2018 se decide hoje

Bernadete Menezes

     Dia 8 quando a mulherada em todo o mundo ocupou as ruas das grandes cidades, no Brasil não foi diferente. As brasileiras abriram caminho para a virada que se viu no dia 15 de março. Era a revolta do povo contra o caos que se instalou no país.

Esse início de virada pode tomar uma força vigorosa com a greve geral marcada para o dia 28 de abril e aprovada conjuntamente pelas centrais sindicais.

O motor desta virada é que o golpe mostrou sua verdadeira cara. Recessão, desemprego em massa, desnacionalização, desindustrialização, crescimento brutal da violência nas cidades, quebradeira dos estados e municípios, intervenção da Força Nacional contra os movimentos sociais, desmonte dos serviços públicos e da proteção social, ataque a direitos históricos da classe trabalhadora e, em particular, das mulheres, negros e negras, e imoral concentração de renda e riqueza.

Combinada à força das ruas a crise política tem aumentado dia a dia. Ministros e parlamentares governistas presos, processados, o próprio Temer envolvido em corrupção e na iminência de ser cassado. Mas este governo, que tem como único projeto alinhar o Brasil à globalização imperialista, aos ditames do mercado financeiro e à entrega do país para as grandes corporações internacionais, agoniza, mas não morre. O que o mantém protegido pela mídia, a Justiça e os empresários são a pauta de ataques aos trabalhadores e ao nosso povo.

Um continente polarizado

     O Brasil não foge à regra da polarização por que passa nosso continente. Está em curso uma tentativa violenta de recolonização da América Latina.

A onda de eleições de governos progressistas era a resposta de um povo acuado por sucessivos planos neoliberais e que fazia uma aposta em outro rumo. Mas como produto desta polarização assistimos, por outro lado, a golpes institucionais como em Honduras, no Paraguai, em nosso país e, agora mesmo, na Venezuela, onde o parlamento tenta empossar três deputados impugnados por compra de votos, só para garantir maioria absoluta e poder alterar a Constituição.

Essa polarização põe em xeque os governos progressistas, pois a crise internacional obriga esses países a avançar, sob pena de perder a confiança do povo de serem alternativa de mudança.

Portanto, se a primeira década deste século encontrou a América Latina começando a pagar a dívida social com nossos povos, a continuidade de economias apoiadas somente na venda de commodities, não avançando para uma integração e para reformas estruturais, como parte de um projeto de nação soberana, levará inevitavelmente ao retrocesso.

Em 2018 pode haver um voto à esquerda no Brasil

     A cada ação de ataque às conquistas e direitos de nosso povo implementado por Temer e o Congresso, os setores sociais de esquerda crescem no país. Nas marchas, ouvimos as buzinas de apoio, os polegares para cima dentro dos ônibus, a excelente receptividade a nossos jornais e panfletos, as bandeiras de sindicatos, partidos e frentes (Povo Sem Medo e Brasil Popular) voltaram às manifestações. O povo acordou e à esquerda.

Partidos vistos pelo povo como contrários a esse governo têm se fortalecido. Nós do PSOL, o PCdoB e, em particular, o PT, que é o maior partido. A presença de Lula nos atos tem aumentado a audiência deles, fortalecendo a necessária frente ampla social para derrotar o golpismo em nosso país. Por outro lado, abre um debate decisivo entre nós sobre os caminhos a tomar.

Essa possível mudança na correlação de forças e o aumento de consciência na sociedade diante dos ataques enfraquecem os setores do PT que queriam entrar no governo Temer. Por outro lado, fortalecem a estratégia do salvador da pátria e de todos a 2018! Mas 2018 se decide agora. Só avançando em uma politização maior de nosso povo, no enfrentamento aos planos neoliberais, se poderá chegar a uma nova correlação de forças, para garantir um programa que avance em medidas estruturais e dar um passo adiante. Não com medidas paliativas apenas de diminuição da pobreza, mas na construção fundamental de um projeto para o país.

Mudar a correlação de forças tem uma importância estratégica. Portanto, esquecem os petistas que a frente ampla social e as mobilizações de hoje vão determinar o futuro, se Lula poderá ou não ser candidato e até se haverá ou não eleições.

Um programa para um país continental

     Qualquer governo que se autointitule de esquerda e que assume o Poder Executivo em 2018 tem que partir de três questões. Primeiro, anular as medidas do governo golpista de Temer, revogar os cortes de verbas dos setores públicos e o aumento da DRU (Desvinculação das Receitas de União), as contrarreformas, as terceirizações, a Lei do Ensino Médio etc. Segundo desenvolver um programa de emergência de erradicação da pobreza, combatendo o desemprego e reduzindo drasticamente as horas de trabalho. Por último, compreender que este é um país rico. Somos a nona economia do mundo. Temos uma população jovem, somos ricos culturalmente, temos uma biodiversidade fantástica, num país continental. Portanto, nosso programa não pode se restringir ao que tem proclamado Lula, o aumento do Bolsa-Família, o Seguro-Desemprego e os empréstimos consignados. Assumir em 2018 para fazer mais do mesmo, parafraseando Marx, seria uma farsa!

Um projeto para o Brasil não será obra de um partido, ou de uma instituição, será construído a partir das necessidades e potencialidades de nosso povo. Neste sentido, a resolução do PSOL de iniciar o debate sobre programa com a militância, mas ouvindo as entidades dos movimentos sociais, da academia e de outras instituições é o início de um processo na elaboração deste programa.

Será um desafio. Trata-se de um novo programa para um novo período histórico, capaz de orientar a disputa de hegemonia na sociedade e ser o antídoto para o pragmatismo e o oportunismo que, globalmente, têm dominado a ação política da esquerda.

Em meio à crise de um capitalismo cada vez mais destrutivo, cabe à esquerda criticar não só as propostas de gestão civilizadora do mercado, que encantou e ludibriou a administração petista, mas também as propostas que historicamente ignoraram os limites naturais do planeta. Neste sentido, defendemos seis princípios a partir dos quais deveremos trabalhar um programa construído no limiar de uma era.

– Democratização do poder político.

– Enfrentamento da crise com direcionamento da política econômica para o social.

– Distribuição da riqueza e da renda.

– Defesa do meio-ambiente e mudança da estrutura produtiva nacional.

– Integração regional dos povos.

– Desenvolvimento humano, liberdade, respeito e valorização da diversidade como princípios, tanto de gênero como de raça.

Estes princípios devem orientar um programa que rompa com a globalização financeira. Em defesa de nossa moeda e rompendo a supremacia do dólar como reserva internacional e de proteção em relação aos países ricos, desenvolveremos a solidariedade com os países dependentes, como nós, a retomada de parceria com os Brics e a integração latino-americana.

Da mesma forma, devemos ter um efetivo controle de capitais e das transações financeiras e comerciais. Auditaremos a dívida pública e faremos uma redução drástica dos juros aplicados no país, assim como uma reforma tributária.

Desenvolveremos uma defesa radical da democratização do poder político, de forma que a população possa se expressar através de plebiscitos e referendos sobre temas de importância nacional. E faremos uma democratização dos meios de comunicação.

É preciso ter como princípio a defesa do meio-ambiente, na qual o Estado tenha uma política planejada de preservação dos recursos naturais, direcionando o investimento público para atividades com uma nova matriz energética, de energia renovável e limpa. Que tenha uma matriz de transporte baseada no deslocamento sobre trilhos e no uso de veículos de transporte coletivo e não individual.

Que respeite e valorize a diversidade como um princípio básico do desenvolvimento humano.

Que coloque a soberania nacional como central para qualquer projeto de nação, na perspectiva de superação do sistema capitalista.

Estes eixos podem ser a base para a elaboração de um programa de superação da crise e para que o PSOL se torne mais e mais influente na sociedade, nas lutas cotidianas e nas eleições em 2018.

Várias iniciativas devem ser tomadas para que os eixos deste programa sejam enriquecidos, como a realização de debates públicos pelo PSOL e pela nossa fundação em nível nacional, envolvendo partidos, frentes, movimentos, personalidades políticas e setores de esquerda que possam contribuir com este programa.

FLCMF
FLCMFhttps://flcmf.org.br
Fundação do PSOL
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