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  • Não é possível contestar a legitimidade de Maduro sem fazer coro com a direita

    Não é possível contestar a legitimidade de Maduro sem fazer coro com a direita

    Não é possível contestar a legitimidade
    de Maduro sem fazer coro com a direita

    Por Gilberto Maringoni

    Nicolás Maduro toma posse hoje em seu segundo mandato na presidência da Venezuela. O país vive uma gravíssima crise econômica e humanitária. Dos 32 milhões de habitantes, cerca de 1,9 milhão teriam saído do país desde 2015. O desemprego atinge quase um terço da população economicamente ativa e a inflação pode alcançar 1 milhão por cento neste ano.

    Apesar de indicadores para lá de preocupantes, não há neles motivos para se contestar a legitimidade de Maduro ou para chama-lo de ditador.

    A crise humanitária dos migrantes da América Central para os EUA é igualmente dramática e ninguém exige que se isolem os países da região. A situação dos Direitos Humanos na fronteira México-EUA é bestial, sem contar a ação deste último em Guantánamo, nas incursões bélicas que faz no Oriente Médio, seu apoio ao governo terrorista de Israel ou seus ataques a organismos humanitários da ONU. Os EUA seguem impávidos se autoproclamando os campeões da democracia.

    MADURO FOI ELEITO em uma disputa com regras contestadas. Ele não teria – segundo países do Grupo de Lima – votos necessários para se eleger. O Grupo é composto por Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, Honduras, México, Panamá, Paraguai e Peru. Os mesmos países deveriam – por coerência – voltar suas baterias contra o sistema distrital das eleições legislativas francesas. Em junho de 2017, o partido Em Marcha!, de Emmanuel Macron, granjeou 43,6% dos votos válidos. No cômputo final, alcançou 53,5% das cadeiras (308 em 577). É uma distorção séria.

    A Venezuela enfrenta desde 2015 – ainda no governo de Barack Obama – pesado bloqueio econômico por parte dos EUA. Estes se acentuam no governo Trump. A forte queda dos preços internacionais do petróleo entre 2014-16 arrebentou o caixa do Estado, num país sem indústrias e marcado por um único produto exportável. A moeda nacional virou pó.

    AS PRESSÕES QUE O PAÍS sofre dos Estados Unidos, da União Européia e agora do Grupo de Lima vêm acentuar a crise. Dominado pela direita e pela extrema direita continental, em especial pelos governos Bolsonaro (Brasil), Macri (Argentina) e Piñera (Chile), o Grupo se tornou uma extensão da política do Departamento de Estado estadunidense.

    É difícil apoiar o governo Maduro, tamanha é sua incompetência e conduta reprovável em várias frentes. Mas é um governo eleito e legítimo (coisa que a administração Michel Temer não era).

    Política se faz com atos e movimentos concretos. Não há alternativa democrática ou progressista a Nicolás Maduro. As pressões por sua queda se originam na cobiça de Washington pelas reservas petrolíferas venezuelanas (as maiores do mundo) e por forças políticas internas que combinam obscurantismo, autoritarismo e submissão ao Império.

    Não há neutralidade possível ou oposição que não favoreça o ultraliberalismo no país vizinho. Não é possível contestar a posse de Nicolás Maduro sem jogar água no moinho do outro lado.

  • 2018 foi. Que se vá!!! Que 2019 seja de vitórias  construídas, coletivamente!

    2018 foi. Que se vá!!! Que 2019 seja de vitórias construídas, coletivamente!

    2018 foi. Que se vá!!!
    Que 2019 seja de vitórias
    construídas, coletivamente!

    Francisvaldo Mendes
    Presidente da Fundação Lauro Campos

    O ano de 2018 foi marcado por contradições, algumas conquistas e muita tristeza. Não há como descrever em uma só palavra esse ano que refletiu e desenhou alteração inimaginável nas relações institucionais e sociais. Pensar sobre essas movimentações só pode servir para aprender, fazer diferente, construir pujança para transformar a vida para melhor, ao menos criar um movimento potente e criativo.

    Vimos à vitória presidencial de um candidato que ancorou suas narrativas, práticas e atitudes em uma tirania algoz e em um preconceito decrépito e anacrônico. Para além, disso ai, manifestou-se todas as concordâncias e múltiplos compromissos com a pior face da exploração do preconceito, do machismo, do racismo, do sentimento mais baixo que as pessoas possam expressar. Mas, seja como for, todos e todas que querem o respeito à vida, à dignidade, às pessoas, independente da escala sofrida por essa mudança de comportamento devem superar esse atraso. Essa angustia somente passará pela compreensão do povo, da periferia, populares, trabalhadores, que acreditaram nas mensagens “fake news”, quando perceberem o quanto foi utilizado para um fim que não é para melhorar suas vidas.

    Esse ano a tristeza e a indignação nos cortou a alma, os corpos, os sentimentos e os pensamentos com os assassinatos de Marielle e Anderson. Tal crueldade absurda, que não deveria haver na vida, ainda mais no século XXI, foi dilacerante. Viver o luto necessário deve nos recompor para aprender a importante ampliação da solidariedade e o agir coerente, com ações concretas, para que ninguém se sinta e nem muito menos fique só. Nenhuma pessoa crítica a esse sistema e ao modelo que apareceu como vencedor pode estar sujeito a tais violências e nossa postura, nossa organização e nossas ações devem ser significativas e emblemáticas para combater esse sentimento animalesco e desumano.

    Sinais de avanços, da nossa parte, pulsaram no ambiente da política e da estética para uma convivência mais afetiva e solidária. A Fundação Lauro Campos esteve presente em vários locais do país, norte, nordeste, sudeste, centro-oeste, e estará ainda mais no ano que se inicia. Investiu-se em diálogos, formulações e formações para fortalecer nossos elos e a coletividade. Apostou-se em insumos para a democracia aparecer como fundamento das relações humanas, na disputa com o Estado, na organização da sociedade civil e na consistência de elos que unifiquem toda a esquerda existente no Brasil, com apostas que inunde a América Latina.

    Saudamos a vitória de López Obrador no México. Animamo-nos com a primeira vice-presidente negra eleita na Costa Rica. Com a votação que o PSOL obteve reunindo mais de um milhão de votos que o pleito anterior, permitindo eleger uma bancada maior em São Paulo, no Rio de Janeiro, além de contar com as presenças de Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Pará. Comemoramos a paridade alcançada entre os 10 parlamentares federais, com 5 mulheres. Isso é um grande salto de qualidade, política, humana, existencial e de formação. Não deixamos dívidas para a limitadora clausula de barreira e isso foi produto de ação coletiva e qualificada, organizada com solidariedade e luta.

    Assim nos sentimos fortalecidos para enfrentar 2019 para que dele, com unidade, respeitando a diversidade, mas com identificação clara dos nossos desafios para vitórias coletivas. Apostar em formação, nas pessoas que já são militantes e em toda a sociedade civil crítica à intolerância e à exploração são metas atingíveis que contarão com todo nosso empenho. Investir em ações qualificadas pela democracia, seja ampliando a contradição no Estado Capitalista autoritário, seja conquistando direitos cada vez mais amplo para as pessoas e com as pessoas. Assumir, sem trégua, a defesa inequívoca de todas as pessoas que vendem a força de trabalho para a sobrevivência: salários, condições de trabalho, de moradia, de transporte, de vida digna na cidade são fundamentais. Avançar, marchar com unificação da diversidade, para a conquista do socialismo, polindo a cada dia frestas cada vez mais libertárias. Esses são nossos desafios e apostamos que os construiremos a cada dia do próximo ano, para que, o ano seja, de fato, novo.

    Não podemos esquecer, aprender com a teoria acumulada, com a história, com as práticas coletivas e ações em busca do socialismo. Importante não repetir erros, isso é imprescindível. Fazer isso com afirmações afetivas e solidárias é o que nos marcará. Neste grande, qualificado e potente muro de mãos dadas ninguém está só, ou abandonado à própria sorte. O capitalismo impõe ao povo a ideia que o ocorrido na vida de cada um é uma questão de sorte ou azar, e não um labirinto proposital do sistema contra o povo. E por mais duro que seja o “pessimismo da razão” não maculará o nosso “otimismo da vontade” coletiva. Vamos construir, na luta continua e com objetivo claro socialista, a aposta na democracia, nos direitos e na liberdade, para colorir um 2019 de conquistas e vitórias para todas as pessoas, principalmente para aqueles que realmente estão desamparados.

  • Negras Vozes: o movimento negro e as parlamentares negras no PSOL

    Negras Vozes: o movimento negro e as parlamentares negras no PSOL

    Negras Vozes: o movimento negro
    e as parlamentares negras no PSOL

    A Fundação Lauro Campos realiza, na próxima terça-feira (27/11), o seminário Negras Vozes: a atuação do movimento e das parlamentares negras do PSOL e a luta anti-capitalista para contribuir com o mês da Consciência Negra. A mesa contará com militantes do movimento negro e com algumas das parlamentares negras eleitas pelo PSOL em 2018.

    O debate abordará temas atuais como a avaliação do processo eleitoral e a representatividade no congresso e nas assembleias legislativas, a luta das mulheres negras e a importância do feminismo e do movimento na luta anti-capitalista.

    Estão com presença confirmada, a deputada estadual eleita em Minas Gerais, Andreia de Jesus;  a deputada estadual eleita em São Paulo, Erica Malunguinho; a deputada estadual eleita, junto ao Mandato Coletivo Juntas em PE, Robyoncé Lima; a deputada estadual eleita, junto ao Mandato Bancada Ativista; a historiadora, militante do Movimento de Mulheres Negras, Dida Dias e a Advogada, professora do EDUCAFRO, Débora Camilo, que irá fazer a mediação do debate.

    Serviço

    O evento começa as 19h, na terça-feira, 27 de novembro, na sede da Fundação Lauro Campos – Alameda Barão de Limeira, 1400, Campos Elíseos, São Paulo (SP).

  • A nossa luta coletiva vencerá. Não deixemos nos abater em tempos sombrios!

    A nossa luta coletiva vencerá. Não deixemos nos abater em tempos sombrios!

    A nossa luta coletiva vencerá. Não deixemos nos abater em tempos sombrios!

    Por Francisvaldo Mendes de Souza, presidente da Fundação Lauro Campos

    Vivemos mais de 20 anos de ditadura militar e, possivelmente, sentir o peso de todo aporte autoritário bate muito duro em todos nós. O pior que dessa vez o caminho foi a via democrática: a estrada do voto dando legitimidade por meio da escolha da maioria. Assim, a dor dessa realidade ganha maior profundidade. A democracia que existe não é para maioria, sabe-se bem disso, pois só os ricos desfrutam do bom e do melhor na sociedade, no entanto ela se apresenta para todas as pessoas, com a ideia ilusória de igualdade ou de merecimento entre todas. Contudo, é preciso compreender que o voto não é a única veia de realização democrática, apesar de ser relevante. A participação popular é de igual importância, diariamente, seja na fiscalização e nos questionamentos ao poder instituído.

    No último dia 28, um domingo, vimos a maioria das pessoas escolher, por “via democrática” o retorno da política tradicional das oligarquias atrasadas e veremos, no dia a dia, em futuro próximo suas consequências. Trata-se mais do que política ultrapassada, é o aumento da concentração das decisões políticas em pequenos grupos com interesses puramente privados acima dos interesses públicos. São as já conhecidas ações com novos nomes, que poderão vir com a imposição do silêncio e do medo, tentando a legitimação para retirar ainda mais direitos das pessoas que trabalham. Poderá haver controle, perseguições e ameaças em todos os aspectos e sentidos. Aquilo que se conhece como neoliberalismo na sua máxima potência, para ampliar lucros e controlar a ferro e fogo as pessoas que atuam por liberdade, conquistas e direitos.

    Claro que há responsáveis, sempre há. Nesse caso não há dúvidas que a oligarquia financeira fez um grande acordo com o setor político dominante no país. Os candidatos tradicionais com compromissos com tais setores, internacionais e nacionais, não emplacaram, e o aventureiro foi a solução encontrada pelos poderosos do sistema. Abre-se, assim, uma nova fase da ideologia dominante sobre o povo, quem viverá as mais duras consequências econômicas. Todas as pessoas que questionam o centro do poder, sejam indígenas, negras, nordestinas, militantes, sindicalistas, ativistas sociais e que possuem uma lente crítica sobre o mundo e atuam para que ele seja mais humano, mais democrático e com mais dignidade poderão viver o peso da violência institucional, mesmo que disfarçada por meio das milícias.

    Nessa hora devemos clamar pelo coletivo que será capaz de produzir a solidariedade, na defesa para continuar a vida, para a sobrevivência da mente e dos corpos, para a saúde em busca de ações qualificadas em nome de uma verdadeira democracia, com mais liberdade e mais direitos. A ideologia dominante forçará o individualismo, o salve-se quem puder e apostará que o temor predomine individualmente tentando empurrar cada pessoa para os ventos do medo, das doenças, da angústia, da ansiedade e do desespero.

    Vamos construir os ventos em outra direção. Ventos coletivos, de solidariedade, com mais organização, mais formação, ampliando para mobilizações conscientes e eficazes. Nessa direção que aqueles que querem ver o outro feliz devem seguir, e não estará só. Será na coletividade, com estudo, organização de base, companheirismo e fortalecimento das características pessoais que se dará a construção de alternativas. Faz-se necessário o cuidado um do outro para suportarmos a situação atual com sabedoria e acumular forças para superar esse momento histórico. Acredite!

    Ninguém estará só e não é o individualismo, tão divulgado e propagandeado pelo liberalismo, que fará cada um de nós vencedor desse processo. Essa é a hora do coletivo e vamos ser capazes de enfrentar os desmandos que a ideologia vencedora momentaneamente nos impõe. Vamos apoiar cada camarada no enfrentamento a desesperança que predomina na sociedade; vamos nos apoiar defendendo o valor da democracia, da liberdade e dos nossos direitos. Vamos unificados, juntos, toda a militância e com cuidado mútuo para nossa ação na construção de uma sociedade fraterna, justa e com liberdade. Essa é a hora do coletivo bradar seu som mais alto e apontar para soluções que ampliem nossas vidas, com mais dignidade humana, altivez e a alegria do nosso povo.

  • As eleições e a democracia: qual futuro?

    As eleições e a democracia: qual futuro?

    As eleições e a democracia: qual futuro?

    Francisvaldo Mendes, presidente da Fundação Lauro Campos

    As eleições de 2018 são de um diferencial significativo na vida das pessoas. Quem possui mais de 50 anos guarda a lembrança da ditadura militar no Brasil. As outras pessoas possuem lembranças de um país sem ditadura militar. Levando-se em conta que a população brasileira se divide em três grandes faixas de idade – jovens até 19 anos; adultos dos 20 aos 59; idosos a partir dos 60 – e que tal diferenciação etária, segundo o IBGE, se divide estatisticamente em jovens e adultos com 90,7% e 9,3% são de idosos, a lembrança do tempo vivido durante a ditadura militar é a menor.

    Por outro lado, a vida com internet no Brasil, modificou hábitos de aproximadamente 90% da população. Os jovens, mais de 40% hoje, foram formados com os equipamentos e as linguagens desse ambiente digital, com o celular na primeira fileira e as leituras rápidas, fotos, memes, vídeos, tomando a maioria dos sentidos. Não são os livros, assim como não é a leitura do conhecimento acumulado, que predomina na vida das pessoas. Na verdade, no Brasil, a leitura e os estudos do conhecimento acumulado nunca foi predominante. Mas hoje se vive um período que nem os jornais impressos e nem mesmo a Televisão ocupam o principal espaço de tempo das pessoas, muito menos o rádio (principal comunicação popular do passado). Mas pode-se arriscar dizer que somente um meme, uma mensagem de alguns caracteres, desenhos, fotos, vídeos – facilmente produzidos e editados no próprio celular – predominam e, pior, são travestidos em conhecimento. A inverdade supera a verdade facilmente e em múltiplas dimensões. Não é por menos que os tais fake news estão em primeiro lugar na organização política na vida das pessoas. Vale uma informação, mesmo correndo o risco que todas as pessoas saibam, a tradução de fake news é notícias falsas.

    Agora, em outubro, na véspera de iniciar a terceira semana, a segunda depois da votação do primeiro turno em eleições quase gerais, com um dos candidatos tratando normal não ir ao debate, agredir verbalmente as pessoas, não respeitar minimamente as diferenças e ainda ser ponto fixo de uma (im)possível democracia, é algo muito assustador. O medo vai tomando as mentes e corações com mais força e predomínio a cada dia.

    Vale refletir sobre o que foi o saldo eleitoral do primeiro turno, para além de olhar somente para o PSOL na Câmara e nas Assembleias Legislativas. Na Câmara ampliamos para dez cadeiras, pois ocupávamos seis. Por sua vez, a sigla partidária do Bolsonaro, PSL, que eleição passada elegeu apenas 1 deputado, nessa fez 52, a segunda maior bancada da Câmara. O principal ambiente da política federal do país, terá a presença de 30 siglas das 35 registradas no TSE, continuará com conservadores como maioria e, para piorar, haverá predomínio dos reacionários.

    O PSOL ultrapassou a clausula de barreira, obteve mais de 1,5% dos votos válidos para Câmara em nível nacional e chegou, em mais de nove Unidades Federativas, com pelo menos 1% dos votos válidos em suas candidaturas. Ou seja, até 2022, significa que o partido terá direito aos rateios do fundo partidário e do tempo de TV. Agora, para além do Rio de Janeiro, São Paulo e Pará, o PSOL contará com parlamentares de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul. Não se pode deixar de registrar que, mesmo diminuindo o número de cadeiras de 69 eleitos na eleição passada para 56 na eleição atual, o PT foi a sigla partidária que mais elegeu deputadas e deputados.

    Nessa passarela que pode ser argumentada como democracia, pelo fato das pessoas votarem, o cenário que aponta para o próximo ano é desfavorável para o significado do termo. Caso o candidato da legenda PSL ganhe as eleições, o povo brasileiro viverá uma ação de estética e práticas autoritárias, com um modelo que ampliará o predomínio neoliberal com apoio da Câmara. Caso contrário, ainda que se derrube a estética autoritária e o modo reacionário de dirigir, haverá uma Câmara e um Senado combatendo qualquer fresta que aponte para enfrentar desigualdades e o neoliberalismo. Passagem com marcas democráticas que apontam para futuros com baixos odores da democracia.

    Nós do PSOL não tivemos dúvidas, apoiamos Haddad. Faremos de tudo para transformar os votos aos parlamentares do partido, ao Boulos, às nossas candidaturas, buscando sempre ampliar, em possibilidade de um ambiente que favoreça conquistar mais democracia e qualidade de vida. Sabemos que os próximos anos serão de muitos desafios. Formação, mobilização, participação das pessoas nos mandatos e construção de um novelo unificado partidário, avançando para um PSOL fortalecido e unitário, despersonalizando ao máximo nossas fileiras e ampliando a organização coletiva, será um grande desafio e que vamos fazer de tudo para construir. Mas, também sabemos, que nesse momento, será mais favorável para o futuro e para o presente, derrotar a xenofobia e toda estética da guerra com compromisso com o capitalismo que vem com a figura que representa a sigla PSL e seu candidato. Por isso, nesse momento, faremos de tudo para garantir a unidade e a mobilização para que Haddad seja o vitorioso no segundo turno das eleições.

  • Superar as desigualdades: esse é o desenvolvimento que o Brasil precisa

    Superar as desigualdades: esse é o desenvolvimento que o Brasil precisa

    Superar as desigualdades:
    esse é o desenvolvimento que o Brasil precisa

    Francisvaldo Mendes, presidente da Fundação Lauro Campos

    Restam menos de quinze dias para a primeira votação nessas eleições e ainda que as grandes mudanças não venham desse processo, quanto mais neste em especial – mudanças profundas que envolvem a relação das pessoas com a natureza, o processo histórico da produção e o trabalho para realização da potência humana criativa – podem ser uma semente de possibilidades e isso importa neste momento.

    Para os principais setores das oligarquias políticas brasileiras, assim como para os poderosos do império em nível internacional, não é possível, para eles, enxergarem, em um dos dois candidatos que as pesquisas hoje colocam no segundo turno, alternativas. Claro, são por razões absolutamente distintas, mas não é possível. A alternativa colocada é buscar construir um “bote salva vidas” com o discurso para evitar crise; seja uma crise no campo moral, econômico (como o mercado trata o termo priorizando o lucro) ou social. Mas isso não está dado e no tempo que resta para a votação do primeiro turno pode não ser possível ser construído. Assim sendo, a oligarquia política brasileira pode ir para o segundo turno sem opções e, caso isso ocorra, terão que buscar acordos com os dois candidatos e escolher pelo acordo mais apropriado, para seus interesses, frente as condições.

    Da nossa parte, que temos uma chapa que acumula, tanto do ponto de vista político quanto programático, uma evidente identidade com o povo trabalhador, com toda sua diversidade, da periferia aos setores médios, o desafio colocado é apostar ao máximo para acumular nesse período. Nem o momento, nem a situação política, muito menos as condições objetivas, nos colocam agora alternativas de “voto útil”. Seria um grande equívoco político tomar esse rumo. Nesse momento é necessário unificar, acumular em formação, eleger uma bancada qualificada e que possa, junto com Boulos e Guajajara, ampliar a adesão do partido junto aos que vivem do seu trabalho e acumular condições para eleger deputados federais e estaduais que apresentem uma pauta contemporânea para enfrentar a exploração e as várias formas de discriminação social.

    Neste momento, o desafio do PSOL, e da acertada aliança que construímos, é investir na unidade e apostar em pautas que sejam propositivas em favor do povo trabalhador. A mídia ter reforçado o palco para o candidato que representa as principais pautas autoritárias, que marcam a formação social brasileira, que podem ser chamadas de fascistas ou até nazistas, não nos fortalece e não se pode investir em estrada similar. Apenas desfoca o elemento central da construção de um País que defenda a vida e os direitos como prioridade. Foi na esteira do golpe e da ação politica da mídia que unificou MDB, PSDB, DEM (e as várias siglas de aluguel que seguem seus dirigentes) que foi criada uma terra fértil para uma narrativa autoritária, machista, racista, que aposta no ódio e na estética da guerra e a fez ganhar tanta força, aparecendo com ênfase neste processo eleitoral. A politica de seguir essa estética de acusações, como se estivesse em uma batalha campal, é um grande equívoco. O caminho é o da formação e da demonstração de que lado está o PSOL: da grande maioria do povo, os que vivem da venda de sua força de trabalho.

    A principal identidade do povo brasileiro é com o trabalho e construir uma campanha focada nos direitos, no controle da natureza, na qualidade de vida, com mais postos de trabalho, maiores salários e dignidade, para homens e mulheres, negros e negras. Ou seja, para todo o povo que depende da venda de sua força de trabalho para sustentar suas vidas e as de suas famílias é nosso caminho. Vamos, portanto, intensificar nossa chapa presidencial. Apostar em ações que anime a militância, aproxime nossa chapa que disputa o planalto a todos que disputam os governos e as vagas nos parlamentos, principalmente as figuras de grande expressão nas Unidades Federativas. Vamos fortalecer o PSOL falando para a maioria do povo, com uma pauta que enfrente e demonstre que é possível, com mobilização, formação e ação qualificada, ter uma Brasil que supere as desigualdades e avance em defesa da vida.

  • O que representa esse incêndio no Museu Nacional

    O que representa esse incêndio no Museu Nacional

    O que representa esse incêndio no
    Museu Nacional
     

    Francisvaldo Mendes, presidente da Fundação Lauro Campos

    Na noite do domingo, dia 2 de setembro de 2018, as pessoas se viram estarrecidas com o incêndio no Museu Nacional, na cidade do Rio de Janeiro. Um acervo de aproximadamente 20 milhões de itens, que apresentam momentos de gerações brasileiras, relações culturais e formas históricas do processo de produção, foi jogado fora. A causa do fogo, seja ela especificamente qual for, demonstra como o Estado, no Brasil, está de braços dados com a ignorância. O contrário disso seria o necessário investimento no cuidado, em formas de prevenção, em condições de manutenção, para se proteger das casualidades da vida, que todo o tempo ocorre. No entanto, a preferência está clara e evidente, pois o Estado investe no privado e cuida do lucro.

    Mais que um museu, ali funcionava um centro de pesquisa, de organização do conhecimento acumulado, gerido pela UFRJ. Tratava-se de um polo de saber, que toda a comunidade deveria participar e atuar para que ao público fosse dedicado e com o público organizado. Para isso caberia ao Estado provir condições, das básicas às mais complexas existente no século XXI, para que o conhecimento encontrasse caminhos de avanço. Mas nada foi feito, o que piorou profundamente com o governo golpista de Temer.

    Mas ao contrário dos investimentos que deveriam existir, o que se constatou, com o lamentável fato ocorrido no domingo, foi que o Museu, a escola, o que deveria ser ponto de encontro para fazer girar o conhecimento estava largado. O exemplo máximo de tal situação foi o fato de que nem os hidrantes, próximos ao museu, tinham água para combater o fogo. Hidrante sem água é só uma mercadoria de metal sem nenhuma serventia. mesmo que tratar as fotos, representações, espelhos de gerações, símbolos, existentes no Museu, apenas como uma figura qualquer. Dessa forma não podem assumir a importante função de colaboração para organizar o que foi acumulado no tempo, muito menos o conhecimento que, desse processo, possa ser criado para contribuir na construção uma vida melhor.

    O mais antigo museu do país, com tempo bicentenário em seus acúmulos e conteúdos, desde quando foi destinado aos cuidados da Universidade Federal do Rio de Janeiro, possuía grande possibilidade de ser um ponto forte de apoio ao conhecimento. Tratava-se de um salto importante, organizar esse acúmulo junto à academia e ao conhecimento, fundamental para a população acessar o percurso do tempo no Brasil, para os estudantes da UFRJ organizarem o conhecimento e para os cientistas avançarem em produção acadêmica. Mas para isso, por sua vez, demandava-se que o Estado no Brasil investisse, com aportes e condições para que tal processo ocorresse. Fato que nunca aconteceu. Na verdade, investimentos em conhecimento e melhoria da vida, seja em que aspectos e dimensões possam ocorrer, encontra no governo golpista atual desvios para ampliar o lucro dos empresários. 

    No mês de junho, com os 200 anos completados, houve uma assinatura para uma verba de 21 milhões destinada à prevenção de incêndio. Evidente que isso entra para um registro que amplia a sombra que o Estado no Brasil impõe a sociedade. Cultura, história, organização de conhecimento, fica jogado às traças pois, lamentavelmente o lucro persiste acima da vida. Esse criminoso e lamentável fato só tem um responsável: o Estado e o seu gerente atual, o governo de Temer. 

  • A disputa presidencial: programas, diálogos, majoritários e vices

    A disputa presidencial: programas, diálogos, majoritários e vices

    A disputa presidencial: programas, diálogos,
    majoritários e vices

    Francisvaldo Mendes, presidente da FLC

    A disputa presidencial já está aberta no Brasil faz alguns meses. No entanto, no último mês houve uma arrumação dos rostos nas disputas. As pessoas que assumem papel de vice começam a aparecer, muito mais para atender um calculo eleitoral do que na defesa de um programa. O PSOL desde o início já havia apresentado sua chapa: Guilherme Boulos, trabalhador, militante, comprometido com as periferias e com linguajar que os mais pobres entendem e por defender um projeto de sociedade oposta ao que vivemos, já havia dado as mãos a indígena, professora, nordestina Sonia Guajajara. A chapa Boulos e Guajajara já se apresentava para quem o partido quer dialogar e o que está em centro na disputa presidencial. Dialogar com todos que vivem do trabalho, com todas as estéticas das periferias e apresentar saídas para enfrentar e superar as desigualdades, das econômicas até todas as outras que afloram subsequentes, são as notas de apresentação do PSOL.

    No mais do mesmo, do mundo eleitoral, vices foram compondo chapas. A senadora Ana Amélia, do PP, se juntou a Alckmin dando rosto para a apresentação que unifica PSDB com DEM, entre outras siglas, como próprio PP e PR, por exemplo. Hamilton Mourão, do PRTB, abraçou Bolsonaro, agora PSL. Eduardo Jorge, do PV, com Marina Silva da Rede. Katia Abreu, que representa o agronegócio compõe com Ciro Gomes uma chapa só PDT. Meirelles também formou uma chapa só MDB com Rigotto.

    Há mais chapas, mas essas disputarão, com o PT, entre Lula, Haddad e Manoela, por enquanto uma chapa de três, compondo a reedição da aliança básica, PT-PCdoB, para a presidência. Tudo indica que a chapa será Haddad e Manoela, mas por enquanto petistas lutam e ainda esperam pela manutenção, oficial, de Lula na disputa.

    Possibilidades não são muitas, haja vista, o artificio criado pelas elites para realizar o golpe contra o PT e o direito dos trabalhadores. O discurso da “democracia” vai ganhar as narrativas de várias formas. As representações, o simbolismo das mulheres, a questão racial, temas que afloraram, ainda com mais força no momento atual, bordarão o tema da democracia. Caberá, principalmente ao PSOL, compor o tema da democracia com temperos estruturantes, que vão além das representações.

    Vive-se uma situação nacional na qual emerge uma ditadura organizada por uma espécie de “oligarquia jurídica”. A ideologia dos três poderes – judiciário, legislativo e executivo – sucumbiu para a centralidade do judiciário e o poder econômico ganhou peso com as contra-reformas do governo golpistas. As várias Medidas Provisórias e o mercado estabelecido com a maioria do legislativo brasileiro, entre presidência, Câmara e Senado, cria uma nuvem para as questões centrais a serem debatidas e uma dificuldade para que temas estratégicos entrem no debate com compreensão para a maioria da população.

    Avanços em inclusões específicas, conquistadas pela força dos movimentos, em educação, principalmente, estão sendo apagadas das linhas do ordenamento jurídico. Mas no fundamental o que está em questão é a organização da oligarquia financeira para manter e ampliar o lucro, colocando-o acima da vida. Preço de transporte, gastos com moradia, sacrifícios para vagas em hospitais e escolas, além do grande custo da sobrevivência das pessoas, são consequências das desigualdades que se ampliaram e aparecem mais forte na vida dos mais pauperizados.

    Avançar em democracia, para além das transparências, da presença das várias raças e dos sexos no espaço de organização superestrutural, questões importantes em realidades que o racismo e o machismo ocupam espaço estrutural nas desigualdades, coloca o direito à vida com dignidade. Precisa-se conter o desmonte do Estado e a desestruturação da sociedade e avançar em salários, espaços de trabalho e custos de vida, que abram ambientes para mais saúde, com uma política que faça da natureza uma promotora da vida e não das destruições, como predomina hoje.

    Sabe-se que o trabalho é visto como uma necessidade, e para as pessoas venderem suas forças de trabalho por condições nas quais possam viver melhor, o faz elemento chave. Isso, por sua vez, é reforçado com preços de passagens e transportes qualificados; alimentos orgânicos e com valores acessíveis; equipamentos culturais em todos os territórios, com qualidade para acesso e participação, principalmente nas periferias; saúde como base fundamental, com respeito a todos os seres vivos, humanos e não humanos; garantia de acesso de todas as pessoas no tratamento das doenças, com diminuição das filas de hospitais, que precisam de investimentos, cuidando das pessoas com respeito. Enfim, todo o investimento na dignidade humana, com respeito às diferenças e garantia de sobrevivência com saúde, em todos os aspectos e mobilidade em toda a cidade, exige melhores salários, mais postos de emprego, mas também um ordenamento das cidades com investimento em todos os territórios.

    O PSOL tem condições de enfrentar esse debate, apresentando um projeto com força e identidade social para o diálogo com os sujeitos que podem fazer a mudança. A maioria da população brasileira é a cabeça, os braços, as pernas, para um programa de transformações em que essas pessoas, sujeitos desse processo, se vejam nos rostos da nossa chapa. Boulos e Guajajara possuem condições de costurar esse grande tecido, com participação organizada de todo Partido e dos movimentos sociais comprometidos com o enfrentamento e superação das desigualdades.

  • Crise fiscal e o caso CAPES

    Crise fiscal e o caso CAPES

    CRISE FISCAL E O CASO CAPES

    Assessoria Econômica do PSOL na Câmara

    1)         O teto dos gastos: crise fiscal ou projeto estrutural de mercantilização de todas as esferas da vida?

    Desde 2015 a sociedade brasileira vem sofrendo as consequências drásticas de um autoritário e irresponsável programa de ajuste fiscal. A situação tornou-se progressivamente mais grave após o golpe parlamentar com a imposição da austeridade fiscal como política de Estado cristalizada por intermédio da Emenda Constitucional 95/2016, popularmente conhecida como a “PEC do fim do mundo”.

    Com a vigência do novo regime fiscal, os gastos serão corrigidos, anualmente, de acordo com a inflação dos últimos 12 meses, até junho do ano anterior. Assim, em 2019, por exemplo, a inflação usada será a medida entre julho de 2017 e junho de 2018. Dessa forma, mesmo havendo crescimento econômico e populacional, os gastos públicos permanecerão estáticos. Isso quer dizer que haverá redução, ano a ano, do orçamento público em proporção ao PIB e também em relação ao crescimento demográfico. É pior do que congelamento: trata-se de esmagamento dos gastos sociais.

    O grande objetivo do teto dos gastos é a redução do papel do Estado na economia em paralelo à consequente ampliação da atuação do setor privado nos espaços antes ocupados pelo setor público.  Trata-se da constitucionalização da ideologia neoliberal de mercantilização de todas as esferas da vida. E isso é comprovado pelos dados[1]: com a vigência do teto dos gastos, a participação do Estado na economia passará de 19,6% do PIB em 2015, para 15,8% em 2026 e 12% em 2036. Enquanto o pacto democrático de 1988, com todos os seus limites, visava à universalização dos bens sociais públicos como a educação, saúde e cultura, o novo regime fiscal visa ao exato oposto: a privatização generalizada do nosso ainda embrionário estado de bem-estar social.

    Muitos economistas comprometidos com a defesa da privatização generalizada do Estado tentam justificar a austeridade fiscal permanente como um meio para se alcançar o equilíbrio orçamentário e, recorrentemente, usam como instrumento retórico a associação das finanças públicas com a economia do lar. Repetem, inclusive, o slogan muito utilizado pelo grande símbolo do neoliberalismo, Margaret Thatcher: There Is No Alternative (em português, ‘Não há alternativa’).

    Contudo, como a boa e velha economia política, corroborada por inúmeras experiências históricas nos ensina, a austeridade fiscal apenas agrava os problemas que, supostamente, pretende resolver. A explicação é simples: sendo o gasto do governo renda do setor privado, quando o governo deixa de gastar e, logicamente, alguém deixar de receber. Sendo assim, em meio a crises econômicas, que por definição implicam contração dos gastos privados, se o governo também contrair gastos, irá piorar a situação do setor privado, que por sua vez terá ainda menos demanda para a sua produção, com duas consequências imediatas: ampliação do desemprego e, dada a queda no ritmo de atividade, contração da própria arrecadação do estado.

    No fim das contas, a tentativa de ajuste levará a um desajuste ainda mais profundo. É exatamente o que vem acontecendo no Brasil desde 2015: ao passo que nos 12 primeiros anos do governo PT, que muitos economistas liberais taxavam como irresponsável do ponto de vista fiscal, tivemos 11 anos de superávits primários, ou seja, gastava-se abaixo da arrecadação, após a imposição do ajuste fiscal em 2015 convivemos, ano a ano, com os maiores déficits primários da nossa história em paralelo à explosão do desemprego e à queda da arrecadação, o que prova que o objetivo da austeridade não era a busca pelo equilíbrio fiscal, e sim, como apontamos antes, a perseguição constante da privatização generalizada do Estado.

    Há ainda um último fator perseguido pelos defensores da austeridade: a redução dos salários dos trabalhadores e a retomada da taxa de lucro dos capitalistas. Austeridade, como vimos, implica ampliação do desemprego e este último altera a correlação de forças entre trabalhadores e capitalistas. Quanto maior o desemprego, menor o poder de barganha dos trabalhadores, o que gera pressões baixistas nos salários. O medo do desemprego é disciplinador. Entretanto, a visão do capitalista é míope: só enxergam salários como custo e ignoram que, a nível agregado, os salários também correspondem à própria demanda pela produção.

    2)         O regime fiscal brasileiro e as experiências internacionais

    A literatura clássica questionou a eficácia da política fiscal enquanto instrumento de política econômica durante muito tempo. A evidência empírica, contudo, demonstrou o viés eminentemente ideológico desse pensamento. Ao longo de diversas crises utilizou-se o poder do Estado para conter recessões por meio da expansão fiscal, com impactos positivos sobre a atividade econômica. A política fiscal mostrou-se em diversos casos um importante instrumento de suavização dos ciclos econômicos.

    Nesse sentido, dois casos são emblemáticos, por se tratarem de países evidentemente liberais: EUA e Inglaterra. Nos EUA, com a crise financeira de 2008, que provocou crises econômicas a nível mundial, o governo aprovou um pacote de estímulo fiscal de quase U$ 800 bilhões, visando impulsionar a economia norte-americana. O programa foi denominado ARRA – American Recovery and Reinvestment Act – que tinha como forte característica a diversidade de instrumentos. Mais de 96% da programação financeira era concentrada nos 3 primeiros anos da crise, sendo o restante diluído em 7 anos.

    As ações eram balanceadas entre instrumentos mais ágeis x instrumentos com maior multiplicador fiscal. Foram ampliadas dotações orçamentárias em saúde, educação, trabalho, segurança, transporte, etc., aplicadas desonerações que aumentassem a renda disponível das famílias (ex. redução temporária de IR), transferidos recursos de auxílio aos estados. Esse conjunto de ações impediu o aprofundamento da crise, estimulando a recuperação econômica.

    Na Inglaterra também foram adotadas medidas para combater a crise e utilizar a política fiscal como instrumento anti-cíclico. Nesse sentido, a regra de ouro e o limite de 40% de endividamento líquido / PIB foram abandonados. Além disso, houve uma redução temporária do IVA (imposto sobre valor agregado) e a antecipação de investimentos. Com essas medidas, a Inglaterra conseguiu voltar a crescer.

    Na contramão das experiências internacionais recentes, em 2015 o Brasil iniciou um processo de contração fiscal, aprofundando os efeitos da crise econômica. Como mencionado anteriormente, as despesas discricionárias da União estão sendo comprimidas para o cumprimento do Teto dos Gatos, refletindo a dificuldade de priorização de despesas em face das limitações impostas. O Estado está perdendo sua capacidade de prestar serviços essenciais para a população e para o desenvolvimento do país.

    O caso Capes: breve prelúdio do que ainda está por vir

    A previsão de cortes de bolsas de pós-graduação no Brasil para o ano de 2019, que será abordado adiante, não é um caso isolado ou um problema meramente conjuntural. Trata-se de parte integrante de um amplo projeto estrutural de mercantilização da educação, como iremos demonstrar nesta seção.

    O novo regime fiscal foi concretizado através de uma emenda à constituição por um motivo importante: havia a necessidade de desvinculação constitucional das receitas destinadas à saúde e educação. Todo o resto poderia ser feito por intermédio de instrumentos legais mais simples, ou seja, trata-se em última instância de um projeto de desvinculação orçamentária e, consequentemente, de privatização da saúde e da educação.

    No caso específico da educação, antes da EC 95, o art. 212, caput, da Constituição determinava que anualmente a União aplicasse em despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino, no mínimo, 18% da receita líquida de impostos (receita de impostos deduzida de transferências constitucionais a Estados e Municípios). Agora, com a vigência da EC 95, o gasto federal mínimo com educação será congelado no patamar de 2017. Vale destacarmos que o orçamento de 2017 já havia sido aprovado após dois anos de um duro ajuste fiscal, o que faz com que o congelamento das despesas se dê em um patamar extremamente baixo. Com isso, segundo dados da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (Conof) da Câmara dos Deputados, cerca de R$ 24 bilhões poderão deixar de ser investidos por ano em educação com a vigência da EC 95.

    Os defensores do teto dos gastos, contudo, argumentam que o novo regime fiscal não congela investimentos em educação, mas sim estabelece um piso que pode ser ampliado desde que haja cortes em outras áreas. Ora, esse argumento, ao observarmos a evolução concreta do orçamento dado o pacto social estabelecido em 1988, não se sustenta. Por exemplo: com a ampliação do número de idosos, os gastos com previdência e seguridade social tendem, naturalmente, a aumentar. Sendo as despesas com previdência obrigatórias e crescentes e dado que temos um teto para os gastos agregados, não haverá um mínimo de espaço para o crescimento de despesas com saúde e educação ao passo que as demais despesas discricionárias, como, por exemplo, o pagamento de bolsas de pós-graduação, serão esmagadas. Ou seja, o que seria supostamente um piso para a educação, na verdade, acaba por virar um teto. Um teto deslizante (Figura 01).

    Uma simulação estatística, realizada pelos economistas Pedro Rossi e Esther Dweck, aponta que as despesas com saúde e educação, em proporção do PIB, serão esmagadas, passando de 4% do PIB em 2015 para 2,7% do PIB em 20 anos. Pior: daqui a vinte anos a população será 10% maior. Isso significa uma brutal redução do gasto público per capita com educação e saúde na ordem de 38,6%.

    Segundo dados da Instituição Fiscal Independente do Senado Federal, a margem fiscal  de 2024 deve ser negativa, isto é, não haverá recursos para custear qualquer programa governamental de caráter não obrigatório (discricionários).

                                                                                                                                                                                                     Fonte: IFI

    São exemplos de ações discricionárias da União:

    • Investimentos públicos em geral;
    • Programas de incentivo à pesquisa científica, formação de professores e pós-graduação;
    • Programa de fortalecimento e dinamização da agricultura familiar;
    • Políticas para as mulheres: promoção da igualdade e enfrentamento da violência;
    • Política de promoção à reforma agrária;
    • Promoção da Igualdade Racial;
    • Diversas ações ligadas ao fortalecimento do SUS, tais como: Rede Cegonha, Farmácia Popular, estruturação de redes de atenção básica e especializada em saúde, custeio do SAMU, programa Mais Médicos, pesquisa e desenvolvimento tecnológico em saúde, etc;
    • Política de Assistência Social;
    • Programa de erradicação do trabalho infantil.

     

    Como se pode perceber, as ações discricionárias da União estão longe de ser dispensáveis, ao contrário, são essenciais para a sociedade brasileira, além de contribuírem para o crescimento econômico, já que promovem a dinamização de diversos setores, impulsionando a demanda agregada.

    Em face dessa necessidade de priorização imposta pelo Teto dos Gastos, também chama atenção o direcionamento do Fundo Público dado pelo governo. Constantemente são aprovados no Congresso Nacional remanejamentos orçamentários e são editadas portarias pelo Ministério do Planejamento que evidenciam o completo descaso com a população brasileira e o compromisso de preservação das elites nacionais no Poder. São exemplos recentes:

    • Edição da Portaria n° 75, de 2018: governo remanejou mais de R$ 200 milhões de recursos das áreas de saúde, política para mulheres, reforma agrária e investimentos públicos para ações de comunicação da Presidência da República. O valor era 88 vezes maior que o gasto até a edição do ato, destacando que estamos em ano eleitoral. A Portaria foi objeto de Ação Popular do PSOL e teve sua eficácia suspensa;
    • Edição de crédito extraordinário de R$ 1,2 bilhão para custear a fracassada Intervenção Militar no Rio de Janeiro. Lembrando que o crédito extraordinário é um recurso que não se submete ao Teto de Gastos Público, mas apenas à meta fiscal. O ato evidenciou a preferência do governo pelo patrocínio de políticas de violentas e ineficientes, como já mostram os recentes dados da Intervenção;
    • Aprovação do PLN 4, que tratou de remanejamentos orçamentários de mais de R$ 4 bilhões, retirando recursos da educação básica, da política para mulheres, do programa da reforma agrária, dentre outros, em benefício de “Cobertura das Garantias Prestadas pela União nas Operações de Seguro de Crédito à Exportação”, de órgãos como o CADE e a ABIN, etc;
    • Aprovação do PLN 8, que tratou de remanejamentos de mais de R$ 1 bilhão para “Cobertura das Garantias Prestadas pela União nas Operações de Seguro de Crédito à Exportação”, retirando os recursos do seguro desemprego, em um país com uma taxa de desemprego de mais de 13 milhões de pessoas, o que representa mais de 12% da população economicamente ativa.

     

    3)         O caso CAPES

    Foi amplamente divulgado na imprensa o corte previsto no orçamento de 2019 da CAPES. Segundo ofício encaminhado pelo Conselho Superior da CAPES ao MEC, a redução proposta em relação ao orçamento de 2018 inviabilizaria o custo mínimo anual dos programas de fomento da agência. As principais consequências destacadas são:

    • Suspensão de pagamento de todas as bolsas de mestrado e doutorado a partir de agosto de 2019, atingindo mais de 93 mil discentes e pesquisadores e paralisando as atividades de pesquisa no país;
    • Suspensão de pagamento de 105 mil bolsistas a partir de agosto de 2019, interrompendo o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid);
    • Interrupção do Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) e dos mestrados profissionais do Programa de Mestrado Profissional para Qualificação de Professores da Rede Pública de Educação Básica (ProEB) a partir de agosto de 2019, afetando mais de 245 mil beneficiados;
    • Prejuízo à continuidade de quase todos os programas de fomento da CAPES destinado ao exterior.

    Como se percebe, os prejuízos nas áreas de pós-graduação, formação de professores da educação básica e de cooperação internacional são enormes para o ano seguinte. Analisando detalhadamente o orçamento da CAPES, percebe-se com mais clareza a gravidade da situação.

                                                                                                                         Fonte: CAPES

    O Orçamento anual da CAPES já vem sofrendo cortes significativos desde 2016, enfraquecendo o desenvolvimento de pesquisas e a qualificação de profissionais brasileiros. Em 2016 houve um corte de 16% em relação a 2015. Em 2017 a situação foi agravada com um corte de 33% em relação a 2015, chegando a uma situação dramática de redução de 47% em 2018. A previsão de uma compressão ainda maior do orçamento da agência acarretará sua inviabilidade de funcionamento e de promoção da ciência.

    Se pensarmos em termos reais (corrigindo os valores pela inflação), os dados são ainda mais chocantes. Para ter um orçamento real igual a 2015, a CAPES deveria ter uma dotação de pouco mais de R$ 9,2 bilhões. Hoje ele é de R$ 3,9, isto é, 43% do patamar de 3 anos atrás. Comprimir ainda mais esses recursos é criminoso. Caminha-se para a privatização dos sistemas de educação e de pesquisa científica.

    O Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias aprovado pela Câmara dos Deputados antes do recesso parlamentar previu, em seu art. 22, que o Projeto de Lei Orçamentária de 2019 deveria destinar pelo menos o mesmo montante de 2018, corrigido pela inflação, para o Ministério da Educação. Buscou-se preservar, pois, o já precarizado orçamento destinado ao custeio das ações de educação. Não obstante tal previsão, muitas dessas despesas poderão ser contingenciadas por possuírem natureza discricionária, para que o governo cumpra sua meta fiscal. É o que sinalizou o MEC para a CAPES esta semana, agravando a crise já instalada na instituição e que se reproduz em todas as instituições públicas de ensino.

    [1] Dados apresentados no documento Austeridade e Retrocesso: Finanças Públicas e Política Fiscal no Brasil