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  • FUNDEB: UM PASSO PARA A TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

    FUNDEB: UM PASSO PARA A TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

    FUNDEB: UM PASSO PARA A TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

    Por Francisvaldo Mendes, presidente da FLCMF

    O FUNDEB é o FUNDO DE MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA E DE VALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO, voltado para garantir a ação de educar e assegurar o investimento para valorizar, com salários mais dignos, a formação qualificada, dos profissionais da educação. Foi criado em 2006, e iniciou-se em 2007 e no ano atual, 2020, terminaria sua vigência. É isso que está em debate, podendo tornar o fundo permanente e voltado para assegurar a jornada do letramento e da organização do conhecimento para as pessoas e alcança a infância, juventude e fase adulta quando falamos de educação básica no Brasil.

    A PEC trata especificamente de manter o FUNDEB existindo permanentemente, com um ganho para a sociedade que não são costumeiros diante desse parlamento que na maioria das vezes retiram o que de melhor há na Constituição de 1988, desde 1995. A Constituição brasileira e o que está colocado na PEC, ainda que não sejam as medidas e as letras ideais, predominam em partes dos “consensos” que atuam a favor da educação, encontraram saldo positivo pois ficou evidente as linhas necessárias ao instituir nova roupagem e função: “instrumento permanente de financiamento da educação básica pública, incluir o planejamento na ordem social e inserir novo princípio no rol daqueles com base nos quais a educação será ministrada”. Há, portanto, suspiros de público que valorizam a vida para além do Estado que se concentra em organizar a exploração, a dominação e o controle.

    Trata-se, portanto, do impacto na vida das pessoas, da multidão para ter acesso ao conhecimento, ou seja, cerca de 40 milhões de pessoas. Esse grupo social tem no FUNDEB um investimento fundamental para que se possa atuar, coletivamente, no sentido contrário das profundas desigualdades que criam chagas agudas em nossa formação social. Mais que isso, permite as bases legais para que o Estado, espalhado nas 27 unidades federativas e concentrado na União, assumam o papel e a responsabilidade com o salário desses profissionais tão importantes em nossa história, e na vida de muitas pessoas que precisam, os que se dedicam e investem a força de trabalho para a educação.

    Um detalhe nada secundário dessa disputa que está em movimento no parlamento, é que a aprovação da PEC, em particular, muito diferente da grande maioria das PECs aprovadas em tempos atuais, reflete as bases para se avançar na construção de educação pública. É importante se atentar que o FUNDEB, pode contribuir para que a infância, a juventude e adultos, tenham acesso ao conhecimento que os ensinos fundamental e médio deveriam garantir para todas as pessoas. Mais ainda, que se tenha as condições para que exista investimento em salários e qualificações permanente das pessoas que vendem a força de trabalho neste ambiente educacional.

    Trata-se assim de um insumo fundamental para alterar a capacidade de formulação, raciocínio, leitura e formação para o mercado de trabalho e do fortalecimento das universidades. Com as bases colocadas será possível sim acumular para um rumo que aponte na qualidade da educação e para que a multidão que ocupa a periferia espalhada em toda a geografia física viva as condições para ampliar a vida e a potência humana criativa que está sufocada diante de um mercado de trabalho perverso existente. Não há dúvidas, portanto, que é um dos mais importantes temas a favor da vida que está em debate nesse espaço do Estado que é o parlamento.

    A melhoria da condição educacional do povo fará sim a diferença para garantir o afastamento da ignorância que atualmente está impactando para diminuir vidas com essa fase da pandemia. O que ocorre por responsabilidade da política desastrosa que toma o país, ou seja, as pessoas poderão ser sujeitos ativos na disputa politica e não telespectador passivo que, em boa parte das vezes, nem tem ideia do que está ocorrendo em suas próprias vidas. Certamente todas as pessoas sofrem e sentem o impacto dos resultados das disputas políticas, nas quais predomina os raios de limitação da vida e da humanidade, imposta pelo Estado.

    Mais do que justo participar ativamente da condução da vida e criar aberturas para ambientes públicos no Estado e uma organização na sociedade que se aproxime da igualdade social com acesso ao conhecimento conquistado para a maioria das pessoas. É justo que o investimento em formação, sem as fortes deformações da exploração, sofra impactos de elevação da dignidade com a participação na organização do conhecimento, que envolve as relações humanas e a convivência democrática. E assim é possível criar uma jornada de avanços para conquistas que fortaleçam os sujeitos históricos da mudança e que nós, trabalhadoras e trabalhadores, grande maioria da humanidade existente nesse mudo e em nosso país, sejamos sujeitos com atuação decisiva para que a energia siga nos enlaçando para fortalecer o ambiente da vida, com dignidade e participação ativa na organização do conhecimento.

  • Leia a Revista Socialismo & Liberdade n.29

    Leia a Revista Socialismo & Liberdade n.29

    PRECISAMOS DE HUMANIDADE E SOLIDARIEDADE, POTENCIALIZANDO A VIDA

    Francisvaldo Mendes de Souza, Diretor-Presidente da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco

    Apresentamos o número 29 da revista Socialismo e Liberdade. No meio desta política destruidora que faz a pandemia ser devastadora, apostamos na ciência e na ação coletiva que podem trazer otimismo e avançar em conquistas, direitos e dignidade humana. É nessa estrada que apresentamos exemplos de solidariedade e humanidade, como o professor Florestan Fernandes e a ótima entrevista com Edmilson Rodrigues. São fontes de inspirações para o estudo, o conhecimento, a formação, ações coerentes e práticas coletivas que criam fortes ondas na maré contrária que predominam no capitalismo.

    Mas, para além disso, avançamos na política. A unidade de todas as pessoas que vivem da venda da força do trabalho é elemento central para superação da ordem que nos é imposta. Mais que isso, o mundo clama por democracia e humanidade para fazer com que a vida exista e seja cada vez mais potente. Por isso, apresentamos análises da política que articulam as condições de vida na periferia e o bom debate sobre a ação de superação do caos, desgovernos e da necropolítica que predomina no mundo.

    O desafio colocado para a esquerda socialista é de grande importância e com vulto tão amplo que há poucas vezes, no tempo da cronologia humana, que podemos encontrar referências que se igualam a situação que nos toma hoje. Sabemos que formação, organização e ação coletiva são caminhos que orientam práticas radicais para a democratização progressiva em todas as dimensões da vida. Mas precisamos encontrar a tonalidade que nos unifique e seja inspiradora para movimentar ações assertivas que nos faça avançar em transformações.

    Queremos acabar com esse modelo que toma o mundo e consegue aparecer como normal a desigualdade na sociedade e presente na mente da maioria do povo, criando a inverdade de acúmulo de riqueza de uns e a pobreza da maioria como fruto da natureza, mas que é fruto do capitalismo. O capitalismo não é um “palavrão”, mas um conceito que precisamos entender na profundidade e raiz para transformar e superar. Esse sistema que hoje toma os continentes e aparece como se não houvesse alternativa e que toda disputa existente se limita ao rumo, ao formato e à organização é uma inversão profunda do real que só o conhecimento pode mostrar o quanto essa vocação que predomina contra a vida precisa ser superada pela política a favor da vida.

    Quando falamos das ruas, por exemplo, não estamos incentivando que sejamos irresponsáveis no meio da imposição de doença e morte que a política hegemônica faz ampliar em tempo de vírus.

    Ao contrário, estamos usando o símbolo de ação que nos motiva de potência e otimismo nesta fase e que busque o verdadeiro sentido de viver.

    Apostamos nas pessoas, as que vendem a força do trabalho e esta é a única mercadoria que possuem para viver. Nossa aposta é coletiva e solidária e tem chamas poderosas de otimismo para reconhecer a diversidade dos sujeitos da transformação e do avanço da humanidade, potencializando a vida. É isso, simples assim, somos socialistas. Apostamos na plenitude da dignidade humana em todas as condições materiais e espirituais para que a natureza seja transformada a favor das pessoas e não para a exploração, como predomina neste mundo, com o capitalismo.

    Dessa forma, somos defensores da mais profunda democracia. Construiremos coletivamente um mundo no qual as pessoas vivam e façam da vida um grande mar de criatividade, com conquistas que bordem nossas diferenças com um grande formato de força e com a qualidade que construímos na unificação. A inteligência coletiva, com toda a diversidade que envolve as pessoas que precisam vender a força do trabalho para sobreviver, forma-nos como classe nesse processo rico de consciência coletiva e é a nossa aposta para superar governos, parlamentos, judiciários ou qualquer aparelho de Estado que se volte para dominar e controlar as pessoas de forma autoritária por meio das leis que são aplicadas contra a maioria do povo. Vamos superar esse Estado contra a vida criando nossa inteligência coletiva e apostando nas mudanças. Nossa revista é uma contribuição para esse fim e segue mais este número para contribuir com todas as pessoas que podem dizer sim à revolução.

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  • Leia a Revista Socialismo & Liberdade n.28

    Leia a Revista Socialismo & Liberdade n.28

    PARA SUPERAR A BARBÁRIE: SOCIALISMO E LIBERDADE

    Francisvaldo Mendes de Souza, Diretor-Presidente da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco

    Apresenta-se aqui a revista SOCIALISMO E LIBERDADE, número 28. O tempo de pandemia nos consome, mas, além disso, as surpresas do desgoverno no Brasil nos assustam. Até onde pode piorar? As atitudes do governo federal em pleno século XXI, se alterna entre comédias e tragédias de demissões e renúncias com falas e frases feitas e desfeitas. Lamentavelmente, essas são as marcas do tempo que misturam as margens do capitalismo atual com a situação política no Brasil. E, para provocar os desafios, um inimigo à vida que não é visto a olho nu, chega com doenças e mortes.

    Neste momento que a superação exige ainda mais unidade, solidariedade e companheirismo, contribuições para formação, organização e pistas de ações são alimentos para o vazio de alternativas políticas à esquerda. Aprendemos e precisamos aprender mais, que o socialismo é a alternativa para a superação da barbárie que o capitalismo cria à vida das pessoas. É necessário aprender mais e sempre mais coletivamente, pois, principalmente neste tempo de pandemia, é fundamental saber e nos apoiar em organização para que todas as trabalhadoras e trabalhadores tenham certeza de que não estão só. Fazer ampliar a energia de transformação neste momento é um desafio que precisamos abraçar, por isso esta edição apresenta insumos de reflexão, debates, formação, organização e ação.

    Ficar em casa é uma necessidade de saúde pública. Não podemos aceitar a utilização dos efeitos da pandemia para explorar, ainda mais, os trabalhadores, garantindo os ganhos dos milionários.

    É urgente ir além, por isso, em nossa pauta, taxar os milionários em geral para que o Estado invista na defesa da vida, faz-se necessário. O programa emergencial para enfrentar a pandemia ainda é insuficiente àqueles que vivem na informalidade do mercado de trabalho. Acabar com o vírus e assegurar saúde à população, exige medidas firmes em defesa da vida da maioria das pessoas e, por esse motivo, pensar a economia a parte da situação das pessoas é excluí-las ainda mais da sociedade.

    Certamente, o Estado já está seguindo a cultura da propaganda da morte e a prática do extermínio de trabalhadoras e de trabalhadores, o que não é uma novidade da pandemia. Todavia, com a situação atual, os setores dominantes apostarão em retirar a responsabilidade da política e colocá-la no vírus. Isso é mais uma mentira que só pode crescer com desconhecimento e com informações falsas.

    Trata-se, portanto, de radicalizar a democracia e reforçar os setores que defendem a vida acima do lucro em todos os momentos. Nós, do PSOL, convencidos da barbárie criada pelo próprio capitalismo, acreditamos que apenas o socialismo, com liberdade e democracia, pode ser a superação. Porém, somos conscientes que este momento precisa ser ampliado com formação, organização e ações democratizantes. Dessa forma, nosso desafio é fazer com que a solidariedade e a força coletiva sirvam como baldes inspiradores da consciência em favor da vida, hoje e sempre.

    O imperialismo está em disputa que ameaça o atual bloco histórico de dominação e o governo do Brasil apoia a hegemonia decadente dos EUA, este com poder de organização da exploração e dominação no mundo. Nós temos que curvar essa vara por completo. A defesa da vida precisa sair vencedora e trazer oxigênio para a política crescer com raios de esquerda e revolução transformadora.

    São bem-vindas todas as contribuições que forem apresentadas para o crescimento da consciência e atuação na formação e ampliação da organização para ações coletivas vitoriosas, hoje e amanhã. Não podemos cair no discurso fácil em troca da defesa da democracia. Dessa forma, seguiremos apostando na transformação da maioria social política no Brasil.

    Portanto, seguiremos coletivamente e firmes com nossa estratégia socialista para um mundo que a potência humana criativa seja algo real e verdadeiro, com respeito às diferenças e com a mais plena convivência entre as pessoas que atuam para a transformação. Somos nós, os que vivem da venda da força de trabalho, os sujeitos estratégicos para alargar as vagas abertas a favor da maioria das pessoas.

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  • PANDEMIA E RACISMO

    PANDEMIA E RACISMO

    PANDEMIA E RACISMO

    Por Raimundo Calixto* 

    A população preta é a que mais sofre com as pandemias e não seria diferente com a que está em curso no mundo (Covid-19) quando percebemos que cento e trinta e dois anos após o fim da escravidão no Brasil, ainda não temos a garantia de inclusão plena da sociedade nas políticas públicas, a visão do sub- julgo, o menosprezo, a opressão, as discriminações e as intolerâncias são muito fortes no nosso cotidiano.

    Segundo os noticiários da imprensa, o Coronvírus chegou ao Brasil através da classe média e alta, na sua maioria composta por brancos, que realizavam muitas viagens internacionais. Inicialmente, estes noticiários passaram a ideia de ser um vírus democrático, ou seja, não escolheria quem infectar, o que de fato pode ser comprovado pela composição racial dos infectados no mundo e no Brasil, mas a pandemia com seus efeitos devastadores, ao longo do tempo revelou  algo diferente, um crescimento como pólvora, atingindo os bairros periféricos, os quilombos, os assentamentos, as comunidades indígenas, as áreas urbanas e rurais do interior do país, que predominantemente, com exceção dos indígenas, são majoritariamente ocupados pelos pretos e pardos, que vivem em condições muito precárias, pois, as políticas públicas de saúde, habitação, saneamento básico, educação, e segurança são tratadas com descaso pelos governantes.

    Nessas comunidades além da população está sofrendo os efeitos da crise sanitária, vivem o aprofundamento das condições de sobrevivência provocado pelo agravamento das dificuldades financeiras, oriundas da política de isolamento social, forma mais eficiente encontrada pelas autoridades sanitárias, para conter a proliferação do vírus. Essas dificuldades poderiam ser em menor escala, se os governos Federal, estaduais e municipais adotassem medidas mais eficazes para proteger os trabalhadores e suas famílias dos impactos da crise econômica.

    Além disso, o sistema capitalista que o Brasil adota, renega essa população a mais dura e cruel condição social, o sub-emprego e o desemprego e as péssimas condições de moradia são hegemonicamente frequentes, o que facilita a proliferação do vírus, e é nesse contexto que se visualiza o racismo institucional.

    A política de segurança pública aplicada para essa parcela da população também merece destaque negativo, uma vez que as forças de segurança, atuam nessas comunidades como se estivessem em campos de batalhas entre o bem e o mau, onde a ordem é matar e exterminar promovendo verdadeiros genocídios. Dados estatísticos mostram que essa população continua sendo atacada ferozmente mesmo diante da pandemia, situações vividas nas periferias dos grandes centros e até nos interiores demonstram que quase nada mudou desde o dia 14 de maio de 1888.

    Os números de infectados e mortos pelo Covid-19 no Brasil, escancaram o racismo no país, a exemplo, no Espirito Santo que é um estado que não tem uma população majoritariamente preta, o percentual de infectados entre brancos e negros fica em torno de 4% a mais para os negros e pardos e o número de mortos para essa população é de 18%, ou seja, morrem quatro vezes mais. Os números são ainda mais assustadores quando trata-se das mulheres negras, pois sobe de 18% para 24%, ou seja, seis vezes mais, segundo dados da Secretaria de Estado da Saúde de Vitória – ES (Sesa).

    Esses dados assombrosos alguém pode dizer que não são surpreendentes, pois 75% da população preta e parda do país estão classificados como pobres, enquanto 70% dos mais ricos são brancos, conforme dados do IBGE, porém, conclui-se que, quem mais sofre no país com os serviços públicos de saúde, habitação, educação, saneamento básico, educação, infraestrutura e segurança ineficientes, são os pretos e pardos, portanto, compreendemos que o pano de fundo da questão é o Racismo.

    *Raimundo Calixto é formado em administração com ênfase em gestão de Negocio pela Unicenid (Faculdade de Ciências Gerenciais da Bahia) foi diretor do MNU (Movimento Negro Unificado) foi  um dos fundadores da UNEGRO (União de Negro Pela Igualdade), foi membro do grupo de Teatro Amador Vandré, na peça Somos Todos Iguais, Presidente Licenciado da Federação dos Trabalhadores Públicos Municipais do Estado da Bahia, ex secretário de Relações do Trabalho da CUT ( Central Única dos Trabalhadores) e pré candidato a Prefeito de Salvador pelo Coletivo Travessia – PSOL.

  • OS PODERES SÃO LEGAIS OU CONSTRUIDOS?

    OS PODERES SÃO LEGAIS OU CONSTRUIDOS?

    OS PODERES SÃO LEGAIS OU CONSTRUIDOS?

    Por Francisvaldo Mendes, presidente da FLCMF

    A cada dia ocorre novo acontecimento que faz disparar as atenções e exige informações além dos exibidos e sentidos. A polêmica envolvendo o Ministro Gilmar Mendes do Supremo Tribunal Federal o Exército, e o Executivo está rendendo mais um desses acontecimentos que é necessário olhar para além dos limites empíricos e das informações que interessam a imprensa formal. Afinal de um lado há um discurso do dever agir e de outro o discurso da tragédia, pois, nada de bom há, e muito menos o respeito a Constituição do país.

    Por falar em Constituição, vale lembrar que a ordem jurídica que organiza o Estado no Brasil, em suas letras máximas diz que há três poderes: EXECUTIVO, LEGISLATIVO E JUDICIÁRIO. Ainda afirma que esses três poderes devem viver em harmonia, um com os outros. Não há também poder maior ou poder menor segundo a chamada lei máxima do país. São três poderes com tarefas, funções e atribuições distintas na ordem jurídica do Estado.

    Toda polêmica reside na crítica do Ministro do Supremo ao ministro interino da saúde e membro das forças armadas. Afinal na Ditadura militar inaugurada formalmente em 1964 no Brasil, as forças armadas formavam o único poder do Estado. Executivo, legislativo e judiciário se amalgamaram em Forças Armadas. Esse aparelho do Estado poderoso, chamado forças armadas, que todos temem, mas que não é poder segundo a Constituição brasileira, acumula a maior força de repressão, nunca enfrentada por nenhum governo até os dias atuais.

    Vamos olhar para além do espelho para não ter acesso apenas as imagens invertidas. O grande poder de fato que conta com o Estado para se manter é o capital. O Estado é uma organização que garante o capital, e cada Estado nacional fica tomado pelo capitalismo. E o Estado, em escala global, firma-se como uma organização política que impõe o capitalismo em escala mundial e em formação social específica. Afinal, isso não está em questão para os poderes do Estado, seus aparelhos e aparatos. Não está em questão nem quando o Estado alterna sua ordem jurídica que impera sobre a sociedade e faz com que o tão repetido “ESTADO DE DIREITO” ocupe, para explorados e exploradores, a predominância dos discursos e das frases faladas ou escritas, para garantir o lucro para alguns poucos em detrimento da maioria da população.

    Mas para nós, exploradas e explorados, que vivemos da venda da nossa força de trabalho, com todas as diferenças de contratos – contratos com estabilidade ou contratos precarizados, o que faz muita diferença para a vida – está colocado o desafio de conhecer profundamente como se dá a supremacia do capital. Nós que estamos espalhados por toda a cidade, nos espaços físicos onde vivem os membros das periferias ou nos espaços das tão repetidas classes médias ou da burguesia, sofremos o impacto do poder que não aparece, mais que exerce sua força na vida que é a exploração capitalista. Para compreender a organização do poder, mais que saber o que está nas leis, principalmente na Constituição, se faz necessário estudar e conhecer como funciona essa sociedade na qual vivemos, e pra quem ela e construída.

    Nos dias atuais, os conflitos entre os poderes da ordem jurídica deixam a realidade ainda mais embaçada e opaca. Há um desgoverno eleito com os votos da maioria da sociedade e que, portanto, são as maiorias de nós mesmos. Há um conflito entre os tais poderes institucionais presente a cada momento e em cada ação do Estado, representado pelos detentores dos poderes de plantão e que, como consequência, trabalhadoras e trabalhadores sofrem os maiores impactos. Nos tempos atuais a crueldade da exploração se encontrou com um vírus que torna ainda mais cruel as consequências de sobrevivência. E, ao olhar no horizonte, identificamos disputas que estão absolutamente desfocadas, propositadamente como política do caos, para maior nitidez sobre a política necessária para enfrentar e superar as condições atuais.

    A saúde deveria ser a maior preocupação do Estado brasileiro com investimentos, qualificação, e comprometimento com a vida. Já padecemos por ser parte de uma formação social na qual o conceito de seguridade inexiste e saúde aparece como sinônimo de tratamento de doenças, apenas com intuito de lucro da indústria farmacêutica e dos planos de saúde. Não há dúvidas, que todo aporte a saúde e mesmo de combate às doenças deve ser formada por pessoas que estudaram, entendem, aprenderam e podem cuidar e ensinar a viver a vida com menos doenças biológicas e psíquicas. Esse universo de conhecimento não é de poder algum constituído pelo Estado ou que impera no Estado. Portanto, cabe ao Estado sim formar e contratar quem deve ser contratado para enfrentar e superar essa situação pandêmica na qual vivemos.

    É muito importante que tenhamos atenção para as notícias transformadas em fofocas. Não está em questão uma discussão entre pessoas que estão em cargos centrais dos poderes. Isso, serve apenas para desvirtuar o foco dos reais problemas que estamos enfrentando. As principais diferenças que precisam aparecer e os conflitos que fazem parte de uma sociedade dividida por desigualdades de classes, raças, gêneros e identidades não aparecem nos espaços que ocorrem tais conflitos. E isso não pode fazer perder de vista quem são os aliados dos explorados e quem defende a vida.

    Nós que apostamos na política da vida e da dignidade humana não podemos ter dúvidas que a morte já inicia com a ignorância, com a violência e com a opressão sem limites do Estado a favor do lucro. Assim sendo, reforçamos nossa chamada, vamos estudar, organizar e atuar coletivamente e com a energia solidária necessária para viver e criar um diferente mundo que todos os governantes insistem em preservar sempre conta os interesses da maioria da população.

  • NA EDUCAÇÃO, UM “PACTO” DE ANORMAIS*

    NA EDUCAÇÃO, UM “PACTO” DE ANORMAIS*

    NA EDUCAÇÃO, UM “PACTO” DE ANORMAIS

    CADERNINHOS QUINZENAIS – A cada 15 dias publicaremos aqui crônicas da conjuntura. São breves análises sobre fatos e atos do nosso cotidiano. Reforçando o caráter de educação política da Fundação, os textos estarão vinculados a políticas públicas e/ou se reportarão a acontecimentos que nos fazem refletir sobre nossa vida em sociedade. Gostando, compartilhe!

    Por Chico Alencar*

    E julho entra na sua segunda metade, assim como o ano de 2020! Em tempos “normais”, hoje teríamos multidões de crianças e jovens acorrendo às escolas e universidades, para a última semana antes do recesso de inverno… O cotidiano escolar no Brasil envolve, direta ou indiretamente, metade da nossa população.

    Tudo mudou com a pandemia. Juntar gente em unidades educacionais agora – a grande maioria das 180 mil com salas sem ventilação adequada e muitas até sem água potável – seria criminoso. Por outro lado, a educação remota é excludente, a democratização da internet ainda não se processou plenamente. Desafios da hora, que as autoridades educacionais nacionais não estão sabendo enfrentar.

    O quarto ministro da Educação em 18 meses de Bolsonaro chega apelando por um “verdadeiro pacto nacional pela qualidade da educação em todos os níveis”. Quer, “em articulação com os estados e municípios, mudar a história da educação no Brasil”. Palavras belas e óbvias.

    Palavras, infelizmente, contraditada pelos FATOS: no mesmo dia em que elas eram inscritas na rede virtual de Milton Ribeiro (esse é o nome do novo ocupante do MEC), o governo oficializava os 12 novos integrantes do Conselho Nacional de Educação – órgão fundamental de assessoria para a política nacional da área. Como lembra o jornalista, especialista em educação, Antônio Gois, em O Globo de 13/7, “entre os escolhidos há olavistas, defensores do método fônico, representantes do setor privado e do ensino religioso. As indicações feitas por Consed e Undime – entidades que representam secretários estaduais e municipais de educação – foram ignoradas”.

    Gois destaca que as redes municipais e estaduais atendem mais de 80% dos alunos na educação básica, e as escolas federais (colégios militares, de Aplicação, Cefets e Pedro II), de excelência, representam apenas 1% das matrículas.

    As 19% do setor privado, pela nova composição do CNE, ficarão com a faca e o queijo no MEC. O tal “pacto” do novo ministro é uma balela. Prevalecerá a política sectária (vem de seita!) que o pastor Silas Malafaia defende: “nos unir a esquerdopatas que destruíram o próprio sentido de educar ideologizando a educação?”. A pergunta é um repúdio.

    Cabe também indagar o que o ministro-pastor pensa, entre outras questões, sobre a Escola Nova de Anísio Teixeira e outr@s, sobre os Cieps concebidos por Darcy Ribeiro e sua equipe, sobre o método Paulo Freire, sobre o Fundeb, o Enem e o Fies, sobre a prevalência da escola publica, gratuita, democrática e de qualidade e o caráter complementar do ensino privado…

    A nova chefia no MEC não é novo começo, lamentavelmente. É a continuidade da estreiteza, do sectarismo, da ideologização ultraconservadora, acrítica, limitadora, emburrecedora. É um 4º  recomeço… do FIM. O Brasil não merece.

    *Chico Alencar é professor, escritor, ex-parlamentar e membro do Diretório Nacional do PSOL

  • Somos Seres em Extinção? FLCMF lança terceiro livro da Coleção Cadernos do Povo

    Somos Seres em Extinção? FLCMF lança terceiro livro da Coleção Cadernos do Povo

    Somos Seres em Extinção? FLCMF lança
    terceiro livro da Coleção Cadernos do Povo

    Este livreto faz parte da coleção Cadernos do Povo que, a Fundação Lauro Campos e Marielle Franco, do Partido Socialismo e Liberdade, tem a honra de produzir e editar.

    O título da coleção faz referência a outra, publicada entre 1962 e 1964, “Cadernos do Povo Brasileiro”, durante o governo do presidente João Goulart. Naquele Brasil ávido por mudanças, por reformas estruturais, de base, a educação popular tinha enorme importância. A iniciativa foi dos editores Ênio Silveira (1925-1996) e Álvaro Vieira Pinto (1909-1987), por meio de uma parceria entre a Editora Civilização Brasileira, o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) e o Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC da UNE).

    A formação política é uma das principais missões das Fundações Partidárias. Para a Lauro Campos/Marielle Franco é urgente e decisivo chegar à base da sociedade, a quem é negado o acesso à informação democrática, para nos constituirmos, de fato, como uma República digna desse nome.

    A questão ambiental, isto é, a maneira como lidamos – pessoas e governos – com o planeta onde vivemos, ganhou enorme importância nos últimos 30 anos. Não é mais uma escolha de “pessoas sensíveis e amantes da natureza”. Tem a ver com a nossa própria sobrevivência como espécie.

    A vida na Terra está ameaçada: a água potável escasseia, a cobertura florestal se reduz, centenas de espécies já entraram em extinção e outras centenas estão ameaçadas, o ar está poluído nos grandes centros urbanos – em um mundo cuja população, hoje, se concentra nas grandes cidades -, chegamos a um colapso climático, com o aquecimento global.

    Para enfrentar essa encruzilhada existencial, histórica e ambiental é preciso, em primeiro lugar, conhecê-la. E, a partir daí, promover uma espécie de “conversão ecológica”: do ponto de vista pessoal, mudar de hábitos de consumo e de descarte do lixo que produzimos, diariamente. Do ponto de vista social, cobrar políticas públicas que, efetivamente, enfrentem os problemas graves de envenenamento do planeta.

    Hoje, quem quer ter perspectivas de futuro precisa colocar a questão sócio-ambiental no centro de seus propósitos e projetos.

    Esse livrinho quer contribuir para a popularização do tema e tem a pretensão de, gerando bons debates, provocar mudanças de atitudes: nas pessoas, na sociedade, nos partidos políticos, nos governos. Em defesa de nossa ameaçada “Pachamama” – a mãe Terra!

    Na sua elaboração, foi decisiva a contribuição de Juliana Ferreira Leite, professora, doutora em Geografia, que se sabe irmã de tudo o que tem patas, asas e raízes.

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  • A política internacional e a pandemia do coronavírus

    A política internacional e a pandemia do coronavírus

    A política internacional e a pandemia do coronavírus

    Quais os efeitos imediatos do contágio da Covid-19 nas disputas globais? A crise revela não apenas o crescimento de tensões diplomáticas, como aguça disparidades dentro de cada país. O atraso ou ineficácia de ações governamentais se traduz em aumento do número de mortes e desastres na economia, com elevação dos índices de desemprego, falências e miséria

    Por Flávio Rocha de Oliveira*

    A epidemia global do novo coronavírus afeta o planeta em vários âmbitos: sanitário, social, econômico e político. Desde o momento em que as primeiras informações deram conta de que um vírus havia surgido na China, até à situação de pandemia no final de junho, mais de 9 milhões de casos foram diagnosticados, com cerca de 500 mil mortes nesse período, o que implica, grosseiramente, uma porcentagem de óbitos da ordem de 5,4%. São dados globais e provavelmente alguns países e regiões terão porcentagens ainda maiores, dependendo de vários fatores.
    A pandemia causada pela Covid-19 começou e está se desenvolvendo numa conjuntura internacional marcada por uma “nova era” de competição entre as grandes potências. Os três grandes protagonistas são a China, os EUA e a Rússia.

    Apesar de serem os três atores mais poderosos num agregado de fatores (poder militar, recursos naturais, tamanho da população, presença geopolítica, economia etc), eles não estão sozinhos nessa disputa. Potências regionais, com variados graus de capacidades, também se tornaram protagonistas: Japão, Coréias, Índia, Austrália, Irã, Arábia Saudita, Turquia e Brasil. A título de informação, apenas alguns têm procurado aumentar a sua influência nos primeiros anos do século XXI. E há, ainda, a existência de grupos sociais e interesses econômicos que agregam complexidade a essa situação.

    O contexto imediato

    As indicações de que uma cepa completamente nova de um vírus havia sido descoberta na China começaram a ganhar os noticiários em dezembro de 2019. Um mês depois, a China já havia reconhecido a extrema gravidade do problema. No dia 23 de janeiro, o governo central decretou um lockdown em Wuhan, o epicentro da epidemia, e em outras cidades vizinhas. Essa medida afetou diretamente cerca de 57 milhões de habitantes. A título de comparação, a Colômbia possui cerca de 49 milhões de habitantes, ou seja, Beijing colocou em quarentena forçada um número de pessoas maior do que o número de habitantes do nosso vizinho sul-americano.

    Ao conseguir ser bem-sucedida em estancar o número de mortes dentro de suas fronteiras, a China vai além: como é o grande centro produtor de manufaturas no mundo, e inclusive de produtos de saúde, ela alia essa posição singular com a experiência de política pública emergencial no caso da Covid-19 e passa a oferecer ajuda aos países europeus, com destaque para a Itália, e a outros governos.

    Com o avanço da epidemia, declarada pandemia pela Organização Mundial da Saúde em 11 de março, as desigualdades existentes entre os países e dentro dos países ganham destaque. Desigualdades no tocante ao poder político, a capacidades econômicas e tecnológicas e as divisões entre as classes sociais e as etnias são escancaradas. Fica claro que os EUA são lentos na reação inicial e têm que lidar com desigualdades brutais dentro da sua própria população

    O coronavírus se propaga rapidamente fora da China. Quando chega a Europa, o mundo assiste ao impacto que a expansão da doença tem sobre os sistemas de saúde na Itália, Espanha, França e Reino Unido, para citarmos apenas alguns. Isso acontece entre fevereiro e abril com velocidades crescentes. Também, deve-se levar em conta que a prevalência do vírus se concentra mais em algumas regiões desses países do que em outras.

    O vírus na América

    Segundo matérias nos principais jornais norte-americanos, como o New York Times, o governo Trump já possuía oficialmente informações sobre a gravidade da Covid-19 em 3 de janeiro de 2020. Somente no último dia do mês é que começaram as restrições de entrada de pessoas vindas da China, mas o mesmo não se aplicou aos cidadãos estadunidenses provenientes daquele país.
    O presidente Trump minimizou o perigo do vírus até o dia 27 de fevereiro, nas entrevistas dadas e na conta na rede social Twitter. Vale a pena lembrar que, do final de dezembro de 2019 até fevereiro de 2020, o Departamento de Estado e o Pentágono estavam concentrados numa confrontação com o Irã. Em dezembro houve um ataque contra bases americanas dentro do Iraque, e em 6 de janeiro os estadunidenses assassinaram o General Suleimani, da Guarda Revolucionária Iraniana, que havia ajudado a conter, por terra, o Estado Islâmico (ISIS). Os próprios EUA começaram a advertir o Irã de que poderiam escalar as ações militares contra o país na região do Golfo Pérsico.

    Em 29 de fevereiro, morreu, oficialmente de coronavírus, a primeira pessoa no território americano, apesar de haver informações dando conta que a primeira vítima da doença havia falecido 23 dias antes.

    Segundo o New York Times, nesse período, cerca de 40 mil pessoas provenientes da China circulavam pelos EUA. Em 17 de março já eram 100 pessoas oficialmente diagnosticadas, e no dia 20 de março apenas a cidade de Nova York já confirmava 5,6 mil casos. No dia seguinte, o Departamento de Saúde (Governo Federal) fez um requerimento em larga escala de máscaras N95, ou seja, entre 3 de janeiro e 21 de março, foram mais de dois meses perdidos pelo governo enquanto o vírus se disseminava entre a população estadunidense.

    Reação dos mercados

    Enquanto isso, os mercados também foram impactados, com um crash na bolsa de Nova York no final de fevereiro, motivado também pela crise do coronavírus.
    No dia 3 de abril, o Departamento do Trabalho indicava que o desemprego havia chegado a 13%, sinalizando que o país – e o mundo – poderia estar a caminho de uma grande depressão pior do que a de 1929.

    Tão logo os norte-americanos lançaram a ideia de que poderiam se retirar da Organização Mundial da Saúde, Beijing tratou de aumentar a sua contribuição financeira. Ao longo dos próximos anos, veremos essa disputa se acirrar

    Com o avanço da epidemia, declarada pandemia pela Organização Mundial da Saúde em 11 de março, as desigualdades existentes entre os países e dentro dos países ganharam destaque. Desigualdades no tocante ao poder político, a capacidades econômicas e tecnológicas e as divisões entre as classes sociais e as etnias são escancaradas. Fica evidente que mesmo Estados que já fizeram o básico em termos de saúde pública, como Itália e França, têm o sistema vergado sob o peso da expansão da doença. E fica mais claro ainda que os EUA são lentos na reação inicial e têm que lidar com essas desigualdades brutais dentro da própria população, que dificulta a identificação dos infectados. A natureza do sistema de saúde norte-americano – privado – impede ou desestimula a população menos abastada a procurar por ajuda ou por testes para identificar se são portadoras do vírus.

    Confusa reação de Trump

    Como observado, o governo Trump demorou a reagir à doença. Quando o fez, foi de forma totalmente egoísta e voltada para a satisfação dos próprios interesses. Surgiram, na imprensa europeia e estadunidense, informações que davam conta de que o governo federal e os governos estaduais começaram a sair a campo para comprar suprimentos médicos e respiradouros do único grande fornecedor global, a China. Utilizaram a grande capacidade de compra, mais o peso geopolítico, para atravessar acordos prévios de aquisição feitos por governos de países aliados, como Alemanha e França. Também foi amplamente notado por analistas e observadores na cena internacional que os Estados Unidos se esquivaram de liderar qualquer esforço de resposta conjunta aos efeitos da pandemia, o que terminou abrindo espaço para a diplomacia de países rivais, como a própria China e mesmo Cuba.

    A Batalha de Narrativas

    O fato é que a resposta doméstica estadunidense foi desordenada na comparação com a reação chinesa. E o governo Trump tratou de politizar a questão, e passou para o ataque contra a China.
    O dirigente estadunidense e o secretário das Relações Exteriores, Mike Pompeo, tentam emplacar o nome “vírus chinês” com o intuito de causar prejuízos à imagem do país asiático. Os EUA começaram a acusar Beijing de ter, propositalmente, escondido informações sobre a propagação do vírus no território durante a fase inicial, tendo contado com a cumplicidade da OMS para isso. O vice-primeiro ministro japonês, Taro Aso, já havia feito tal acusação contra a Organização Mundial da Saúde antes dos EUA, ou seja, um aliado de Washington fez um tipo de declaração que se inseriu numa batalha de narrativas em torno da Covid-19. Em março, o presidente norte-americano começou a ameaçar o órgão da ONU com o desligamento dos Estados Unidos.

    A China rechaçou essas afirmações. Antes, porém, a diplomacia russa manifestou-se em defesa de Beijing e criticou a posição estadunidense em 12 de abril, num comunicado do próprio chanceler russo, Sergei Lavrov. O comunicado elogiava a OMS e dizia que ela estava agindo de acordo com as linhas de orientação, respeitando todos os países membros. Sem adotar meias palavras, o governo russo disse que os EUA estavam tentando desviar a atenção da opinião pública do fato de que haviam cometido erros grosseiros no tratamento da pandemia.

    Milhares de pessoas acompanham velório do general Qassim Suleimani, em Bagdá. Suleimani foi morto durante o ataque dos Estados Unidos

    O Porta-Voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Zhao Lijian, saudou a posição russa e tratou de apresentar a China como um líder internacional no combate ao coronavírus. Ao mesmo tempo, atacou os EUA por politizar qualquer forma de cooperação antipandemia e foi além. Disse que os chineses estavam prontos a trabalhar com a OMS, a Rússia e qualquer país no sentido de conter os efeitos do novo coronavírus. O Secretário Geral da ONU, Antonio Guterres, saiu em defesa da OMS contra as acusações norte-americanas. Os chineses também começaram a acusar os norte-americanos de terem levado o vírus para seu território durante os jogos militares que ocorreram em Wuhan no final de 2019, o que contribuiu para elevar ainda mais a tensão com os Estados Unidos.

    O efeito duradouro

    O Coronavírus já tem um efeito que pode se tornar duradouro na política internacional: a imagem dos EUA como líder hegemônico sai arranhada por conta da atuação, que foi oscilante e na qual abriram mão de toda e qualquer liderança. Isso se deu principalmente pelo fato de não terem ensaiado nenhuma forma efetiva de apoio aos aliados europeus. Em contrapartida, a China conseguiu dar uma resposta efetiva na contenção da Covid-19 dentro de suas fronteiras, além de usar sua singular situação econômica para oferecer ajuda a países necessitados, como foi o caso da Itália.

    Todavia, mesmo tendo sido bem sucedida, paira a dúvida sobre a transparência das informações veiculadas pelo governo chinês nas fases iniciais do problema. Não é impossível que governantes em níveis regionais (cidades e províncias) e, mesmo, no plano nacional, tenham tentado segurar informações, enquanto tomavam ciência da situação. Se isso ocorreu de modo a evitar pânico ou porque houve uma decisão de não veicular a informação por conta da situação política doméstica e internacional (estavam ocorrendo os protestos em Hong Kong, há a situação no Xingiang e disputas geo-econômicas com os EUA e territoriais no Mar do Sul da China), é algo que ainda precisa ser elucidado.

    Minar a imagem da China

    Ao mesmo tempo em que a liderança estadunidense simplesmente não opera, também se observa que há um esforço acentuado do governo Trump para minar a imagem da China. Pesquisas feitas nos EUA em abril pelo Pew Research Center indicavam que 62% dos entrevistados consideravam a República Popular da China como uma ameaça global aos Estados Unidos. Isso, certamente está sendo usado com objetivos de curto, médio e longo prazo, em que se deve levar em consideração o calendário das eleições presidenciais e os efeitos da competição geopolítica e econômica com Beijing.

    Os efeitos do Coronavírus afetarão os países do chamado Sul-Global. A esmagadora maioria desses países tem problemas econômicos e sociais muito sérios, agora agravados pela pandemia. Há regiões com sistemas de saúde precários que buscam lidar com outras epidemias, como é o caso de Estados africanos e latino-americanos

    A Covid-19 também afetou outra disputa em curso no sistema internacional: a busca por controle ou influência de organizações internacionais. Isso está exemplificado no caso da OMS, com os EUA e alguns aliados acusando a organização de ser conivente com a China.

    Tão logo os norte-americanos lançaram a ideia de que poderiam se retirar da Organização Mundial da Saúde, Beijing tratou de aumentar a contribuição financeira. Ao longo dos próximos anos, veremos essa disputa se acirrar, com a China e alguns países pressionando ainda mais pela reforma de importantes organizações e acusando os EUA e os aliados (principalmente a Europa Ocidental e o Japão) de tentarem manter o controle que têm sobre elas desde o final da II Guerra Mundial.

    Poderemos assistir a uma aproximação ainda mais forte entre a Rússia e a China por conta da atuação dos Estados Unidos. Essa aproximação tem uma lógica econômica fundada na questão energética (necessidades chinesas e recursos russos abundantes) e na questão geopolítica (conter o excesso de poderio americano em termos militares e econômicos). No meio, poderemos ver, também, a uma rearticulação de todo um leque de alianças regionais, com países tentando se posicionarem diante dessa aproximação sino-russa em reação à política externa estadunidense.

    Nesse último aspecto, ressalte-se que os EUA têm uma vantagem estratégica de peso: a maioria das demais potências econômicas e militares do mundo é, de alguma forma, aliada do dispositivo geoestratégico norte-americano, ou tem interesses em conter a China. No primeiro caso, temos países como Japão, Austrália, Grã-Bretanha e França. No outro grupo, destacam-se a Índia e o Vietnã.

    Os efeitos do Coronavírus afetarão os países do chamado Sul-Global e como eles se posicionarão nessa competição entre as três grandes potências. A esmagadora maioria desses países tem problemas econômicos e sociais muito sérios, agora agravados pela pandemia. Há regiões com sistemas de saúde precários que buscam lidar com outras epidemias (sarampo, dengue, febre amarela), como é o caso de Estados africanos e latino-americanos.

    E o Brasil?

    A situação internacional de competição entre as grandes potências já estava se manifestando no Brasil. Desde as eleições de 2018, o presidente Jair Bolsonaro tenta realizar um processo de alinhamento com a política externa norte-americana. O acordo em torno do uso da Base Aeroespacial de Alcântara, por exemplo, está totalmente inserido na competição que os Estados Unidos têm com a China. Nessa disputa, a tecnologia é um setor-chave no qual os EUA e seus aliados tentam resguardar a sua posição de criadores mundiais de padrões frente a uma China que tenta se inserir como uma desafiante nesse jogo.

    Desde as eleições de 2018, o presidente Jair Bolsonaro tenta realizar um processo de alinhamento com a política externa norte-americana. O acordo em torno do uso da Base Aeroespacial de Alcântara, por exemplo, está totalmente inserido na competição que os Estados Unidos têm com a China

    O setor aeroespacial é visto pelos dois contendores como parte vital dessa disputa, e a base brasileira está, simplesmente, localizada no melhor ponto do planeta para o lançamento de cargas espaciais. A assinatura da cooperação, nos marcos em que foi feita, é uma declaração do governo Bolsonaro de que está tomando partido dos interesses estadunidenses.

    Não é só nesse exemplo que o governo brasileiro começa a realizar uma política externa subserviente. Em várias reuniões em órgãos internacionais, o Brasil sempre procura se alinhar com o governo Trump. O chanceler Ernesto Araújo dá constantes declarações fustigando a China, sendo que em maio ele emitiu um parecer aconselhando o presidente Bolsonaro a adiar o leilão do 5G de modo a favorecer interesses estadunidenses em detrimento da chinesa Huawei. O mesmo ocorre com membros do governo brasileiro, que sempre tratam de criticar em termos duros o governo chinês.

    Isso vem junto com uma política doméstica de negação da importância da doença, feita pelo próprio presidente da república. Durante o mês de fevereiro, Bolsonaro ecoava qualquer afirmativa do presidente Trump minimizando a gravidade do Coronavírus. Quando o dirigente norte-americano começou a mudar de posição, Bolsonaro permaneceu em negação.

    O Brasil perdeu tempo precioso em comprar suprimentos médicos como máscaras e respiradouros da China. Além disso, o governo brasileiro tratou de solapar as bases das relações especiais que haviam sido construídas com Beijing nos governos anteriores, e que mesmo o governo Temer tentou manter após o golpe de 2016

    Um dos resultados imediatos foi que o Brasil perdeu tempo precioso em comprar suprimentos médicos como máscaras e respiradouros da China. Além disso, o governo brasileiro tratou de solapar as bases das relações especiais que haviam sido construídas com Beijing nos governos anteriores, e que mesmo o governo Temer tentou manter após o golpe de 2016. Sob o impacto da Covid 19, começam a ser mostrados os limites da Política Externa Brasileira nessa nova era de competição entre as grandes potências.

    *Flavio Rocha de Oliveira é professor de Relações Internacionais da UFABC.

  • MENTIRA, INSENSATEZ E DESPOLITIZAÇÃO: MARCAS DO TEMPO ATUAL?

    MENTIRA, INSENSATEZ E DESPOLITIZAÇÃO: MARCAS DO TEMPO ATUAL?

    MENTIRA, INSENSATEZ E
    DESPOLITIZAÇÃO: MARCAS
    DO TEMPO ATUAL?

    Por Francisvaldo Mendes, presidente da FLCMF

    O presidente da república, que aplica o maior desgoverno dos tempos atuais na política no Brasil, afirma estar com COVID-19. Para piorar, afirma que está melhorando com hidroxicloroquina. Nesse momento em que os filhos do presidente parecem atrapalhar mais que ajudar, com rachadinhas, blogueiras e porcos, chamar a atenção para uma situação de vida, ainda que inventada, pode ser a saída para a política mais desqualificada. Mas, para além da mentira, insensatez e despolitização, que parece fazer parte desse tempo sombrio, ainda há a ações de desprezo pelo próprio governo.

    Pois o presidente do país, que disse que era atleta e não tinha medo do vírus, agora se diz infectado. O mesmo presidente que disse que se tratava só de uma “gripezinha”, e administra o país com essa quantidade alarmante de óbitos. O mesmo presidente que investiu recursos em um remédio que a ciência, comprovadamente, afirma que faz mais mal do que bem para o combate da covid e agora aproveita para “inventar” que essa droga está o salvando. O mesmo presidente que vive uma situação de desgaste político com seus filhos envolvidos em escândalos, entre os quais, a tal rachadinha bate recordes de piadas populares pelo país, pretende que as pessoas olhem com seriedade a sua condição atual. Esse mesmo presidente diz estar sendo tratado pelo remédio que não tem efeito positivo sobre a doença, movimenta as atenções para o seu tal covid tirando o foco dos filhos, tenta justificar os gastos de medicamentos e ainda, atleta como diz ser, busca construir comoções e mostrar que o mundo enfrenta uma gripezinha. Essa situação é descaradamente desrespeitosa, irresponsável e segue os caminhos das tais fake news, mentiras e inverdades que sustentam o governo atual. Lamentavelmente, não possível ter o mínimo de credibilidade.

    A condição humana está mais e mais, progressivamente, desrespeitada pela grande maioria dos governantes. Quando a vida está no alvo direto e o Estado tem ações para a morte e não para condições de saúde e sobrevivência, realmente não se pode culpar o vírus, por mais letal que possa ser. Deve-se responsabilizar a política e, nesse caso, são justamente o que controlam o Estado, que deveriam ser responsabilizados.

    Aqui no país, que a Constituição afirma existir três poderes, todos possuem sua parcela de responsabilidade nessa maré destruidora. Mas não se trata de uma maré que arrasta todas as pessoas do país da mesma forma e com os mesmos impactos. Mas de uma política de manutenção do genocídio e que atinge, principalmente, as pessoas empobrecidas, moradoras das periferias, na maioria negras e negros; as que vivem nas ruas e nas detenções, as pessoas mais sofrem as consequências destruidoras causadas pelo desemprego e pela precarização do trabalho.

    Nessa condição pela qual passa o mundo e o país, com o impacto de uma necropolítica avassaladora, não é possível acreditar em quem assume o principal lugar dos tais poderes. O chefe do executivo federal vai passar pela “gripezinha”, justificar todos os seus absurdos políticos, confirmar o valor das mentiras e continuar com a investidura irresponsável que despreza a humanidade em nome do lucro? Lamentável, mas não se pode saber quando a mentira e as mais alarmantes enganações orquestram os governos a começar pelo principal do país.

    Da nossa parte, não tenhamos dúvidas, que essa situação nos exige o compromisso com o verdadeiro de uma forma que poucas vezes nos foi tão impactante. Verdade, o compromisso com o verdadeiro não é uma política que, ao menos entre nós que vivemos da venda da força de trabalho, pode ir e voltar de acordo com os interesses. Ao contrário, deve ser sempre presente em nosso meio. O maior meio, pois, trata-se da maior parte da população. E não podemos descansar nem um segundo. Mantendo todas as responsabilidades coletivas e solidárias para cuidar da vida precisamos construir, urgentemente, com formação, organização e ação transformadora uma onda a favor da vida e outra política no país.