Em Gaza, paz sem justiça é incompleta

Comunidade internacional precisa respaldar as investigações de genocídio

Por Thiago Amparo*

O necessário cessar-fogo inicial de seis semanas acertado entre Israel e Hamas nesta quarta-feira (15) pode reconfortar as famílias à espera do retorno dos reféns israelenses e dos prisioneiros palestinos, além de pôr fim à chuva de bombas que o aparato militar de Israel despejou sobre a estreita faixa de terra, matando mais de 46 mil palestinos, a maioria crianças e mulheres.

Não é por menos que um dos termos mais debatidos em detalhes entre Hamas e Israel foi a saída das tropas israelenses de Gaza, o que indica que o futuro é ainda incerto.

A paz em Gaza construída sobre o peso de milhares de corpos não perdurará sem que justiça seja feita. O pós-conflito requer que a comunidade internacional, em especial os países ocidentais, dê respaldo às investigações de genocídio, no âmbito do Tribunal Penal Internacional, e façam cumprir as ordens contra a ocupação israelense dos territórios palestinos, nos termos da mais recente decisão da Corte Internacional de Justiça. Binyamin Netanyahu é um criminoso de guerra que merece há tempos estar preso em Haia.

Não é novidade para ninguém que, durante a guerra em Gaza, assentamentos israelenses estavam sendo expandidos na Cisjordânia, mostrando que o plano da ultradireita israelense não era somente matar milhares de palestinos, mas privá-los de suas terras em violação à lei.

Cortes internacionais consideram ambas Gaza e Cisjordânia como ocupadas no sentido legal do termo. Sem que Israel seja pressionado a apresentar um plano para desocupar os territórios palestinos não há que se falar em uma paz duradoura na região.

Netanyahu rejeitou por meses acordos semelhantes ao que endossa agora, atrasando o retorno dos reféns israelenses, com exclusivo intuito de manter-se no poder por meio da perpetuação do morticínio em Gaza.

Com 1,8 milhão de palestinos em Gaza em insegurança alimentar crítica (86% da população), fica evidente que o clã Netanyahu empregou fome como arma de guerra. Mesmo com o cessar-fogo, sem que haja a reconstrução de uma Palestina livre, a guerra perpetuada pela penúria alimentar continuará a matar milhares, com ou sem bombas.

*Thiago Amparo é advogado, professor de direito internacional e direitos humanos na FGV Direito SP. Doutor pela Central European University (Budapeste), escreve sobre direitos e discriminação.

 

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