram obrigadas a fazer o título de eleitora, nem a votar. Assim, o que se dava na prática com o voto facultativo era uma permissão para que as mulheres ficassem à mercê de seus maridos no momento de participar politicamente. No limite, o acesso à esfera pública era concedido com a autorização do espaço privado, ou seja, do chefe da família.

    Apesar de muita coisa ter mudado naquele período, com um maior ingresso das mulheres no mercado de trabalho e o aumento significativo do seu grau de escolaridade, por incrível que pareça o voto somente passou a ser obrigatório a ambos os gêneros, equiparando os direitos políticos de homens e mulheres, em 1965.  Por consequência, se levarmos em conta então que durante todo o regime militar não houve eleições diretas para o cargo máximo do nosso governo, o de Presidência da República, isso significa que as mulheres votaram pela primeira vez para Presidente nos mesmos termos que os homens somente há 29 anos, há menos tempo que a promulgação da nossa Constituição.

    Em se tratando do exercício de cargos políticos a disparidade se torna ainda maior. Entre 1933 e 1964 o Brasil elegeu somente 4 deputadas e durante a Constituinte de 1946 nenhuma mulher foi eleita. Ainda hoje as mulheres são menos que 10% dos parlamentares. Em uma perspectiva comparada, entre 140 países analisados pela ONU, o Brasil está no 108º lugar em relação à representação da mulher no Parlamento. Em termos gerais pode-se dizer que avançamos no quesito representação, é verdade, mas ainda hoje os partidos sistematicamente desrespeitam a lei de cotas de no mínimo de 30% de candidaturas femininas, assim como distribuem de maneira bastante desigual os recursos disponíveis para campanhas eleitorais.

    Por todos esses aspectos, no dia 8 de março as mulheres reivindicam, acima de tudo, que suas vozes sejam ouvidas. Que elas possam estar nos espaços deliberativos para pensar e construir junto com os homens um diálogo onde o gênero não seja o critério para decidir se uma opinião merece ou não ser ouvida. Um dia de se lembrar que há um longo caminho a ser percorrido, inspirando-se na coragem daquelas que ao longo da história lutaram por igualdade de condições.

    [1] Mestranda em Ciência Política pela USP, pesquisadora do Núcleo de Estudos Comparados Internacionais (NECI), e bacharel em Ciências Sociais.

    [2] Doutorando e Mestre em Ciência Política pela USP. Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais pela mesma Universidade.

  • 8M: Um dia de luta que vai sendo extraído da consciência de todos

    8M: Um dia de luta que vai sendo extraído da consciência de todos

    8M: Um dia de luta que vai sendo extraído da
    consciência de todos

    Roseli Fossari*

    O dia 8 de Março, data em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, foi criado, basicamente, para se ter uma data anual em que fossem lembradas as lutas e conquistas das mulheres durante a história da humanidade. Não só para lembranças e comemorações, mas, principalmente, para unir, lembrar e reforçar na consciência das mulheres a sua condição de cidadãs, de trabalhadoras, de membros importantes e constituintes da sociedade, tão construtoras dessa sociedade quanto os homens, para que jamais perdêssemos essa consciência de indivíduos, bem distante de visões machistas de apêndices, de coadjuvantes, de objetos de um mundo predominantemente dos homens.

    Essa data nasceu no início do século XX, justamente para marcar as lutas das mulheres por melhores condições de vida, de trabalho e pelo direito ao voto. Primeiramente foi comemorado no dia 28 de fevereiro, de forma nacional, nos Estados Unidos, em 1909. Nos anos seguintes, outros países também comemoraram um dia alusivo à luta das mulheres, mas, em datas diferentes, normalmente entre o final de fevereiro até o dia 19 de março. Lembro ainda a importante contribuição do movimento socialista, não só para a instituição dessa data, mas, destacadamente, para o reconhecimento do papel da mulher na sociedade, sua necessária organização e, por fim, do estabelecimento de uma data comemorativa a essas lutas e organização.

    Em 1975 a ONU declarou aquele ano como o Ano Internacional da Mulher e, reconheceu o dia 08 de março como Dia Internacional da Mulher, o que de certa forma deu força ao reconhecimento mundial dessa data, sua afirmação e divulgação até os dias de hoje.

    Em 8 de março de 1917, as mulheres operárias da Rússia deflagraram uma greve contra o governo do Czar Nicolau II, devido à situação de fome que estavam passando, péssimas condições de trabalho e exploração. Esse acontecimento é reconhecido por muitos como tendo sido o estopim da Revolução Socialista Russa de 1917. Depois de vitoriosa a revolução, a feminista bolchevique Alexandra Kollontai persuadiu Lênin a oficializar o dia 08 de março como Dia Internacional da Mulher. Essa data até os dias atuais é feriado na Rússia e em outras repúblicas do leste europeu.

    Ocorre que como tudo que envolva pessoas, lutas, conquistas, celebrações, esta data que, foi criada para celebrar a luta, a união, as conquistas, a resistência das mulheres em todas as dimensões de suas vidas, foi e continua sendo, paulatinamente, absorvida pelo liberalismo econômico‐financeiro, apoiado e impulsionado pela grande mídia que, ou lhe pertence ou é refém de seu dinheiro, transformando‐a em uma data para homenagens, presentes e lembranças das mulheres como o antigo objeto dos homens: belas, trabalhadoras, educadas, dedicadas, mães, donas de casa entre outras classificações afins, descoladas das imagens de lutas e conquistas, avanços e retrocessos desses movimentos tão caros às mulheres da classe trabalhadora. Quer dizer, para a classe dominante, o objeto pelo qual tal data foi instituída, o valor das lutas das mulheres, de forma ampla eu diria que luta por sua emancipação como indivíduo, como membro social em termos de igualdade com os homens, foi sendo deixado de lado, deixado de ser lembrado, de ser citado, é como algo que não deve ser falado, se possível até esquecido, ou pelo menos, adormecido na consciência de todos, especialmente das próprias mulheres.

    Acredito que se fosse para termos um símbolo do dia 8 de março, ao invés de rosas, flores, corações, símbolos do feminino com esta ou aquela caracterização, desenhos de mulheres como normalmente esse dia é lembrado, deveríamos, de forma consciente, instituir como símbolo desse dia uma Amazona. Retratadas na história como mulheres guerreiras, que lutavam montadas a cavalo, boas na arte do arco e flecha e, que enfrentavam os homens que queriam submetê‐las. O próprio termo Amazona tem dois significados importantíssimos para nós, mulheres, quando pretendemos destacar nossa disposição de luta e resistência: esse termo que deriva de outro termo iraniano, quando lido em gentílico iraniano significa exatamente – guerreira – e, esse mesmo termo quando utilizado em jônico, significa “que luta junto”. Não seria perfeito termos como símbolo do dia que simboliza nossa luta, nossa capacidade de união e entendimento para lutarmos juntas e unidas pelo que consideramos justo, um símbolo que signifique: guerreiras que lutam junto?

    Nós precisamos lembrar a nós mesmas, a todos e ao mundo, que o dia 8 de março é celebrado como o Dia Internacional da Mulher, mas, que esse dia festeja a mulher guerreira, não um enfeite feminino em forma humana.

    *Servidora Pública Federal, Bacharel em História pela UFRGS, Bacharel em Direito pela UNIRITTER Porto Alegre e filiada ao PSOL

  • Mães e Trabalhadoras: os desafios em tempos de precarização dos direitos sociais

    Mães e Trabalhadoras: os desafios em tempos de precarização dos direitos sociais

    Mães e Trabalhadoras: os desafios em tempos de precarização dos direitos sociais

    Camila Pires*

    Longas horas desperdiçadas no transporte público precário para o deslocamento casatrabalho/trabalho-casa; dupla, e quando não, tripla jornada de trabalho, intercaladas entre as tarefas laborais, as tarefas de aperfeiçoamento profissional e as tarefas domésticas do cuidado da casa e dos filhos; baixa remuneração se comparada aos homens nos mesmos cargos assumidos e a informalidade nos postos de trabalho; esta é a realidade de milhares de mulheres, mães e trabalhadoras, nos contextos urbanos.

    Uma realidade que não é natural e sim resultado de processos históricos em que as mulheres foram inseridas no mercado de trabalho sem haver promoção de igualdade na divisão sexual do trabalho entre homens e mulheres. Após a revolução industrial o trabalho doméstico executado pelas mulheres deixou de contribuir para a economia do Estado, convertendo-se tão somente em tarefas de reprodução da força de trabalho. A centralidade da mulher como executora exclusiva do trabalho reprodutivo não foi superada com a sua inserção no mercado de trabalho: ao contrário, como bem pontuou Sílvia Federici1, “a reprodução dentro do sistema capitalista não é vista como um trabalho, mas como um dom natural, biológico” atribuído as mulheres, e portanto, não remunerado. Assim, o sistema capitalista se sustenta por meio da exploração das mulheres no trabalho reprodutivo não renumerado, ou seja, o capitalismo depende de “uma separação da produção e da reprodução, e consequente hierarquização da divisão sexual do trabalho”.

    Soma-se a este contexto os índices de pesquisas recentes, apontando um crescimento significativo de mulheres que comandam os lares: se em 1995 este índice consistia em 23%, em 2015, segundo informações da pesquisa Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça, (Ipea)2, apontam para um salto de 40% de famílias chefiadas por mulheres. Não obstante, o IBGE apontou ainda que em 26,8% dos domicílios com filhos de casais separados era a mulher a pessoa de referência. Entre os homens, essa proporção era de 3,6%. No total de domicílios em que o pai e a mãe estão separados, em 88,2% dessas casas é a mulher a pessoa de referência.

    Ora, se o trabalho reprodutivo segue sendo não remunerado e atribuído exclusivamente as mulheres, bem como crescem os índices de mães solteiras e chefes de família, quais são os limites e desafios quando se trata da emancipação das mulheres, mães e trabalhadoras, da sua condição de exploração?

    É preciso denunciar, portanto, que a inserção das mulheres no trabalho produtivo (além das tarefas de reprodução), assumindo o comando no lar, não significa a sua plena e efetiva emancipação se, no mercado de trabalho, permanecem as desigualdades na divisão sexual do trabalho que impõe as mulheres a sobrecarga da jornada dupla, impõe as piores remunerações3, bem como postos de trabalhos mais precarizados, sem garantir direitos sociais específicos para as mulheres a exemplo da licença-maternidade, creches e escolas públicas de turno integral.

    As mulheres, mães e trabalhadoras, não alcançarão sua plena emancipação enquanto ainda são as principais penalizadas com os escassos investimentos em serviços públicos, quadro que se agrava com a perversa agenda ultraneoliberal imposta pelo Golpe de 2016. Se os investimentos em serviços públicos já eram precários, a Emenda constitucional 95 que aprovou o congelamento em investimentos nos serviços públicos pelos próximos 20 anos afeta de forma perversa a vida das mulheres, principalmente as mães trabalhadoras negras e periféricas: Com o desmonte da educação pública, seus filhos serão abandonados a sua própria sorte, o acesso a creches públicas será cada vez mais escasso. Seguindo a mesma lógica do enxugamento do Estado, a Reforma da Previdência defendida pelo Governo ilegitimo de Temer, desconsidera todas as desigualdades do mercado de trabalho, aprofundando-as no momento da aposentadoria. O diferencial entre homens e mulheres na previdência social (que ainda garante um menor tempo de contribuição para as mulheres) é o único mecanismo a reconhecer a divisão sexual do trabalho, que destina às mulheres piores salários, piores condições de trabalho e maiores responsabilidades do trabalho não remunerado.

    Em tempos de perversos retrocessos, é preciso disposição para lutar e defender a plena emancipação das mulheres, trabalhadoras e chefes de família, o que passa pela defesa de um programa radical de políticas em que a coletividade e o Estado assumam a responsabilidade pelo trabalho reprodutivo e invista na promoção de qualidade dos serviços públicos. E para tanto, é preciso ampliar o acesso a educação em tempo integral, ampliar o acesso a creches publicas, para os filhos das mães trabalhadoras; bem como investir na construção de lavanderias e restaurantes públicos para aliviar a sobrecarga da dupla jornada de trabalho das mulheres. Nenhum direito a menos!

    Que no 8 de março, mobilizadas pela história das mulheres lutadoras que vieram antes de nós, façamos ecoar as nossas pautas e construamos uma importante trincheira de resistência contra a agenda de retirada de direitos do governo ilegítimo Temer!

    *Camila Pires é Mestre em Ciências Sociais pela UERJ e militante da Intersindical e do Fortalecer o PSOL

    ___________________
    1 FEDERICI, Silvia. Calibã e a Bruxa. mulheres, corpo e acumulação primitiva. Editora Elefante; 2004.
    2 A sondagem, divulgada em 2016, é realizada com base nos números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), IBGE.
    3 Segundo o IBGE, os homens sempre ganham maiores salários inclusive ao assumir cargos de chefia: eles tem rendimento médio mensal de R$ 5.222 e elas, R$ 3.575, uma diferença de 31,5%.
  • A mulher como eixo da igualdade material prevista na Constituição da República à luz do caso da jogadora de vôlei Tifanny Abreu

    A mulher como eixo da igualdade material prevista na Constituição da República à luz do caso da jogadora de vôlei Tifanny Abreu

    Por Mariah Lessa*

    Em oito de março comemora-se o Dia Internacional da Mulher, data que simboliza mundialmente o êxito em uma série de reivindicações, a fim de alçar, por exemplo, direitos políticos e trabalhistas indistintamente aos cidadãos ou àqueles com qualidades de sê-los. Dia marcante em uma jornada incansável de luta e enfrentamento político-social.

    Em um país historicamente tradicional, como é o que se revela no Brasil, o simples fato de ser mulher representa aspectos mais relevantes que o gênero do indivíduo, tais quais, os imbróglios na inserção no mercado de trabalho, a tripla jornada, bem como as mazelas oriundas da realidade misógina hodierna. Nascer mulher é conviver com inúmeros impasses , tornar-se mulher – através de um processo de transgenia – é ato de força, coragem e, sobretudo, empoderamento feminino. Tifanny Abreu representa exatamente todos estes predicados. Ela foi a primeira – e até então, a única – atleta transexual a disputar uma partida oficial na Superliga Feminina de Vôlei.

    A jogadora reacendeu diversos questionamentos e preconceitos silentes na sociedade e na comunidade esportiva, principalmente por despontar como a maior pontuadora da Liga. Argumentos sociológicos, metabólicos e os do senso comum não foram suficientes para coibir a atuação de Tifanny na competição, tendo em vista que, segundo a Confederação Brasileira de Vôlei, os índices de testosterona da atleta estão nivelados com os dos seus pares, após tratamento médico pertinente.

    Em face dos debates decorrentes da condição biológica (não só hormonal) da jogadora e das nuances da transgenia, é de suma importância reviver o conceito de igualdade extraído da Carta Magna vigente, proclamando o aspecto material que o norteia, a saber, o tratamento desigual que deverá ser suplantado aos desiguais, na medida de suas desigualdades. Trago à baile a igualdade material não para clamar por um tratamento desigual à Tifanny, mas sim para apontar a necessidade, através do políticas públicas, de naturalizar a inserção da mulher trans nos contextos sociais, não as marginalizando, tampouco as negligenciando.

    É de suma importância que mulheres transexuais, bem como transgêneras, adentrem, de forma humanizada, nas diversas camadas sociais, a fim de mitigar uma realidade cruel e hostil que tende a se potencializar diante dos discursos de ódio que se propagam de força maçante.

    Dito isto, vale ressaltar que, ser mulher é, principalmente, ter o prazer de usufruir de todas as forças que os percalços nos obrigam a ter, é ser mais forte do que imaginávamos que realmente somos. Em um país enfestado de machismo, ser mulher é sofrer, mas também sorrir, sem nunca deixar de regar a flor da esperança.

    *Mariah Lessa, 23, é advogada, pós-graduanda em Direito de Família e Mediação, filiada ao PSOL e Membro do Diretório Municipal do PSOL em Maceió-AL