Revolucionários e revolucionárias se reuniram na noite de segunda-feira (04/03) na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP para debater o papel da esquerda socialista no enfrentamento à extrema direita a convite da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco (FLCMF), do PSOL. O evento contou com as presenças de Luciana Genro, deputada estadual no Rio Grande do Sul e presidenta da FLCMF; Mariana Riscali, diretora executiva da Fundação; Sâmia Bomfim, deputada federal; Daniela Mussi, cientista política e professora da UFRJ e da Unicamp; e Letícia Chagas, advogada e codeputada estadual pelo Movimento Pretas em São Paulo. Depois da atividade, ocorreu o lançamento do livro “A Alemanha da revolução ao nazismo – Reflexões para a atualidade”, de Luciana Genro.
Luciana Genro abriu a mesa fazendo um apanhado histórico do que foi a experiência da revolução democrática que derrubou a monarquia na Alemanha e, menos de três décadas depois, culminou na tomada do poder pelo regime nazista. Após a ascensão do Partido Social-Democrata alemão (SPD) a partir do apoio da luta dos trabalhadores que derrubaram o Império, seus governantes passaram a gerir o capitalismo e frear o ascenso das massas a partir da repressão. “O ápice desse processo foi o assassinato, pelas forças repressoras do estado comandado pelos sociais-democratas, de Rosa Luxemburgo, importante revolucionária que ajudou a construir o SPD e que se colocava contra suas políticas reformistas”, disse a presidente da FLMCF. Tudo isso culminou na frustração das massas, que apostaram na derrubada do Império e no programa proposto pela social-democracia, mas que não viram as políticas reformistas transformarem suas vidas e passaram a buscar uma alternativa mais radicalizada e antissistêmica no nazismo.
Cem anos depois da experiência histórica na Alemanha, Luciana apontou para o fato de que muitos problemas daquele momento seguem atuais. “Na atual conjuntura, vemos a extrema-direita ainda se postulando como alternativa diante das necessidades e frustrações do povo, como demonstrado por Milei na Argentina e por Netanyahu em Israel”, ressaltou. Diante disso, a presidente da Fundação expressou a necessidade de não cometermos os mesmos erros que a social-democracia alemã cometeu ao se afastar das massas e de construirmos uma alternativa da esquerda socialista que seja consolidada pelas próprias mãos da classe trabalhadora.
Comentando a fala de Luciana, a codeputada estadual Letícia Chagas, pessoa mais jovem da história a ocupar a Assembleia Legislativa de São Paulo, trouxe ao debate a contribuição do conceito de “neoliberalismo progressista” de Nancy Fraser, que denuncia projetos políticos que abraçam as pautas democráticas e que se colocam ao lado das mulheres, das pessoas racializadas e das pessoas LGBTQIA+ ao mesmo tempo em que seguem a cartilha do neoliberalismo, um dos responsáveis pelas opressões sentidas pelas chamadas “minorias sociais”. Nesse sentido, para ela: “A luta pautada na representatividade e nas identidades não pode parar por aí, ela deve se conectar com as massas e almejar a transformação das estruturas que alimentam as opressões”, concluiu.
Daniela Mussi reafirmou que a derrota do fascismo e a consolidação de um programa anticapitalista para a sociedade só poderá se concretizar com a organização da classe trabalhadora. “Diante de uma sociedade neoliberal e que impõe à população o individualismo e a atomização, se organizar em movimentos sociais e partidos da esquerda radical é, por si só, um ato revolucionário”, observou.
Carregando a experiência do enfrentamento cotidiano aos representantes da extrema direita no Congresso Nacional, Sâmia Bomfim apontou para a importância de termos derrotado Bolsonaro nas urnas em 2022 e garantido o direito de lutar em uma democracia, ainda que muito limitada. Apesar disso, a deputada reiterou os limites do governo Lula, que segue aplicando um modelo econômico comprometido com os grandes empresários e dando sequência a projetos como o Novo Ensino Médio. “A saída, portanto, não pode ser a absoluta confiança de que os problemas da sociedade serão resolvidos pelos governos e pelas instituições, mas sim a mobilização para a luta nas ruas”, defendeu Sâmia.
Construir uma alternativa da esquerda socialista
Ao fim e ao cabo, o debate trouxe questões fundamentais que devem orientar a esquerda para o enfrentamento da extrema direita e para a construção de um programa anticapitalista. A responsabilidade da esquerda, nesse contexto, é postular uma alternativa da esquerda socialista que supere políticas reformistas e que dialogue com as frustrações do povo. O caminho para isso, como bem apontado pelas debatedoras, deve passar pela organização da classe trabalhadora e pela luta nas ruas, nos territórios, nas universidades e escolas, nos locais de trabalho e em todas as esferas onde seja possível construir uma política revolucionária.