A eleição de Lula representa uma importante vitória das forças democráticas e populares contra a extrema-direita. Essa não foi uma vitória contra um candidato ou uma coalizão eleitoral. Foi uma vitória contra a máquina do Estado brasileiro.
Lula encontrará um Brasil devastado. Os seis anos de agenda golpista (dois de Temer e quatro de Bolsonaro) desmontaram os programas sociais. Ao menos cinco grandes reformas – trabalhista, previdenciária, teto de gastos, autonomia do Banco Central e fim do modelo de partilha na Petrobras – representaram um choque de neoliberalismo na economia. A retomada das privatizações, o desmonte das políticas de proteção ao meio ambiente e os sucessivos cortes no Orçamento, desarmaram o Estado para enfrentar as demandas mais urgentes do povo. O resultado pode ser visto nas ruas, com o aumento da fome, da pobreza extrema, da informalidade e na volta de doenças que já haviam sido erradicadas.
Antes e durante a eleição, Bolsonaro abusou da máquina do Estado como nenhum outro presidente havia feito: mudou a Constituição para conceder benesses às vésperas da campanha, inflou os recursos do Centrão através do Orçamento Secreto, aumentou os valores do Auxílio Brasil, conteve artificialmente a alta nos preços dos combustíveis, aprovou um auxílio específico para taxistas e caminhoneiros, usou o Cadastro Único para propaganda e criou até uma modalidade de empréstimo consignado para os beneficiários de programas sociais. Um escândalo sem precedentes.
No segundo turno, a candidatura de Lula se transformou numa frente ampla que incluiu os partidos do campo da esquerda e centro-esquerda, frações dos partidos da direita, setores burgueses, parte da mídia tradicional, economistas ortodoxos, artistas, influencers, entre outros. Considerando a pequena diferença entre Lula e Bolsonaro – 1,8% dos votos válidos – é possível afirmar que sem essa frente, essa vitória poderia ter sido inviabilizada.
Apesar da derrota, o bolsonarismo se consolidou como uma força política enraizada em parte da sociedade brasileira. Mais que isso: ele não se manifesta como um fenômeno puramente classista, expressando os interesses materiais das classes dominantes, mas como um fenômeno político-cultural que penetra em amplos setores populares com a promessa de manter ou resgatar privilégios – de homens sobre mulheres, de brancos sobre negros, da classe média sobre a classe trabalhadora, das regiões ricas sobre as regiões pobres – e proporcionar ao Estado uma direção ideológica orientada a conservá-los.
A oposição bolsonarista será diferente de tudo o que já vimos. Lula não enfrentará uma oposição disposta a respeitar as “regras do jogo”. A tática do bolsonarismo será, como mostra a extrema-direita nos EUA, apostar na desestabilização do governo, na incitação da violência, no terrorismo doméstico e na insubordinação das Forças Armadas. Se por um lado essa forma de oposição legitima ainda mais os apelos por paciência e compreensão em relação aos limites e às alianças do governo Lula, por outro, exigirá uma defesa firme – no parlamento e eventualmente nas ruas – de suas medidas por parte da base de apoio.
Há enormes expectativas em relação ao governo Lula – e elas não podem ser frustradas. Nos 13 anos em que esteve no poder, o PT optou por um “reformismo fraco” em que todos puderam sair ganhando com o crescimento econômico do país. Esse reformismo foi assegurado com um pacto de governabilidade que incluía muitos dos partidos que estiveram com Temer e Bolsonaro nos últimos anos. Com um governo que estará em franca disputa pela ampla e já caracterizada base que declarou apoio eleitoral no segundo turno ao Lula, cabe à esquerda unir-se para estabelecer a política que deve ser o principal norte da disputa intragovernamental e de seus efeitos sobre o povo.
O PSOL não se furtou a assumir esta responsabilidade durante a campanha de Lula neste ano de 2022. Nunca recuamos nas pautas políticas que são tão caras ao nosso povo e, também, nunca vacilamos no entendimento de que impor derrota ao Bolsonaro era princípio para a retomada de direitos usurpados da população brasileira em sua recente história pós golpe de 16. O PSOL manifestou apoio a Lula, mas apontou as pautas mais caras para o povo e que eram inegociáveis para a construção eleitoral que permitisse sustentar um governo com possibilidades de retomada dos rumos democráticos de um Brasil que foi sucateado pelo bolsonarismo.
Se fizer metade das medidas que prometeu na campanha, Lula já terá avançado mais que em todo o período anterior dos governos petistas. Mas nada disso será feito sem o necessário tensionamento do governo pela esquerda brasileira, principalmente frente a ampla base de direita que também irá o compor. A sinalização de não oposição ao teto de gastos dada por Lula já aponta para a necessidade de que devemos unificar a esquerda em torno das medidas prometidas.
A relação de forças na sociedade é amplamente desfavorável para as posições alternativas. Não haverá espaço para uma “terceira via de esquerda” nos próximos anos. Por isso, falar de temas como defesa de direitos, combate à fome, à pobreza extrema e à crise climática, dentre outros, é uma contribuição concreta para a disputa de um imenso contingente de trabalhadores e trabalhadoras que foram tocados pelas promessas da extrema-direita.
A tática do PSOL de aposta na unidade progressista foi e continua sendo corretíssima. Ela permitiu que o partido se conectasse a milhões de pessoas que buscavam uma renovação das ideias e posições de esquerda. Os resultados vieram com a ampliação da bancada mais diversa do país e a projeção de novas lideranças nacionais e regionais. O PSOL, definitivamente, mudou. E mudou para melhor, exigindo de nós responsabilidade e coragem para enfrentar contradições e dialogar com um campo amplo da sociedade brasileira.
Os setores progressistas e a sociedade em geral esperam de nós empenho e unidade para recuperar o país da destruição promovida por Temer e Bolsonaro. O PSOL deve participar do governo Lula para disputar os rumos da reconstrução do Brasil, derrotar o fascismo e restabelecer a dignidade do povo brasileiro, possibilitando um novo ciclo de lutas por mais direitos e mais democracia.
Assinam esta contribuição o campo PSOL Popular. Assine o nosso manifesto: https://reconstruirobrasil.org.br/
O Psol deve integrar ao governo Lula