Autor: Redação Lauro Campos

  • Boitempo publica livro de Lauro Campos

    Boitempo publica livro de Lauro Campos

    A editora Boitempo acaba de lançar a segunda edição da obra “A crise da ideologia keynesiana”, escrita pelo economista Lauro Campos. A edição contou com o apoio da Fundação que leva seu nome.

    Publicada pela primeira vez em 1980 pela editora Campus, a nova edição que agora chega às livrarias foi revista e ampliada pelo autor quando vivo, e é uma importante contribuição ao pensamento econômico marxista.

    Os professores Carlos A. F. Lima (Universidade de Brasília) e João dos Reis Silva Jr. (Universidade de Sorocaba) afirmam, no prefácio que escrevem, que “este livro é impressionante pela análise percuciente, meticulosa e cuidadosa que faz dos meandros, ardis e malabarismos contidos na obra do genial lorde Keynes. O texto está escrito numa linguagem inteiramente acessível. O autor era um mestre nos variegados domínios em que, como escafandrista, analisou a obra de Keynes”.

    Juliano Medeiros, presidente da Fundação Lauro Campos e autor da orelha do livro, escreve que “nesta extraordinária obra, Lauro Campos demonstra toda a atualidade da perspectiva marxista sobre a economia política. E o faz tecendo uma crítica implacável ao que denominou de ideologia keynesiana, cujo papel seria o de sustentar um Estado capaz de ‘preservar as relações capitalistas, evitar o crescimento das forças produtivas, fazer com que o capitalismo sobreviva a si mesmo’”.

    O livro “A crise da ideologia keynesiana” pode ser encontrado nas livrarias ou ser adquirido na página da editora Boitempo.

     

  • Carandiru, Pedrinhas e Manaus: as prisões como projeto de dominação de classe

    Carandiru, Pedrinhas e Manaus: as prisões como projeto de dominação de classe

    por Marcelo Biar*

    Eis aí, em Manaus, uma nova velha rebelião. Nova em Manaus, e velha no Brasil. Repetitiva, arriscaria dizer. Uma rebelião de classe, ainda que sem consciência. Há algo que unifica a história do Carandiru (SP), Pedrinhas (MA) e COMPAJ (AM). São presídios brasileiros e cumprem, ou cumpriram, a mesma função. A de aglutinar excluídos. Na verdade, os presídios são locais que recebem os indesejados a ordem dominante, quando em excesso. Quando extrapolam o quantitativo conveniente e controlável. É assim hoje em dia e também desde o século XIX quando recebia em sua absoluta maioria, escravos indisciplinados. Pois é, pena de privação de liberdade para quem não a tinha. Reclusão e castigo a quem ameaçava a ordem. No Rio de Janeiro, entre 1810 e 1821, tivemos o total de 4776 presos. Destes, 3182 eram escravos, 944 libertos (negros ex escravos) e 20 homens livres**. Neste período, seja pela questão étnica ou pela condição jurídica (escravo ou homem livre) ficava muito fácil identificar quem devia ser reprimido no Brasil. Hoje, reconfigurada a questão étnica e, transformada a questão jurídica em questão de classe, seguimos com a mesma prática. A mesma lógica. O encarceramento do excluído.

    Mas não se trata apenas de encarcerar. Na verdade é necessário demarcar este grupo como sendo aquele que erra, para que o projeto de dominação e exploração brasileiro tenha êxito. É preciso, portanto, ter uma prática penal que demarque o indivíduo que delinquiu como impróprio para o convívio social, não apenas no período previsto pela pena, mas por todo o sempre. E, considerando que como preso não temos um sujeito social aleatório que cometeu um delito, mas sim um perfil social muito claramente definido, pode-se, assim, atestar a todos, a incivilidade da classe subalterna. Pronto, a classe social que se apodera do aparato jurídico e repressivo legitimador da ordem classista, criminaliza a existência do grupo social por ela explorado. Transforma o estar à margem em ser criminoso. Ou seja, criminaliza toda identidade do subalterno, justificando e absolvendo a relação de produção que o subalternizou. Absolvendo a si própria da expropriação e naturalizando a diferença de classe.

    Completa este quadro o uso que a classe dominante faz do oprimido que, à margem da sociedade, do emprego formal, da condição cidadã e tudo mais, acaba por se ocupar de atividades criminosas que acumulam capital para seu opressor. O tráfico de drogas é um exemplo. A etapa conhecida, temida e criminalizada desta atividade econômica tão contemporânea quanto concentradora de renda é, justamente, a fase varejista que é executada por este subalterno. Este que morre, é preso e não acumula capital. Este que vive e sofre uma peculiar expropriação do grande capital.
    O presídio é um setor importante desta lógica expropriadora. É o local, inclusive, de onde o Estado organiza, fomenta e regula o crime a partir da concentração daqueles que o cometeram, e da “faccionalização” deste. Não por acaso as facções criminosas conhecidas e desenvolvidas nas últimas décadas foram criadas dentro dos presídios com clara intervenção e/ou mediação de agentes do estado.

    O Estado centauro, aquele que possui parte do corpo voltado para a ausência do Estado (em questões sociais) e outra parte para a grande presença (em questões repressivas), assim chamado pelo sociólogo francês, Loicq Wacquant***, tem seu coração no presídio. Nesta lógica neoliberal, em que quanto maior a ausência do estado no campo social, maior, por consequência, no campo repressivo, o aparato vem se sofisticando. Criaram as SEAPs (secretarias de estado de administração penitenciária), o FUNPEN (Fundo Penitenciário) e uma parafernalha tecnológica como detectores de metal etc. Isto que parece investimento de Estado na questão da segurança é especialização e financiamento de um processo de dominação. As SEAPs são a afirmação do encarceramento como fim, já que de todo amplo espectro da execução penal concentra como seu único foco, a privação de liberdade. Não entende esta como um aspecto de todo um contexto que deve ser abrangido que envolve, dentre outras coisas, a reconfiguração de identidade daquele que delinquiu e a mediação com a sociedade e suas relações para que este sujeito se integre de forma construtiva na mesma. É a afirmação da clausura. Por sua vez, o FUNPEN é o órgão que financia tal prática. Criado em 1994, tem se esmerado em financiar ampliações e construções de cadeias. Ampliação deste sistema.

    Neste Brasil que já é o quarto país em população carcerária, Carandiru, Pedrinhas e o recente episódio em Manaus (COMPAJ), são tão somente acidentes de percurso. O problema não são as rebeliões, mas sim o próprio sistema. Mas as rebeliões, contraditoriamente, ao invés de denunciar a falência deste sistema, reforçam no imaginário coletivo a indesejabilidade do preso, e consequentemente do seu grupo social, ratificam a repressão e, pasmem, afirmam a eficiência do Estado que, como se não lhe coubesse responsabilidade no processo de rebelião, aparece com soluções repressivas que nada diferem de suas ações anteriores, mas que parecem redentoras ante grande parte da população amedrontada pelos “perigosos”.

    A foto, amplamente divulgada, dos rebelados de Manaus com armamento pesado no interior do presídio, assusta tanto e a tantos que impede que se pense na falência da instituição que, antes mesmo de ser queimada por estes, já se apresenta secularmente apodrecida. A mesma foto dá vida a notícia de que o governo Temer liberará R$1,2 bilhões para o FUNPEN. Divulgada dias antes da rebelião sem maiores repercussões, esta notícia reciclada pela rebelião dá pungência a ação repressora. Reafirma a necessidade de tal prática. Revigora um governo ilegítimo e gestor das relações que implodiram.

    Não se trata, por ora, de discutir se a gestão dos presídios é pública, terceirizada ou privada. Trata-se de negar a ação gestora opressora. O laboratório de negação de direitos e estigmatização que é o presídio contemporâneo. Esta instituição que, não por acaso, surge na afirmação da sociedade burguesa, é um importante mecanismo da dominação de classe. Atua no consenso e na coerção. Na repressão e na construção de subjetividades que legitimam a desigualdade. Tanto quanto podemos dizer que a prisão é um elemento de opressão de classe, podemos afirmar que qualquer um que anseie o fim da desigualdade social, da opressão classista, que não repense a instituição de privação de liberdade estará operando de forma inócua. Assim, seja em Manaus ou na Lava Jato, na prisão de um ladrão de celular ou do Eduardo Cunha, temos que ter cuidado para não alimentar o monstro que quer nos engolir. A prática de violações aos direitos do cidadão é um projeto de poder, seja na sociedade livre, no trato do judiciário, ou na prisão. Quando comemoramos tal prática com aqueles que não simpatizamos reforçamos uma lógica de opressões com a qual, salvo engano, também não simpatizamos. (Espero que não!). O sistema não pode receber o respaldo de quem deseja sua derrocada. Milhares de presos, no Rio de Janeiro, tem o acesso a água limitado a 3 vezes ao dia com duração de 20 minutos e defecam em buracos no chão. Os chamados “buraco do boi”. Quando alguém comemora a chegada de Sérgio Cabral a uma destas prisões, percebendo ou não, aceita tal situação. E pior, a cada ex governador a ter seu direito violado, a despeito de sua indigna conduta na vida pública, milhares de oprimidos seguirão sendo desrespeitados em sua dignidade. Quando se comemora uma ação arbitrária do juiz Sérgio Moro com um réu da Lava Jato, repito, a despeito de sua indigna conduta, milhares de populares sofrerão, ou continuarão a sofrer, tais arbitrariedades. Enfim, não se vence um sistema comemorando suas ações. Não se rompe a exploração de classes fortalecendo seus mecanismos.

    Termino recordando uma cena do filme 400 contra 1, baseado no livro homônimo de William de Souza (o Professor, fundador do Comando Vermelho), em que presos comuns ao verem sendo retirados do presídio da Ilha Grande os presos políticos, gritam que estava havendo um engano. Dizem que proletários ali, são eles. Sem entrar no mérito de quem representa o proletariado naquela circunstância, é preciso que se deixe claro que o sistema penitenciário brasileiro e o judiciário com sua prática autoritária, são um projeto classista de dominação e opressão. Em Manaus ou em qualquer lugar, o preso, a despeito do delito cometido, é sim um preso político. Um preso de classe. O desrespeito aos direitos humanos, na cadeia, assim como a arbitrariedade da justiça que fere, por muitas vezes, o próprio direito de defesa e a presunção de inocência, também é um projeto de dominação classista. Não perceber ou não denunciar isto é, portanto, consciente ou não, uma prática reacionária que sustenta esta sociedade desigual.

    Manaus, Pedrinhas ou Carandiru, são panelas de pressão. Todas apitam ou explodem. Mas o que devemos discutir não é isto, mas sim a panela em si!

    *Marcelo Biar é professor de História com mestrado em Serviço Social e doutorado em História, pela UERJ. De 2007 a 2011 trabalhou como diretor de escola e professor no Complexo Penitenciário de Gericinó (Bangu_ RJ) e é autor dp livro ARQUITETURA DA DOMINAÇÃO: O RIO DE JANEIRO, SUAS PRISÕES E SEUS PRESOS, Editora Revan.
    ** Este estudo pode ser encontrado no artigo ENTRE DOIS CATIVEIROS: ESCRAVIDÃO URBANA E SISTEMA PRISIONAL NO RIO DE JANEIRO 1790-1821, de Carlos Eduardo M. de Araújo, do livro HISTÓRIA DAS PRISÕES NO BRASIL, Editora Rocco.
    *** Loiq Wacquant é um sociólogo francês, autor de AS DUAS FACES DO GUETO e AS PRISÕES DA MISÉRIA.

  • Fundação Lauro Campos recebe o lançamento da Bancada Feminista

    Fundação Lauro Campos recebe o lançamento da Bancada Feminista

    Na sexta-feira, dia 09 de dezembro, a Fundação Lauro Campos recebeu o lançamento da Bancada Feminista do PSOL. A atividade, promovida em conjunto com o Setoriais de Mulheres Nacional e Estadual-SP, recebeu 10 das 11 vereadoras eleitas em 2016.

    Estiveram presentes Áurea Carolina e Cida Falabella de Belo Horizonte (MG); Marielle Franco, da cidade do Rio de Janeiro; Talíria de Niterói (RJ); Fernanda Garcia, de Sorocaba (SP); Sâmia Bonfim, da cidade de São Paulo (SP);  Rosi, de Tanabi (SP); Fernanda Melchiona, de Porto Alegre (RS); Fernanda Miranda, de Pelotas (RS); e Mariana Conti, de Campinas (SP).

    Mais de 200 pessoas compareceram ao lançamento da bancada, que contou ainda com a participação de Luciana Genro, candidata à prefeitura de Porto Alegre, e Luciana Boiteux, candidata a vice-prefeita do Rio de Janeiro nas últimas eleições.

    Ao final da atividade, as vereadoras eleitas leram uma carta que orientará a ação política dos mandatos feministas, que pode ser conferida abaixo:

    Apresentamos nesta carta a constituição da nossa Bancada Feminista do Partido Socialismo e Liberdade. Acreditamos que é tempo de uma intervenção unificada entre as vereadoras e os movimentos sociais para resistir aos ataques dos governos e dar mais potência às lutas em defesa das mulheres.

    Estamos vivendo um ataque sem precedentes aos direitos dos trabalhadores com o governo ilegítimo de Temer, com a PEC 55 que congela por 20 anos os investimentos nas áreas sociais e a recente (Contra) Reforma da Previdência que impõe a idade mínima de 65 anos para as aposentadorias.  Todas essas medidas afetam o conjunto da classe trabalhadora e, principalmente as mulheres, que ganham em média 30% a menos que os homens, que enfrentam duplas e triplas jornadas de trabalho, que sofrem com o assédio sexual e moral, não encontram vagas nas creches e têm os empregos mais precários. São as mulheres mais pobres que morrem vítimas dos abortos clandestinos e inseguros. Precisamos debater a descriminalização do aborto como questão de saúde pública e não como um tabu.
    Além disso, na maioria das cidades do país ganharam prefeitos da direita, que se alinham com a política do governo federal e que de longe não têm como prioridade os direitos das mulheres. Há ainda setores fundamentalistas que representam sérios riscos aos nossos direitos sexuais e reprodutivos e liberdades democráticas.

    Mas, apesar disso, há muita luta protagonizada pelas mulheres no mundo e no Brasil. Recentemente a campanha #Ni Una a Menos reuniu milhares de mulheres na Argentina, a resistência ao ataque a legislação do aborto na Polônia foi vitoriosa depois de muito luta, as primeiras manifestações de resistência à Trump nos EUA tem jovens, mulheres e negros na linha de frente. No Brasil,  os atos contra o Cunha, contra a cultura do estupro, da Marcha das Mulheres Negras, das hashtags nas redes, nosso recado é forte: não aceitaremos mais o machismo, vamos denunciá-lo e vamos nos organizar para conquistar nossos direitos. Vamos ocupar a política e todos os espaços que nos foram negados historicamente.  E a eleição das feministas do PSOL também é a expressão da Primavera das mulheres. Para além de ocupar as ruas, estamos ocupando a política.

    Apresentamos a vocês a nossa bancada: a Bancada feminista. Agora, em pelo menos 10 Câmaras do país, haverá uma mulher feminista disposta a levar nossas demandas e lutas nas cidades, onde as mulheres mais sofrem com o machismo. Vamos enfrentar o conservadorismo, defender mais verbas para o combate à violência, leis e políticas públicas voltadas à nossa segurança, saúde, cultura e liberdade. Queremos fazer dos nossos mandatos megafones das vozes das mulheres que tomam as ruas de todo o país.

    Queremos fazer desta construção um espaço de discussão permanente dos feminismos, colocando a necessidade da luta das mulheres ser interseccional, classista, trans e negra. Queremos ter espaços coletivos e permanentes com os movimentos sociais e ativistas, debatendo e potencializando as lutas. Sabemos que são tempos de resistência e de organização para construir o futuro. Cada um de nossos mandatos é parte das trincheiras necessárias para enfrentar a exploração capitalista e um de seus principais pilares: o patriarcado, o racismo e toda a forma de opressão.

    Nosso primeiro encontro realizado em 09 de dezembro de 2016, lança este desafio e convidamos a todas as ativistas a estarem nesta construção conosco.

    bancada-feminista

  • Revista nº 15 – dezembro de 2016

    Revista nº 15 – dezembro de 2016

    Esta edição da SOCIALISMO & LIBERDADE é dedicada à memória de Fidel Castro, falecido quando a revista estava em vias de ser enviada para a gráfica. Refizemos a capa e inserimos mais quatro páginas sobre o líder máximo da Revolução Cubana. Seria inaceitável que a primeira edição da revista depois da morte de Fidel não prestasse uma merecida homenagem a ele.

    Fidel – Morre um gigante. Fica seu exemplo |Cid Benjamin
    Balanço das eleições municipais | Luiz Araújo
    A reforma educacional e o Estado em disputa | Andrea Caldas
    O desmonte do Estado | Denise Gentil
    Democratização da mídia| Gustavo Gindre

     

  • Corrupção, transparência e participação popular

    Corrupção, transparência e participação popular

    por Juliano Medeiros*

     

    No último dia 2 de maio, o Ipea recebeu o presidente da Associação Brasileira de Ciência Política, Leonardo Avritzer, para debater os impasses da democracia brasileira, da participação popular e do combate à corrupção. Para o presidente da ABCP, o Brasil possui um sistema político imune à participação social. Tomando como ponto de partida as considerações do pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais e o complexo momento político que vive o país, é válido perguntar: a participação popular pode contribuir no combate à corrupção e no aumento da transparência?

    O conceito de participação surgiu no âmbito da teoria democrática em contraposição aos limites da ideia clássica de representação, historicamente associada à defesa de modelos minimalistas ou estritamente eleitorais de democracia. Ao contrário, a participação vertebraria a crítica a tais modelos e serviria para elaborar propostas de democracia mais ambiciosas.1

    No Brasil a participação deu um salto na década de 1980 a partir da difusão das novas teorias, do surgimento de novos movimentos sociais e da implantação de programas específicos, criados com o propósito de democratizar a gestão do Estado e de aperfeiçoar as formas de interação entre o poder público e a sociedade. Essa ampla mobilização origina várias formas de participação local, com destaque para a experiência do Orçamento Participativo, que chegou a ser adotada por 192 municípios, administrados por vários partidos.

    Portanto, os mecanismos de participação popular não são novidade no Brasil. No âmbito 1 GURZA LAVALLE, A.; ISUNZA VERA, E. Representación y participación em la critica democratica. Desacatos, n. 49, setembro‑dezembro 2015, pp. 10‑27. federal, foram constituídos ou aprimorados nos últimos anos diferentes mecanismos de interação entre Estado e sociedade. Existem hoje 35 Conselhos Nacionais temáticos que contam com a presença da sociedade civil, além de outros mecanismos como as 98 Conferências Nacionais sobre os mais diversos temas, realizadas desde o começo dos anos 2000. Esses mecanismos ampliaram o alcance da participação sem, no entanto, assegurar a implantação efetiva de políticas públicas reivindicadas por esses espaços.

    Um bom exemplo é a Conferência Nacional de Comunicação, que reuniu diferentes representantes da sociedade civil ligados ao tema e cujas iniciativas por ela aprovadas nunca se transformaram em políticas públicas, como a regulamentação dos artigos constitucionais que tratam das finalidades educativas e culturais da programação, da regionalização e da presença da produção independente no rádio e TV (Art. 220); ou que asseguram a proibição do monopólio e oligopólio no setor (Art. 221). Nesses casos, nada foi feito efetivamente para promover a posição da sociedade civil aprovada na Conferência.

    Apesar disso, um estudo do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (Iuperj), que procurou medir o impacto da participação popular na atividade legislativa, constatou que um quinto dos projetos de lei e quase metade das propostas de emenda constitucional que tramitavam no Congresso, em outubro de 2009, apresentavam forte convergência com deliberações de alguma conferência.

    Mas, apesar dessas limitações, o que mais chama a atenção em relação às políticas de participação é a forma como elas têm se transformado, estimulando processos de diferenciação e pluralização da representação política, ampliando a quantidade de lugares, atores e funções da representação, que já não se resume ao Parlamento e se insere de modo relativamente autônomo na própria estrutura administrativa do Estado. Há uma crescente demanda por controle social e participação da sociedade no controle e na fiscalização das instituições do Estado. Apenas no Portal da Transparência, mantido pelo governo federal, foram mais de 11 milhões de visitas apenas em 2013. Como destaca Avritzer, em seu estudo sobre o Ministério Público e a Polícia Federal, apesar do grande número de instituições voltadas à promoção da prestação de contas – disseminado na Ciência Política pelo conceito de accountability –, como a Controladoria Geral da União (CGU), os tribunais de contas e as mais de 270 ouvidorias federais, a forma pela qual se dão o controle e a fiscalização é essencialmente horizontal, isto é, são os órgãos de Estado que se fiscalizam mutuamente. Para estimular a fiscalização vertical, aquela que permite que a sociedade exerça seu controle diretamente sobre as instituições de Estado, é que entra a participação popular.

    Essa, no entanto, não é tarefa fácil. Apesar dos diversos estudos que comprovam que quanto mais participação social, maior a transparência e, consequentemente, menor a corrupção, há ainda grande resistência à ampliação do controle social sobre as instituições de Estado. A resistência entre muitos legisladores ao Decreto nº 8.284, que instituiu a chamada Política de Participação Social, é apenas uma prova das dificuldades de aprofundar os mecanismos de participação na perspectiva de ampliar o alcance do controle social.

    1 GURZA LAVALLE, A.; ISUNZA VERA, E. Representación y participación em la critica democratica. Desacatos, n. 49, setembro‑dezembro 2015, pp. 10‑27.

     

    * Juliano Medeiros é é doutorando em Ciência Política pelo Ipol/UnB e presidente da Fundação Lauro Campos.

    (Artigo originalmente publicado na revista Desafios do Desenvolvimento, publicado pelo IPEA, edição 88, ano 13 (23/11/2016)

  • Álbum de Fotos: Seminário “A cidade que queremos: os desafios dos mandatos do PSOL”

    Álbum de Fotos: Seminário “A cidade que queremos: os desafios dos mandatos do PSOL”

    Álbum de Fotos: Seminário “A cidade que queremos: os desafios dos mandatos do PSOL”

    Fotos de Tuane Fernandes

     

    Acesse o álbum e veja as fotos em alta qualidade:

    https://www.flickr.com/photos/149030709@N03/albums/72157672677167944

    _DSC0337

     

  • A esperança que vem do Norte

    A esperança que vem do Norte

    por Juliano Medeiros *

         Durante o primeiro turno das eleições municipais deste ano, enquanto os principais meios de comunicação do país privilegiavam a cobertura da disputa eleitoral em São Paulo e Rio de Janeiro, uma verdadeira guerra era travada no norte do país. Durante todo o primeiro turno o candidato do PSOL à prefeitura de Belém, Edmilson Rodrigues, liderou as pesquisas de intenção de voto. Com apenas 42 segundos no horário eleitoral gratuito e duas inserções diárias de rádio e televisão, o ex-prefeito e atual deputado federal conseguiu superar adversários de peso e ir ao segundo turno contra o atual prefeito, Zenaldo Coutinho (PSDB).

         Numa recuperação impressionante, o candidato tucano venceu a disputa contra o delegado Eder Mauro (PSD) por uma vaga no segundo turno. O também deputado federal, famoso por suas posições de extrema-direita contra a comunidade LGBT e em favor de penas mais duras para menores infratores, perdeu a segunda posição na última semana de campanha, sendo ultrapassado pelo atual prefeito que agora enfrenta Edmilson Rodrigues.

         Belém é uma das três cidades em que o Partido Socialismo e Liberdade disputa o segundo turno. As outras duas são Sorocaba (SP) e Rio de Janeiro (RJ). Mas diferente destas, a disputa na capital paraense já toma o contorno de uma batalha épica.

         De um lado, o candidato do PSOL, ex-prefeito por oito anos, professor doutor, arquiteto e ex-sindicalista, defensor dos povos indígenas e do meio ambiente. Um crítico implacável do que chama de “dinâmica perversa do capital” que amplia as desigualdades sociais e econômicas. De outro, um típico representante da velha casta política que vive dos privilégios do Estado: o tucano Zenaldo Coutinho é político profissional desde a adolescência, jamais trabalhou e aposentou-se aos 44 anos. É um filho das elites paraenses, um produto de marketing produzido com esmero pelos tucanos no Pará durante os anos 90.

         Em 2012, na disputa que travou contra Edmilson Rodrigues no segundo turno, Zenaldo levou a melhor. Mas hoje chega desgastado ao segundo turno após quatro anos de completo abandono das políticas sociais, aumento da criminalidade e caos nos serviços públicos.

         O primeiro turno acabou com leve vantagem para Zenaldo: o candidato tucano alcançou 241.166 votos (31%) contra 229.343 votos de Edmilson (29,5%). Uma pequena diferença de pouco menos de 12 mil votos. No segundo turno, os candidatos de oposição declararam seu apoio a Edmilson.

         O primeiro foi o deputado estadual Lélio Costa (PCdoB), que obteve 0,76% dos votos no primeiro turno. Em seguida foi a vez de Ursula Vidal (Rede Sustentabilidade), uma das grandes surpresas da eleição. Ela alcançou 10,3% dos votos e declarou apoio a Edmilson na última semana. A candidata do PT, Regina Barata, que obteve 1,71% dos votos, também se manifestou nas redes sociais a favor do candidato do PSOL. O candidato do PMDB, o ex-reitor da Universidade Federal do Pará (UFPA), Carlos Maneschy, fez questão de declarar seu apoio a Edmilson.

         O PMDB divulgou nota pública declarando neutralidade no segundo turno, mas Maneschy, um professor que jamais havia disputado uma eleição e conquistou supreendentes 9,7% dos votos, fez questão de manifestar-se em favor do candidato do PSOL. Até o delegado Eder Mauro, terceiro colocado na eleição, que optou por não apoiar nenhum candidato, fez questão de expressar seu repúdio à candidatura tucana numa coletiva de imprensa na semana passada, o que pode facilitar a conquista de seu eleitorado, crítico da gestão tucana, por parte de Edmilson. Esses apoios deram resultado: na pesquisa Ibope divulgada na semana passada, o candidato do PSOL lidera com 46% das intenções de voto, contra 43%.

         Para além da corrida eleitoral, há outras questões em jogo nesta disputa eletrizante entre PSOL e PSDB em Belém. Desde o impeachment de Dilma Rousseff e o aprofundamento da crise do Partido dos Trabalhadores, a esquerda brasileira passa por um processo de reconfiguração. Como é comum depois de um tsunami, o cenário devastador que o campo progressista encontrou nestas eleições também permitiu o surgimento novas alternativas.

         O PSOL, após onze anos de legalização, tem se tornado o polo mais dinâmico num processo de renovação da esquerda brasileira que pode levar alguns anos. Por não ter feito parte dos governos petistas, rejeitando a tática de conciliação de classe que marcou a política do PT nos últimos anos, o PSOL é o partido que detém as melhores condições para liderar este processo de renovação. E esse fenômeno, evidentemente, não se resume a Belém, mas ocorre também em outras cidades como Rio de Janeiro, Porto Alegre, Florianópolis, Recife e Cuiabá.

         Mesmo em cidades onde os resultados eleitorais das chapas majoritárias não foram tão expressivos, como São Paulo e Belo Horizonte, o processo de oxigenação política da esquerda se faz sentir, com o surgimento de novas lideranças e a afirmação de uma agenda política de independência frente aos velhos partidos que se expressa mais claramente no PSOL.

         Mas a experiência de Belém é ainda mais emblemática. Isso porque na capital do Pará o candidato do PSOL representa ele próprio uma intersecção histórica. Edmilson Rodrigues foi prefeito pelo PT entre 1997 e 2004, mas deixou o partido em 2005, no auge do escândalo do mensalão. Foi um dos raros políticos com experiência administrativa e reconhecimento público a ter a ousadia de romper com o partido de Lula. Tem ampla penetração em bairros populares de Belém, contrariando a realidade do PSOL em outras capitais, onde o partido ainda não alcançou essa capilaridade.

         No entanto, a ruptura, que marca a rejeição da tática petista de conciliação com as classes dominantes, não significou a negação das boas experiências nascidas com as primeiras administrações petistas, que democratizaram a gestão do Estado, inverteram prioridades e enfrentaram poderosos interesses para assegurar a ampliação de direitos. Nessas experiências, onde se destacam os governos de Luiza Erundina em São Paulo (1989-1992) e os dezesseis anos de governos populares em Porto Alegre, Belém surge como a primeira tentativa de implementar um programa democrático e popular no coração da Amazônia, com todas as suas particularidades históricas, sociais e culturais.

         Se os outros candidatos do PSOL que disputam o segundo turno no Rio de Janeiro e Sorocaba representam uma saudável e necessária renovação da esquerda (Marcelo Freixo tem 49 anos e Raul Marcelo tem 37), na candidatura de Edmilson se fundem o melhor daquilo que se produziu desde a redemocratização na forma de experiências de governos democráticos e participativos com a resistência daqueles que não aceitaram o vale-tudo da “governabilidade” e optaram por recomeçar praticamente do zero, criando o PSOL.

         Se estivesse no Sudeste, Edmilson sem dúvida seria um dos mais badalados políticos da esquerda brasileira. Isso porque ele representa o encontro entre passado e futuro, materializado na promessa de um presente de renovação e esperança. Mesmo que muitos não consigam ver, na batalha que se trava em Belém, também está em jogo o processo de reorganização da esquerda brasileira.

    *Juliano Medeiros é presidente da Fundação Lauro Campos

    (artigo originalmente publicado na página da Carta Capital em 19/10/2016)

  • Um partido necessário 10 anos de PSOL

    Um partido necessário 10 anos de PSOL

    Uma breve trajetória de um partido que mais cresce na esquerda brasileira, suas conquistas e desafios analisados por diferentes olhares.

    Organizado por Juliano Medeiros e Israel Dutra, o livro traz diversos artigos que narram a trajetória do Partido Socialismo e Liberdade escritos por alguns daqueles que ajudaram a construí-lo durante esse período. Escrevem na obra Luciana Genro (prefácio), Juliano Medeiros (Por uma história do PSOL), Babá (A decadência do PT e o surgimento do PSOL), Chico Alencar (O porvir do PSOL), Afrânio Boppré (A alegria do amanhã), Milton Temer (Parece que foi ontem), Edmilson Rodrigues (Utopia renascida: o PSOL como desafio e promessa), Edilson Silva e Albanise Pires (Socialismo com Liberdade: eis o convite desafiador do PSOL), Roberto Robaina (Breve Balanço dos anos de legalização do PSOL), Ivan Valente (A disputa do espaço à esquerda), Gilberto Maringoni (Dez ano adiante), Luiz Araújo (Um partido para um novo ciclo da esquerda no Brasil) e Lincoln Secco (Epílogo).

    A obra, publicada em 2016, pode ser conferida na íntegra abaixo ou ser adquirida na sede da Fundação Lauro Campos em São Paulo.

     

     

     

  • Revista nº 14 – setembro de 2016

    Revista nº 14 – setembro de 2016

    O GOLPE DERRADEIRO CONTRA O ESTADO SOCIAL | Eduardo Fagnani
    IMPACTOS DAS OLIMPÍADAS DO RIO E DOS MEGAEVENTOS | Flávio Campos
    ENTREVISTA SOBRE OS DESAFIOS DO PSOL NAS ELEIÇÕES DESTE ANO | Marcelo Freixo