Em 2022, o povo brasileiro passou pelo processo eleitoral mais importante de sua história desde a redemocratização do país. Diante de um cenário polarizado, dois projetos estavam em disputa. De um lado, a permanência da barbárie, da intensificação das injustiças sociais e da disseminação de violência, ódio, mentiras e medo. Do outro lado, a reconstrução do Brasil, a retomada de diálogos e políticas públicas, além de esperançar para recuperar o que nos foi tirado e construir novos avanços.
Jair Bolsonaro, após 4 anos na presidência de um governo corrupto, cruel e que aparelhou o Estado, tentou a reeleição para seguir com seu projeto de extermínio e enriquecimento próprio. Além disso, foi apoiado por um conjunto gigantesco e bem organizado da extrema-direita, impulsionada e financiada por setores reacionários da burguesia brasileira. E, por fim, contou com uma rede de comunicação bem consolidada, capaz de mobilizar massas a partir da fake news e da conspiração.
Apesar disso, Bolsonaro tornou-se o primeiro presidente na história da democracia brasileira que não conseguiu a reeleição. Lula teve seus direitos políticos recuperados após a anulação de sua condenação, condenação essa que só foi possível a partir de uma armação política protagonizada por Moro e orquestrada por setores envolvidos na campanha de Bolsonaro. Luiz Inácio, o maior líder popular do Brasil, mostrou-se o único capaz de derrotar Jair nas urnas. Portanto, um pacto histórico de unidade para enfrentar o retrocesso bolsonarista foi formado entre as esquerdas e setores moderados, como a centro-direita democrática e republicana. Ainda assim, a vitória da candidatura de Lula foi apertada, com menos de 2 milhões de votos de diferença.
Após a derrota, setores aglutinados ao redor da campanha de Bolsonaro, especialmente os mais radicalizados, serviram como seus cães de guarda. Dessa maneira, organizaram uma espécie de resistência antidemocrática. Primeiro, interditaram rodovias por todo o país. Depois, passaram a ocupar a entrada dos quartéis militares de norte a sul do Brasil. Suplicam por “intervenção federal” das forças armadas nacionais e até internacionais. Perdidos entre alegações de fraude nas urnas eletrônicas ou simplesmente por não aceitarem o governo de um “ladrão ex-presidiário”. Ainda que nada disso tenha concretude e materialidade, fato é que a extrema-direita está mobilizada.
Diferente do que pensavam os que estavam em negação até a última hora, esse movimento “neofascista” ganha força e se radicaliza nas ruas mesmo com a vitória de Lula. Como alertamos, este movimento precisa ser combatido de diversas maneiras. Tanto institucionalmente, a partir de mecanismos que garantam a punição exemplar desses atos e organizações antidemocráticas, de caráter evidentemente terrorista e bárbaro. Mas também nas ruas, a partir de manifestações populares, seguras e organizadas, em defesa da democracia e de um governo democrático e popular.
Para isso acontecer, é necessário, por princípio, garantir que o governo atenda às demandas populares e seja radicalmente democrático, de sua composição à sua atuação social. E, tanto pelo histórico das composições petistas, quanto pelas movimentações conjunturais observadas, é necessário uma forte incidência do campo das esquerdas dentro do governo para garantir a existência deste movimento de ruptura com a tradicional conciliação observada em experiências anteriores.
Em uma eventual ausência de partidos da esquerda na composição do novo governo, e diante da máxima de que não há vácuo nos espaços políticos, é previsível que se veja o governo repetir a tática conciliadora e aliancista para conseguir apoio do Congresso, tendo que, para isso, abrir mão de pautas caras ao nosso campo político e, mais que isso, à nossa gente.
O papel da juventude democrática e popular organizada deve ser, portanto, pressionar as direções dos partidos de esquerda que compuseram a coligação de Lula desde o início a integrarem o governo não apenas por um movimento tático ou muito menos por uma necessidade carguista, mas porque é desta decisão que será possível cobrar, por óbvio, que estas direções estejam presentes nas principais decisões do futuro governo.
É preciso que os partidos e as figuras da esquerda popular brasileira estejam dentro do governo, ocupando papéis estratégicos, de referência e de destaque, para que possam ouvir e se fazerem ouvidos nas decisões que afetam diretamente o povo brasileiro, em especial numa conjuntura que, como vimos, está fortemente polarizada e com riscos graves e severos de radicalização violenta.
O momento é de repactuação do Brasil com seu povo e isso só será possível se o novo governo operar em prol da classe trabalhadora, dos que estão na extrema pobreza, dos camponeses, dos estudantes, das mulheres, das negras e dos negros, da população LGBTQIA+, dos sem teto, dos sem terra, dos indígenas e de todas as populações marginalizadas, oprimidas e/ou perseguidas neste país. O governo Lula será cobrado – corretamente – se vacilar com aqueles que lutaram e, por vezes, deram sangue para conseguir elegê-lo.
É da juventude a missão histórica de reconectar o governo do Brasil a todo o conjunto do povo brasileiro e, por isso, passa pelas mãos da juventude ajudar a construir um governo que se permita governar para aqueles que mais precisam, com as alianças menos contraditórias e, sobretudo e fundamentalmente, com as prioridades corretas de um governo democrático e popular.
Coordenação Provisória da Juventude Manifesta e Juventude da Primavera Socialista, 24 de Novembro de 2022