No dia 30 de outubro de 2022 derrotamos Bolsonaro nas urnas. O resultado dessa eleição presidencial, devolveu ao país o direito de sonhar. A esperança tomou conta e a alegria foi senhora nesse dia que tiramos um homem atroz do poder. Foi uma batalha árdua: lutamos contra o uso criminoso da máquina do Estado, o orçamento secreto, nosso povo enfrentou toda forma de assédio (no trabalho, nas igrejas e em casa – em especial as mulheres) e, apesar disso, vencemos!
Se por um lado, comemoramos um país que nos deixa vibrar novamente, por outro, não se pode ignorar que a fotografia do dia 30 de outubro revela um país dividido e que o golpe perpetrado contra Dilma em 2016 deixou marcas profundas. Esse projeto golpista, e de bases ideológicas ultraconservadoras, encontrou eco e deu voz à uma extrema-direita fascista, que se organizou em torno do Bolsonarismo e implementou um programa de devastação nacional, retirando direitos sociais e respondendo de forma eficiente a “guerra cultural”. As narrativas conspiratórias criadas em torno do medo e de um discurso de ódio contra aqueles que representam uma ameaça aos valores dos ditos “cidadãos de bem” serviram de combustível para coesionar e manter as bases sociais do bolsonarismo mobilizadas constantemente.
O “dia seguinte” revelou o que prevíamos: nossa batalha será duríssima. A extrema direita no Brasil não é apenas a classe média vestida de camisa amarela, ela se tornou um fenômeno de massas, orgânico, mobilizada e com base popular. Além de contar com uma expressiva base parlamentar no congresso nacional (câmara federal e senado), esse movimento ocupa espaços de poder em todos os níveis de representação política do país, inclusive nas forças armadas e no poder judiciário. Conta ainda com o apoio de setores do agronegócio e do empresariado.
A derrota imposta a Bolsonaro nessas eleições passou fundamentalmente pela figura de Luiz Inácio Lula da Silva, um homem que certamente estará marcado nas páginas dos livros de História, pela sua capacidade de se conectar com o povo brasileiro. Sabemos que se fosse qualquer outro candidato nossa derrota estaria dada como certa. Estamos em um momento crucial e que exige maturidade e grandeza, precisamos acumular forças para o futuro sem prescindir do presente.
Diante desse cenário, qual é a nossa tarefa histórica para enfrentar essa conjuntura? Respondo: A nossa tarefa prioritária deve ser a derrota do fascismo, da extrema direita e hoje nenhuma força política à esquerda é capaz de fazer isso sozinha. A polarização da sociedade brasileira não nos permite hesitar: só há dois lados, não há espaço fora deles. A derrota do governo Lula é a ruína da esquerda e a extrema-direita dará o combate para que esse governo fracasse para que ela possa voltar ao poder em 2026.
A leitura de que podemos nos manter independentes parte da ideia de que haverá inflexões na conjuntura, porém isso é notoriamente equivocado. Sabemos que a oposição será aterradora e que, para manter sua base social mobilizada, irá a todo tempo se instrumentalizar de pautas regressivas, impor sua agenda conservadora no congresso e buscará infligir derrotas ao governo. Não haverá espaço para demarcação e, muito menos, para o antipetismo (este está sempre rondando…).
Desde o golpe parlamentar em 2016, nós que construímos o PSOL tomamos decisões que marcaram a nossa história e trajetória: lutamos contra o impeachment da Dilma, nos solidarizamos e condenamos a prisão arbitrária de Lula, nos engajamos pela sua liberdade, construímos frentes amplas no movimento social (a exemplo da Campanha Fora Bolsonaro) e apoiamos a candidatura de Lula no primeiro turno. Essas decisões se mostraram acertadas, somos um partido com identidade e cada vez mais forte e enraizado na sociedade, mesmo compondo frentes amplas, em que alguns, aliás, nos acusavam de “diluição” do partido. Além disso, esse processo é a prova de que a superação do PT não se dará pelo antipetismo.
Por isso, defendemos que o PSOL mantenha sua coerência dos últimos anos. O partido deve estar na linha de frente de defesa do governo Lula, assumir responsabilidades nesse governo compondo espaços no poder executivo, manter-se mobilizado e conectado com os movimentos sociais e ajudar a reconstruir o Brasil. Reduzir esta posição a uma mera discussão sobre a ocupação de cargos na estrutura do governo federal reflete uma incapacidade de analisar conjuntura e avaliar o que está em risco. A decisão de compor o governo atravessa também a nossa base social, que espera isso de nós. Precisamos estar em sintonia com esse sentimento também, com as milhares de pessoas que depositaram a sua confiança e esperança em nosso partido.
Por fim, temos certeza de que esse será um governo com contradições e não podemos ter medo de enfrentá-las. A derrota da extrema-direita deve ser nossa tarefa principal e nesse quadro não há lugar de conforto. Devemos seguir com a nossa energia e combatividade, enfrentando os poderosos dentro dos espaços institucionais e sobretudo nas ruas. Seremos o tempo inteiro confrontados e precisamos ter a capacidade e serenidade de enfrentar todos desafios. O Brasil de hoje precisa da nossa ousadia e da nossa coragem para que no futuro a alegria seja a senhora de todos nós.
Paula Coradi
Executiva Nacional do PSOL